Reforma Agrária - Questão de Consciência


Secção II

Capítulo III

Proposição 27

Impugnada

Acresce que a propriedade tem uma função social. A agricultura, que é nossa principal fonte de riqueza, deveria render o bastante para manter o Estado com largueza.

Pelo contrário, o Brasil vive pobre e endividado. Quer dizer que a agricultura não cumpre sua missão. Urge, pois, sujeitá-la a uma reforma de base.

Afirmada

A agricultura tem concorrido de modo muito relevante para o incremento dos outros setores da economia nacional. Com efeito, graças às exportações e ao sistema cambial, o Brasil tem realizado um relevante esforço de capitalização pela transferência de rendimentos das atividades rurais para as atividades urbanas; e ao mesmo tempo se tem beneficiado de um substancial e constante volume de receitas de divisas estrangeiras indispensáveis à aquisição do equipamento necessário para a industrialização do País e o aparelhamento de suas atividades básicas em matéria de energia e transportes.

 

Comentário

Confira-se a Parte II, especialmente o capítulo IX.

 

Proposição 28

 

Impugnada

As condições de vida dos trabalhadores rurais são hoje em dia infra-humanas. O único meio de as aliviar é distribuir as terras entre eles, de sorte que o produto de seu trabalho fique todo para eles, em lugar de se desviar na maior parte para os patrões.

A "Reforma Agrária" é, pois, justa e necessária.

Afirmada

Em um país como o nosso, de terras e culturas tão diversas, e em que as condições concretas da existência do lavrador são tão variadas, os meios para melhorar com a necessária presteza estas últimas devem também ser diversos.

Em alguns lugares caberá a formação – por processos moralmente lícitos, convém ressalvar – de pequenas propriedades. Em outros será aconselhável temperar o salariado com a parceria. Em outros ainda, será preferível aumentar simplesmente os salários.

A imposição da partilha das terras como solução geral é medida anorgânica, violenta e contraproducente. Ela acarretará em muitos casos a transferência de bens para mãos que, sem direção superior, serão incapazes de cultivá-los e de lhes aproveitar os frutos.

O desfecho desta carência de direção será a economia totalmente planificada e dirigida pelo Estado, diante do qual o pequeno proprietário inerme ficará exatamente como na URSS um membro de kolkhoze.

 

Comentário

Confira-se a Proposição 22.

Ainda nas zonas em que sem a partilha não for possível aliviar a situação do homem do campo, ela não será "o único meio", como pretende a proposição impugnada.

Com efeito, mesmo que partilhássemos as terras, as condições de existência sub-humanas de certos trabalhadores braçais não variariam. Há no Brasil muitos pequenos proprietários que levam em sua gleba uma vida infra-humana, não tanto por pobreza quanto por doença, por indolência e inapetência.

Os problemas econômicos não são, via de regra, meramente econômicos. Eles só se resolvem inteiramente com o concurso de uma boa formação moral.

* * *

Ademais, se a capacidade de produção das terras é suficiente para manter os trabalhadores, não se vê por que uma melhora nas condições de salário e de parceria não bastaria para aliviá-los. Este seria, em todo caso, um remédio mais fácil, mais rápido, e sem os riscos patentes dessa imensa aventura que é a "Reforma Agrária". E se a capacidade de produção das terras não é suficiente, para que dividi-las, quando temos nosso "hinterland", e a estrada Belém-Brasília parece clamar por quem habite suas margens incultas?

* * *

Estariam, aliás, todos os nossos trabalhadores agrícolas aparelhados para receberem essas terras e aproveitarem-nas desde logo convenientemente? Não se trata apenas aqui de aptidão pessoal, mas de apetrechamento técnico etc.

* * *

A propósito do aproveitamento das terras ainda incultas, marginais da estrada Belém-Brasília e de outras vias de comunicação existentes ou a serem abertas, há um princípio básico, que importa notar. Dado que a condição natural do homem é ser proprietário, não basta que o poder público, sistematicamente, arrende as terras devolutas. O arrendamento é, de si, uma situação legítima mas instável: compreende-se que ele exista, não porém que se generalize a ponto de substituir a propriedade e, pois, a estabilidade que a natureza humana pede. Talvez fosse o caso de estudar, a propósito deste problema, uma judiciosa atualização da enfiteuse. Fazemos esta observação com vistas à experiência de arrendamento de terras que se vem realizando no novo Distrito Federal, e que será analisada na Parte II, Capítulo II.


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