Reforma Agrária - Questão de Consciência


Secção II

Capítulo III

Proposição 29

Impugnada

É possível que, na execução de tão vasta reforma, sofram acidentalmente os proprietários alguns abusos. Mas estes são menos de temer do que a permanência do grande abuso consistente em que uns passem fome e outros vivam na abundância, quando não em luxo insolente.

Afirmada

A divisão das terras não remediaria convenientemente a situação lamentável e sub-humana em que vivem muitos trabalhadores rurais (215).

Daria, além disto, lugar a um grande abuso contra os médios e grandes proprietários, privados de seus bens sem vantagem alguma para o País: antes com grave dano para este (216).

De outro lado, ela atribuiria esses bens a proprietários novos que, em muitos caos, se mostrariam incapazes de fazer um uso acertado deles (217).

Por fim, essa partilha deixaria intactas as terras devolutas; ou só as cederia a título de arrendamento, o que seria, nas condições atuais, outro abuso.

Em suma, a "Reforma Agrária" é o abuso dos abusos.

 

Comentário

Evidentemente, toda grande reforma acarreta abusos acidentais inevitáveis. Quando ela é necessária e justa, o receio desses abusos só pode deter os egoístas e os pusilânimes.

Não é, porém, neste terreno que se situa a questão. A "Reforma Agrária" é em si mesma um abuso muito maior do que o que ela visa remediar.

 

Proposição 30

Impugnada

Afirma-se que a "Reforma Agrária" levará à socialização total. Cumpre não exagerar. A aplicação dos princípios socialistas à agricultura não importa em que eles sejam estendidos à indústria, ao comércio ou aos imóveis urbanos.

Um país pode, perfeitamente, estar coletivizado no campo e ter a iniciativa privada florescente nas cidades.

Afirmada

Se hoje se admite que ao poder público compete decretar arbitrariamente a abolição da propriedade rural média e grande, é lógico que amanhã ele se sinta no direito de abolir todas as outras formas de propriedade, no campo como nas cidades, quer seja imobiliária, industrial ou comercial.

Uma coisa convida, aliás, à outra, pois o regime exclusivo de pequenas propriedades sujeita virtualmente todas ao Estado (218). Munido ele desse poderio político e econômico imenso, ficarão automaticamente à sua mercê os patrimônios urbanos industriais, comerciais e imobiliários.

 

Comentário

O assunto desta proposição não é tratado na Parte II. Inserimo-la aqui pela afinidade que tem com as anteriores. Uma observação a respeito dela basta.

Talvez haja comerciantes e industriais desavisados que pleiteiem a "Reforma Agrária", sem perceber que abrem mão do princípio da propriedade privada, base de sua prosperidade.

Se não o amor à justiça, pelo menos o instinto de defesa de seus próprios interesses deveria levá-los a maior circunspecção.


Notas:

(215) Cfr. Proposição 22.

(216) Cfr. Proposição 20.

(217) Cfr. Proposição 23.

(218) Cfr. Proposição 10.


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