Capítulo II
Apogeu e crise da Terceira Revolução
1. Apogeu da III Revolução
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Queda do muro de Berlin (novembro de 1989) Como vimos70, três grandes revoluções constituíram as etapas capitais do processo de demolição gradual da Igreja e da civilização cristã: no século XVI, o Humanismo, a Renascença e o protestantismo (I Revolução); no século XVIII, a Revolução Francesa (II Revolução); e na segunda década deste século, o Comunismo (III Revolução). Essas três revoluções só são compreensíveis como partes de um imenso todo, isto é, a Revolução. Sendo a Revolução um processo, obviamente, de 1917 para cá, a III Revolução continuou sua caminhada. Encontra-se ela, no momento, em um verdadeiro apogeu.
Comentário acrescentado pelo Autor em 1992, à margem do texto de 1976: Crise na III Revolução, fruto inevitável das utopias marxistas Na mais ampla das escalas, isto é, na escala internacional, esse apogeu era notório. Di-lo o texto um pouco mais adiante. Com o recuo do tempo, o quadro geral desse apogeu pode ser pintado com traços ainda mais vastos, quer pela extensão e pela população das nações efetiva e plenamente sujeitas a regimes comunistas, quer pelas impressionantes dimensões da máquina vermelha de propaganda internacional e pela importância dos partidos comunistas dos países ocidentais, quer, por fim, pela penetração das tendências comunistas nos diversos domínios da cultura desses países. Tudo isso, acrescido pelo pânico mundial gerado pela ameaça atômica que a agressividade soviética, servida por um poder nuclear incontestável, fazia pairar sobre todos os continentes. Tão múltiplos fatores davam origem a uma política de moleza e de capitulação quase universais em relação a Moscou. As Ostpolitiks alemã e vaticana, o vento mundial de um pacifismo incondicionalmente desarmamentista, o pulular de slogans e de fórmulas políticas que preparavam tantas burguesias ainda não comunistas a aceitar o comunismo como fato a ser consumado em um futuro não distante: todos nós vivemos sob a compressão psicológica desse otimismo de esquerda, que era enigmático como uma esfinge para os centristas indolentes, e ameaçador como um Leviatã para quem, como as TFPs e os seguidores de Revolução e Contra-Revolução em tantos países, discernia bem o “apocalipse” a que tudo isso ia conduzindo. Quão poucos eram, então, os que percebiam estar esse Leviatã carregando em si uma crise in crescendo que ele não conseguia resolver, porque era o fruto inevitável das utopias marxistas! A crise veio crescendo e parece ter desintegrado o Leviatã. Mas, como adiante se verá, essa desintegração difundiu por sua vez, por todo o universo, um clima de crise ainda mais letal.
Continuação do texto de 1976: Considerados os territórios e as populações sujeitos a regimes comunistas, dispõe a III Revolução de um império mundial sem precedentes na História. Este império é fator contínuo de insegurança e de desunião entre as maiores nações não-comunistas. De outro lado, estão nas mãos dos líderes da III Revolução os cordéis que movimentam, em todo o mundo não-comunista, os partidos declaradamente comunistas e a imensa rede de criptocomunistas, para-comunistas, inocentes-úteis, infiltrados não só nos partidos não declaradamente comunistas - socialistas e outros - como ainda nas igrejas71, nas organizações profissionais e culturais, nos bancos, na imprensa, na televisão, no rádio, no cinema, etc. E, como se tudo isto não bastasse, a III Revolução maneja com terrível eficácia as táticas de conquista psicológica de que adiante falaremos. Por meio destas, o comunismo vem conseguindo reduzir a um torpor displicente e abobado imensas parcelas não-comunistas da opinião pública ocidental. Tais táticas permitem à III Revolução esperar, neste terreno, sucessos ainda mais marcantes, e desconcertantes para os observadores que analisam os fatos de fora dela. A inércia, quando não a ostensiva e substanciosa colaboração de tantos governos “democráticos” e sorrateiras forças econômicas particulares do Ocidente, com o comunismo assim poderoso, compõe um terrível quadro de conjunto diante do qual vive o mundo de hoje. Nestas condições, se o curso do processo revolucionário continuar como até aqui, é humanamente inevitável que o triunfo geral da III Revolução acabe se impondo ao mundo inteiro. - Dentro de quanto tempo? Muitos se assustarão caso, a título de mera hipótese, sugiramos mais vinte anos. Parecer-lhes-á surpreendentemente exíguo o prazo. Na realidade, quem poderá garantir que esse desenlace não sobrevenha dentro de dez ou cinco anos, ou antes ainda? A proximidade, a eventual iminência desta grande hecatombe é sem dúvida uma das notas que, comparados os horizontes de 1959 com os de 1976, indicam maior transformação na conjuntura mundial. A. Na rota do apogeu, a III Revolução evitou com cuidado as aventuras totais e inúteis Se bem que esteja nas mãos dos mentores da III Revolução lançar-se, de um momento para outro, numa aventura para a conquista completa do mundo por uma série de guerras, de cartadas políticas, de crises econômicas e de revoluções sangrentas, é bem de ver que tal aventura apresenta consideráveis riscos. Os mentores da III Revolução só aceitarão de os correr caso isto lhes pareça indispensável. Com efeito, se o emprego contínuo dos métodos clássicos levou o comunismo ao atual fastígio de poder sem expor o processo revolucionário senão a riscos cuidadosamente circunscritos e calculados, é explicável que os guias da Revolução mundial esperem alcançar a cabal dominação do mundo sem sujeitar sua obra ao risco de catástrofes irremediáveis, inerente a toda grande aventura. B. Aventura, nas próximas etapas da III Revolução? Ora, o sucesso dos costumeiros métodos da III Revolução está comprometido pelo surgimento de circunstâncias psicológicas desfavoráveis, as quais se acentuaram fortemente ao longo dos últimos vinte anos. - Tais circunstâncias forçarão o comunismo a optar, daqui por diante, pela aventura?
Comentário acrescentado em 1992: “Perestroika” e “glasnost”: desmantelamento da III Revolução, ou metamorfose do comunismo? No ocaso do ano de 1989, aos supremos dirigentes do comunismo internacional, pareceu afinal chegado o momento de lançar uma imensa cartada política, a maior da história do comunismo. Esta consistiria em derrubar a cortina de ferro e o Muro de Berlim, o que, produzindo seus efeitos de forma simultânea à execução dos programas “liberalizantes” da glasnost (1985) e da perestroika (1986), precipitaria o aparente desmantelamento da III Revolução no mundo soviético. Por sua vez, tal desmantelamento atrairia para seu supremo promotor e executor, Mikhail Gorbachev, a simpatia enfática e a confiança sem reservas das potências econômicas estatais e de muitos dos poderes econômicos privados do Primeiro Mundo. A partir disto, o Kremlin poderia esperar um fluxo assombroso de recursos financeiros a favor de suas vazias arcas. Essas esperanças foram muito amplamente confirmadas pelos fatos, proporcionando a Gorbachev e à sua equipe a possibilidade de continuar flutuando, com o timão na mão, sobre o mar de miséria, de indolência e de inação, em face do qual a infeliz população russa, sujeita até há pouco ao capitalismo de Estado integral, vai se havendo, até o momento, com uma passividade desconcertante. Passividade esta propícia à generalização do marasmo, do caos, e quiçá à formação de uma crise conflitual interna suscetível, por sua vez, de degenerar em uma guerra civil... ou mundial72. Foi neste quadro que irromperam os sensacionais e brumosos acontecimentos de agosto de 1991, protagonizados por Gorbachev, Yeltsin e outros co-autores dessa jogada, que abriram caminho à transformação da URSS numa frouxa confederação de Estados e depois ao seu desmantelamento. Fala-se da eventual queda do regime de Fidel Castro em Cuba e da possível invasão da Europa Ocidental por hordas de famintos vindos do Leste e do Magreb. As diversas tentativas de incursão de desvalidos albaneses na Itália teriam sido como que um primeiro ensaio desta nova “invasão de bárbaros” na Europa. Não falta quem, na Península Ibérica como em outros países da Europa, veja estas hipóteses em um comum panorama com a ação de presença de multidões de maometanos, despreocupadamente admitidos em anos anteriores em vários pontos desse continente, e com os projetos de construção de uma ponte sobre o Estreito de Gibraltar, ligando o Norte da África ao território espanhol, o que favoreceria por sua vez mais outras invasões muçulmanas na Europa. Curiosa semelhança de efeitos da derrubada da cortina de ferro e da construção dessa tal ponte: ambas abririam o continente europeu para invasões análogas às que Carlos Magno repeliu vitoriosamente, isto é, as de hordas bárbaras ou semibárbaras vindas do leste e hordas maometanas provenientes de regiões ao Sul do continente europeu. Dir-se-ia quase que o quadro pré-medieval se recompõe. Mas algo falta: é o ardor de fé primaveril nas populações católicas chamadas a fazer frente simultaneamente a estes dois impactos. Mas, sobretudo, falta alguém: onde encontrar hoje em dia um homem com o estofo de Carlos Magno? Se imaginarmos o desenvolvimento das hipóteses acima enunciadas, cujo principal cenário seria o Ocidente, sem dúvida nos assombrarão a magnitude e a dramaticidade das conseqüências que as mesmas trariam consigo. Entretanto, esta visão de conjunto nem de longe abarca a totalidade dos efeitos que vozes autorizadas, procedentes de círculos intelectuais sensivelmente opostos entre si e de imparciais órgãos de comunicação, nos anunciam nestes dias. Por exemplo, a crescente oposição entre países consumidores e países pobres. Ou, em outros termos, entre nações ricas industrializadas e outras que são meras produtoras de matérias-primas. Nasceria daí um entrechoque de proporções mundiais entre ideologias diversas, agrupadas, de um lado em torno do enriquecimento indefinido, e de outro do subconsumo miserabilista. À vista desse eventual entrechoque, é impossível não recordar a luta de classes preconizada por Marx. E daí surge naturalmente uma pergunta: será essa luta uma projeção, em termos mundiais, de um embate análogo ao que Marx concebeu sobretudo como um fenômeno sócio-econômico dentro das nações, conflito este no qual participaria cada uma destas com características próprias? Nessa hipótese, a luta entre o Primeiro Mundo e o Terceiro passará a servir de camuflagem mediante a qual o marxismo, envergonhado de seu catastrófico fracasso sócio-econômico e metamorfoseado, trataria de obter, com renovadas possibilidades de êxito, a vitória final? Vitória essa que, até o momento, escapou das mãos de Gorbachev, o qual, embora certamente não seja o doutor, é pelo menos uma mescla de bardo e de prestidigitador da perestroika... Da perestroika, sim, da qual não é possível duvidar que seja um requinte do comunismo, pois o confessa seu próprio autor no ensaio propagandístico “Perestroika – Novas idéias para o meu país e o mundo” (Ed. Best Seller, São Paulo, 1987, p. 35): “A finalidade desta reforma é garantir .... a transição de um sistema de direção excessivamente centralizado e dependente de ordens superiores para um sistema democrático baseado na combinação de centralismo democrático e autogestão”. Autogestão esta que, de mais a mais, era “o objetivo supremo do Estado soviético”, segundo estabelecia a própria Constituição da ex-URSS em seu Preâmbulo. Notas: 70) Cfr. Introdução e Parte I - Cap. III, 5, A-D. 71) Falamos na infiltração do comunismo nas várias igrejas. É indispensável registrar que tal infiltração constitui um perigo supremo para o mundo, especificamente enquanto levada a cabo na Santa Igreja Católica, Apostólica, Romana. Pois esta não é apenas uma espécie no gênero "igrejas". É a única Igreja viva e verdadeira do Deus vivo e verdadeiro, a única Esposa mística de Nosso Senhor Jesus Cristo, a qual não está para as outras igrejas como um brilhante maior e mais rútilo em relação a brilhantes menores e menos rútilos. Mas como o único brilhante verdadeiro em relação a “congêneres” feitos de vidro... 72) NOTA DA EDITORA: Sob o título Comunismo e anticomunismo na orla da última década deste milênio, foi lançada, a partir de fevereiro de 1990, firme interpelação do Autor aos líderes comunistas russos e ocidentais, a propósito da perestroika. Publicada em 21 jornais de oitos países, alcançou grande repercussão, especialmente na Itália (Cfr. “Catolicismo” de março/90). |