Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Minha

 

Vida Pública

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Parte V

Dom José Gaspar e Dom Carlos Carmelo, sucessivamente Arcebispos de São Paulo

 

Capítulo I - Dom José Gaspar, novo Arcebispo de São Paulo

Capítulo II - Escândalo progressista em Taubaté: primeiro golpe no liturgicismo

Capítulo III - Deposição das “construtivas”

Capítulo IV - Padre César Dainese: relatório para o Núncio

Capítulo V - O IV Congresso Eucarístico Nacional em São Paulo

Capítulo VI - “Em Defesa da Ação Católica”: livro kamikaze

Capítulo VII - O episódio Svend Kok

Capítulo VIII - Começam as represálias

Capítulo IX - Morte trágica de Dom José Gaspar

Capítulo X - Vacância da Sede Arquiepiscopal: período de trégua

Capítulo XI - Dom Motta Arcebispo de São Paulo: oposição pertinaz ao “Legionário”

Capítulo XII - Imergindo dentro da catacumba

Capítulo XIII - Estruturação e consolidação do pequeno grupo

Capítulo XIV - Reabilitação, reviravolta e contra-ofensiva

Capítulo XV - Santa Sé elogia o “Em Defesa”

 


Capítulo I

Dom José Gaspar, novo Arcebispo de São Paulo

1. “Dias duros nos esperam”

"...quando eu me aproximava com o pessoal do Legionário, ele tomava um ar tristonho, distante e cerimonioso..."

Quanto a nós, do Legionário, estávamos muito esperançados na eleição de um Arcebispo que corrigisse os desvios na liturgia, os erros na Ação Católica e restaurasse as Congregações Marianas.

Estávamos nessa esperança, quando recebo um telefonema de um membro da Ação Católica comunicando-me, radiante, que Dom José havia sido eleito Arcebispo de São Paulo.

De nossa parte, prestamos a Dom José todas as homenagens, todas as atenções, todas as cortesias. Mas senti que toda a nossa situação estava precária e abalada com a vinda dele para São Paulo [1].

Evidentemente, a tal roda de moças da Ação Católica ficou esfuziante de alegria.

Ele estava em Itanhaém passando férias. E essas moças seguiram imediatamente para lá, para felicitá-lo.

Eu também resolvi descer até Itanhaém para felicitar o Arcebispo. Ele me acolheu muito bem, muito amavelmente, mas notei que toda a simpatia ia para o outro lado.

Quando elas chegavam perto, ele se tornava vivaz, alegre, divertido. E quando eu me aproximava com o pessoal do Legionário, ele tomava um ar tristonho, distante e cerimonioso.

Eu pensei: “Dias duros nos esperam” [2].

*   *   *

Posse de D. José Gaspar noticiada pela "Folha da Manhã" de 19 de setembro de 1939

Dom José veio para São Paulo e nós fizemos parte da comissão de recepção. A cerimônia de posse foi no dia 17 de setembro de 1939.

Eu me lembro que a Praça da Sé estava cheia de gente para festejá-lo, para homenageá-lo. As moças da Ação Católica se destacavam com umas boinas brancas, gritando: “Viva o nosso Arcebispo! Viva o nosso Arcebispo!”

Ao vê-las, ele desviou-se do trajeto, chegou até elas, deu uma bênção e prosseguiu. Foi um entusiasmo, um delírio da parte delas.

Quando houve aquela bênção, avaliei novamente o que é que vinha [3].

*   *   *

Também por esse tempo eu notei que o presidente da Ação Católica Brasileira, Tristão de Athayde, com quem eu me correspondia - era meu fraternal amigo: quando ele vinha a São Paulo, almoçava ou jantava na minha casa; e quando eu ia ao Rio eu jantava em casa dele; e nossas famílias acabaram fazendo relações - começava a mudar também e a adotar as diretrizes novas.

E pensei comigo: “Preciso arranjar um jeito de conservar junto ao novo Arcebispo uma situação que me permita lentamente ir abrindo os olhos do Arcebispo, para que ele veja que espécie de coisas ele está apoiando involuntariamente” [4].

2. “Recado” para Dom José

Dias antes de Dom José tomar posse, eu tinha ido à Cúria [5].

Lá estava o secretário dele, Padre Paulo Rolim Loureiro, que depois se tornou Bispo de Mogi das Cruzes [6], o qual, vendo-me lá, veio sentar-se ao meu lado e me disse:

— Então, Dr. Plinio, o Sr. está contente com a nomeação de Dom José?

— Estou e não estou. Eu tenho no fundo muita queixa de Dom José. Eu não digo a ninguém, mas ao senhor que é tão amigo dele, eu devo dizer: eu tenho muita queixa de Dom José.

— Mas não diga! Qual é a queixa que o senhor tem dele?

— Dom José não me compreende. Dom José é um homem de um temperamento muito diferente do meu e por causa disso ele vive preocupado com os adversários da Igreja e não cuida dos melhores amigos da Igreja. Nós, que somos fiéis a ele, nós que o estimamos, nós que somos verdadeiros católicos, ele nos põe constantemente de lado, enquanto aos adversários da Igreja, ele favorece constantemente. Com isso o Movimento Católico de São Paulo está ficando praticamente um feudo dos adversários da Igreja [7].

E continuei:

Ele tem a impressão de que o mundo todo se conquista com um sorriso, e que todos os adversários da Igreja, à força de bons agrados, passam a ser amigos. Quem tem a respeito dos adversários da Igreja essa posição, deve achar que um jornal combativo como o Legionário, e um homem combativo como eu, estragamos tudo, porque exatamente azedamos aqueles que, por meio de um sorriso, poderiam ser conquistados. De maneira que eu compreendo que ele tenha a respeito de nós a mesma impressão de um homem que está recebendo visitantes e que tem um cachorro buldogue solto no jardim: para que a festa dê bom resultado, a primeira coisa é pôr focinheira no cachorro. Então a primeira preocupação dele deve ser acabar com a nossa combatividade. E acabando com a nossa combatividade, acabar conosco. Quer dizer, em última análise, eu tenho a impressão de que nós não temos mais nada que fazer debaixo do governo arquidiocesano dele [8].

O Padre Loureiro ficou muito incomodado e disse:

— Meu amigo, meu amigo, não pense assim! Isso é uma coisa errada! Eu vou falar com ele [9].

*   *   *

Outra coisa que fiz foi procurar um jovem padre chamado Antonio de Castro Mayer, que era íntimo amigo do Arcebispo. Em conversa, chamei a atenção dele a respeito das tendências da Ação Católica e das simpatias do novo Arcebispo para com esse movimento.

Quer o Padre Mayer, quer o Padre Rolim Loureiro falaram com o Arcebispo [10].

3. Presidente da Junta Arquidiocesana da Ação Católica

O fato é que, quando depois eu fui falar com Dom José, ele estava açúcar e mel, querendo adocicar a situação [11].

Daí a pouco o Arcebispo mandou-me um convite para ir ter com ele:

— Dr. Plinio, eu queria constituir a Ação Católica aqui em São Paulo, e que o senhor fosse presidente e me indicasse os membros da diretoria. (Chamava-se Junta Arquidiocesana da Ação Católica).

— Como não, Senhor Arcebispo. Com todo gosto. Eu estou aqui para servi-lo.

Indiquei então para os cargos de direção da Junta pessoas do grupo do Legionário [12]: O presidente, eu, por escolha do Arcebispo; primeiro-secretário, José Gonzaga de Arruda; segundo-secretário, Fernando Furquim de Almeida; tesoureiro, José Benedito Pacheco Sales.

Dom José convidou o Cônego Mayer para ser Assistente Geral da Ação Católica de São Paulo e Padre Geraldo de Proença Sigaud para Assistente Geral da JEC [13].

De maneira que, de um modo inteiramente inesperado, nós ficamos colocados na direção da Ação Católica. E eu levei a sério os encargos dessa nomeação [14].

Hoje, com o recuo do tempo, percebo que, tanto Dom José como eu, tínhamos cada um a intenção de converter o outro: eu ia com a esperança de mostrar a ele como aquele grupo progressista andava mal; e ele com a esperança de me virar a cabeça para o outro lado.

4. Diferença completa de mentalidade

Como presidente da Junta Arquidiocesana da Ação Católica, eu dirigia a Ação Católica masculina e feminina. O Cônego Mayer estava acima de mim, era o assistente eclesiástico.

Começam então as reuniões da diretoria [15].

Tive com Dom José Gaspar várias conversas sobre os rumos da Ação Católica. Ele manifestava sempre uma tendência contemporizadora, não me desautorando, mas também não querendo desautorar a outra parte [16].

Palácio São Luís, residência do Arcebispo de São Paulo - 1938. Localizava-se na atual Praça Dom José Gaspar, junto a Av. São Luís. Demolido para construção da Biblioteca Municipal Mário de Andrade.

Íamos ao Palácio São Luís, que era então o Palácio do Arcebispo. Era uma grande casa senhorial, muito bonita.

O Arcebispo nos recebia na saletinha dele:

— Então, que novidades trazem, que idéias trazem?

— Senhor Arcebispo, nós viemos aqui trazer a V. Excia. um projeto de regulamento para a Ação Católica.

— Ah! sei.

— No projeto tem isso, tem aquilo, aquilo outro.

E entramos no assunto modas:

— As saias têm que ser abaixo do joelho e as moças não podem deixar de andar com meias.

— É verdade... Nossa Senhora, entretanto, não usava meias [17]...

Dr. José Gonzaga de Arruda, que estava presente por ser secretário da Junta Arquidiocesana da Ação Católica, com seu timbre de voz característico, replicou:

— Senhor Arcebispo, é verdade. Mas Ela usava a túnica até embaixo nos pés [18].

Ele: suspiro profundo.

Essas eram mais ou menos todas as reuniões: desinteligências e dúvidas [19].

*   *   *

No ano de 1940, o Cônego Mayer e eu levamos a ele uma declaração de princípios a respeito da Ação Católica, pedindo a ele aprovar.

Esta declaração definia, entre outros, o seguinte ponto: que a Ação Católica deveria tratar de valorizar as Congregações Marianas em vez de romper com elas. E fazer delas uma espécie de núcleo interno de seleção dentro do Movimento Católico.

Eu me lembro de que nós lemos esse documento para Dom José numa reunião da Junta, em ambiente de muita cortesia, mas pesado de cortar com faca.

Depois de fazermos esta proposta, Dom José, com o olhar perdido no vago, disse para Dom Mayer, na época Monsenhor por ser o Vigário-Geral da Arquidiocese:

— O senhor quer mesmo publicar isto aí?

Monsenhor Mayer respondeu:

— Isto me parece uma coisa verdadeira.

— Se isto lhe parece assim, publique então em seu nome.

“Em seu nome” queria dizer: agüente com as conseqüências, eu não tenho nada com isto. É um modo de tirar o corpo e de fazer cair sobre nós toda a responsabilidade.

Monsenhor Mayer disse: “Está bem”.

No dia seguinte sai pelos jornais: “De ordem do Senhor Arcebispo Metropolitano...”

5. Aproximação do Padre Mariaux

Seis anos depois de ter sido deputado [20], numa certa noite de 1940 [21], houve uma conferência do Padre Roberto Sabóia de Medeiros, um jesuíta célebre [22], na Escola de Comércio Álvares Penteado, um prédio no Largo de São Francisco, à direita de quem sai da Faculdade de Direito.

Pe. Walter Mariaux S.J.

Como era para o público em geral, achei que havia conveniência em comparecer, e fui com os nossos amigos para assistir à conferência.

Chegando lá, eu vejo, do meio para o fim do anfiteatro, uma bancada de uns cinco jesuítas sentados juntos. Entrei, cumprimentei-os, pois eu era conhecido de quase todos eles. Cumprimentaram-me amavelmente.

Entre eles, bem no centro, destacava-se um gigantão [23] que transbordava da cadeira por todos os lados. Era alto, mocetão ainda, com um nariz pontudo, os olhos azuis, dir-se-ia um dos primeiros germanos que invadiram o Império Romano do Ocidente [24], e que me cumprimentava efusivamente.

Eu vi desde logo que não era brasileiro e tinha muita possibilidade de ser alemão. Nunca tinha visto aquele homem.

Quando terminou a reunião, vi os jesuítas que se aproximavam em fila para falar comigo. Não era comum. E me apresentaram o Padre Walter Mariaux, dizendo: “É um jesuíta que está vindo de Roma, e era até há pouco o diretor do Secretariado Mundial das Congregações Marianas. Está passando um tempo no Brasil”.

O Padre Mariaux me disse em francês [25]:

— Eu vim a São Paulo só para falar com o senhor. Procurei o seu endereço por todo lado e não havia meio de encontrar. Afinal de contas, telefonei para o lugar “x” e o telefone não respondia. E vim aqui com a esperança de encontrar o senhor, porque me disseram que o senhor talvez viesse a esta conferência. Não era possível eu ter um encontro com o senhor em um desses dias? [26]

— O senhor quantos dias fica em São Paulo?

— Quantos dias for preciso para conseguir falar com o senhor.

Ele me disse uma coisa que me chamou a atenção: “Eu sou um entusiasta dos artigos do senhor no Legionário [27].

E referiu-se muito a um artigo intitulado Medalhões [28], que descrevia o tipo de homem vazio, inútil, pomposo, que ocupa posições e não adianta para nada.

Ele disse que deu risadas com o artigo, que era isso mesmo no mundo inteiro: medalhões que não prestavam para nada [29]. E comentou:

Com certeza o senhor viu que eu tenho reproduzido muitos artigos do senhor no nosso boletim mundial.

Eu nem sabia que eles tinham um boletim mundial. Mas quando ouvi isto (este secretariado era em Roma) [30], minhas orelhas se levantaram [31].

Louro, muito alto, hercúleo, exuberante de saúde, gestos largos, mãos de feld-marschall, ele causava sempre uma primeira impressão de robustez e determinação, que aos poucos se ia completando com elementos psicológicos novos. Não conheci personalidade mais rica em aspectos contrastantes e todavia harmônicos [32].

Marcamos um encontro, não sei bem onde, e começamos a conversar. E vi que ele tinha muita afinidade conosco em uma porção de pontos. Enfim, foi uma conversa cordialíssima.

Ele me contou que tinha sido diretor de Congregações Marianas na Alemanha, obtivera tais e tais resultados e queria fazer uma organização de jovens aqui.

6. Consolidação da amizade com o Padre Mariaux

Como trabalhávamos em muita conexão com o Cônego Mayer, que naquele tempo era Assistente Geral da Ação Católica, eu quis que ele o conhecesse.

Ele era um personagem extremamente pitoresco, tinha gestos categóricos: “Ach!”

“Ach!” é uma exclamação alemã equivalente ao nosso “Ah!” [33].

Ele me interrompeu [34]: “Ach nein!” [35] As maneiras dele não eram as mais suaves do mundo. “Não”, um mãozão enorme, “não!”

— Mas, “não” por que, Padre Mariaux?

— Essas figuras importantes do Clero eu não gosto. Em geral são “medalhões” como o senhor escreveu. O senhor vai me fazer perder tempo falando com esse homem.

Eu insisti e ele acabou aceitando:

— Olha, é só porque o senhor está insistindo. Onde será esse encontro? [36] Não quero que seja em nenhum lugar eclesiástico.

— Está bom, Padre Mariaux, em minha casa.

Ele não era de levantar tarde como eu, era ultra madrugador. Afinal, com certo jeito eu consegui que o encontro fosse às 10 horas em casa [37].

*   *   *

Minha casa era, nesse tempo, na rua Itacolomi. Hoje está demolida. Eu morava ali com minha mãe.

A casa, alugada, era pequena, mas primorosamente arranjada [38], com acabamentos esplêndidos: papéis de parede de primeira ordem, cristal nos vidros separando as portas, maçanetas também de primeira ordem. Minha irmã havia montado nossa sala de visitas e tinha ficado realmente muito bem. Muitíssimo agradável a sala, mas era pequena, e nela cabiam poucos móveis [39].

Aparece o nosso homem em casa. Cumprimentos [40], e entra o alemãozão enorme, bem mais alto do que eu, na minha sala cor-de-rosa [41]. Ele por assim dizer encheu a sala.

Ele comprometia um pouco a solidez dos móveis, mas eu não olhei para isso, eu estava olhando só para as relações romanas dele [42].

E ele me disse, num francês, assim: “Vous habitez bien”.

Eu disse: “Está à disposição, Padre Mariaux” [43].

Entra o Cônego Mayer. O contraste não poderia ser maior. Cônego Mayer moreninho, pequenino, transbordante de vida, mas muito pouco parecido com um alemão. E o Padre Mariaux personificando a Alemanha a cem por cento. Na primeira conversa ficaram logo amigos [44].

Eu mandei a empregada trazer, numa bandeja de prata, cálices e uma garrafa de vinho do Porto, o que para nós é banal.

Ele: “Ach! Portugal, hein?”

Ele gostou muito do vinho do Porto. Mas em dose correta, nem de longe em excesso, mas enfim, largamente.

Acendeu um charuto, começou a fumar e aí teve início uma conversa sobre a situação geral da Igreja, sobre o nazismo e vários assuntos do gênero.

No que diz respeito à crise da Igreja, em alguns pontos ele foi mais longe do que eu. E contou várias coisas passadas em Roma [45]. A crise dentro da Igreja ele percebia bem. Entendíamo-nos vigorosamente nesse ponto [46].

Falamos contra Jacques Maritain, que era um filósofo da esquerda católica com enorme voga no mundo inteiro. Nós aqui escrevíamos muitos artigos contra esse filósofo, e ele acompanhava todos [47].

Entendemo-nos totalmente sobre o nazismo. Ele tinha lançado um livro contra o nazismo, de umas 700 ou 800 páginas, superdocumentado, provando que o nazismo havia perseguido a Igreja Católica de um modo brutal. O livro se chamava [48]: Testis Fidelis — La Iglesia en el III Reich Alemán [49].

É a melhor obra que eu conheço a respeito do nazismo: as perseguições religiosas, todo o mal que o nazismo fez, argumentação muito séria e muito sólida; parte doutrinária límpida [50].

À vista dessa concórdia, sendo ele jesuíta e eu ex-aluno dos jesuítas, e admirador até hoje, a perder de vista, de Santo Inácio de Loyola e da Companhia de Jesus como ela foi e como ela deveria ser; e gostando muito das coisas alemãs, mas muito, não tardei em formar uma simpatia enorme para com o homem. E depois, com o tempo, uma verdadeira amizade.

Não oculto que a condição de alemão do Padre Mariaux me dava muito gosto no trato com ele. Aquele categórico, certa truculência, certa ênfase oratória, eu gostava muito.

Nós o convidávamos frequentemente para as nossas coisas, íamos jantar em restaurantes, uma coisa e outra. E ele era um parceiro para um almoço ou para um jantar, interessantíssimo. Tinha muito boa prosa, era engraçado, inteligente. E comia de maneira a dar apetite a uma estátua de pedra ou de bronze. Ele era engraçado até nos erros de português que cometia [51].

7. Razões da vinda para o Brasil do Padre Mariaux

Por que razão o Padre Mariaux tinha vindo da Europa para o Brasil? [52]

Ele não me contou, mas deixava escapar pequenas coisas por onde eu percebia que ele estava sendo perseguido [53]. Contaram-me depois que, em certo momento, ele fez não sei que imprudência [54], talvez alguma pirueta política [55], tornando-se necessário que saísse correndo de Roma.

Então, o Geral da Companhia, um polonês, Conde Wlodimir Ledochowski, deu-lhe a liberdade de escolher o país para onde quisesse ir. Ele foi à Argentina e de lá [56] veio para o Brasil, atraído pelo Legionário.

Pe. Mariaux com a Congregação Mariana por ele fundada, semente do "grupo da Martin"

E eu me pus inteiramente à disposição dele, para o que ele quisesse.

Ele disse que ia visitar o Rio. Mais do que compreensível.

Foi ao Rio, passou um tempo lá, e de lá ele me telefonou um dia:

— Queria que o senhor me dissesse, com toda franqueza, o que o senhor pensa: para o meu apostolado no Brasil, é melhor eu me fixar em São Paulo ou no Rio?

Então dei a ele uma resposta imediata [57]:

— Padre Mariaux, o senhor querendo, fique no Rio. Acho que o senhor pode fazer um grande bem no Rio. Agora, preciso lhe dizer que o Rio é capital do País, mas o centro econômico é São Paulo. E acontece que a sociedade de São Paulo é organizada de modo cônico. São Paulo, no fundo, economicamente, comanda o Brasil. E há umas 200 ou 300 famílias que comandam São Paulo. Os filhos dessas famílias estudam no Colégio São Luís, onde o senhor pode formar um grupo. Se esse seu grupo for dessas famílias, o senhor, através desse grupo, toma impulso no Brasil [58].

Ele bateu-se então para São Paulo, fixou-se no Colégio São Luís e começou a trabalhar junto aos alunos. Tudo muito normal.

Essa foi a semente do “grupo da Martim”, constituído na década de 50, de que falarei mais adiante [59].

Capítulo II

Escândalo progressista em Taubaté: primeiro golpe no liturgicismo

1. Padres novos: polvorosa na cidade, escândalos

Entrementes, um fato rumoroso acontecido na Diocese de Taubaté, interior de São Paulo, abriu os olhos de muitos a respeito dos extremos de virulência a que podia chegar a corrente nova que ia surgindo.

A Diocese foi governada, como já dissemos, até 1935 por um excelente Bispo, Dom Epaminondas Nunes D’Ávila e Silva, ao qual sucedeu, em 1936, o Bispo Dom André Arcoverde de Albuquerque Cavalcanti [60].

Nesta Diocese formou-se um grupo de sacerdotes moços, os quais entraram freneticamente para o movimento litúrgico: Padre Ramón de Oliveira Ortiz, Padre Carlos Ortiz (que depois apostatou [61] e publicou, sob a forma de romance, a história de sua apostasia e ligação pecaminosa com uma jovem da Ação Católica “moderna” [62], tornando-se cineasta e propagandista comunista), Padre Benedito Mário Calazans, Padre Jairo de Moura, Padre Carlos Gomes e mais alguns outros. Esses padres ficaram logo e imediatamente liturgicistas quando o movimento apareceu. E constituíram uma célula liturgicista que teve muita repercussão no Brasil [63].

Esse grupo de padres litúrgicos levou a sarabanda a tal ponto que chegaram a fazer os atos de culto de modo quase comunista. Eles não rezavam mais a Missa nos altares, mas tomavam uma mesa de copa e a colocavam no centro da nave, com todos os bancos afastados e cadeiras em volta, como em uma refeição. E ali celebravam a Missa com as pessoas sentadas em torno, para dar idéia de um banquete.

Nenhuma imagem sobre a mesa, a não ser um pequeno crucifixo, e isto porque o Código de Direito Canônico obrigava.

A idéia era a da comunidade cristã reunida em torno do padre, visto enquanto deputado da comunidade para oferecer o sacrifício. Na hora da oferenda, todos os que iam comungar levavam uma partícula na mão para que o padre a consagrasse. E faziam disto um cavalo de batalha.

Essa conduta pôs Taubaté em polvorosa. As idéias dos padres litúrgicos repercutiram aí como uma verdadeira explosão.

Outro motivo de escândalo eram os namoros de alguns daqueles padres com moças da Ação Católica. Depois, ditos incríveis dos membros da Ação Católica, como a idéia de que todos eles deveriam freqüentar lugares não recomendados pela moral católica para aí "levar o Cristo", e outras loucuras de todo o tamanho.

2. Reação de Monsenhor João de Azevedo e de Monsenhor Ascânio Brandão

O pobre Bispo Diocesano, Dom André Arcoverde de Albuquerque Cavalcanti, havia sofrido um desfalque financeiro da parte de um padre, que fugiu com o dinheiro do Bispo. Tudo isto obrigou-o a renunciar. Ele propriamente teve que fugir: partiu para a Nunciatura e deixou uma carta na Cúria.

Reuniram-se os conselheiros da Diocese e foi eleito Vigário Capitular um sacerdote, que era amigo meu, Monsenhor João José de Azevedo [64], vigário de Pindamonhangaba.

Monsenhor Ascânio Brandão

Monsenhor João de Azevedo era um homem de grande estatura, já naquele tempo com os cabelos grisalhos, de óculos, traços do rosto regulares e um todo de homem decidido, perspicaz, inteligente.

O braço direito de Monsenhor João era um padre de São José dos Campos, Monsenhor Ascânio Brandão. Homem também alto, lógico e decidido.

Foi essa dupla — Monsenhor Ascânio e Monsenhor João — que deu o primeiro golpe frontal no liturgismo no Brasil. Eles têm essa glória que é preciso que lhes seja reconhecida por justiça.

O caso passou-se assim:

Monsenhor Ascânio era capelão de uma congregação religiosa feminina, as Pequenas Missionárias de Maria Imaculada, de São José dos Campos (então pertencente à Diocese de Taubaté). Esta congregação religiosa havia sido fundada por uma prima minha que conheci pouco: Madre Maria Teresa de Jesus Eucarístico [65]. Era pessoa inteligente e com muita ascendência sobre Monsenhor Ascânio.

Dulce e sua mãe Helena Herold - Dulce passou a ser chamar Me. Maria Teresa de Jesus Eucarístico

Madre Maria Teresa chamou Monsenhor Ascânio e perguntou a ele se não estava percebendo alguma coisa esquisita no grupo do Padre Carlos Ortiz e naquela farândola toda. E pediu a Monsenhor Ascânio que analisasse a questão.

Monsenhor Ascânio atendeu ao pedido, e teve um primeiro lampejo sobre aqueles desvios. Homem de consciência reta, espírito tradicional, em desacordo com os abusos que estavam sendo praticados, começou a intervir e a falar com um e com outro daqueles padres, dizendo: “Vocês estão errados nisto, naquilo”.

Os padres retrucavam dizendo que não, que era assim que se deveria fazer.

Em dado momento ele diz a um desses padres o seguinte:

— A prova de que vocês estão errados é que Monsenhor Ramón Ortiz (que tinha esse título por ser Vigário Geral) é muito mais moderado do que vocês.

Respondeu o padre:

— Ora, Ascânio! Você não vê o que é? Monsenhor Ramón tem a tarefa de se fazer de moderado, pois assim ele é elevado a Bispo. Os outros, pelo contrário, fazem o jogo franco. Ele, uma vez Bispo, fará depois os outros subirem”.

Fiat lux na cabeça de Monsenhor Ascânio, o qual imediatamente escreveu ao Sr. Arcebispo de São Paulo, Dom José, mandando pouco depois carta semelhante (18/11/41) ao Sr. Núncio Dom Aloisi Masella, contando o caso*.

* Pouco depois, em 30 de novembro de 1941, Monsenhor Ascânio escreveu carta ao Padre Carlos Ortiz, da qual destacamos os seguintes trechos:

"Meu caro, desde há algum tempo para cá, diante de certos fatos e atitudes suas e do Padre Calazans, Padre Jairo e dos dois moços da A.C. em Taubaté, o Benedito Ortiz e o Quintanilha, fatos e atitudes bem conhecidos, estou e continuo em desacordo com vocês quanto a alguns métodos e ideias. [...] Desde que o vi aprovar e sustentar o estilo do Padre Carlos Gomes na 'Agonia do cristianismo' e o vejo discípulo fervoroso de Leon Bloy e Bernanos, nesta matéria, senti que não podia e não devia em consciência apoiá-lo e incentivá-lo, como o fiz até ainda há pouco, julgando não chegasse suas ideias àquele extremismo irreverente e perigoso. [...] Só lhe pediria um favor: não use esta linguagem nem no púlpito nem na imprensa. Ela escandaliza e faz mal. É chocante. Não aprecio o seu modo de encarar a vocação religiosa da A.C. no século. [...]

"Quanto à formação sentimental, tive queixas de pessoas que ouviram seus círculos de estudos e estranharam a linguagem. [...]

"Sempre censurei e comigo bispos, sacerdotes, religiosos e fiéis, a linguagem irreverente que usam vocês no púlpito, em círculos de estudos, em palestras, sobre os altares, imagens, e tradições sagradas do povo. Não imagina a repercussão de certas expressões de vocês nesta matéria! [...]

"A sua frase: - A Igreja não é nenhum feudo da autoridade eclesiástica, é ousada. Não admito leigos da A.C. fazendo policiamento litúrgico nas igrejas e chamando a atenção de vigários. Os fatos, meu caro, são por demais conhecidos. A idéia de propagar Missa versus populum, casula gótica substituir paramento romano por gótico etc., e a linguagem: altares prateleiras, santos horrendos etc. perante o povo, tudo isto é chocante e escandalizante. Não sou pela piedade exclusivamente litúrgica com menosprezo da extra-litúrgica. Não gosto dessas ironias sobre Congregações marianas e Associações pias, escapulários, medalhas e o terço. [...]

" A maneira de falar e de criticar as procissões extra-litúrgicas, de vocês, é quase a dos protestantes... [...]

"A respeito da Autoridade, dos Bispos etc., não use expressões de comunistas: Clero burguês e amigo da burguesia [...].

"Os métodos para reforma do mundo são os da Igreja e nesta hora os da A.C. Não encontro porém nos documentos pontifícios a linguagem que vocês usam às vezes... A reforma do mundo virá não pela revolução mas pela santidade" [Todos os grifos são do original].

3. Denúncia e panos quentes na reunião do Episcopado paulista

Na reunião seguinte do Episcopado paulista, Monsenhor João de Azevedo compareceu como Vigário Capitular de Taubaté e disse que tinha um caso do Movimento Litúrgico na Diocese de Taubaté a relatar. Tomou a carta em que Monsenhor Ascânio contava esses fatos todos, e também uma série de outros documentos, e leu na reunião.

Como em Taubaté já tinha havido um escândalo com a saída do Bispo Dom André, o Episcopado paulista resolveu não agravar as coisas e apenas fazer uma circular reservada ao Clero da Província contando os abusos litúrgicos ali ocorridos, mas recomendando que nada fosse dito aos leigos [66].

Com isso punham uma pedra no assunto para evitar novos escândalos.

*   *   *

Nós, nas conversas com Dom José Gaspar, sempre lembrávamos esse documento:

— Senhor Arcebispo, veja como foi bom V. Excia. ter conseguido atalhar isso na Arquidiocese, com as medidas que nos permitiu tomar na Ação Católica. Isso foi uma uma coisa excelente.

Ele não dizia nada.

Esses fatos também concorreram para deixar o Núncio de sobreaviso, e ajudou-o a compreender a gravidade do problema diante do qual estávamos.

4. Dom José Gaspar impede punição e acolhe os padres escandalosos

Dom José Gaspar não esperava que estourasse esse caso.

E vendo que Monsenhor João estava resolvido a tomar medidas enérgicas contra aqueles padres, interveio dizendo que achava perigoso que esses padres chegassem à apostasia. E que era melhor mandá-los para São Paulo, que ele iria tratar de lhes mudar a orientação.

Todos esses padres então levantaram vôo de Taubaté e desceram em São Paulo.

Naturalmente foi evitado o pior para os padres liturgicistas, pois Monsenhor João de Azevedo acabou não lançando um decreto contra eles na Diocese de Taubaté.

E foi muito bom para o liturgismo, pois, chegando aqui em São Paulo, esses padres começaram a prestar serviços ao pessoal da Ação Católica que se reunia no Centro Leão XIII e em outras organizações do mesmo gênero.

Mas foi muito ruim para Dom José, pois muita gente ficou vendo que ele de fato estava protegendo essa corrente.

Tanto mais que ele fez uma coisa ainda mais grave: tomou o Monsenhor Ramón Ortiz e o fez morar no próprio Palácio, incumbindo-o de uma tarefa de suma importância e responsabilidade, que era secretariar e redigir o futuro sínodo diocesano de São Paulo.

Ora, o sínodo era uma assembléia de padres presidida pelo Bispo, e convocado para tomar as medidas necessárias para a organização da Diocese, o que só pode ser planejado por um padre muito bom, observante e competente. Dar ao Monsenhor Ramón Ortiz essa tarefa era uma bofetada em Monsenhor João e um ato de apoio à corrente nova.

Ademais, nomeou a outro desses padres para o cargo de Inspetor de Ensino Religioso, o que causou muito escândalo*.

*Nessa ocasião, Monsenhor Ascânio Brandão escreveu carta a Monsenhor Mayer (em 31 de dezembro de 1942) desabafando:

"A campanha surda contra mim e Monsenhor Azevedo continua terrível e sorrateira. E... se fazem de vítimas! [...] Porém (e aqui permita que eu fale com franqueza), o que mais me abateu e chocou é a atitude do Sr. Arcebispo [de São Paulo]. [...] S. Exª não vê bem a Monsenhor Azevedo, sei que me trata com desconfiança e... tem lá no Palácio o líder do Movimento de Taubaté, o responsável, o defensor nato de toda a Revolução litúrgica do caso de Taubaté! Sei que lá no Palácio de São Luís se cochicha em favor das 'vítimas' (!) contra os 'carrascos'... Percebo tudo. Vejo e ouço os despautérios e os boatos do "Inspetor do Ensino religioso" que se gaba e afronta a todos nós com a petulância que o distingue. Sei de muita coisa, Monsenhor Mayer, muita atitude dúbia, indecisa, da Autoridade. [...] Julgo que S. Exª está nas doces ilusões de Dom André [Arcoverde]... o despertar poderá ser muito triste... Sei que os líderes da célebre A.C. [Ação Católica] se carteiam, tramam, organizam-se em segredo e... se orgulham de andar conquistando o Arcebispo! Esperam depor o Vigário Capitular de Taubaté e me desterrar após um processo canônico com que me ameaçam. [...] As atitudes do Sr. Arcebispo me desconcertam..." (grifos do original).

Isso tudo produziu, em muitos meios católicos de São Paulo, uma crepitação contra Dom José* [67].

* O Cônego Mayer, escrevendo ao Cardeal Leme, comentava de Dom José Gaspar:

“A maneira com que ele [Dom José Gaspar] tem agido nestes dois últimos anos mostra esta sua intenção, intenção que, a julgar pelas coisas que aparecem, não fruto de uma inadvertência, de uma tolerância mal compreendida [para] com elementos perniciosos, mas fruto de um plano premeditado e aplicado com muita inteligência e argúcia. O exame atento da maneira como tem ele procedido com o chamado caso de Taubaté demonstra-o com a evidência possível [...] Sem que esses padres mudassem de opinião, ou dessem a menor demonstração de reprovarem os erros que professavam antes, o Sr. Arcebispo começou uma campanha desmoralizadora do Exmo. Sr. Vigário Capitular de Taubaté [Monsenhor João de Azevedo], porque este padre não era favorável às doutrinas dos anteriores. [...] Acusou-o de violar o sigilo a que estão obrigados os que tomam parte nas reuniões dos Srs. Bispos, quando Monsenhor Vigário Geral limitou-se a comunicar ao seu Clero as resoluções tomadas. [...] Acusou-o de violência e arbitrariedades [...]. Não contente com esta ação à distância, foi a Taubaté com o fim de desautorar a Monsenhor Vigário Capitular, pois foi para inaugurar um centro de higiene e puericultura confiado a um grupo de moças que tinham tomado e ainda tomam atitude francamente contrárias à orientação de Monsenhor Vigário Capitular [...]. Mas, como disse, tudo isso é feito com muita inteligência. Assim, por escrito ele não fornece documento nenhum sobre nenhum desses pontos. Há até documentos em que ele diz o contrário. Mas em conversa com padres que ele sabe que espalharão suas idéias, ele se abre, com leigos ávidos de maior liberdade na Moral Católica, também ele se abre”.

Capítulo III

Deposição das “construtivas”

1. Desvios e doutrinas esotéricas: relato verbal ao Arcebispo

Em vista de todas essas circunstâncias, no ano de 1941, o Cônego Mayer e eu — ele enquanto assistente eclesiástico e eu enquanto presidente da Junta Arquidiocesana da Ação Católica — começamos a chamar os dirigentes dos diversos setores já existentes, para tomarmos conhecimento do que estava se passando dentro da Ação Católica.

Falamos na ocasião com os altos dirigentes, mas também com as diretorias de nível médio, para ter esse contato rico, vital, que se deve ter entre pessoas que são irmãs de apostolado.

E nessas conversas veio à tona a doutrina esotérica dessa gente, não dita pelos chefes, mas pelo pessoal de 2° grau que nos contou algumas coisas reveladoras.

Fizemos então um relato verbal para Dom José, mostrando que estava pegando fogo na casa. E dissemos a ele:

— Dom José, a Ação Católica está toda infectada, está com gente que pensa assim, tem tais erros assim. Nós temos informações tais e tais.

E contamos tudo quanto ouvimos, e que era muito grave [68].

A certa altura o Cônego Mayer disse a Dom José:

— Excelência, a situação é muito grave. E eu só terei condições de governar a Ação Católica, se V. Excia. me der a autorização de depor todas as diretorias e nomear diretorias novas. Se V. Excia. não der, eu não saberei como continuar. De maneira que V. Excia. veja o que quer fazer.

2. Dom José entre a espada e a parede

Diante da gravidade da denúncia, se Dom José mantivesse essas diretorias e nos pusesse fora, ele tomaria partido oficial pelo lado errado. E isto absolutamente não convinha a ele.

Então, entre suspiros, ele disse a Dom Mayer que poderia depor essas diretorias, mas que esperasse ele estar fora de São Paulo para fazê-lo. E saiu para uma viagem de vinte dias a uma estação de águas [69].

Em outubro de 1941, Dom Mayer e eu, devidamente habilitados, reunimos, ele as diretorias femininas e eu as masculinas, e comunicamos a destituição de todas as diretorias. Depois publicamos que, com a autorização de Dom José, tinham sido nomeadas tais outras diretorias [70].

As novas diretorias eram constituídas todas por moças que tinham aberto os olhos a respeito dos desvios da Ação Católica. Elas assumiram a doutrina católica séria, veiculada pelo Legionário, e forneceram ao Cônego Mayer relatórios do que se passava entre elas, o que foi decisivo para nós.

A líder dessa ala sadia era Dª Adalgisa Giordano. As outras eram Dª Estela Dourado, Dª Aurora Ruiz, Dª Angélica Ruiz, Dª Caetaninha (Angelina Caetano), Dª Iraci Ribeiro e mais um certo número de moças, que assumiram a direção da Ação Católica [71].

3. Saída hábil de Dom José

As antigas diretorias foram depois queixar-se a Dom José quando este voltou.

Com uma perícia incomparável, ele disse o seguinte:

— Vocês estão depostas. Mas, debaixo de minha autorização, vocês fundam uma associação chamada Centro Social Leão XIII. E continuem na mesma orientação, que eu não deixarei o Padre Mayer mexer com vocês. Vocês têm toda a minha simpatia [72].

Poucos dias depois, elas promoveram uma homenagem a Dom José, com notícia publicada em todos os jornais, e ele dando mostras de que as recebia carinhosamente.

Era, portanto, a nossa desautorização indireta. Mas resolvemos não dizer nada [73].

*   *   *

Quando vi que a situação estava azedando, dei-me conta de que deveria procurar a Nunciatura Apostólica no Rio, para ver o que o Núncio pensava a respeito de todos esses desvios.

Capítulo IV

Padre César Dainese: relatório para o Núncio

1. Aparecimento providencial do Padre Dainese

E aqui se situa um dos episódios mais rocambolescos de todo esse caso [74].

Lembro-me que, uma noite [75], eu estava na sede da Ação Católica atendendo ao expediente, quando entrou um sacerdote de estatura baixa [76], com uma maletinha na mão [77]. Pela roupa, por certo modo de cortar o colarinho, eu percebi logo que se tratava de um jesuíta [78].

Era o Padre César Dainese, italiano da região do Vêneto [79], no físico muito parecido com Santo Inácio de Loyola [80].

Homem de seus sessenta e tantos anos, portanto bem mais velho do que eu, mas ainda na força do trabalho [81]. Era de fato muito inteligente, muito vibrátil, de uma vibratilidade informativa, de tal maneira que, em qualquer lugar que ele entrasse, as vibrações dele o informavam de tudo o que se passava ali dentro [82].

Todo feito de sutilezas [83], dava a impressão do jesuíta da escola clássica do tempo de Santo Inácio de Loyola [84].

De outro lado, sabia muito bem como tratar com as pessoas, dizendo coisas acertadas no momento acertado: um homem muito capaz [85].

Eu me aproximei dele e o cumprimentei [86]. Ele agiu como se me conhecesse.

Ah! Padre, como vai o senhor?

— Dr. Plinio, como vai? Sou o Padre Dainese [87].

Passamos para a minha sala e eu disse:

— Padre, estou às suas ordens, o que o senhor deseja? [88]

— O senhor é presidente da Ação Católica em São Paulo, não?

— Sou sim, Padre Dainese.

— O senhor quereria me dizer bem exatamente qual o seu objetivo, o que o senhor tem em mente com a atuação que desenvolve à testa da Ação Católica? Eu quereria muito saber.

Olhei para ele e pensei: "Este aqui veio mandado por outrem. Ele é muito esperto e muito experiente da vida e eu tenho que me mostrar em relação a ele esperto e experiente também. Eu não vou fazer o papel de bobo e perguntar quem o mandou falar comigo. Ele vai me dar a entender aos poucos. Vou conversar com ele em português claro”.

E então respondi:

— Padre Dainese, eu vou ser franco com o senhor. A situação é esta assim, assim. É uma doutrina errada, é uma corrente errada. Eles pretendem destruir toda a autoridade eclesiástica, pretendem destruir a moral tradicional da Igreja, pretendem destruir as devoções tradicionais e colocar uma outra religião no lugar da primeira. É uma religião toda feita de pagodeiras, de concessões ao espírito do mundo. Em última análise, é uma religião que reproduz o modernismo condenado por São Pio X. Eu me sinto profundamente chocado com o que estou vendo e luto contra isso. Pode ser que eu seja esmagado nessa luta, mas eu lutarei até o fim, porque essa é uma luta pela Igreja Católica.

Ele foi ouvindo tudo e depois me disse:

— É, eu dou toda razão ao senhor. O senhor merece verdadeiramente apoio. O senhor nunca procurou informar ninguém?

Eu disse:

— Padre Dainese, moro em São Paulo e tenho pouca oportunidade de ir ao Rio. O meu informante natural seria o Núncio Apostólico, a quem eu dirigiria minhas informações. Mas falta-me quem sirva de instrumento de ligação junto ao Núncio.

— Algo eu posso fazer.

— Então, Padre, eu poderia fazer para o senhor um relatório?

— Pois não. Então o senhor faça assim [89].

Mais adiante, ele solta uma frase: “O Senhor Núncio, um dia, depois de confessar-se comigo, disse-me tal coisa”.

Evidentemente ele não disse nada do segredo de confissão, mas deixava entendido que era confessor do Núncio.

A certa altura ele se levanta e se despede: “Então, Dr. Plinio, até logo.” [90]

*   *   *

Não preciso dizer que logo na manhã seguinte procurei o Cônego Mayer e comentei o assunto com ele. Cônego Mayer então me explicou que ele era um jesuíta de alta categoria, homem tido como muito inteligente [91].

A partir dessa conversa, até o momento em que o Dom Carmelo foi nomeado Arcebispo de São Paulo, e mesmo depois, eu pude contar com o apoio decisivo do Padre Dainese [92].

2. Relatório e encontro com o Núncio

Eu então fiz o relatório. Alguns dias depois esse relatório estava seguindo para o Rio [93], por intermédio de meu bom e distinto amigo, Padre Dainese [94].

Passou-se algum tempo e certo dia vem um recado do Padre Dainese.

— Olha, aquele senhor gostaria de conversar consigo.

— Quando?

— Ele passa esta semana toda aqui no Rio. O senhor pode vir quando quiser.

Foi aí que conheci pessoalmente o Núncio e a Nunciatura.

*   *   *

Dom Bento Aloisi Masella

O Núncio, Dom Bento Aloisi Masella [95], foi um dos homens mais interessantes que eu tenha conhecido em minha vida. Naquele tempo ele teria seus sessenta e poucos anos.

De família nobre da Itália, ele era sobrinho de outro Cardeal Aloisi Masella que tinha sido um grande teólogo.

Claro, corado, de altura mediana, com um rosto um pouco quadrado, os traços muito regulares, cabelos já brancos, atitudes muito distintas e sumamente reservado [96]. Era um aristocrata e um prelado da Igreja tradicional na força do termo, muito bom diplomata e muito relacionado na alta sociedade do Rio de Janeiro [97].

Eu fui apresentado a ele pelo Padre Dainese, numa sala de visitas grande, toda dourada, com mosaicos, toda arranjada à maneira de palácio.

Ele entrou muito jovial, muito amável, deu-me o anel para beijar e depois me disse: “Venha, venha”. E me fez entrar para uma segunda sala de visitas menor, também bem arranjada, mas feita evidentemente para confidências.

Sentou-se no sofá e perguntou-me:

Caro Doutor, o que o senhor tem para me dizer?

Eu então desfilei diante de seus olhos toda a situação como eu a via.

Ele me ouviu impassível durante o tempo inteiro. A fisionomia dele não mudou nada. Nem um gesto de aprovação, nem de desaprovação. Um diplomata perfeito.

Ele me tinha posto numa atitude de confiança, e eu disse a ele tudo o que tinha de dizer.

Ele não quis revelar o juízo dele. Mas no fim me disse:

— É, precisamos rezar muito. O senhor reze muito, eu vou rezar muito também.

Mas o que os lábios não diziam, o olhar dizia. E o olhar era sumamente complacente, sumamente amável, dando a entender que ele atuaria.

Volto para São Paulo. E segue-se uma série de novos encontros com o Padre Dainese, novas informações, que depois iam, naturalmente, para a Nunciatura.

3. Dom José Gaspar manobra para afastar Dom Mayer

De repente chega-nos a notícia de que Dom José estava manobrando para tirar o Cônego Mayer do cargo de Assistente Geral da Ação Católica [98].

O Vigário Geral da Arquidiocese, Monsenhor Ernesto de Paula, que aliás era muito simpático a nós, havia sido convidado para Bispo de Jacarezinho (depois tornou-se Bispo de Piracicaba). E Dom José planejava elevar, no lugar de Dom Ernesto, o Cônego Mayer a Vigário Geral, para assim retirar dele o cargo de Assistente Geral da Ação Católica.

Dom José evidentemente pretendia colocar no lugar do Cônego Mayer um padre litúrgico. E assim eu, como presidente da Junta, teria de acabar me demitindo. O Cônego Mayer ficaria pairando nas nuvens, despachando papéis, e a Ação Católica tomaria um outro rumo [99].

Telefonei então ao Padre Dainese, contei para ele o caso, e ele me disse:

— Está bem, vamos ver o que se pode fazer.

4. Padre Dainese e o Núncio intervêm

Estava eu dando aula na Faculdade Sedes Sapientiae, quando uma freira veio me dizer que havia um padre do Rio querendo falar comigo com muita urgência.

Eu fui voando ao telefone, e ele, sem dizer o nome:

Como vai passando?

Eu vi bem que ele não queria que se mencionasse o nome dele. E eu respondi:

— Bem, e o senhor, como está?

— Bem. Olhe aqui, se o seu amigo receber um convite para ser promovido, diga a ele que não recuse. Não recuse!

— Pode estar certo que eu digo para não recusar [100].

Custei para conseguir dar o resto da aula. Terminada esta, fui e contei para o Cônego Mayer o telefonema. Ele também ficou com uma interrogação na cabeça.

*   *   *

Dias depois sai a nomeação de Dom Ernesto de Paula como Bispo. E, logo em seguida, o Arcebispo convida o Cônego Mayer para Vigário Geral [101].

Mas mesmo assim o Cônego Mayer aceita o convite.

Soubemos que, logo em seguida à nomeação, o Núncio escreveu um cartão a Dom José, dizendo mais ou menos o seguinte: “Felicito-o pela escolha de seu excelente Vigário Geral, mas não dispense os serviços dele na Ação Católica, tão preciosa é a sua colaboração”.

O Cônego Mayer acumulou, deste modo, o cargo de Vigário Geral e o de Assistente Geral da Ação Católica. E a tentativa de Dom José de afastar o Cônego Mayer da direção da Ação Católica ficou frustrada [102].

Criou-se assim uma situação difícil para Dom José: o Cônego Mayer estava sustentado como Assistente Geral da Ação Católica pelo Núncio. Como demiti-lo, sem pedir licença ao Núncio? E se o Núncio não desse licença, no que ficava? [103]

Foi um serviço inestimável que o Padre Dainese prestou naquela ocasião em favor da boa causa [104].

5. Fato muito significativo: a Carta Apostólica “Com singular complacência”

Dois meses depois, no dia 21 de janeiro de 1942, Pio XII dirigiu ao Cardeal Leme a Carta Apostólica Com singular complacência da qual fizemos um exame atento e meticuloso.

Preliminarmente, é digno de nota que o Sumo Pontífice tenha tratado um problema de envergadura mundial, qual seja o da situação jurídica das Congregações Marianas nos quadros do apostolado leigo depois da fundação dos atuais organismos da Ação Católica, por meio de um documento dirigido ao Cardeal-Arcebispo do Rio de Janeiro.

O Santo Padre poderia exprimir-se pela voz autorizada de seu Secretário de Estado. Preferiu, entretanto, honrar o movimento mariano do Brasil, dirigindo-se pessoalmente e em português - o texto oficial é em nosso idioma - ao Cardeal Dom Sebastião Leme.

Quis o Santo Padre mencionar nominalmente a Confederação Nacional das Congregações Marianas no Brasil, e seu “dileto filho César Dainese, da Companhia de Jesus”.

Maior ainda foi Sua satisfação “ao saber que as valorosas Falanges Marianas são cooperadoras eficazes na propagação do Reino de Jesus Cristo e que exercem um fecundo apostolado, por meio de múltiplas e variadas obras de zelo”. O Pontífice se rejubila com a magnitude desse papel, e acrescenta a expressão de seu grande contentamento pelo fato de que elas “ocupam um lugar conspícuo, segundo está informado, no trabalho e na luta para a maior glória de Deus e bem das almas, e que são, como força espiritual, de grande importância para a causa católica no Brasil”.

Que informações teve o Sumo Pontífice para chegar a tal afirmação?

Foram as mais autorizadas e imparciais, e é Ele mesmo quem no-lo diz: “com tanto entusiasmo, publicamente o tem manifestado em repetidas ocasiões, dileto Filho Nosso, bem como também o tem feito outros Veneráveis Irmãos no Episcopado” [105].

Logo que este documento chegou às mãos do Cardeal Leme, este resolveu dá-lo à publicidade em uma Concentração Mariana que dentro em breve se iria realizar. Mas ao mesmo tempo recomendou aos padres jesuítas que, eles mesmos, falassem o menos possível sobre a Carta Apostólica.

Assim, os padres jesuítas emudeceram.

Mas em São Paulo, o Legionário consagrou à Carta Apostólica uma série de artigos claros e precisos.

Salvo o Legionário, ninguém mais tratou do assunto [106].

Capítulo V

O IV Congresso Eucarístico Nacional em São Paulo

1. Eventos do ano de 1940 a 1942

Em 1940 houve a chegada do Padre Mariaux a São Paulo.

Em 1941 foi a nomeação do Cônego Mayer para Vigário Geral. E também o ano em que comecei a escrever o meu livro Em defesa da Ação Católica.

Passamos agora para 1942, ano do IV Congresso Eucarístico Nacional, realizado entre os dias 4 a 7 de setembro aqui em São Paulo.

O Congresso teve muita solenidade. E um brilho extraordinário*.

* No dia de seu encerramento, o Vale do Anhangabaú estava tomado por uma multidão de mais de 500 mil pessoas, vindas do Brasil inteiro.

O Presidente da República não estava presente, mas havia altas autoridades na tribuna: [107] o Interventor Federal (equivaleria ao governador do Estado, hoje); membros do governo e das Forças Armadas; o Arcebispo Dom José Gaspar, o Núncio Apostólico Dom Bento Aloisi Masella, que como Legado do Papa tinha honras especialíssimas [108].

2. Tensões e triunfo: discurso no Vale do Anhangabaú

Durante esse Congresso, deram-se fatos que mostram bem a tensão em que nós estávamos.

Dom José convidou-me para ser o orador da 3ª sessão solene no Parque do Anhangabaú. E eu devia, a pedido dele, fazer a saudação às autoridades, mesmo sabendo que eu era antigetulista.

Antes do evento, Dom José mandou dizer que não queria que nenhum orador improvisasse, e que todos pusessem seus discursos por escrito para ele ver.

Escrevi então o meu discurso e mandei para ele.

Quando à noite chego para falar, Dom José se aproxima de mim muito amável e diz:

— Dr. Plinio, há um ressentimento muito grave de diversos Ministros de Estado contra o Congresso Eucarístico, porque ninguém até agora fez elogio do Doutor Getúlio (ele gostava muito do Getúlio). E eu queria pedir ao senhor para fazer uma homenagem calorosa ao Doutor Getúlio Vargas, e exprimir toda a simpatia pelo apoio que ele tem dado ao Congresso.

Então eu disse a ele:

— Mas, Senhor Arcebispo, V. Excia. me manda alterar o meu discurso agora, diante de todo este mundo? V. Excia. calcule essas 500 mil pessoas aqui e outras milhares de pessoas ouvindo pela rádio. E eu vou improvisar um discurso assim?

Ele ainda me pediu uma outra coisa:

Como o Doutor Getúlio (ele dizia sempre “Doutor” Getúlio) sofreu um acidente na estrada de Petrópolis e está com uma das pernas encanadas, exprima também toda a nossa alegria pelo fato do restabelecimento dele.

E depois acrescentou:

— Ademais, Dr. Plinio, eu queria lhe fazer outra recomendação. Como mandei falar alguns oradores fora do programa, eu quero que o senhor faça um discurso bem rápido: uns 10 minutos no máximo.

O único orador dessa noite que iria falar só 10 minutos seria eu. Eu lhe respondi:

— Senhor Arcebispo, eu calculei o meu discurso para muito pouco tempo: quinze minutos no máximo.

— É, mas aquele seu discurso está muito longo. O senhor abrevie esse discurso de qualquer maneira.

De fato o meu discurso não estava muito longo. Eu disse:

— Bem, Senhor Arcebispo, eu vou fazer o que for possível, mas eu não lhe garanto o que conseguirei fazer.

*   *   *

O Exmo. Dom John Mark Gannon, representante do Episcopado norte-americano, discursa observado por Plinio Corrêa de Oliveira

Nessa mesma noite deveria falar o Tristão, depois eu, e por fim o Bispo de Erie, Pensilvânia, Dom John Mark Gannon, que não dizia uma palavra em português.

Ficou ele, Dom José Gaspar, numa mesa com as autoridades, e eu na mesa dos oradores. Nessa mesa dos oradores, o Bispo de Erie ficou no meio, eu à esquerda e o Tristão à direita. E eu com cara amarrada.

O Tristão então passou a mão por detrás do Bispo e me perguntou:

— O que é que você tem?

— O que tenho é que Dom José fez assim, assim e assim comigo, e isto é uma coisa que não se faz.

Diz o Tristão:

— Mas, não tem nada. Você se arranja de qualquer jeito e às vezes esses improvisos saem melhores.

Eu insisti:

Mas isto é uma falta de consideração dele.

*   *   *

Plinio Corrêa de Oliveira discursa na sessão de encerramento

Chegou a minha vez de falar.

O locutor anunciou e eu fui e fiz exatamente o discurso que eu tinha redigido, que levou no máximo uns 10 minutos. E arranjei um jeito, sem me comprometer em nada, de me referir ao Getúlio de modo totalmente impessoal [109].

O discurso não teve um elogio sequer ao Getúlio. Eu insinuei que ele tinha em torno de si uma equipe de propaganda do outro mundo. E que à glória de ter essa propaganda se juntava uma outra glória, que era a unanimidade dos brasileiros no que diz respeito à luta contra o estrangeiro*. Mais nada [110].

* Esse “elogio” ao Getúlio limitou-se às seguintes palavras:

“Poucas vezes, no curso da História Brasileira, se tem erguido em torno de uma figura concerto tão generalizado de louvores e admiração, do que em torno de S. Excia., o Sr. Presidente da República, Dr. Getúlio Vargas.

“Será supérfluo neste momento acrescentarmos a tantos louros, mais um. A situação de beligerância em que nos encontramos [contra as nações do Eixo], fez erguer-se em torno de S. Excia. todos os brasileiros de todos os quadrantes geográficos e ideológicos do País. Esse apoio unânime ao governo de S. Excia. é hoje um imperativo patriótico, em cujo cumprimento os católicos reclamam para si a primeira linha, no terreno do devotamento e da disciplina.

“Mas há uma afirmação sobremaneira importante a fazer aqui. Mil e mil vezes têm sido ditos a S. Excia. os motivos pessoais que em torno de sua figura têm congregado tanta solidariedade.

“É preciso que o intérprete da opinião católica afirme que a disciplina dos católicos ao Poder Temporal firma suas raízes mais no fundo, e que, abstração feita das considerações de ordem pessoal, sua obediência aos poderes públicos se baseia na convicção de que obedecem assim a vontade do próprio Deus, conhecida pela luz da razão natural e pelos esplendores da revelação cristã.

“Católicos, não somos nem podemos ser partidários da doutrina da soberania popular, e por isto mesmo recusamo-nos a ver a augusta autoridade do Poder Temporal firmada sobre a areia, movediça entre todas, da popularidade. Ela se crava na rocha firme de nossas consciências cristãs” (cfr. O Legionário, n° 525, de 7/9/42).

O que me salvou foi que o representante do Getúlio, Fernando Costa (era o Interventor em São Paulo), ficou literalmente maravilhado com o discurso. Ele acompanhava com os olhos encantados. Uma vez até interrompeu puxando as palmas [111]. E os outros políticos, vendo o Interventor contente, mostraram-se contentes também.

O Legado Papal, Cardeal Masella, permaneceu impassível. E Dom José Gaspar, vendo o efeito do discurso, ficou um pouco mais serenado [112].

*   *   *

Quando acabou o discurso, passei em frente do Interventor, Fernando Costa e fiz uma inclinação diante dele, como fazem os oradores. Ele então se levantou para me abraçar. Eu o abracei também.

Dom José estava bem longe, por causa do protocolo, mas quis também entrar na onda, sorrindo para mim [113].

Embaixo o povo começou a aplaudir, gritando: “Plinio! Plinio!”

Dom José ficou vendo que a posição verdadeiramente popular era a antigetulista, porque eu tinha feito um discurso que, sem falar mal do Getúlio, não falava nada de bem dele. Naquele tempo já era uma prova clara de antigetulismo [114].

Logo que eu me sentei, o Tristão me disse por detrás do Bispo de Erie: “Seu improviso foi bem bonzinho [115]. Sabe que até elegância tinha o seu discurso?” [116]

3. “No meu Estado você seria preso”

No fim da sessão, ao descer as escadas do palanque, encontrei-me [117] lado a lado com Agamenon Magalhães, que era interventor federal em Pernambuco, e que tinha sido meu colega na Constituinte [118].

Cumprimentamo-nos, ele me pegou por dentro do braço e descemos juntos. E ele me disse, com aquela voz um pouco cantante do pernambucano [119]:

— Plinio, Plinio, ainda bem que você fez esse discurso em São Paulo e não em Pernambuco.

— Por que, Agamenon?

— Porque eu, em Pernambuco, mandava pôr você na cadeia [120].

Quer dizer, ele tinha sentido até onde ia o discurso.

Eu me dava muito com ele e respondi: [121]

— Não sou bobo, sei onde falo. Por causa disto eu não aceitaria o convite para falar em Pernambuco.

Ele me deu uns tapinhas nas costas e nos despedimos.

Com isso, acabou sendo que a noite foi de vitória para a Contra-Revolução [122]. E foi uma ovação como talvez eu nunca tenha recebido em minha vida! [123]

*   *   *

Dias depois, o Conde Ernesto Pereira Carneiro [124] me convida para um almoço no Hotel Esplanada, em São Paulo.

Cheguei lá pensando que fosse um almoço para muitas pessoas, mas era apenas numa salinha interna do Hotel.

Estavam ali para almoçar também Mateus Pereira Carneiro (aparentado com familiares meus), Dom Aquino Corrêa (Arcebispo de Cuiabá), Dom José Gaspar e eu.

Nem Dom José esperava me encontrar ali, nem eu a ele. Mas durante o almoço conversei normalmente com ele.

Na saída, ele me pegou pelo braço e disse:

Meu Presidente da Junta Arquidiocesana ainda está muito zangado comigo?

Respondi:

— Não, Senhor Arcebispo. A gente se esquece de tudo com o tempo.

Ele “mineirou” [125] em cima do assunto e o incidente do Congresso Eucarístico se deu por encerrado.

Mas esse incidente mostrava bem como, por detrás da amabilidade, a tensão era grande. E o livro Em Defesa da Ação Católica nem estava ainda publicado... [126]

Capítulo VI

“Em Defesa da Ação Católica”: livro kamikaze

1. Reviravolta em nossa história

Na avaliação de nosso passado, julgo importante ter em mente as circunstâncias que determinaram o golpe desferido no progressismo nascente pelo livro Em Defesa da Ação Católica.

Esse golpe representou um tournant, uma reviravolta em toda a nossa história.

Essa reviravolta foi marcada por uma voluntária renúncia a uma situação de fastígio dentro dos meios católicos brasileiros, em vista de um interesse maior da Igreja.

A Ação Católica era a tubulação por meio da qual os erros que denunciei estavam penetrando na Igreja. Era de fato a Igreja que estava em jogo [127].

2. Desprevenção dos católicos face à inoculação do erro

Eu notava que a corrente progressista ia crescendo cada vez mais em São Paulo e no Brasil, penetrava nos seminários, tomava influência no Clero, entrava, enfim, como uma torrente por todos os lados [128].

Era uma infiltração gradual, poderosa, mas ao mesmo tempo muito prudente.

Os meios católicos tradicionais eram muito mais numerosos do que hoje, mas ingênuos, e não tinham — diferentemente de hoje — nenhuma prática da luta interna no seio da Igreja. Por causa disso, estavam a léguas de admitir que um Bispo pudesse favorecer idéias erradas, ou que essas idéias fossem pregadas por um eclesiástico.

Essa idéia era tão arraigada que, anos depois, certo católico veio falar comigo e me disse: “Para mim, é obrigação do católico ‘sentire cum Ecclesia’, ou seja, sentir com a Igreja. E isso quer dizer ‘sentire’ com o Romano Pontífice, ‘sentire’ com o Bispo, ‘sentire’ com o pároco, ‘sentire’ até com o sacristão”.

Para se ter o sacristão como padrão de ordenação do próprio pensamento, vê-se até que ponto chegava essa idéia errada de disciplina.

A batalha não era, portanto, da maioria tradicional contra a minoria nova, mas a batalha da penetração velada de uma minoria nova nos meios tradicionais, mudando-lhes gradualmente as idéias.

3. Um sacrifício aceito de antemão

Ora, como eles eram muito ingênuos, era necessário que alguém assumisse a tarefa de lhes abrir os olhos, denunciar a infiltração. Também que estivesse disposto a sofrer as perseguições, as calúnias, as detrações que viessem, e ser esmagado se fosse necessário, mas jogar-se como um kamikaze contra os infiltrantes.

Eu via perfeitamente que, se eu fizesse isto, ficaria criado um caso e a maioria ingênua ficaria de pé atrás com essa infiltração. E se eu não fizesse essa denúncia, a maioria ingênua se deixaria dominar completamente.

Portanto, era preciso preparar uma denúncia monumental [129].

Fiz então o seguinte cálculo:

Vou escrever um livro denunciando toda essa doutrina [130]. Criado o escândalo, muitos ficarão atemorizados. Não aderirão a nós, mas também não aderirão a eles. Ficarão com uma interrogação na cabeça. A minha posição de líder católico vai ser arrasada. Mas é melhor eu começar o fogo e iniciar a batalha enquanto ainda tenho soldados, do que iniciar o fogo no momento em que tudo em torno de mim estiver gangrenado [131].

Eu me dava bem conta, portanto, de que o livro iria produzir um estouro do outro mundo e que era uma obra, como disse, de kamikaze: eu iria destruir o adversário, mas eu também iria me destruir.

Era portanto uma auto-imolação [132]. Mas ao menos a prevenção contra o progressismo, que viria em decorrência desse gesto, haveria de brecar o ímpeto da infiltração na Ação Católica [133].

4. Preparando o livro e prevenindo os companheiros para o contragolpe que viria

Comecei a escrever o livro em 1941. Mas só em 1942 ele ficou pronto.

Primeiramente, mandei vir uma coleção de documentos pontifícios publicados pela editora francesa Bonne Presse, desde Leão XIII até Pio XI inclusive (era Pio XII o Papa reinante) [134] para estudar. Tive de ler também muitas publicações da corrente progressista [135].

Isso tudo me tomou meses, e o fiz no maior segredo. Depois, no livro, eu citei mais de quatrocentos documentos pontifícios para mostrar os erros daquela corrente.

Para escrever o livro, resolvi passar um mês em Santos [136].

Toda a vida tive uma letra muito feia e também não conseguia escrever por muito tempo. Precisava levar, portanto, alguém a quem eu ditasse.

Convidei o Dr. José Carlos Castilho de Andrade [137], pois a praia naquela época permanecia deserta, não havia o inconveniente moral de hoje [138].

Castilho se hospedou no Hotel Atlântico e eu no Hotel Santos.

E então ditei ao Dr. Castilho o Em Defesa da Ação Católica, anotado por ele com aquela correção, aquela paciência, aquela meticulosidade, aquela sobriedade de atitudes que todos os que conviveram com ele conhecem [139].

*   *   *

A luta foi particularmente árdua em vista de nosso intuito de tentar extinguir o mal, mas de forma a causar o mínimo possível de ressentimentos e de divisão nos meios católicos.

Para isto era preciso conduzir o combate na ordem das idéias, poupando as pessoas tanto quanto possível. E só mencionando os opositores que tivessem matéria publicada sobre o assunto.

Se tivesse descido ao plano concreto em meu livro, indicando nomes e lugares, acusar-me-iam, na época, de “falta de caridade”... [140]

*   *   *

Eu também precisava prevenir os mais chegados a mim de que a casa poderia cair, para que eles soubessem se proteger contra os escombros que viessem por cima deles, e assim permanecessem firmes.

Era um susto para eles: a casa vai cair! E era preciso incutir nos meus companheiros a idéia da conspiração que estava sendo feita. E conspiração de homens de altar, o que há dois anos antes seria uma “blasfêmia” imaginar.

Não havia clima, por exemplo, para se fazer uma reunião geral. Era preciso conversar com cada um. Levou tempo até que todos se dessem conta da situação [141].

Então, tive de desenvolver um triplo trabalho ao mesmo tempo: ler os documentos pontifícios para embasar o livro; ir colhendo os fatos que comprovassem os erros denunciados; e por fim ir conversando com os mais íntimos, para mostrar-lhes que nos sacrossantos meios católicos, na Cidade de Deus, na Santa Igreja Católica, haviam penetrado os erros progressistas.

Alguns dos meus primeiros irmãos no Movimento Católico tiveram medo e fugiram, se dispersaram.

"...um punhado permaneceu fiel. E esse punhado viria a ser de futuro a semente do grupo de Catolicismo e posteriormente da TFP..."

Mas um punhado permaneceu fiel. E esse punhado viria a ser de futuro a semente do grupo de Catolicismo e posteriormente da TFP [142].

5. Revisão e a necessidade de um prefácio do Núncio

Quando terminei o livro, procurei os sacerdotes com quem eu podia contar: Cônego Mayer, Padre Sigaud e três jesuítas: o Padre Walter Mariaux (que, como disse, eu conhecera durante essa batalha), o Padre César Dainese e o padre Louis Riou, provincial dos jesuítas em São Paulo.

Ao Cônego Mayer e ao Padre Sigaud eu disse:

— Aqui está esse livro. Os senhores querem fazer o favor de ler e opinar se pode sair?

Terminada a revisão de ambos [143], mandei uma cópia ao Padre Dainese:

— Padre Dainese, estou com vontade de publicar este livro, o senhor veja o que acha.

Tempos depois, o livro me volta do Rio de Janeiro, restituído por ele [144].

Folheei um pouco e encontrei, escrito numa tira de papel comprido, creio que à tinta: “Livro admiravelmente exato quanto à doutrina, muitíssimo original mesmo em questões muito debatidas e maravilhosamente oportuno, providencial, atualíssimo”, mas sem dizer de que livro se tratava [145].

Marquei então um encontro com o Padre Dainese e disse a ele:

— Padre Dainese, eu não tenho a menor ilusão de que este livro vai ser uma explosão, e que com essa explosão eu me liquido. Eu estou disposto a essa liquidação, desde que ele saia em condições de representar uma bomba para o progressismo. Eu me liquidar em vão, não. Portanto, este livro só sairá se tiver um prefácio do Núncio Apostólico. Com isto eu publico o livro. Sem isto o livro não sai.

— Bem, eu vou falar [146].

O resultado foi que pouco depois seguia uma carta minha ao Sr. Núncio oficializando o pedido de prefácio*.

* A carta era datada de 4 de agosto de 1942.

6. Frieza de Dom Pedrosa e Dom Teodoro Kok

Levado pelo desejo de proceder em tudo com cortesia, eu mostrei o livro também a Dom Pedrosa e a Dom Teodoro Kok, para opinarem.

Algum tempo depois, Dom Teodoro me telefona:

— Sabe, lemos o seu livro e estamos prontos a opinar. Como Monsenhor Mayer é Vigário Geral, Dom Pedrosa declarou que ele prefere tratar do assunto na casa do Vigário Geral. Então manda propor um encontro em casa de Monsenhor Mayer entre nós dois, Monsenhor Mayer e você.

No encontro, os dois foram amáveis, mas frios. Notava-se, entretanto, que estavam uma pilha de nervos, sobretudo Dom Pedrosa...

A certa altura Dom Pedrosa disse com fisionomia mortificada:

— Bem, eu li o livro, aqui está.

Eu: “O senhor teria alguma ponderação a fazer?”

Resposta de Dom Pedrosa: “Não teria nada de especial a dizer”.

Dom Pedrosa, dirigindo-se a Monsenhor Mayer: “Monsenhor leu, não, Monsenhor?”

Diz Monsenhor Mayer: “Li”.

Dom Pedrosa: “É, Monsenhor, com certeza está bem”.

Eu disse: “Teria algum ponto que o senhor gostaria que eu alterasse?”

Dom Pedrosa: “Bem, digamos, tal ponto e tal ponto”.

Eram dois ou três pontos sem importância, pequenas correções de forma que não atendiam à doutrina. Eu logo concordei.

Dom Pedrosa por fim pegou o livro, colocou-o em cima de uma mesinha e disse: “Bem, então está tratado o nosso assunto”.

Como Monsenhor Mayer era o dono da casa, eu voltei meus olhos para Dom Mayer, pois não competia a mim continuar uma visita em casa de outro.

Monsenhor Mayer, sempre muito positivo, categórico e belicoso, respondeu: “Está bem!”

Os dois se levantaram, despediram-se e estava acabado [147].

Eu quis mencionar a participação deles no livro, e mostrar a cordialidade com que eu os tratava, para se compreender a gravidade das acusações feitas por eles pouco tempo depois [148].

Era visível que o livro os tinha desagradado no mais alto grau, mas que não tinham nenhuma objeção a fazer. Ficou visível também que eu estava combatendo contra uma doutrina disposta a não discutir e a não se mostrar.

Foi nessa ocasião que acabei percebendo o quanto Dom Pedrosa estava comprometido com a nova corrente, e que não sairia mais dessa orientação [149].

7. Carta e entrevista com Dom José e pedido de “imprimatur”

Uma coisa que também pensei: “Eu não posso publicar este livro como presidente da Junta Arquidiocesana da Ação Católica sem consultar o Arcebispo. Nós vamos ao Arcebispo” [150].

Na segunda-feira à tarde (21/12/42), enviei-lhe o trabalho, juntamente com uma carta em que lhe dava uma explicação sobre as minhas intenções e pontos de vista ao elaborar a obra [151].

O livro estava num desses classificadores de tamanho enorme, porque um livro de 400 páginas enche um classificador [152].

*   *   *

Naquele mesmo dia o Sr. Arcebispo foi à chácara que ele possuía em Santo Amaro e leu o livro, ao menos em parte [153].

Certa pessoa que servia o Arcebispo, e que se sentia escandalizada com o que ouvia sobre toda a espécie de trama e conspiração que estava sendo feita no sentido do liturgicismo, contou-me que Dom José passou a noite em claro, andando muito. De manhã, ele encontrou o classificador aberto, com anotações nas 20 ou 30 primeiras páginas [154].

*   *   *

No dia seguinte (portanto na terça-feira, 22 de dezembro), Dom José chamou-me com insistência ao Palácio São Luís, procurando-me com açodamento em vários lugares [155].

Ele me recebeu mais amável do que nunca [156]. Muito gentil, pegou o classificador com o livro e disse: [157]

— Que livro enorme, hein? Quanta dedicação escrever um livro tão grande! [158]

Mas notei que ele estava vermelho [159].

Ainda com fisionomia muito prazenteira, disse-me de modo mais ou menos vago que aprovava o esforço que eu tinha desenvolvido em confeccionar o trabalho. Mas não fez um só elogio ao livro, nem por amabilidade.

E logo abriu o “jogo”.

Disse que lera os dois primeiros capítulos do livro, aproveitando uma noite de insônia que tivera. E que desde já me deveria declarar que era muito ocupado, e não poderia lê-lo senão muito devagar, pelo que inevitavelmente deveria ser grande a demora na saída do livro.

Ademais, ele não achava clara a exposição da parte que leu. As frases eram muito grandes, contendo “muitas idéias”, o que tornava muito complexa a leitura. Seria preciso portanto “arejar” o livro, alterando-lhe a redação. E que ele conhecia “um doutor” que poderia se encarregar disso. Não gostaria eu de dar o livro ao Dr.? Ele mesmo gostaria de me auxiliar, mas estava ocupadíssimo.

Outra coisa: ele havia notado no livro algumas repetições e certos conceitos eram objeto de muita insistência. Para que, por exemplo, insistir tanto sobre o fato de que há erros na Ação Católica?

Respondi ao Sr. Arcebispo que reconhecia que minhas frases tinham o defeito de ser muito grandes. Entretanto, eu não precisava do “doutor” conhecido dele para as reduzir. Pediria isto a um amigo, Pacheco Sales.

Diante dessa resposta, o Sr. Arcebispo ficou contrafeito, e me disse que ele mesmo, então, indicaria as frases que era necessário “desbastar”. Iria lendo “lentamente” o livro, e, à medida que fosse lendo, me enviaria as páginas tendo entre parênteses o que não deveria sair.

Ficava evidentíssimo que os pretextos literários encobriam simplesmente o intuito de tornar o livro tão inócuo quanto possível. E a atitude dele punha em risco de morte o livro.

Respondi-lhe a tudo com muita cordialidade, dizendo-lhe que agradecia a cooperação que ele iria me prestar [160].

Eu ainda disse que queria que o livro saísse sob o meu título de presidente da Junta da Ação Católica, e assinando-o como tal.

Ele, muito amável, disse: “Está bem”.

*   *   *

Tal era o poder de sedução dele, que eu saí do Palácio alegre [161], sem perceber a cilada em que caíra. Saí pela rua São Luís em direção à rua da Consolação, e quando transpus a grade do Palácio, parece que a ação de presença dele se desfez.

E eu pensei: “Meu Deus! Estou liquidado. Este negócio nunca mais sai”.

8. Perplexidade: intervenção do Núncio desencalha o livro

Prefácio no Núncio D. Bento A. Masella

Tomado de perplexidade, escrevi uma carta ao Padre Dainese com o pedido de que transmitisse ao Núncio as dificuldades que estava havendo*.

* A carta ao Padre Dainese era datada de 23 de dezembro de 1942. No dia seguinte, 24 de dezembro, Dr. Plinio escreveu diretamente ao próprio Núncio, relatando-lhe com luxo de detalhes os termos da conversa mantida com Dom José, e solicitando uma intervenção para resolver o impasse.

Dias depois chegava ao Palácio São Luís uma comunicação da Nunciatura mandando o Arcebispo entregar o livro para ser publicado tal como estava.

O Arcebispo então chamou Monsenhor Mayer e disse:

— Mayer, eu estive vendo este livro. Vamos mandar publicá-lo. Você leu o livro?

— Li sim, Senhor Arcebispo.

— Bem, se você leu, dê você o imprimatur.

— Pois não.

Monsenhor Mayer então bateu o imprimatur: “De mandato Ecmi. ac Revmi. DD. Archiepiscopi Metropolitani. — Monsenhor Antonio de Castro Mayer, Vicarius Generalis.” *.

* Traduzindo para o português: "Por mandato do Exmo. e Revmo. DD. Arcebispo Metropolitano — Monsenhor Antonio de Castro Mayer, Vigário Geral". O imprimatur vem datado de 25 de março de 1943, festa da Anunciação de Nossa Senhora.

Passados alguns dias, chegou-me o prefácio do Núncio. Vinha também datado de 25 de março de 1943.

Tomei o prefácio [162], tirei uma cópia e tranquei-o na minha melhor gaveta [163].

9. “Em Defesa da Ação Católica” vai para a gráfica

Com o prefácio do Núncio e o imprimatur de Dom Mayer, mandei o livro para a tipografia Ave Maria [164] dos padres da igreja do Coração de Maria [165]. Vinte dias ou um mês depois, não posso me lembrar, a tipografia entregava os primeiros exemplares [166].

Era uma edição de 2500 exemplares, insignificante hoje, mas não para aquele tempo. Além do mais, eu queria que o livro só circulasse nos meios católicos, para não desedificar os meios não católicos [167].

A edição custou 5 contos de réis. Naquele tempo era muito dinheiro. E era também o único dinheiro que eu tinha depositado em banco. Não tinha mais.

O doloroso é que eu era responsável pela subsistência de meus pais já velhos. Uma doença que houvesse, eu não teria recursos para resolver a situação. Mas confiei em Nossa Senhora e paguei o livro [168].

10. Lançamento da “bomba” e difusão

Bem, eu estava prevendo que o livro iria ocasionar uma confusão, uma desordem, um desconcerto nos meios contaminados pelos erros nele denunciados. E tinha nossos pequenos dispositivos preparados para o combate [169].

*   *   *

Nisto ocorreu um fato escandaloso que tornou o ambiente mais favorável ao lançamento de meu livro.

Um dos padres de Taubaté, que depois se tornou apóstata, Carlos Ortiz, escreveu na Ordem, revista do Tristão de Athayde, um artigo com uma série de inconvenientes de caráter doutrinário.

Diante disso, Monsenhor Rosalvo Costa Rego, eleito Vigário Capitular pela morte de Dom Sebastião Leme, depois Arcebispo Auxiliar do Rio, publicou em 1943 algumas Instruções condenando indiretamente o artigo e dizendo que Dom Leme, antes de morrer, estava muito aborrecido com essas tendências litúrgicas*.

*Essas Instruções, dadas a lume dia 21 de maio de 1943, foram publicadas na íntegra no Legionário n° 564, de 30 de maio de 1943. Nelas lemos:

"Estas lamentáveis confusões e outras temerárias asserções, que não raramente se ouvem acerca da Sagrada Liturgia, muito e muito preocuparam o espírito do nosso falecido Cardeal".

Era mais um escândalo público dessa corrente contra a qual nós nos opúnhamos [170]. O que facilitou a receptividade ao livro.

*   *   *

Mandei o livro, antes, para os amigos. E escrevi uma carta para cerca de vinte Arcebispos e Bispos, também amigos meus, acompanhada do livro com uma dedicatória.

De todos recebi respostas boas, algumas até calorosas, entusiásticas, manifestando todo apoio [171].

De algumas dessas cartas, eu tive de suprimir certas expressões que teria sido imprudente publicar. Por exemplo, Dom João Batista Muniz, um redentorista, Bispo da Barra, na Bahia, dizia que eu denunciara um protestantismo em estado larvar, que ele já observara grassando em Juiz de Fora. Por respeito ao Sr. Bispo de Juiz de Fora — de quem eu recebi depois uma injúria grave — não publiquei esse comentário [172].

Depois de receber essas cartas, soltei a bomba!

Primeiro, o Legionário publicou uma notícia dizendo que iria sair o livro Em Defesa da Ação Católica, com prefácio do Exmo. Revmo. Senhor Dom Bento Aloisi Masella, Núncio Apostólico no Brasil, e com imprimatur, da parte do Arcebispo Metropolitano, de Monsenhor Castro Mayer. E também com cartas de aprovação dos senhores Arcebispos e Bispos tais e tais [173].

Procuramos então as principais livrarias católicas de São Paulo, pois naquela época livro católico só se vendia em livraria católica. E livraria católica só vendia livro católico. Os livreiros em geral pertenciam ao Movimento Católico. E o livro foi posto à venda em várias delas [174]. Isto foi em junho de 1943.

Todo esse mundo católico se atirou em cima do livro [175]. Repercutiu nos meios católicos do Brasil inteiro. Foi uma verdadeira bomba! [176]

Mandei o Em Defesa em encadernação especial, com dedicatória, a Dom José Gaspar. Também mandei ao Tristão de Athayde e a uma série de outras pessoas do Movimento Católico. E o correio levou a bomba por toda a parte [177].

Um belo dia, para um lindo automóvel em frente à minha casa e entrega uma carta do Arcebispo [178] agradecendo o exemplar encadernado, e fazendo votos de que na Arquidiocese houvesse uma unidade de espírito como a já reluzente entre os primeiros cristãos*[179].

*A carta do Sr. Arcebispo vinha datada de 25 de junho de 1943 e afirmava que “nada tenho mais a peito do que fazer de todos os meus caríssimos diocesanos um só coração e uma só alma, porquanto assim se tornariam a ver, na arquidiocese de São Paulo, aquelas maravilhas de caridade e prodígios de santidade, que os primeiros cristãos, consoante refere o Livro dos Atos dos Apóstolos, exibiam aos olhos atônitos dos pagãos”. E acrescenta: “E não será este apostolado de concórdia e amor fraterno o que devemos exercer, num mundo trabalhado pelos maus fermentos do paganismo?”.

Terminava dando a entender que não lera a obra: “Vou ler atentamente o seu livro, prezado Dr. Plinio, na medida em que os meus muitos e graves encargos do ministério pastoral me facultarem algum vagar”.

Em notas pessoais (certamente do 2° semestre de 1943), Dr. Plinio registrava os “rumores entre pessoas chegadas a S. Excia., que declaram o aborrecimento do mesmo com a difusão do livro”. A Monsenhor Mayer, em reunião na Cúria, diante dos Vigários Gerais, o Arcebispo disse que o livro fora escrito com períodos longos, o que “é pena, porque senão ele poderia fazer muito bem”.

11. Primeiras reações contrárias

Aí comecei a receber repercussões do lado contrário ao livro.

Tristão de Athayde escreveu-me uma carta em que ele se queixava amargamente, dizendo que no meu livro, sob o aspecto de defender a Ação Católica, eu fazia denúncias injustificadas a personalidades respeitáveis. Que ele lamentava que eu desse o meu nome a essa campanha indigna que estava sendo feita. E cortamos relações.

A última vez que nos vimos foi em 1955, por ocasião do 36° Congresso Eucarístico Internacional que houve no Rio. Encontramo-nos casualmente no corredor do Palácio São Joaquim, depois de anos de relações rompidas.

Ele foi muito amável:

— Oh! Plinio, como vai você?

— Dr. Alceu, o senhor como está?

Quase não paramos para nos falar. Apertamos as mãos e depois disso, até a morte dele, não nos vimos mais. Acabaram-se as relações [180].

Também Dom Cabral e outros começaram a dizer que o livro deveria se chamar “Indefesa Ação Católica” [181].

A reação contrária teve três etapas. Ela fracassou na primeira, e novamente fracassou na segunda. Porém alcançou pleno êxito na terceira. Vejamos cada uma delas.

12. Ameaças de condenação que não vieram

A primeira etapa foi a das ameaças.

Lembro-me ainda que, de volta de uma viagem a Minas, meu então jovem amigo José de Azeredo Santos (que seria depois tão conhecido como polemista de indomável coerência) nos informou bem humorado e divertido:

Estive com Frei BC, que me disse estar constituída uma comissão de teólogos para refutar o livro do Plinio. ‘Ele se arrependerá’ — disse Frei BC — ‘de o ter publicado’.

Resolvemos esperar a refutação. Até hoje ela não veio.

*   *   *

Também penso, escrevendo estas linhas, em um cartão de uma muito ilustre e respeitável personalidade. Dizia o missivista que agradecia o oferecimento do livro e que em breve denunciaria de público os erros nele contidos. Nada se publicou [182].

Excetuou-se a tentativa de réplica explícita do Bispo de Uberaba, Dom Alexandre do Amaral. Com ela não estive de acordo. Mas agradou-me a franqueza com que, de viseira erguida, ele afirmou o que lhe parecia bem [183].

13. Zum-zum que também fracassa

Fracassadas as ameaças de refutação, veio a fase do zum-zum.

O livro continha erros. Até numerosos erros. Não se dizia quais eram. Mas que os havia, havia. Já não se falava de refutação. Era somente a reafirmação insistente da mesma acusação imprecisa: “há erros, há erros, há erros”.

Pobre Em Defesa da Ação Católica: dele tudo se disse. Ora se afirmou que era obra de sapateiro trabalhando fora de seu mister: livro de leigo, que supunha conhecimentos de Teologia e Direito Canônico.

Ora, para melhor combater o livro, se afirmava que um leigo jamais teria conseguido escrever tal trabalho. E então se lhe fazia a honra de atribuir como autor, ora a Monsenhor Mayer, ora ao Padre Sigaud*[184].

* Em Belo Horizonte, chegou-se até o baixo recurso da calúnia. De lá, o Padre Dainese escreveu a Dr. Plinio contando: “O livro suscitou por aqui uma grande celeuma: espalham até o boato de que o autor ‘foi’ católico mas que agora é um simples ‘apóstata’, que não freqüenta mais a religião etc....” (cfr. carta do Padre Dainese a Dr. Plinio, de 9 de julho de 1943).

*   *   *

Houve uma coincidência desagradável que contribuiu para azedar o ambiente.

Dom Antônio dos Santos Cabral, Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte

Quando publiquei o Em Defesa, eu ignorava completamente que Dom Cabral, Arcebispo de Belo Horizonte, havia preparado uma Carta Pastoral sustentando exatamente o contrário do meu livro [185], por ocasião do 25º aniversário de sua sagração episcopal. Era uma Pastoral ousadíssima, em que ele defendia com calor a maior parte dos erros existentes em matéria de Ação Católica [186].

Essa Pastoral saiu a lume mais ou menos concomitante com o lançamento do Em Defesa*.

* O fato deixou Dom Cabral exacerbado e fora de si, conforme contou o Padre Dainese, então residente em Belo Horizonte, em carta de 3 de novembro de 1943 a Monsenhor Mayer:

“No dia 21 de outubro p.p., fui chamado a palácio pelo Sr. Arcebispo [Dom Cabral]. Entre outras coisas falou-me S. Excia. do livro do Dr. Plinio Corrêa de Oliveira, ‘Em Defesa da Ação Católica’. A respeito desta obra exprimiu-se o Sr. Arcebispo em termos de franca censura e oposição, salientando os pontos seguintes: 1°) o livro do Dr. Plinio é um livro ‘negativo’: prejudica a A.C. em lugar de favorecê-la ou defendê-la. [...] 2°) É portanto um livro contraproducente: é como se alguém escrevesse um livro em defesa do sacerdócio, pondo em realce suas dificuldades, as misérias e os escândalos dos maus padres... 3°) A propósito da afirmação de Pio XI de que o apostolado da A.C. faz parte do próprio ministério sacerdotal, diz S. Excia. que encontrou cinco textos em que o Papa reafirma esta sua asserção. Ora o Dr. Plinio sustenta que o Papa não pode entender esta participação no sentido estrito porque seria heresia. Donde o Sr. Arcebispo conclui que praticamente o Dr. Plinio qualifica de herética uma afirmação do Papa. 4°) Disse também o Sr. Arcebispo que o Dr. Plinio, sendo um simples leigo, não pode arvorar-se em juiz e censor dos Srs. Bispos, nem da A.C. que está sob a imediata vigilância do Episcopado. 5°) Afirmou finalmente S. Excia. que o Dr. Plinio fez uma lista de Bispos ‘hereges’, na qual incluiu o nome do Sr. Arcebispo de Belo Horizonte. [...]

“O livro do Dr. Plinio suscitou aqui, como V. Revma. deve saber, uma verdadeira celeuma, com escândalo de muitas almas: pois que de um lado o livro foi praticamente banido do Seminário e da A.C. (a Presidente da J.F.C. chegou a telefonar a todas as dirigentes proibindo-lhes a leitura do livro), e do outro é um livro que se apresenta sob a égide e com aprovação do representante do Papa no Brasil”.

*   *   *

Amainada a segunda etapa do zum-zum, deram-se os acontecimentos que marcaram a terceira etapa, esta sim, profundamente prejudicial a nós. É a que narro a seguir.

Capítulo VII

O episódio Svend Kok

1. Antecedentes

Havia sido criado um setor da Ação Católica, que era a JUC — Juventude Universitária Católica. Foi, aliás, o primeiro setor da Ação Católica em São Paulo, fundado ainda quando Dom José era Bispo Auxiliar.

O cargo de assistente eclesiástico foi entregue a Dom Pedrosa. E, indicado por mim, teve como presidente primeiramente José Pedro Galvão de Sousa e depois Franco Montoro. O vice-presidente era Paulo Barros de Ulhôa Cintra.

De nosso grupo faziam parte da JUC, além de Paulo Barros, José Fernando de Camargo, José Gustavo de Souza Queiroz e outros.

Acontece que, como já disse, Dom Pedrosa tinha uma orientação profundamente oposta à nossa, mas ele não a revelava claramente. Houve atritos entre ele e nós durante todo o tempo em que ele foi assistente eclesiástico da JUC.

É preciso dizer que eu estimava sinceramente Dom Pedrosa e sempre o tratei com a maior consideração com que se possa tratar uma pessoa.

Como presidente da Ação Católica, nunca publiquei um ato sem antes levar ao conhecimento dele e perguntar o que achava. Agia assim por deferência, sem ter a mínima obrigação de fazê-lo, pois ele era assistente eclesiástico de um setor e eu era presidente da Junta Arquidiocesana.

Lembro-me de que, quando os mal-entendidos entre ele e eu estavam muito grandes e com algumas intrigas pelo meio, combinei com Dom Pedrosa e com Dom Teodoro Kok que nunca um de nós tomaria qualquer atitude em desabono do outro, sem antes avisar e procurar ver se o mal-entendido não poderia ser desfeito.

Foi o que me levou, por exemplo, a pedir a ambos que opinassem, como já mencionei, sobre o livro Em Defesa, antes de publicá-lo.

2. Confidências numa viagem a Campinas

Um dia, como eu ia a Campinas fazer uma conferência para os salesianos, pedi a Dom Pedrosa para levar junto Dom Teodoro Kok.

Legionário Nº 149, 8 de julho de 1934 - Svend Kok entra para a Ordem dos beneditinos a 10 de julho

Na viagem, conversamos como antigos amigos e companheiros da Congregação de Santa Cecília sobre a situação toda, baseado na amizade que ele continuava a me demonstrar, e também baseado no fato de que ele me contou vários abusos litúrgicos que havia observado no Colégio Santo Anselmo de Roma, onde ele havia feito os seus estudos.

Então contei a ele várias das minhas impressões e mesmo alguns fatos relativos ao andamento do liturgicismo aqui no Brasil, e referi-me ao apoio que Dom José vinha dando a essa corrente.

Chegamos a Campinas, fiz a conferência e pernoitamos naquela cidade. Na manhã seguinte, encontrei Svend Kok e perguntei maquinalmente como passara a noite.

Ele respondeu:

Eu não consegui dormir depois do que você me contou! Fiquei tão impressionado com a situação, que custei a conciliar o sono. Então, haverá nos dias de hoje um Bispo capaz de ter uma doutrina oposta ao Papa? Isto é uma coisa que me deixa arrasado, eu não posso compreender isto.

Ele dizia isto não como quem objetava contra mim, mas como uma pessoa que deplorava a situação.

Falamos um pouco mais sobre isto e voltamos de trem para São Paulo, conversando sobre outras coisas*.

* O Cônego Mayer, em carta ao Sr. Núncio (em 12/5/45), acrescenta que Dr. Plinio havia falado a respeito do mesmo problema com Dom Pedrosa, ao tentar alertá-lo para a má influência exercida pelo Padre Ramón Ortiz. Eis o trecho da carta:

"Não ignora Vossa Excelência todo o apoio que o Sr. Arcebispo dá ao Padre Ramón Ortiz, e aos demais padres de Taubaté. Esses sacerdotes desenvolvem um movimento incessante em prol do liturgicismo, procurando penetrar em todos os ambientes católicos. Ultimamente, o Padre Ramón tem adquirido grande ascendente no espírito do Revmo. Dom Paulo Pedrosa, que o tem levado a Itanhaem fazer férias com os jovens universitários. O mesmo Dom Paulo já convidou para idêntica excursão o Revmo. Padre Calazans, e também já encarregou de um retiro na JUC o Padre Carlos Ortiz.

"O Dr. Plinio sempre foi muitíssimo amigo de Dom Paulo Pedrosa, bem como de Dom Teodoro Kok. Por este motivo, procurou explicar a ambos os inconvenientes do convívio de tais padres com os universitários. Evidentemente, o argumento dos dois Monges foi de que, se tais padres fossem perigosos, o Sr. Arcebispo não os apoiaria. E o Dr. Plinio, então, no mais estrito sigilo, abriu-se com aqueles dois sacerdotes sobre o Sr. Arcebispo. Ambos - e especialmente Dom Paulo - são muito confiantes. Assustaram-se com a afirmação de que o Sr. Arcebispo não desconhece os erros daqueles padres e os apóia" (carta do Cônego Mayer ao Sr. Núncio, de 12/5/45).

3. Estouro na reunião do Clero

Pouco depois realizou-se, sob a presidência do Arcebispo Dom José Gaspar, uma Semana de Estudos de Ação Católica para o Clero regular e secular de São Paulo, no térreo do prédio vizinho à igreja da Ordem Terceira de São Francisco. Estavam presentes os Vigários Gerais, todo o Clero e muitos padres de fora da Arquidiocese [187].

Esta semana de estudos do Clero realizou-se no próprio momento em que o meu livro e a Pastoral de Dom Cabral faziam todo o barulho: a polêmica estava no ar em virtude da efervescência dos dois documentos.

Na primeira sessão, a Pastoral de Dom Cabral havia sido colocada anonimamente na sala de reuniões. Quando os padres entraram, viram-na em cada cadeira.

Qual não foi a minha surpresa quando eu soube que, no segundo dia desse evento, Dom Teodoro Kok se levantou e, sem citar nomes, mas numa alusão translúcida a nós, fez um discurso denunciando-nos como conspiradores contra Dom José Gaspar.

Afirmou ele que se tratava de membros de projeção da Ação Católica, portanto pessoas de confiança de Dom José Gaspar, os quais diziam que [188] há Bispos que têm doutrinas erradas em matéria de Ação Católica:

Eu nem vou dizer os nomes dos Bispos que eles indicam, porque causaria neste ambiente um verdadeiro horror. Mas venho fazer aqui um protesto contra a insolência desses elementos, que se atrevem a imaginar que um Bispo católico possa cair em erro em matéria de doutrina [189]. São pessoas que julgam tudo por seus próprios conceitos, e isto é uma falta de humildade.

E reafirmava: "Acusarem um Bispo de erros em matéria de doutrina... onde já se viu isto.":

Terminado o discurso de Dom Teodoro Kok, foi um escândalo na sala, uma coisa tremenda, pois naquele tempo dava-se como certo que um Bispo não podia errar...

Dom José sabia de antemão que esse golpe ia ser dado. Ele estava presidindo à sessão e assistindo à explosão, combinada antes com ele, como depois ficou evidente pelo desenrolar dos fatos. À direita dele estava Monsenhor Mayer como vítima, porque indubitavelmente falar de nós era falar de Monsenhor Mayer.

Mas então Monsenhor Mayer se levantou e disse:

— Temos que salvar os princípios. Dom Teodoro afirmou que um Bispo nunca pode cair em erro de doutrina. Ora, esta sala está cheia de pessoas que estudaram Teologia, e todos sabem que um Bispo pode cair em erro. E este princípio precisa ser salvo aqui dentro. Nós não podemos aceitar a doutrina da infalibilidade dos Bispos.

Dom Teodoro havia também afirmado que um leigo nunca poderia criticar um Bispo. E Monsenhor Mayer rebateu:

— Eu discordo. Há casos em que um leigo pode e até deve criticar um Bispo. E isto, em boa doutrina, é preciso sustentar.

Com a grande autoridade de teólogo que ele tinha, foi tal o impacto, e estabeleceu-se uma tal confusão, que Monsenhor Mayer saiu mais simpatizado do que nunca da sessão, embora as opiniões fossem muito contrárias a mim pessoalmente e aos demais membros da Junta Arquidiocesana da Ação Católica.

Aí os senhores podem ver o Dom Mayer inteiro dos bons tempos: lealdade, coragem, inteligência, e entrando inteiro dentro da luta. Era Daniel na cova e puxando o bigode do leão.

Dom José não esperava aquela intervenção de Monsenhor Mayer e encerrou a sessão com palavras muito anódinas.

4. Monsenhor Mayer exige ver antes o novo discurso de Dom Teodoro Kok

Dom Teodoro havia anunciado que continuaria a falar no dia seguinte.

Terminada a sessão, Monsenhor Mayer desceu do estrado, dirigiu-se a Dom Teodoro e disse:

— Teodoro, o senhor amanhã, se falar de novo, tem que me mostrar o seu discurso, porque o senhor não é homem que possa falar sem que se veja antes o que o senhor vai dizer.

Dom Teodoro gaguejou, ficou lívido.

Monsenhor Mayer teve ainda a audácia de dizer a Dom José que ele tinha proibido Dom Teodoro de fazer seu novo discurso sem que ele visse antes.

5. “Golpe profundamente nocivo para nós”

Ficamos sabendo depois, através de uma pessoa das cercanias do Arcebispo, o que se passou no Palácio naquele dia, após a reunião.

Dom José havia chegado muito preocupado. Chamou o Padre Ramón Ortiz, que tinha estado presente e assistido à cena. E os dois passearam nervosamente pelos jardins do Palácio durante bastante tempo. Logo depois do almoço, Dom José saiu.

A atmosfera era contrafeita dentro do Palácio. Eles não ficaram contentes com o resultado do golpe dado. Mas esse golpe foi profundamente nocivo para nós.

*   *   *

Dom Teodoro acabou por enviar o discurso dele a Monsenhor Mayer. E na sessão seguinte ele leu o texto aprovado pelo Monsenhor Mayer. Era um discurso anódino.

Dom Mayer e Dom José não comentaram entre si o incidente. Trocaram alguns comentários sobre outros pontos, o que era como que não comentar. Ficou assim no ar e o incidente foi dado como encerrado.

Capítulo VIII

Começam as represálias

1. Retração e gelo

Aí começaram as represálias.

Eu tinha sido convidado para fazer um discurso em Campinas. Dias depois recebo uma carta do Bispo de lá comunicando que esse discurso estava adiado sine die.

Começo a notar, desde esse dia, vários padres mudarem completamente a sua atitude a meu respeito. Em praticamente todo o meio eclesiástico de São Paulo, isto é, entre os padres (no laicato isso não repercutiu), minha cotação, se antes era 80, desceu para 8 ou menos que 8. Foi uma baixa vertiginosa [190].

Um certo número de Bispos que havia apoiado o livro Em Defesa da Ação Católica, vendo que os Bispos novos e influentes se voltavam contra nós, foram também tirando o corpo [191].

*   *   *

Houve belas exceções.

O Provincial dos jesuítas, Padre Louis Riou, tomou uma atitude decididamente favorável ao livro. E evidentemente uma parte dos jesuítas continuou absolutamente na mesma conosco.

Muitos outros, entretanto, foram contra, e boa parte deles afastou-se de mim. E ficou criada entre os jesuítas uma situação de polêmica.

Especialmente continuaram a me apoiar, além do Padre Riou, o Padre Dainese, o Padre Arlindo Vieira e em alguma medida o Padre José Achótegui. A atitude do Padre Mariaux, que também me apoiou, constitui um capítulo à parte, de que vamos falar depois [192].

Um bom número de Bispos e também de sacerdotes de São Paulo e do interior do Brasil ficaram de nosso lado.

Permaneceram também conosco, obviamente, os componentes do grupo do Legionário e os dois sacerdotes que depois se tornariam Bispos: o então simples padre secular Monsenhor Antonio de Castro Mayer, e o jovem sacerdote mineiro da congregação do Verbo Divino, Padre Geraldo de Proença Sigaud [193].

2. Difamação e palavra de ordem

A partir desse momento, houve uma alteração na situação de nosso grupo, já prevista de antemão: antigamente estava no candelabro e agora era posto debaixo do alqueire, quer dizer, numa situação muito cruel [194].

Eu tinha na época 35 anos [195].

Soprou uma onda de difamação tremenda contra mim em toda a Arquidiocese de São Paulo e nos meios católicos de todo o Brasil.

Ninguém mais me convidava para nada. Fui completamente posto à margem, como um exilado. Em 20 dias, a minha situação mudou inteiramente, como, aliás, repito, eu havia previsto [196].

Baixou uma ordem extra-oficial de não mais me convidarem para falar em nenhuma, mas absolutamente nenhuma reunião católica. Sendo que antes eu era um dos oradores mais convidados para toda espécie de discurso em São Paulo, e muito frequentemente em outras cidades.

Tão verdadeiro era isto, na situação anterior ao ostracismo, que a Folha de S. Paulo fez a certa altura uma pesquisa para saber qual era o orador mais apreciado em São Paulo, numa lista de cinco ou dez nomes. Publicados os resultados, o segundo orador escolhido da lista de São Paulo era eu.

Não se passa da condição de segundo orador de São Paulo para a de um homem que nunca mais é convidado para falar em público em eventos católicos, sem uma enérgica palavra de ordem.

E essa palavra de ordem foi cumprida ao pé da letra e em todos os pormenores, exceto em duas ou três ocasiões em que fui convidado para falar em cerimônias da Universidade Católica e aceitei. Mas aí a situação era diferente: o convite não dependia de ordens secretas da Cúria, por ser a Universidade uma entidade autônoma.

Duas ou três vezes também fui escolhido paraninfo e aí a Cúria não tinha o direito de proibir. Aceitei essas minúsculas possibilidades de atuação para que não se pudesse dizer que eu fiz o papel de émigré à l‘interieur [197]. Pelo contrário, tomei parte naquilo que me pediram, e o que eu não fiz foi porque não me pediram [198].

Esses convites indicavam uma popularidade “subcinerícia”. “Cinerício” vem de cinis, cineris, em latim, cinza. Subcinerício é aquilo que fica por debaixo das cinzas [199].

E esta situação perdura até hoje [200].

*   *   *

Uma exceção nessa época foi a cidade de Santos.

Havia ali um amigo nosso, Reinaldo Cruz, católico militante, que se aproximara de nós mais ou menos nesse período de ostracismo.

Ele era um fogosíssimo entusiasta de nossas atividades e um propagandista de primeira ordem. Muito amigo do Dr. Antonio Ablas Filho, que era nosso representante em Santos. E promoveu naquela cidade uma série de conferências minhas que lotavam literalmente um salão muito grande que havia no centro da cidade, da Humanitária [201]. Todos os jornais de Santos davam depois a notícia.

Ele me convidava também para ir falar na rádio (não havia TV naquele tempo).

O Bispo de Santos, Dom Idílio José Soares, ia sempre às conferências, e foi sempre muito amável. Várias vezes fui visitá-lo para agradecer essa atenção.

Era uma situação paradoxal: nós afundando de todos os lados em São Paulo, e com uma popularidade extraordinária em Santos! [202]

3. Removido da presidência da Ação Católica

Eu tinha ido passar alguns dias de descanso, junto com o grupo do Legionário, numa fazenda muito agradável dos jesuítas em Itaici, a mesma onde se realizam hoje, num prédio enorme construído posteriormente, as reuniões do Episcopado nacional *.

* Naquele tempo, Itaici, no município de Indaiatuba-SP, era ainda uma velha fazenda que havia pertencido a Jorge Tibiriçá Piratininga, governador do Estado de São Paulo e avô de Dr. Eduardo de Barros Brotero, futuro membro do grupo de Catolicismo e um dos fundadores da TFP.

Estávamos andando no parque, quando [203] recebo um telefonema de Monsenhor Mayer avisando-me que tinha recebido uma carta de Dom José comunicando que, quando o nosso mandato terminasse, ele queria que saíssemos da direção da Ação Católica [204].

4. Pressão econômica

Chegou-me, pouco depois, uma outra comunicação.

Eu era advogado da Cúria desde o tempo de Dom Duarte, mantendo com ela dois contratos de serviços advocatícios.

E Dom José, através de Monsenhor Consentino, mandou-me o seguinte recado:

— O Senhor Arcebispo pede para avisar a Dr. Plinio que ele será advogado da Cúria apenas até o fim do mês. No fim do mês, lhe serão tirados os serviços [205].

*   *   *

Pouco depois, outra medida, desta vez indireta: inexplicavelmente saiu um decreto do governo do Estado — estávamos em regime de ditadura — fechando o Colégio Universitário onde eu era catedrático vitalício.

Depois eu soube que o decreto de fechamento fora pedido por Dom José Gaspar ao governador Ademar de Barros, de quem ele era muito amigo.

O decreto determinava que o Colégio se dissolvesse, podendo seus professores serem aproveitados em cadeiras de colégios de cursos secundários na capital ou no interior. Se não quisessem aceitar isto, seriam aposentados com vencimentos proporcionais.

Como eu era professor novo, optar pela aposentadoria significaria receber a terça parte dos vencimentos. Assim, eu era praticamente jogado na miséria com essas duas providências* [206].

* Posta essa situação, Dr. Plinio teve de ir lecionar no Colégio Estadual Presidente Roosevelt, situado na rua São Joaquim, no bairro da Liberdade, em São Paulo. Ali foi objeto de grande apreço por parte dos alunos. Os alunos de uma das turmas que, por razões administrativas, deveriam não mais ter aulas com Dr. Plinio, chegaram a promover um abaixo-assinado para que ele continuasse a lecionar para a turma.

Note-se que o homem que agia assim (Dom José Gaspar) pregava a tolerância e a bondade para com todos os inimigos da Igreja, levadas a um grau inimaginável... [207]

5. Boicote do livro nas livrarias

Enquanto isto, o livro Em Defesa pipocava no ambiente católico, estourando de todo o jeito. Mas de repente os membros do grupo do Legionário encarregados da distribuição às livrarias começam a me comunicar que crescia o número de livrarias que se recusavam a continuar a venda, alegando tratar-se de um livro de oposição ao Arcebispo.

Apenas a Livraria Catedral continuou a vendê-lo. Eu não conhecia o dono, mas mandei felicitações a ele, dizendo que eu apreciava a sua coragem. Este senhor, até o fim, enquanto houve leitores em São Paulo para o livro, ele o vendeu [208].

Capítulo IX

Morte trágica de Dom José Gaspar

1. Morte completamente inesperada

Eu estava muito preocupado com essa situação toda quando, durante uma aula no Colégio Roosevelt, sou chamado ao telefone. Disseram-me tratar-se de um assunto urgentíssimo.

Era o José N. César Lessa, redator do Legionário, que com uma voz cava me disse [209]:

— Plinio, eu queria lhe avisar que está correndo o boato de que o avião que levava Dom José Gaspar ao Rio de Janeiro caiu e ele morreu. Morreram também o Cásper Libero, Monsenhor Alberto Pequeno, o Padre Nelson Vieira, secretário dele e toda a tripulação *.

* Em meio a densa cerração, o piloto da VASP havia feito uma primeira tentativa de pouso sem resultado, e na segunda bateu com a asa direita em um dos prédios da Escola Naval situado na Ilha de Villegaignon, contígua ao Aeroporto de Santos Dumont. Três passageiros foram resgatados com vida pelos cadetes da Marinha e as restantes 18 pessoas morreram no desastre. O desastre ocorreu às 9:05 horas do dia 27 de agosto de 1943 (cfr. Legionário n° 577, de 29 de agosto de 1943).

Noticiário sobre o acidente que vitimou D. José Gaspar na Folha da Manhã de 28 de agosto de 1943

Fiquei muito espantado [210]. Esse desastre de avião era uma coisa com a qual ninguém contava [211].

Voltei para dar aula, mas aquela impressão diante do meu espírito se tornou tão clamorosa, que interrompi a aula.

Tomei um automóvel e, ao passar em frente à agência da Vasp, de longe vi uma aglomeração diante da vitrine.

Cheguei perto e encontrei um aviso: “Temos o pesar de informar que faleceram Dom José Gaspar, o senhor Cásper Líbero e outras pessoas.”

Parei um minutinho, olhei e mandei o automóvel tocar para o [212] meu escritório de advogado, no centro da cidade. Fechei as portas e deitei-me um pouco no sofá. Eu estava muito emocionado e, pela única vez em minha vida, tomei um calmante chamado Água das Carmelitas [213].

2. Premonição dessa morte prematura

Uma das razões pelas quais fiquei impressionado [214] foi por ter-me lembrado de uma cena ocorrida algum tempo antes com o Arcebispo.

Numa solenidade na Cúria, [215] estávamos os dois em pé, o Arcebispo e eu, conversando sobre assuntos do Movimento Católico. Ele se referiu a uma coisa qualquer e depois, não sei por que, disse-me o seguinte: “Nos poucos anos de vida que me restam, ainda conto fazer tal coisa”.

Quando falou isto, ele, que estava casualmente olhando para o chão, levantou os olhos e olhou no fundo de meus olhos. Nossos olhares se cruzaram. E percebi perfeitamente que ele tinha razão e iria viver pouco tempo [216].

*   *   *

Apesar de todas as desavenças, prestei a ele todas as honras fúnebres que deveria prestar. E ainda fizemos um número especial do Legionário em sua homenagem [217].

3. A morte o colhe em plena campanha contra nós

Depois da morte de Dom José, soubemos que ele estava de tal maneira empenhado na luta contra nós, e posto numa campanha tão formidável nesse sentido, que ele havia programado uma visita a todos os Bispos da Província Eclesiástica de São Paulo, com o intuito específico de recomendar que não nos convidassem para nada e nos mantivessem no ostracismo mais completo.

Soubemos também que ele estava indo ao Rio de Janeiro para levar à Nunciatura documentos contra nós e tentar nos demolir junto ao Núncio.

Foi encontrado até um caderninho, que um sacerdote amigo nosso chegou a ler, com a agenda dos encontros que ele deveria manter naqueles dias no Rio. Eram quase todos amigos nossos daquela cidade.

*   *   *

Nessa campanha contra nós, ele havia tido um desaponto.

Ele passara uma circular aos seus colegas de Episcopado comunicando que eu tinha deixado a Presidência da Junta Arquidiocesana da Ação Católica.

Os Bispos mandaram uma resposta muito corriqueira e inteiramente burocrática, agradecendo a comunicação, quando ele esperava perguntas: “Por que? Mande informações”. E alguns Bispos, com quem ele foi falar, receberam mal a visita.

O velho Bispo de Ribeirão Preto, Dom Alberto José Gonçalves, chegou a dizer a ele:

— Senhor Arcebispo, V. Excia. é moço e eu sou velho. Cuidado! O caminho da heresia é o que V. Excia. está seguindo.

O Bispo Auxiliar, Dom Manuel da Silveira d‘Elboux, também disse a Dom José coisas muito pesadas.

Numa visita a Dom Cintra [218], na época Reitor do Seminário e mais tarde Bispo de Petrópolis, Dom José perguntou:

— Cintra, você também é dos que acham que eu sou herege?

Dom Cintra respondeu:

— Senhor Arcebispo, eu não acho que V. Excia. seja herege, mas acho que V. Excia. protege os hereges, e que infelizmente a sua atitude não é boa.

Falando depois a meu respeito para Dom Cintra, ele disse: “O Plinio não tem mais razão de ser nesta vida. A única solução para ele é morrer”.

*   *   *

Tudo isto mostrava bem que nós, apesar de precipitados de uma situação brilhante, tínhamos deixado muitas consciências alertadas.

Portanto, dentro de nossas desgraças, havíamos feito, até certo ponto, o papel de Sansão. A coluna estava derrubada [219]. E o nosso cadáver, atravessado na estrada, impedia o inimigo de continuar. Quer dizer, o sacrifício tinha sido útil [220].

4. O dom de romper as estagnações, quebrar as indiferenças e mover as águas paradas

Lá pelo fim da década de 1940, quando as devastações produzidas contra nós em conseqüência do lance do Em Defesa estavam no auge, por essas ou aquelas circunstâncias fortuitas, a Universidade Católica de Porto Alegre convidou-me para fazer uma conferência.

Fui recebido gelidamente pelo Arcebispo Dom Vicente Scherer [221], mas com muito interesse pelos jesuítas de lá.

Ao que parece, esses jesuítas estavam naquele momento numa tensão interna, e eram pertencentes à ala da Companhia de Jesus que me tinha dado apoio.

Por causa disso, conseguiram que eu fosse convidado para fazer conferência em São Leopoldo, que dista cerca de uma hora de Porto Alegre e onde há um grande seminário jesuíta.

*   *   *

Em São Leopoldo havia um sacerdote jesuíta chamado Cândido Santini, que publicara um livro com críticas à Ação Católica.

Por causa dessas críticas, a Ação Católica promoveu um rumor contra esse Padre, que foi posto de lado e transferido para o Seminário Central de São Leopoldo, onde ficou professor.

Por uma conjunção de horários, antes ou depois da conferência, não me lembro bem, os padres me convidaram para um lanche. Eles me levaram ao refeitório, onde encontrei o Padre Cândido Santini.

Não nos conhecíamos. Mas cumprimentei-o muito cordialmente, como se cumprimenta uma pessoa que está na mesma ordem de idéias. E sentamo-nos.

Pe. João Baptista Reus S.J.

Aproveitando alguns instantes em que estávamos sós no refeitório, o Padre Santini, talvez por se sentir não observado, me disse à queima-roupa: “O senhor tem o dom de romper as estagnações, quebrar as indiferenças e mover as águas paradas”.

Mas ele disse isto como uma pessoa que estava numa situação muito desagradável, perseguido, oprimido, e que tinha oportunidade de fazer um desabafo com alguém capaz de compreendê-lo, e que só tinha oportunidade de dizer aquelas palavras entre a saída de um padre e a entrada de outro. E disse isto visivelmente com a intenção de me animar.

*   *   *

Morou e morreu neste mesmo seminário o Padre Reus [222], que não conheci pessoalmente, mas foi meu contemporâneo.

Esse Padre Reus era muito mais velho do que eu. Só um pouco antes de sua morte é que me falaram dele. Após sua morte, mostraram-me a sua fotografia. Ou eu me engano enormemente, ou esse padre foi um grande santo.

Na minha caixa de relíquias, eu tenho uma relíquia indireta dele, um pano que o tocou. Eu osculo metodicamente cada uma das relíquias que tenho diariamente, e quando chega a vez da do Padre Reus, eu osculo com uma particular piedade.

A sua sepultura no cemitério de São Leopoldo é visitada continuamente por pessoas que depositam flores e pedem graças [223]. Não há gente nossa que vá ao Rio Grande do Sul que eu não recomende de ir à sepultura dele [224].

Capítulo X

Vacância da Sede Arquiepiscopal: período de trégua

1. Monsenhor Monteiro como Vigário Capitular

Após a morte de Dom José Gaspar, estava vaga a Arquidiocese. E foi eleito Vigário Capitular [225] o Monsenhor José Maria Monteiro.

O Cônego Mayer foi convidado por Monsenhor José para ser pró-Vigário Geral e pediu a ele para continuar como assistente eclesiástico da Junta da Ação Católica. E autorizou-o a nos manter na Junta Arquidiocesana até que viesse o novo Arcebispo.

Com isto diminuíram também as oposições que se faziam a nós [226].

Eu não perdi os meus serviços advocatícios na Cúria, e nós tivemos assim alguns meses de tranquilidade [227].

A situação se prolongou ad interim, e durante esse tempo o meu livro continuou a sair e a polêmica em torno da Ação Católica a ferver.

2. Polêmica a respeito de Maritain

O Legionário já tinha, ainda no tempo de Dom José, iniciado uma polêmica a respeito de Maritain que ele continuou durante a vacância da sede [228].

Jacques Maritain

Os livros de Maritain tiveram entre nós a mais ampla divulgação, trazendo consigo a aceitação entusiástica, por parte de seus adeptos, de seus principais erros: jesuitofobia, separação entre a Igreja e o Estado, concepção interconfessional e laica da “nova cristandade”, socialismo, “politique de la main tendue” (política da mão estendida) etc.

Era fácil perceber que os erros referentes à Ação Católica e à liturgia preparavam os espíritos para receber muitas das teses de Maritain, como a jesuitofobia e o interconfessionalismo. E a tendência ao panteísmo favorecia uma inclinação para o socialismo e o comunismo* [229].

* O primeiro artigo dessa polêmica foi publicado no n° 586 (31/10/43), e tinha como título A doutrina de Jacques Maritain e os documentos pontifícios. Era de autoria do Padre Arlindo Vieira S.J., e analisava os vários conceitos expostos por Maritain em sua obra Les Droits de l’homme.

Padre Arlindo Vieira tecia um paralelo entre as teses heterodoxas do escritor francês e as doutrinas ensinadas por Pio IX, Leão XIII e São Pio X, apontando a inegável oposição entre o que apregoava Maritain sobre o papel da Igreja e do Estado no mundo contemporâneo e o que a esse respeito ensinava o magistério infalível da mesma Igreja.

Como era de se prever, o artigo suscitou numerosas objeções. Pouquíssimas versavam sobre o mérito da questão. A imensa maioria delas ficava nas preliminares: — “Padre Arlindo teve uma atitude a priori injusta, infeliz e prejudicial aos interesses da Igreja; Maritain fora atacado em sua honra de católico; foram postos em dúvida os ensinamentos do maior filósofo cristão da atualidade”, e assim por diante.

Mas ficavam nisto, não entrando nem de longe na análise dos textos produzidos pelo Sacerdote.

O Diário Católico de Belo Horizonte, por exemplo, estampou em sua edição de 14/11/43 um artigo indignado de Fábio Alves Ribeiro, sob o título Ataques contra Maritain, em que chegava a lançar em rosto do Padre Arlindo Vieira a acusação de que ele estava agindo de “má fé”. Esse artigo fora encaminhado ao Diário por Alceu Amoroso Lima, que assim endossava esse violento ataque.

Em vista dessas reações, o Legionário publicou um artigo, assinado por José Fernando de Camargo, dizendo, em nome da Redação, que ao inserir em suas colunas o trabalho do ilustre Sacerdote, o jornal não se colocava na atitude comum da imprensa, que impunha a seus colaboradores a inteira e exclusiva responsabilidade por tudo quanto tivessem assinado, mas o Legionário se manifestava de acordo com o Revmo. Sacerdote. E por isso, não só lhe franqueou suas colunas, mas se esmerou em dar ao trabalho um destaque proporcional à importância do assunto. Esse artigo de Dr. José Fernando tomou o sugestivo título de Maritain e o “dogma” de sua infalibilidade, e foi publicado no Legionário n° 590, de 28 de novembro de 1943. Nesse mesmo número o Padre Arlindo Vieira apresentava sua réplica aos ataques que havia sofrido.

Essa polêmica enchia colunas inteiras do jornal e contribuiu para nos afastar ainda mais de Tristão de Athayde e de todos os seus partidários.

3. A “Mystici Corporis Christi” reforça a nossa posição

Durante esse período de vacância, o Legionário fez a difusão da encíclica Mystici Corporis Christi, e isto favoreceu ainda mais a posição do nosso jornal.

Pouco antes de Dom José morrer, aconteceu uma coisa muito boa para nós: saiu a encíclica Mystici Corporis Christi, a qual condenava alguns dos erros de que eu falava em meu livro [230]. Ela retificou importantes desvios doutrinários referentes ao elemento sobrenatural e ao elemento jurídico na Igreja [231].

Ora, a ofensiva feita pelos nossos adversários contra o meu livro dizia que ele relatava erros que não existiam. E a encíclica denunciava esses mesmos erros, o que me dava naturalmente muito mais base para denunciá-los.

Capítulo XI

Dom Motta Arcebispo de São Paulo: oposição pertinaz ao “Legionário”

1. Eleição de Dom Motta e inquietação do Sr. Núncio

Certo dia, atravessava eu muito preocupado o Largo de São Francisco, em São Paulo, quando me encontro com Paulo Monteiro, ministro na Ordem Terceira de São Francisco, cargo leigo equivalente ao de prior na Ordem Terceira do Carmo.

Ele me chamou e disse o seguinte:

— Dr. Plinio, tive informações absolutamente seguras de que Dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta, Arcebispo do Maranhão, será nomeado Arcebispo de São Paulo. Amigo íntimo de Dom Cabral, ele vem executar em São Paulo a política do Arcebispo de Belo Horizonte, e já está decidido que o primeiro golpe dele será contra os senhores.

Lembro-me de ter dito a ele: “Sr. Monteiro, nós estamos nas mãos de Nossa Senhora. Ela fará ou permitirá o que entender. Vamos continuando a viver”.

*   *   *

Pouco depois fui a Barra do Piraí para fazer uma conferência no Congresso Eucarístico que iria haver lá [232].

Deparei-me com uma situação quase engraçada, pois a mesa era presidida por Dom Jaime de Barros Câmara, sucessor do falecido Dom Leme na Sé do Rio. Ele estava no centro, à direita o Tristão e à esquerda eu. Tristão e eu éramos oradores no Congresso [233].

De Barra do Piraí fui para o Rio de Janeiro, de onde seguiria depois para Friburgo, convidado para fazer uma conferência no seminário dos jesuítas de lá.

Dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta

Estava eu nesse dia de repouso no Rio, quando, por volta do meio-dia [234], telefona-me o Dr. Pacheco Sales, de São Paulo: “O novo Arcebispo de São Paulo é Dom Carmelo!”

Eu sabia que ele fora intimíssimo amigo de Dom José Gaspar. E tive a impressão de que o Núncio sabia quem é que vinha.

O Padre Dainese, dias depois, me contou que viu o Núncio andando nervoso e dizendo a ele [235]: “O Arcebispo que vem para São Paulo é inimigo pessoal de Dr. Plinio; e vem com intenção de demolir o Dr. Plinio e o seu grupo. É uma tristeza, mas não tem remédio. Coitado do Dr. Plinio, coitado do Dr. Plinio!” [236]

Eu fiquei tão, tão aborrecido, que à noite, já em Nova Friburgo [237], estava com uns quarenta graus de febre, tal o sofrimento moral que a notícia me provocou [238]. Fiz minha conferência como Deus foi servido, voltei para São Paulo, e aqui tomei conhecimento da situação como ela se apresentava.

Então, passei um telegrama a Dom Carmelo, felicitando-o.

Ele mandou-me uma resposta amabilíssima* , que eu publiquei no Legionário, dirigida a mim como presidente da Junta Arquidiocesana, e saudando o “valoroso líder católico”, uma porção de coisas assim.

* Dom Carlos Carmelo ainda se encontrava no Maranhão quando enviou seu telegrama, em data de 14 de setembro de 1944, no qual dizia: “Receba valoroso presidente Ação Católica Diretor Legionário nossos agradecidos abraços bênçãos Pt Arcebispo Carlos Carmelo”.

Eu até hoje não sei por que ele me passou esse telegrama [239].

2. Honroso convite do Sr. Núncio como prêmio de consolação

Alguns meses mais tarde, recebi convite do Padre Dainese para fazer uma conferência no Teatro Municipal, durante uma sessão solene da Federação das Congregações Marianas do Rio de Janeiro *.

* Esta sessão realizou-se no dia 29 de novembro de 1944, em comemoração do centenário de nascimento de Dom Vital Maria Gonçalves de Oliveira, o grande Bispo-mártir pernambucano protagonista da Questão Religiosa que abalou o Império no século XIX (cfr. Legionário n° 645, de 17/12/44).

Falar no Teatro Municipal do Rio era reputado uma coisa muito honrosa. E eu era ainda relativamente moço naquele tempo.

Ficava evidente que o Padre Dainese queria com isto fazer-me uma gentileza, em virtude de todas as lutas de que tínhamos participado [240]. E por detrás da iniciativa estava o Núncio, que, para me afagar um pouco, promoveu esse discurso no Teatro Municipal [241].

Chegando ao Teatro, vi uma mesa de honra colossal posta ali. Sentados, estavam o Padre Riou, o Núncio Apostólico Dom Aloisi Masella, o Padre Dainese e uma série de personalidades políticas e intelectuais, entre as quais o ministro da Agricultura do governo Getúlio Vargas, Dr. Apolônio Sales.

Chamam-me para a mesa, toca uma música, dois outros oradores me precedem, sou o terceiro a fazer o discurso. Nesse discurso eu crivei a facção progressista de indiretas e de farpas de toda ordem.

Olhei para o Núncio, cara impassível. Olhei para o Apolônio Sales, sorrindo. Olhei para o Padre Dainese, impassível.

Fui muito veemente nas minhas palavras e o discurso foi longo. Terminado este, houve uma verdadeira ovação! [242] O Apolônio Sales saiu do seu lugar e veio me abraçar efusivamente [243].

3. Carta Pastoral de Saudação: para Getúlio elogios, para o “Legionário” ordem de se calar

Depois disso, os fatos se sucederam.

Dom Carlos Carmelo veio do Maranhão para o Rio de Janeiro em avião da FAB [244], com todo o apoio de Getúlio Vargas.

E lançou a sua primeira Carta Pastoral antes mesmo de chegar a São Paulo. Em um de seus trechos saudava o Getúlio como o homem da legislação social *.

*  Eram as seguintes as palavras laudatórias ao Presidente da República dessa Carta Pastoral, “dada e passada no Presbitério da Matriz de São João Batista da Lagoa, no Rio de Janeiro”, aos 29 de outubro de 1944, festa de Cristo Rei:

“Ao insigne Presidente da República, Doutor Getúlio Vargas, os Nossos respeitosos cumprimentos, quer na Nossa qualidade de cidadão brasileiro, quer na de Bispo da Igreja de Deus. Não podemos os católicos do Brasil deixar de proclamar, com sincera gratidão, as obras beneméritas de seu Governo, que nos tocam mais de perto: a legislação operária, modelar e cristã” etc. etc. (cfr. Legionário n° 641, 19/11/44).

Publicação pelo "Legionário" de 19 de novembro de 1944 (Nº 641) da Carta Pastoral de Saudação  de Dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta

Ao mesmo tempo em que elogiava Getúlio, essa Carta Pastoral era um tiro contra nós. De princípio a fim, esse documento pode ser qualificado como um libelo contra o Legionário [245].

Eu soube então, com toda a certeza, que Dom Paulo Pedrosa, prior do Mosteiro de São Bento, havia tomado um avião e ido ao Maranhão para indispor ainda mais Dom Carmelo contra nós. E que essa Pastoral tinha sido conseguida por manobra dele, Dom Pedrosa* [246].

* Informação essa que, décadas depois, seria confirmada por Dom Polycarpo Amstalden, O.S.B., diretor da Faculdade de São Bento nos anos 30 e 40. Segundo ele, "Dom Pedrosa, Abade do Mosteiro de São Bento, logo advertiu Dom Motta a respeito do problema 'Plinio Corrêa de Oliveira' e o grupo ligado a seu livro 'Em Defesa da Ação Católica'" (cfr. Frei José Ariovaldo da Silva, O.F.M., O Movimento Litúrgico no Brasil, p. 352).

Em carta ao Sr. Núncio Dom Aloisi Masella, o Cônego Mayer se referia a essa mudança de ânimo de Dom Paulo Pedrosa, que de amigo passou a inimigo acérrimo de Dr. Plinio. Ele se queixava de que Dom Pedrosa “tomou como empreitada levantar escândalos contra nós” (carta de 9/9/44).

Em outra carta ao Núncio, datada de 9 de setembro de 1944, o mesmo Cônego Mayer apontava para uma possível causa dessa rotação: “Desde o rompimento que brutalmente ele teve conosco, na semana de Ação Católica para o Clero em 1943, a aliança de Dom Paulo [Pedrosa] com os RR. PP. Ramón Ortiz e Benedito Calazans é fato público e notório. O Padre Ramón Ortiz fez várias conferências aos jucistas de Dom Paulo Pedrosa, e o P. Benedito Calazans foi constituído por Dom Paulo Assistente Eclesiástico dos jucistas da Escola Politécnica; e se ultimamente deixou esse cargo, foi devido a desejo expresso do Exmo. Monsenhor Vigário Capitular, finalmente alarmado com as reiteradas queixas que contra ele formulavam zelosos vigários da Arquidiocese, e a um sermão escandaloso do seu colega Padre Carlos Ortiz” (doc. cit., de 9/9/44).

O sentido da Carta Pastoral de Dom Carmelo era o seguinte: que os católicos não devem estar divididos. As polêmicas procedem do demônio e são sempre más. A verdade sem a caridade não adianta de nada. E a caridade devia primar por cima da verdade. E por isso ele condenava, censurava, verberava, reprovava, discrepava das polêmicas havidas até então entre católicos [247].

Depois de ter dirigido as mais severas censuras aos causadores de polêmicas [248], dava uma ordem formal: cessar todas essas polêmicas [249], num armistício (a expressão era dele) até que a Comissão Episcopal da Ação Católica julgasse as doutrinas que circulavam sobre essa organização* [250].

* O Legionário n° 641, de 19 de novembro de 1944 publicou na íntegra esta Pastoral de Saudação, cujo tom pode ser medido nos seguintes destaques:

“Os pretextos mais fúteis bem se prestam ao diabólico intento da discórdia. Mesmo entre os católicos de nossa terra se há lançado, por entre o trigal de Cristo, a semente maléfica da cizânia. [...] Os católicos que se deixam fanatizar por disputas e partidarismos doutrinários ou pessoais, cometem contra a vida da Igreja um atentado [...]. Em suas dissidências internas, [...] procure cada um restringir-se aos assuntos de sua competência e do seu dever de estado, sem estorvar as funções e os deveres de outrem. [...] Na hora presente, abstenham-se os católicos de tudo quanto os possa distrair e dividir. [...] Ocupemo-nos e preocupemo-nos com a vida real e objetiva da Fé, ou seja, com sua prática eficiente, mais do que com a vida especulativa da doutrina, isto é, com a teoria pura. [...] Faça-se um armistício total e absoluto nos arraiais contendores! Esta orientação queremos dá-la não em carácter definitivo, mas apenas de emergência, enquanto momentosos assuntos não forem julgados pela Comissão Episcopal da Ação Católica. [...] Seja tida e havida a Ação Católica por instituição oficialmente incorporada ao nosso ministério pastoral” (destaques nossos).

Pouco depois, Dom Carmelo proibiu que na Ação Católica se adotasse o meu livro, ou até se falasse nele. O mesmo nas Congregações Marianas e outras associações religiosas. Exerceu tal pressão, que nem sequer as livrarias católicas ousavam vender a obra, não obstante a aprovação de tantos Bispos e o prefácio que lhe deu o Núncio Dom Aloisi Masella [251].

Dom Carmelo nos pôs, dessa forma, na posição mais humilhante que uma pessoa possa ficar: réus que daqui a pouco iriam ser julgados.

Sem o dizer claramente, o Sr. Arcebispo dava a entender que iria fazer uma verdadeira devassa para, armado de todas as provas contra nós, esmagar aqueles a quem ele estava denunciando [252].

*   *   *

Escrevi então no Legionário o artigo Armistício (fora a palavra utilizada pelo Sr. Arcebispo), comentando a Pastoral de Saudação e dizendo em outras palavras mais ou menos isto: “Como é sábia a Pastoral! Afinal, nos promete uma decisão. Nós não queremos outra coisa senão decisão; nós vamos nos calar porque temos a perspectiva de uma decisão. E essa decisão, nós a acataremos de todo o coração” *.

* O Legionário publicou, no mesmo número, tanto a Pastoral de Dom Carlos Carmelo quanto o artigo Armistício, de Dr. Plinio, este muito respeitoso, cheio de dignidade, mas ao mesmo tempo ousado, pois dizia:

“Promete-nos S. Excia. o julgamento da Comissão Episcopal para os ‘momentosos assuntos’ referentes à A.C. Essa promessa é áurea. Todo ato de magistério da Igreja é uma jóia. E por isto S. Excia. [...] pede um ‘armistício’. Para este ‘armistício’ o Legionário entra, não só a fim de atender ao augusto pedido, mas de ‘grand coeur’ [...] Um distinto sacerdote [...] me aconselhava silêncio a respeito dos assuntos debatidos em matéria de A.C. [...] E eu lhe respondi: a meu ver, paz na estagnação da ambigüidade será para a A.C. uma ruína. Mas a paz à vista de uma solução dos pontos controvertidos é o meu sonho dourado. [...] Que mais pode desejar um espírito sedento de Verdade? O pronunciamento da Comissão Episcopal será um verdadeiro divisor de águas. [...] Na autoridade da Comissão Episcopal [...] esperamos a água viva da Verdade, com a sedenta e abrasada sofreguidão do cervo ‘ad fontes aquarum’” (Armistício, Legionário n° 641, 19/11/44).

Mandei esse artigo ao Arcebispo, acompanhado de uma carta muito respeitosa. Não obtive resposta.

*   *   *

Nos dias seguintes à posse dele, fui visitá-lo. Ele me recebeu amavelmente, fez-me até sentar no sofá ao seu lado.

Logo em seguida, o Cônego Mayer, o Padre Sigaud e eu, como dirigentes do setor de homens da Ação Católica, fizemos uma outra visita a Dom Carlos Carmelo. E ele ainda nos recebeu muito amavelmente.

4. Atitudes hostis e violentas do Arcebispo

Alguns dias depois, o Cônego Mayer organizou uma homenagem da Juventude Feminina Católica ao Sr. Arcebispo. Eram naturalmente algumas centenas de moças de várias cidades, de todas as gamas sociais, e que pertenciam à Ação Católica.

Dom Carlos Carmelo chegou muito mal humorado, nem queria vir, e afinal obteve-se que ele fosse. Fez um discurso que foi um libelo contra o Cônego Mayer, sem mencioná-lo diretamente.

Disse de si mesmo, na ocasião, que ele, Dom Carmelo, era uma pessoa muito reta e detestava os subterfúgios. E que também detestava gente que falasse mal dos outros. E que a doutrina dele era paz, paz, paz. Que ele vinha aqui para pregar o amor.

E acabou dizendo que ele era como uma locomotiva, um comboio que ia pelos trilhos [253]: ia cortando tudo e não admitia réplica de ninguém. E que ele estraçalharia qualquer pessoa que resistisse a ele, tal como uma locomotiva estraçalha os objetos que encontra no caminho [254].

Disse ainda que, quanto a essa mania de falar em Papa, Papa, Papa, que isso também tinha limites. Que, do ponto de vista da hierarquia de Ordem, Bispo e Papa valiam exatamente a mesma coisa; e só do ponto de vista da hierarquia de jurisdição, sim, é que o Papa era o juiz dos Bispos.

Ora, essa era uma afirmação contrária à doutrina católica. O Papa não é mero juiz dos Bispos. O Papa é o Pastor dos Pastores, ele é quem governa os Bispos.

Diante disso, o Cônego Mayer, muito habilmente, fez apenas um discurso de agradecimento. As moças bateram palmas, serviram champanhe e acabou a festa.

*   *   *

Pouco tempo depois, o Padre Sigaud, cuja mãe conhecia muito Dom Carlos Carmelo, foi fazer uma visita a ele no Palácio Pio XII.

Eles se encontraram no momento em que o Padre Sigaud subia uma escada interna do Palácio e Dom Carlos Carmelo descia. E conversaram então no patamar dessa escada.

O Padre Sigaud explicou que era Assistente Geral da JEC, que vinha apresentar as homenagens e que trabalhava junto com o Cônego Mayer.

Dom Carlos Carmelo tratou o Padre Sigaud muito friamente. E a visita deu em nada.

*   *   *

As coisas estavam nesse pé, quando, depois de um retiro do Clero em 1945, Dom Carlos Carmelo chamou o Cônego Mayer e passou-lhe uma repreensão, a mais violenta, a mais apaixonada e a mais injusta que um homem possa passar em outro [255].

Disse que estava muito desgostoso com a Ação Católica; que ele absolutamente não queria saber de a Ação Católica continuar nas mãos do Cônego Mayer; que ele o destituía do cargo de pró-Vigário Geral; que ele cassava todos os seus poderes e que o reduzia a simples vigário; e que, de mais a mais, ele tinha a dizer que, se ele estivesse aqui no momento em que o Cônego Mayer declarou que um Bispo podia errar, ele o teria suspenso de ordens.

Era evidentemente uma jogada bem feita da parte do Cardeal, porque se o Cônego Mayer entabulasse uma discussão, ele diria: “Está vendo? Revoltoso, orgulhoso.”

Como o Cônego Mayer ficou quieto e observou o silêncio mais modelar, ele ainda acrescentou:

— Bem, outra coisa: eu ouvi dizer que esse Imprimatur que figura no livro do Dr. Plinio foi dado sem autorização de Dom José Gaspar. Eu quero as provas de que foi dado com autorização dele.

O Cônego Mayer respondeu:

— Não costuma haver prova nesses casos, porque não há na Cúria documento escrito por onde habitualmente o Arcebispo manda dar “Imprimatur ex comissione”.

Mas tínhamos as provas, pois Dom José Gaspar tinha visto o livro e tínhamos as primeiras páginas do rascunho anotadas pela mão do Arcebispo.

E, pelo que seguiu, o Sr. Arcebispo Dom Carlos Carmelo sabia disso, pois disse:

— Ouvi também dizer que vocês possuem um dos originais do livro de Dr. Plinio tendo nas primeiras páginas marcas do próprio punho de Dom José. Quero ver isto para confrontar a letra”.

O que significava nos chamar de falsários. O Cônego Mayer soube ficar quieto e não disse uma palavra.

No fim, o Arcebispo disse:

— Bem, o senhor tem duas paróquias para escolher: ou vai ser vigário do Ó, ou vai ser vigário do Belenzinho. Escolha.

O Cônego Mayer acabou indo para a paróquia de São José do Belém *.

* Em carta ao Sr. Núncio Dom Aloisi Masella (de 14/1/45), o Cônego Mayer assim narra o episódio:

“Chamado pelo Sr. Arcebispo para um encontro particular, verifiquei desde logo que tinha diante de mim um juiz que me condenava in pectu sem me ouvir, que me chamava para me acusar, me humilhar e me punir, e que parecia disposto a não me dar sequer a oportunidade de expor com calma e filial confiança o que minha consciência me inspirasse em minha defesa. Fiquei reduzido a interpor, durante a conversa, apenas uma ou outra rápida alegação em minha defesa, mas que foram sempre postas em dúvida. [...] Por fim [fui] intimado a redigir um documento, respondendo a duas perguntas que S. Excia. me formulava no momento, documento este que será enviado a V. Excia. pelo Sr. Arcebispo, segundo este me disse. Se, nesse documento eu fizesse alguma acusação ao Sr. Dom José, seria aberto contra mim um processo canônico, disse-me o Sr. Arcebispo. [...] Por fim, S. Excia. me declarou que chamava a si a direção da A.C., o que implicava na minha exoneração. E ordenou-me que aceitasse uma paróquia, oferecendo-me duas para escolher: Freguesia do Ó e S. José do Belém. Disse, então, que estava nas mãos de S. Excia., ao que me replicou que isto não era resposta, pois eu devia escolher positivamente. Respondi que dificuldades oriundas de minha saúde impediam-me de ser tão positivo como S. Excia. desejava, mas S. Excia. ordenou-me que escolhesse, dando-me prazo de alguns dias”.

A nomeação do Cônego Mayer para vigário da paróquia de S. José do Belém deu-se no dia 25 de janeiro de 1945.

*   *   *

O Cônego Mayer falou comigo a respeito do problema do rascunho revisto por Dom José. Eu disse a ele:

— Não mande os originais do livro a Dom Carlos Carmelo. Se ele vier falar de falsificação, eu entesto com ele, porque aí eu faço o contrário: eu digo a ele que me dê ordem por escrito para que eu apresente esses documentos. E quando ele me der essa ordem por escrito, eu apelo para a Santa Sé.

O Cônego Mayer não deu os documentos e ele também não falou mais nisso.

*   *   *

Ainda na anterior conversa, o Arcebispo ameaçou o Cônego Mayer de instaurar contra nós um processo canônico por difamação a Dom José Gaspar, por termos dito que Dom José Gaspar tinha erros de doutrina.

E também levantava a acusação de que o Cônego Mayer havia obtido fraudulentamente a nomeação para Vigário Geral, o que era evidentemente falso.

*   *   *

Dois ou três dias depois, não posso me lembrar bem, saiu um edital da Cúria Metropolitana declarando dissolvidas todas as diretorias e juntas da Ação Católica, e nomeando novas [256].

Desta forma, todos os jovens da Ação Católica com quem cooperei na luta contra o liturgicismo, e eu, estávamos fora das posições de direção.

Além disso, fomos cuidadosamente mantidos à distância de todas as iniciativas católicas importantes: Liga Eleitoral Católica, Universidade Católica etc. Ao pé da letra, estávamos feridos de morte civil em todo esse campo.

Ficamos assim desprovidos dos meios para pôr cobro a um perigo gravíssimo como era o do liturgicismo [257].

Tudo isto somado, constituiu-se em São Paulo um ambiente de tal terrorismo, que praticamente todos os bons se calaram e só os maus tiveram liberdade de se mover.

Este terrorismo chegou a tal ponto que, quando em 1948 o Cônego Mayer foi elevado ao Episcopado pela Santa Sé, um dos Bispos Auxiliares de São Paulo, instrumento dedicado de S. Emcia., proibiu aos antigos companheiros de Ação Católica de irem prestar homenagem ao novo Bispo, sob pretexto de que isto seria "injurioso" ao Sr. Cardeal [258].

*   *   *

Quando Dom Carmelo foi eleito cardeal (em 1944 ele tinha sido eleito Arcebispo de São Paulo, e sua elevação ao cardinalato deu-se em 1946), eu estava em Santos e me lembro que fiquei muito na dúvida sobre o que deveria fazer. Porque era tal o prestígio de um cardeal naquele tempo que, sendo ainda diretor do Legionário, ficaria mal eu não ir homenageá-lo no seu embarque [259].

Então, escrevi-lhe uma carta felicitando-o e justificando o meu não comparecimento à estação para apresentar as minhas despedidas [260].

5. Sucessão de catástrofes

Debaixo do peso desses acontecimentos, e empurrados compulsoriamente para fora da Ação Católica, portanto no cúmulo do desprestígio, fomos substituídos pelos inovadores que, em sua maior parte, haviam sido afastados da Ação Católica por seus desvios. E assim voltaram para os cargos que ocupavam antes. Os padres e leigos que assumiram eram todos da linha nova.

Tudo isto coincidiu com uma série de acontecimentos muito tristes para nós.

*   *   *

Deixou-nos Dom Aloisi Masella, que permanecera 19 anos no Brasil sem conseguir sua elevação ao cardinalato. De repente, as coisas desencalharam misteriosamente. Ele recebeu o chapéu cardinalício e foi-se embora *.

* Ele viajou no navio Duque de Caxias, cedido pela Marinha brasileira, junto com os Arcebispos do Rio e de São Paulo, na data de 22 de janeiro de 1946. Os três foram elevados simultaneamente por Pio XII ao cardinalato, no consistório de 18 de fevereiro de 1946. Em lugar de Dom Masella, assumiu o Núncio Dom Carlo Chiarlo (1881-1964), o qual permaneceu no Brasil de 1946 a 1954, sendo elevado por João XXIII, em 1958, ao cardinalato.

*   *   *

Muito triste também foi a morte de José Gustavo de Souza Queiroz, um dos membros do grupo do Legionário, que tendo recaído na sua doença, após um ano veio a falecer *.

* Seu falecimento se deu no dia 8 de março de 1946, à idade de 31 anos, devido à tuberculose que o acometeu. Ele havia ingressado muito cedo na Congregação Mariana de Santa Cecília, onde estreitou relações com o grupo do Legionário. Filho das mais antigas e ilustres famílias paulistas, era de um trato aristocrático e gentil para todos, sem se vulgarizar jamais, e fez amigos sinceros e devotados em todas as classes sociais. Era também de uma pureza exemplar, e um verdadeiro católico de mentalidade ultramontana na força do termo (cfr. Legionário n° 710, de 17/3/46).

[N. do Site]: José Gustavo de Souza Queiroz deixara  quase concluída a tradução das famosas Cartas sobre a Inquisição espanhola, de Joseph de Maistre. Mãos amigas terminaram o pouco que faltava da tradução, e esta foi editada pelas “Leituras Católicas de Dom Bosco”, nº 712, de setembro de 1949, com uma nota biográfica de 26 páginas sobre o tradutor, escrita por Plinio Corrêa de Oliveira. 

*   *   *

Logo em seguida, veio a notícia de que o Padre Sigaud seria transferido para a Espanha.

O Padre Sigaud, antes de embarcar, ainda nos prestou um grande serviço.

Estava chegando da Europa Dom Jaime de Barros Câmara, que também tinha ido receber o chapéu de Cardeal juntamente com Dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta, na mesma ocasião em que o recebera o Núncio Dom Aloisi Masella.

Faltando algumas horas para partir, Padre Sigaud foi a uma sessão onde Dom Jaime Câmara iria promulgar os novos estatutos da Ação Católica.

Nessa sessão, o Padre Sigaud ouviu coisas que mostravam o lado escorregadio desses estatutos. E repassou-nos essas informações, que nos foram de muita utilidade mais tarde, quando se tentou aplicar aqui no Brasil esses estatutos, fazendo tabula rasa da encíclica Bis Saeculari Die, de 27 de setembro de 1948.

Durante essa sessão, quando o Padre Sigaud passou diante de Dom Jaime, este perguntou:

— O senhor, quem é?

Era uma pergunta surpreendente, pois Padre Sigaud era um sacerdote já ilustre e muito conhecido.

— Senhor Cardeal, eu sou Geraldo de Proença Sigaud, padre do Verbo Divino, e agora vou como missionário para a Espanha.

O Cardeal olhou para ele e disse:

— Me parece que alguma vez já ouvi o seu nome.

Pois não — respondeu Padre Sigaud.

Nas vésperas da partida do Padre Sigaud, lembro-me de que fizemos uma despedidazinha, nos crepes do luto mais profundo. Acompanhei-o até o Rio de Janeiro [261].

Recordo-me até do lugar onde me despedi dele com uma tristeza enorme: foi num ponto de ônibus Rio-Juiz de Fora, perto da igreja de São Francisco de Paula, no largo do mesmo nome. O navio que devia levá-lo à Europa sofrera um atraso e ele aproveitou esses dois ou três dias de delonga para visitar um amigo em Juiz de Fora.

Eu não poderia ficar no Rio esse tempo todo. Então o abracei e, no momento em que eu voltava, pensei: “Um capítulo em minha vida que está encerrado é o Padre Sigaud. Ele agora vai para a Europa e está acabado”.

6. Risco de processo canônico: crise na Igreja vista com maior clareza

Como já disse atrás, o Cardeal Dom Carlos Carmelo nos havia ameaçado com um processo canônico.

Levado pelo receio de que essa ameaça se concretizasse a qualquer momento, como eu tinha direito a uma licença-prêmio no Colégio Estadual, requeri essa licença e passei seis meses lendo as coleções da revista Ordem, do Diário de Belo Horizonte, do Correio Católico de Uberaba e de outras publicações da corrente progressista*, para extrair delas proposições que pudessem me servir de defesa, pois continham muitos erros.

* Serviam também à corrente inovadora revistas como Palavra, de Belém do Pará; Idade Nova, de Porto Alegre; Lampadário, de Juiz de Fora; Presença, de Salvador e outras mais.

Mas, dada a linguagem viscosa que essa corrente costumava adotar, naturalmente muitas dessas proposições eram duvidosas, e eu precisava mostrá-las a censores eclesiásticos.

O Padre Sigaud, antes de sua partida para a Espanha, tendo de vir muitas vezes ao centro de São Paulo fazer compras para a sua viagem, ia almoçar em casa. E eu mostrava a ele aquela pilha de documentos. Ele começou a ler aquele material e a detectar algumas coisas erradas. Certo dia me disse:

— Plinio, não estou satisfeito com este serviço. Não se trata de pegar um errinho aqui ou outro ali. É preciso aprofundar o estudo desses erros e verificar qual é a doutrina oculta dessa gente. Detectada essa doutrina, nós saberemos bem exatamente que heresia está caminhando aí.

Ora, o livro Em Defesa da Ação Católica desenvolvera bem a doutrina errônea em matéria de Ação Católica, mas não focalizara a doutrina errada do liturgicismo. Apontava apenas algumas proposições erradas nessa matéria.

O Padre Sigaud foi então farejando essas publicações e encontrou os primeiros dados para explicar essa questão.

O assunto interessou muito ao Cônego Mayer, a Dr. Pacheco, a mim, e pedimos ao Dr. Pacheco para preparar um estudo com base nos dois autores liturgicistas mais citados pelos inovadores: Dom Anselm Stolz, OSB, e o Padre Romano Guardini [262].

Lendo esses autores, foi possível a Dr. Pacheco delinear perfeitamente toda a doutrina liturgicista.

O Dr. Pacheco estava preparando também, nesse tempo, um livro refutando as teses de Maritain. E o trabalho sobre Maritain serviu para auxiliar o trabalho sobre Romano Guardini.

Com base nesses estudos, nós teríamos o que dizer para nos defender em um eventual processo canônico.

De outro lado, começamos a perceber, mais claramente do que nunca, todo o vulto da trama herética que combatíamos, e que agia dentro da Igreja para introduzir uma religião falsa no âmago da religião verdadeira.

Naturalmente isto nos confortava e dava-nos redobrado ânimo para a resistência [263].

7. Principais focos de oposição ao livro

Os principais opositores do meu livro eram Dom Carlos Carmelo, Arcebispo de São Paulo, Dom Antonio Cabral, Arcebispo de Belo Horizonte [264].

Constou-me que Dom Cabral tinha inclusive mandado queimar o Em Defesa numa reunião da Ação Católica* [265].

* O grau de exacerbação de Dom Cabral em relação ao livro pode ser medido pelo cartão manuscrito, sem data definida, que ele escreveu a Dr. Plinio: “... ‘Em Defesa da Ação Católica’ que melhor deveria chamar-se — Ataque disfarçado à Ação Católica...”

Cabe acrescentar que também em Porto Alegre, Arquidiocese que tinha à frente o Arcebispo e depois Cardeal Dom Vicente Scherer, havia uma campanha cerrada contra o livro, segundo informou o Padre Dainese em carta de 4 de junho de 1944: “Começou-se naquele Estado uma campanha em grande estilo contra nossas idéias, contra seu livro e contra o que chamam o grupo ‘intransigente’ e ‘fanático’. O movimento está muito bem articulado (por quem?...)”.

8. Reunião da Comissão Episcopal da Ação Católica: carta de pedido de julgamento, silêncio como resposta

Nesse ínterim, pelos jornais chega ao meu conhecimento uma reunião da Comissão Episcopal da Ação Católica*.

* Ela se realizou no Palácio Arquiepiscopal de São Joaquim, no Rio de Janeiro, no dia 23 de setembro de 1945, tendo como presidente Dom Jaime de Barros Câmara, e como participantes os Arcebispos e Bispos brasileiros empenhados na mobilização da Ação Católica. E nela se debateu a reforma dos estatutos dessa organização (cfr. Legionário n° 686, de 30/9/45).

Era este o evento que o Sr. Arcebispo de São Paulo anunciara, um ano antes, que iria levantar os assuntos controvertidos referentes à Ação Católica. Parecia-me fora de dúvida que o meu livro seria objeto do pronunciamento da Comissão.

Resolvi então mandar uma carta a Dom Carlos Carmelo.

Eu dizia a ele que havia escrito o meu livro fundando-o todo em textos do magistério infalível e documentos pontifícios. E que estava disposto a derramar até o meu sangue, se preciso fosse, para defender aquelas verdades.

Mas, se estivesse errado na interpretação do pensamento do Romano Pontífice, eu estaria igualmente disposto a aceitar por falso e pernicioso tudo o que, a meu juízo privado e falível, parecesse verdadeiro e bom. E que, com a graça de Deus, eu me retrataria publicamente e sem reservas, praticando esse ato de humildade com a ufania com que os filhos do mundo recebem as glórias da terra.

Eu acrescentava estar no firme propósito de prestar ao Sr. Arcebispo toda a obediência que a S. Excia. eu devia por divina instituição e pelas leis eclesiásticas, muito exatamente na medida e extensão em que a Santa Igreja preceituava tal obediência. Sentimentos esses, dizia eu na carta, que se estendiam à Veneranda Comissão Episcopal que iria se reunir [266].

A mensagem, entregue em mãos na Cúria, levava junto um termo de solidariedade dos demais redatores do Legionário para com essa tomada de posição*.

* A carta era datada de 22/9/45, portanto de um dia antes da reunião da Comissão Episcopal da Ação Católica.

Não obtivemos nenhuma resposta. E os assuntos não foram julgados. Não soubemos o porquê de tal silêncio [267].

Fui depois informado de que a Comissão Episcopal havia resolvido nomear uma subcomissão de sacerdotes, para elaborar uma relação de livros “recomendados” sobre a Ação Católica. Dessa lista o meu livro seria excluído. E seria esta a “resposta” ao meu livro [268].

9. Nova carta ao Episcopado, novo pedido para ser julgado: melodrama de Dom Cabral e pedra sobre o assunto

Meses mais tarde, os jornais começaram a noticiar uma reunião do Episcopado brasileiro no Rio de Janeiro [269], com o objetivo de cuidar do assunto Ação Católica.

Dom José Maurício da Rocha, primeiro de bispo de Bragança Paulista

Não tive dúvida: escrevi uma carta a Dom José Maurício da Rocha, Bispo de Bragança Paulista, pedindo-lhe que lesse, no plenário da reunião dos Bispos, uma carta minha ao Episcopado nacional, e encarreguei Dr. Paulo Barros de a levar àquela cidade.

Dom José Maurício era muito amigo meu, desde o tempo do apogeu do Movimento Católico. E no meio daquela degringolada toda, sempre continuei a ter boas relações com ele [270].

Homem rígido, decidido, de estatura alta, cabelos brancos, sempre de solidéu [271], era um alagoano muito tradicional e mantinha toda a pompa episcopal em sua Diocese [272]. Usava um anel com um dos mais bonitos rubis que eu tenha visto em minha vida. Ele apresentava esse anel para o ósculo, quando íamos falar com ele [273].

*   *   *

Meu apelo se explicava. O meu livro não tinha sido ainda aprovado pela Santa Sé e eu receava muito que os nossos adversários quisessem indiretamente desautorá-lo nessa reunião do Episcopado*.

* Este receio teve posterior confirmação numa carta do padre jesuíta João de Castro e Costa, antigo professor de Dr. Plinio no Colégio São Luís. Escrita de Roma, onde desempenhava funções no Colégio Pio Brasileiro, aquele sacerdote dizia a Dr. Plinio:

“Achei que devia dar conhecimento do seu livro às autoridades superiores, e levei à Sec. de Estado a Monsenhor Lombardi, meu grande amigo, bem informado das cousas do Brasil e já conhecedor da celeuma aí levantada. Dias depois, uns quinze, chamou-me e perguntou-me o meu parecer, dizendo que o livro tinha sido examinado, creio que por outros 2 monsenhores. [...] Vieram os dois exemplares, o pergaminho e a carta [material enviado por Dr. Plinio para ser oferecido ao Papa e à Secretaria de Estado]. Voltei a Monsenhor Lombardi que se encarregou de entregar tudo, como de fato o fez. Mais tarde chamou-me para dizer que lhe escrevesse [a Dr. Plinio], consolando e animando. Pedi que fosse alguma coisa de oficial. Não o quis fazer, pois uma carta da Sec. de Estado iria melindrar a muita gente, principalmente aos Srs. Bispos. Pouco depois recebi uma carta alarmante de Monsenhor Librelotto [capelão chefe da FAB na II Guerra] avisando-me que corriam vozes que o livro seria condenado pela Comissão Nacional [Episcopal brasileira]. Voltei à carga e Mons L. [Lombardi] respondeu-me: seria um absurdo: o livro é ortodoxo, e além disso traz aprovação do representante do Papa. Insisti de novo para que a Sec. mandasse, não digo uma aprovação, mas uma palavra de animação. Desta palavra está encarregado V. R., respondeu-me” (carta do Padre João de Castro e Costa a Dr. Plinio, de 7/9/46).

*   *   *

Manuscrito da Carta ao Episcopado

Na véspera da reunião do Episcopado, uma vez tudo combinado com Dom José Maurício, pedi a Dr. Paulo Barros de Ulhôa Cintra ir ao Rio e organizar a distribuição da carta-circular (datada de 31 de maio de 1946) a todos os Bispos presentes na cidade.

Dr. Paulo fez maravilhas: ele conseguiu no palácio do Cardeal os endereços dos Bispos, tomou automóvel, distribuiu para todos e ainda conversou com vários deles.

*   *   *

Minha carta era muito respeitosa. E também um desafio do outro mundo! [274] Ela ia acompanhada de página separada com uma lista das teses que meu livro levantava.

Eu relembrava nessa carta que o livro havia despertado reações as mais diversas, desde cartas de aprovação de numerosos Bispos e sacerdotes do Clero secular e regular. Que Dom Carlos Carmelo havia pedido para cessar as discussões e polêmicas, o que para o Legionário foi tomado como uma ordem, abstendo-nos de qualquer referência aos assuntos que antes tanto nos empolgavam. Que nossos contendores, pelo contrário, protegidos por nosso silêncio forçado, sustentavam livremente as suas teses em seus órgãos de imprensa, com referências muitas vezes amargas às nossas posições.

E que agora reafirmávamos a todo o Episcopado nacional o pedido anteriormente feito a Dom Carmelo: se qualquer das proposições contidas em meu livro estivesse contra a doutrina católica, eu estaria na inteira disposição de aceitar com docilidade as correções que a doutrina infalível da Igreja de Deus determinasse, pois a receberia com toda aquela medida de submissão que o Direito Canônico estabelece.

Terminava dizendo nessa carta que apenas uma coisa eu desejava, e esta eu pedia pelo sangue infinitamente precioso de Nosso Senhor Jesus Cristo: que o quanto antes se fizesse luz, se condenasse a treva, se dissipasse a confusão, se estraçalhasse o erro, ainda que pela humana fragilidade a treva, a confusão, o erro só de mim procedessem [275].

*   *   *

Além dessa carta-circular ao Episcopado, juntei uma carta especial aos Bispos amigos que haviam elogiado o Em Defesa, na qual lançava mais um apelo: se houvesse qualquer dúvida, o que mais simples do que suplicar a Roma que decidisse a questão? Eu mesmo me associaria de bom grado aos que pedissem tal pronunciamento. Pois, se eu estivesse certo, só teria a lucrar. Se estivesse errado, o que poderia querer de melhor do que ser corrigido de meu erro?

Era justamente o que os opositores de meu livro não haviam querido fazer. Em vão eu lhes pedia apresentarem concretamente a tese, a página, o texto em que errei. Em geral preferiram ficar no terreno das afirmações imprecisas, que não se prestavam a qualquer troca de idéias [276].

*   *   *

Chega então o dia da reunião do Episcopado.

Dom José Maurício da Rocha - um homem que falava alto, com voz nordestina, peito cheio, expressão fácil e ar sobranceiro - se levanta e diz:

“Meus caros irmãos do Episcopado, eu lhes trago uma boa notícia. Tenho aqui esta carta. É um ato de submissão completa do Professor Plinio Corrêa de Oliveira. Ele não pede senão para ser julgado. Julguemo-lo”.

O próprio Dom José Maurício foi quem me contou o fato [277].

Dom Jaime ficou lívido [278]. Dom Carmelo, rubro, entretanto não disse uma só palavra [279]. Mas fez uma cara iracunda e furiosa.

O Arcebispo de Belo Horizonte, muito mais hábil, começou a chorar.

Perguntaram a ele:

— Por que V. Excia. está chorando?

— Porque quem vai ser julgado sou eu.

— Mas como é que V. Excia. vai ser julgado?

— V. Excias. não percebem? [280] O Dr. Plinio, com essa carta, inverteu a situação. Ele estava no banco dos réus e nós éramos os juízes. Agora [281], o julgado serei eu, porque eu condenei esse livro. E julgar-me a mim, um Arcebispo de trinta anos de serviço, é um insulto que minha velhice recebe.

Dom Manuel da Silveira d'Elboux

Equivalia a dizer: como fui eu, Dom Cabral, que condenei, aquele que foi objeto de minha condenação não tem direito à justiça. Razão? Porque sou um velho Arcebispo de trinta anos de serviço... Onde estava a noção de justiça nesse raciocínio? [282]

O Sr. Bispo de Ribeirão Preto (Dom Manuel da Silveira d'Elboux) fez ainda na reunião uma apologia da oportunidade de meu livro.

Não chegou contudo a haver votação. Dom Cabral fez questão fechada de que minha circular não fosse respondida. E o Sr. Cardeal Dom Jaime de Barros Câmara, que presidia à sessão, nem pôs o assunto em votação. Deu-o por liquidado ex auctoritate propria.

E a minha carta-circular ficou sem resposta [283].

*   *   *

Eu recebi depois carta de vários Bispos, felicitando-me por minha atitude e dizendo que eram solidários comigo. Um deles foi o Sr. Bispo da Barra (Bahia), Dom João Batista Muniz [284], que me felicitou pela “atitude edificante” [285]. Eu não publiquei nada [286].

O fato resultante é que prevaleceu a decisão de não julgarem nada *.

* Pouco antes de Dom Masella partir de volta para Roma, onde receberia o capelo cardinalício, Dr. Plinio escreveu-lhe uma carta em que dizia:

“Vossa Eminência sabe o que penso sobre a gravidade do risco a que esses problemas expõem a Igreja, no Brasil. Não vejo no “liturgicismo” e nos excessos da A.C. apenas exorbitâncias de certos grupinhos de leigos de cabeça quente. O mal deitou raízes mais fundas, e põe em risco a fidelidade do próprio Brasil à Igreja de Roma.

Enquanto tive liberdade de ação, lutei contra esses erros com todas as forças. Há mais de um ano, porém, a Pastoral escrita ainda no Maranhão pelo Exmo. Revmo. Sr. Arcebispo me impôs silêncio. E Vossa Eminência tem visto no ‘Legionário’ até que extremos levei minha obediência a esta ordem. [...]

O que é certo é que ninguém pode negar que existem os erros que mencionei. Meu livro é bem anterior à Encíclica Mystici Corporis Christi, e entretanto já impugnava os mesmos erros contra os quais agiu a paternal solicitude do Sumo Pontífice. Como explicar essa atitude ‘profética’ que tomei? Adivinhei os erros?

“O único ponto que pode ser posto em dúvida é se a doutrina que sustentei sobre a A.C. é certa ou errada. Se for certa, diga-se isto para defesa da verdade, preservação das almas e exaltação da Igreja. Se for errada, declare-se isto do mesmo modo. O que não posso compreender é o silêncio. O silêncio, em que os fautores do erro tanto se obstinam, e com o qual só eles podem lucrar.

Já fiz a outros este oferecimento, e o deixo agora em mãos de Vossa Eminência: consta-me que certos membros de nosso Venerando Episcopado acham que caí em erro em meu livro. [...] Denunciem, pois, meu trabalho ao Sumo Pontífice. Eu mesmo escreverei uma carta, que acompanhará a denúncia, em que me comprometo a retratar quanto escrevi, a destruir os exemplares restantes da edição, e a fazer a penitência pública que a justiça do Santo Padre mandar, na hipótese de que eu tenha realmente errado” (carta a Dom Bento Aloisi Masella, de 1°/1/46).

Mas, então, do que adiantaram essas cartas? — Muito.

Eu fiquei de posse da minha carta ao Episcopado. E tenho a carta de vários Bispos dizendo-me que estavam inteiramente solidários comigo.

Portanto, fiquei com a prova de que pedi o julgamento e de que o julgamento não me foi dado. E o medo deles de me julgar trazia a certeza de que eu estava certo.

É uma parte da história que não foi publicada, mas a documentação eu a tenho. E para a História, isto fica [287].

10. No isolamento e no ostracismo

A cascata de catástrofes que se abatem sobre Plinio Corrêa de Oliveira e os poucos que o seguem os relegam a completo isolamento por vários anos

A par de tudo isso, eu ia claramente notando um desânimo cada vez maior em todos os nossos aliados, não os do nosso grupo. Isto queria dizer em outros termos que a corrente ultramontana, que havíamos formado com "sangue, suor e lágrimas" [288], se estava esfacelando. Cada dia eu sentia o isolamento e a indiferença em torno de nós *.

* Em carta ao seu antigo professor no Colégio São Luís, Padre Castro e Costa, Dr. Plinio se abria sobre a situação em que se encontrava:

"Minha situação pessoal é a mais dolorosa possível. Os Srs. Bispos das sedes mais importantes me hostilizam sem rebuços. No Rio, em Belo Horizonte e particularmente em São Paulo estou oficialmente colocado na categoria de lobo com pele de ovelha, que convém manter afastado do rebanho. Meu nome é cancelado de todos os Congressos, de todas as reuniões e dos postos de atividade, por mais apagados que sejam. Sou ainda Diretor do Legionário, órgão cuja existência a Autoridade finge não perceber [...]. Todos esses fatos repercutem intensamente nos meios católicos, onde passei a ser mal visto por muitos daqueles que outrora me estimavam. Nos meios sociais em geral, percebe-se este ostracismo, sem que se lhe conheçam as verdadeiras causas: fico, pois, exposto a suspeitas que podem atingir até a minha própria honorabilidade pessoal (Carta ao Padre João de Castro e Costa, de 10 de outubro de 1946).

Antigamente, quando o funcionário do Legionário ia ao correio abrir a caixa postal, trazia as mãos cheias de cartas. Mas nesse período, houve dia em que chegavam uma ou duas. E numa certa semana não chegou nenhuma. Foi fato virgem na vida do jornal.

Para mim, nada era mais lamentável, mas nada também mais explicável. O adversário progressista estava senhor de todas as posições [289].

Nada faltava a ele: influência, postos-chave, revistas, jornais, bafejo oficial, grandes tipografias. Nenhuma vitória poderia ser mais clara, mais total, mais absoluta e ter ares de mais durável.

Também nenhuma derrota poderia ser mais completa, mais fragorosa, mais pública do que a nossa. Ela se cercava de todos os estigmas das penas infamantes, e nada fazia prognosticar que elas iriam cessar.

*   *   *

Enquanto isto se dava, o Arcebispo de Belo Horizonte realizava congressos da Ação Católica, rodeado de vinte a trinta Arcebispos e Bispos. E era prestigiado pelo comparecimento do Sr. Cardeal de São Paulo, por delegações de leigos do Brasil inteiro que iam lá aprender as doutrinas novas, para depois as disseminar por todo o País.

O Alceu Amoroso Lima tinha liberdade de vir falar em São Paulo contra nós, com o prestígio do bafejo oficial de Dom Motta. Nós continuávamos no pelourinho [290], reduzidos ao silêncio [291]. E a isto o Sr. Cardeal chamava de "armistício".

Nossos amigos de outrora eram empurrados a um canto, ou se recolhiam espontaneamente ao canto. As fileiras dos que lutavam pela ortodoxia foram desbaratadas pela única força capaz de as desbaratar: a obediência [292].

Era o caso de dizer como Corneille no Cid: [293] "et le combat cessa faute de combattants" - A batalha cessou por falta de combatentes [294].

*   *   *

O que mais me fazia sofrer, entretanto, não era isto, mas o fato de que o "delendus Plinius" não era a simples satisfação de uma animosidade pessoal, mas o meio julgado indispensável para derrubar um dos empecilhos que obstavam a uma cabal modificação da mentalidade religiosa no Brasil.

Era para lá que íamos caminhando com passo seguro. Muita gente via o perigo e gemia. Ninguém, ou quase ninguém estava disposto a agir. As posições-chave estavam quase todas em mãos dos "outros". Desarticulados, desanimados, inativos, os partidários da ortodoxia, ou procuravam não ver toda a extensão do problema, ou, se não conseguiam não vê-la, choravam em segredo *.

* Nesta batalha, dizia Dr. Plinio em carta ao Padre João de Castro e Costa datada de 16 de outubro de 1947, “empenhei tudo: nome, posição, tempo, energias, amizades. [...] Não lutei por interesses pessoais, nem me deixei arrastar pelo desejo de exercer cargos, desfrutar influências, fazer carreira. Se estes fossem meus intuitos, eu teria tomado o lado oposto. Dom Cabral e Dom Carmelo têm feito pelo Alceu e pelos leigos que o seguem, o que por mim não fez nenhum dos Bispos que me aplaudem e aprovam. É esta a realidade evidente. Se eu me deixasse arrastar pelo desejo de nome e prestígio, bastaria que hoje mesmo eu me resolvesse a tomar outra orientação doutrinária, para ser acolhido por meus detratores de braços abertos.

11. O jogo dos “moderados” no Brasil e dentro do próprio Vaticano

Para completar esse quadro de desolação, havia quem procurasse apresentar os liturgicistas como pessoas que erraram, é verdade, mas que estavam sendo intempestivamente agredidas por nós. Estariam elas sendo humilhadas, perseguidas, espezinhadas, enquanto nós triunfávamos orgulhosamente [295].

Enviavam assim do Brasil informações falsas ou semifalsas. E em Roma tinham correspondentes que acolhiam e encaminhavam essas informações, e que na proximidade do Santo Padre escolhiam o momento oportuno para apresentá-las.

Procuravam estes semear a impressão de que, da parte dos liturgicistas, os desvios eram uma inclinação fútil, passageira, sem solidez nem raiz, de certos setores da opinião católica.

Essa impressão falsa procurava inspirar uma tática também errada.

Com efeito, em se tratando de um movimento superficial de mocinhos e mocinhas em efervescência, a contemporização poderia parecer a melhor política.

E isso alimentava a idéia de que os partidários mais ardentes do liturgicismo não tinham verdadeira convicção dele, mas simplesmente eram levados por uma certa simpatia alimentada quiçá por circunstâncias inteiramente pessoais, como amizade, relações etc.

Assim, as polêmicas suscitadas aqui pelos adversários do liturgicismo teriam chocado a alma sensível dos corifeus liturgicistas que, por isto e só por isto, se aferraram ainda mais em suas opiniões.

Portanto, todas as polêmicas havidas aqui teriam sido nocivas, e melhor teria sido que jamais elas tivessem ocorrido. De onde os elementos mais obedientes à Santa Sé, mais zelosos da doutrina, mais eficazes em limitar a extensão do erro ficavam parecendo pessoas imprudentes, aos quais não se deveria dar nem prestígio nem cargos, sob pena de comprometer a solução do problema.

Esses elementos deveriam, pois, ficar inteiramente privados da confiança da Santa Sé, e sem meios para empenhar combate salutar contra o erro.

Para quem deveria convergir tal confiança e tais cargos? Forçosamente para os “moderados”, isto é, na maior parte das vezes para pessoas que se mantiveram arredias à luta por motivos bem diversos da verdadeira prudência. Ou seja, porque não tiveram senso católico suficiente para perceber o erro, para o repudiar, e a abnegação para arrostar os terríveis embaraços daí provenientes.

Neste panorama falso, não seria difícil apresentar os fatos de tal maneira que os erros imputados aos liturgicistas não fossem vistos como suficientemente graves, nem suficientemente generalizados para justificar que contra eles se escrevesse todo um livro como o Em Defesa da Ação Católica, nem se movesse uma campanha de jornal como a do Legionário.

Inércia diante do liturgicismo, eis a verdadeira estratégia. Contemporização e indulgência para com os os liturgicistas, eis a solução [296].

Na ordem prática, tiravam então uma conseqüência curiosa: a se proceder com “justiça” e “prudência”, seria preciso punir por sua empáfia os partidários da boa doutrina, e consolar por seus dissabores os propagandistas da doutrina errada.

De um ou de outro modo, alguns informantes do Vaticano participavam desse estado de espírito *. E assim não era de espantar que, estando longe do cenário brasileiro, até pessoas amigas pudessem ter dado um tal ou qual crédito a esta opinião [297].

*  Notava-se realmente àquela época, dentro do próprio Vaticano, um jogo de forças antagônicas representadas por expoentes que atuavam pró ou contra a nova corrente. Os primeiros tinham tendências modernistas, e os segundos eram herdeiros da oposição férrea de São Pio X contra aquela corrente. Este jogo de forças, cheio de vaivens e de sutilezas, ainda era desconhecido do grande público, mas infelizmente se refletia na posição o mais das vezes vacilante da Santa Sé em face do progressismo que nascia.

Dr. Plinio chegou mesmo a apelar aos préstimos do Padre Louis Riou, que nessa época encontrava-se em Roma, pedindo-lhe em carta para tentar desfazer essa falsa impressão. Dizia Dr. Plinio: “Julgo que seria importante dissipar alguns mal-entendidos que percebo perfeitamente estarem dominando em Roma, vindos de informantes muito astuciosos ou muito ingênuos do Brasil, e entretidos aí por outros elementos não menos astuciosos ou não menos ingênuos”. Esses informantes passam a imagem de que “os liturgicistas são cândidos anjinhos que se aferram a seus erros porque eles foram algum tanto ‘malmenés’, mas que se corrigirão infalivelmente se a Santa Sé se abstiver de os condenar” (v. carta ao Padre Louis Riou, de 16/6/47).

O perigo dessas informações tendenciosas estava em que elas eram feitas para induzir Roma a contemporizar, a não agir claramente contra o liturgicismo, receando os efeitos de qualquer luta movida no Brasil. E a focalizar a crise, não como a luta de duas tendências opostas — a da verdade e a do erro — mas de três: a dos que erraram num excesso, a dos que erraram noutro excesso, e a dos “sensatos” e “moderados” que constituiriam um centro “prudente” e “zeloso”, cheio de tato, e poderia levar tudo a bom termo.

O que os propugnadores dessa posição não pareciam admitir era que os liturgicistas constituíam, conscientemente ou não, uma verdadeira organização que espalhava as informações que lhe convinham, difamava os personagens que a hostilizavam, estabelecia o silêncio em torno dos outros, e desenvolvia um plano metódico e admiravelmente articulado para ir conquistando uma a uma todas as posições-chave da vida religiosa do Brasil.

Nessa focalização, ficava inteiramente impossível admitir aquilo que sabíamos de sobra, isto é, que os liturgicistas dispunham de elementos totalmente dedicados à sua causa, os quais faziam o papel de “moderados” apenas para galgar cargos e depois cobrir com sua proteção “insuspeita” os elementos mais ardidos* .

* Dr. Plinio externou em carta a Dom Sigaud esta sua preocupação: "Nossos adversários perceberam isto com uma sagacidade infernal. Por isto, enquanto timbram em manter o Cônego Mayer e a todos nós num ostracismo absoluto, inauguram uma política de pseudo-conciliação, capaz de dar a nossos amigos a ilusão de que a situação vai se consertando por si mesma".

Nessa mesma carta, Dr. Plinio se refere a esse estado de espírito presente numa Semana de Ação Católica realizada em Campinas entre os dias 20 e 27 de outubro de 1947 (v. Legionário n° 781, 27/7/47): “O Cônego ["X"] nos contou que todos os discursos eram num sentido ‘moderado’ do ponto de vista da doutrina. Falavam veementemente do Rosário, dos Exercícios etc. iludindo os ingênuos [...] Eles estão reconquistando lentamente a atmosfera de falsa tranqüilidade [...]. Na aparência, tudo ortodoxo. Os bons se iludem e aceitam incautos o veneno destilado nos conciliábulos, círculos de estudo etc.”. E isto a tal ponto que “o Cardeal Caggiano [Bispo de Rosário, Argentina, presente ao evento, mais tarde Cardeal Arcebispo de Buenos Aires] declarou que leu meu livro, e que, sem se pronunciar sobre a doutrina, disse que não se resolvia a crer que tais erros tivessem existido jamais: típico da nova tática. [...] Tudo se passa, pois, como se nunca tivesse havido um Cônego Mayer, um Padre Sigaud, um Plinio, um ‘Legionário, um livro ‘Em Defesa da Ação Católica no Brasil’" (Carta a Dom Sigaud, 8/8/47).

Este ponto era muito importante para eles, porque, na invariável escolha dos “moderados”, entrariam muitos partidários ocultos da causa liturgicista. E os que ignorassem esse jogo, seriam levados a confiar sem restrição em todo e qualquer elemento “moderado” que aparecesse, o qual seria a priori considerado como “neutro”, “sereno” e “insuspeito”.

Ficaria assim impossível impedir a infiltração do que se poderia chamar de criptoliturgicismo em nosso meio. E o acesso desse criptoliturgicismo às mais altas situações se tornaria inevitável.

Isto também induziria Roma a adotar a política de não agir, não deixar agir, e assim dar inconscientemente aos liturgicistas a liberdade de movimento e as posições-chave que tanto almejavam [298].

*   *   *

Acontece que, aceito como verdadeiro o fato de que as vítimas eram da esquerda e os agressores da direita, daí se seguiria fatalmente uma “terapêutica” para o “caso brasileiro” sumamente perigosa. Com efeito, se a uns era preciso abater, ou ao menos deixar rolar indefinidamente sob os pés dos “esquerdistas”, e a outros era preciso consolar, confortar e acariciar, nunca chegaríamos ao dia em que o erro tivesse suas asas e suas garras cortadas. E em boa parte era o que estava acontecendo no Brasil *.

* Em carta posterior, dirigida ao professor da Gregoriana e assessor de Pio XII, o padre jesuíta Robert Leiber, cuja minuta Dr. Plinio ajudou a redigir, Dom Mayer expressava esta preocupação: “Padre Leiber é mestre em História: lembre-se da aceitação cortês mas exterior dos jansenistas diante dos documentos pontifícios, e entenderá o que se está passando no Brasil. [...] Nosso povo não compreende bem documentos doutrinários, e pois olha como autorizada e aprovada por Roma a orientação dos que se encontram nos maiores cargos, nas posições de maior confiança. E pesa muito na opinião o fato de que os Bispos recentemente promovidos, ou transferidos para sedes com mais amplo raio de ação, serem, em bom número, simpáticos às tendências novas. [...] Tudo isto cria um ambiente que vai desalentando os melhores. E neste desalento está para mim o mais grave da situação (Carta de Dom Mayer ao Padre Leiber, 1/6/52).

Enquanto isto, a Ação Católica — a pseudo-Ação Católica deveria eu dizer — se expandia, incorporava a si os melhores, deformava-os a seu talante, e preparava no laicato católico a incubação de erros que daí a não muitos anos frutificariam em fel e vinagre.

Também os círculos da Ação Católica continuavam a ser dominados pela influência de Alceu Amoroso Lima. Ele havia saído da direção da Junta Nacional, mas continuava a publicar o que bem entendia, a abordar todos os assuntos como queria, e a fazer propaganda de suas idéias no Brasil inteiro.

O Cardeal Dom Jaime Câmara julgava dever tratá-lo com “caridade”. O que produziu esse resultado concreto: aos olhos do grande público, o Dr. Alceu tinha todo o prestígio para fazer o mal que entendesse [299].

Era, aliás, a sua conduta constante diante dos inovadores. Quando levavam ao seu conhecimento exorbitâncias muito evidentes desses inovadores, limitava-se a lamentar e recomendava “caridade”. Contudo, intervinha sempre para evitar que elementos ortodoxos atacassem os inovadores.

De onde decorria a mais ampla liberdade de ação para os inovadores.

Exemplo dessa conduta: devendo substituir na direção suprema da Ação Católica o Sr. Alceu Amoroso Lima (há mais de dez anos no cargo) e demais membros da Junta Nacional, nomeou um discípulo e colaborador do Dr. Alceu, e outras pessoas da mesma orientação.

Outro exemplo. Realizando-se em 1948, no Rio de Janeiro, um Congresso Internacional de Obras Sociais Católicas, S. Eminência designou o Dr. Alceu de Amoroso Lima para presidir o importante congresso, prova de prestígio e confiança que muito impressionou [300].

Ficávamos então diante deste paradoxo: enquanto alguns viam nesta crise do liturgicismo, de hipertrofia da Ação Católica, de 'maritainismo' apenas uma briga de sacristias, eu percebia sem a menor sombra de dúvida que estava latente uma hidra, um monstro à maneira do protestantismo. Também o protestantismo, de início, pareceu uma “querela de frades”. Depois se viu qual era o verdadeiro porte do problema" [301].

Capítulo XII

Imergindo dentro da catacumba

1. Pequeno grupo em discreta resistência

Após o nosso lance de “kamikaze”, tornamo-nos um pequeno grupo de seis pessoas que resistiam, não no sentido de ficar fazendo discursos contra os Bispos solidários com os erros da Ação Católica, mas vivendo a nosso modo, segundo a nossa consciência.

... tornamo-nos um pequeno grupo de seis pessoas que resistiam...

Não desobedecíamos a eles, mas sobretudo obedecíamos à Igreja, enquanto que eles faziam coisas contrárias às máximas católicas. E esta nossa minúscula presença no panorama tinha o seu peso, como o comprova um pequeno fato que aconteceu comigo.

O fato foi o seguinte.

Estava eu tratando, certo dia, de questões de Direito com um Bispo Auxiliar de São Paulo. De repente, ele fez uma pausa e me disse:

O senhor sabe que o Cardeal está contente com o seu comportamento? “Parce que vous avez mis tout à fait de côté” — o senhor colocou muitas coisas de lado sem lhe fazer oposição. E também porque o senhor é muito discreto e não faz nenhum esforço para levantar as pessoas contra ele.

Eu lhe respondi:

— Fico contente de saber que o Sr. Cardeal faça justiça ao meu senso de ordem e de disciplina.

Ele me disse:

— Sim, mas o Cardeal tem uma queixa. Ele sabe que a sua conduta é inteiramente correta, mas o senhor aparece em público com um grupo de amigos, vai a restaurantes, a passeios com eles, e todo o mundo diz: “Eis aí o grupo do Plinio”. Isto representa um fermento de oposição. Percebe-se que o senhor permanece firme em seus princípios e que não deseja mudar. Mas o Cardeal lhe daria qualquer coisa, desde que o senhor dissolvesse esse grupo.

Eu respondi:

— Ah! Excelência. Aqui as coisas são diferentes. Porque ele me pede que eu renuncie aos meus princípios e aos meus amigos. Quanto a renunciar aos meus princípios, jamais. Quanto aos meus amigos, eu não posso permitir que ninguém me imponha a renúncia a amizades que não têm nenhuma relação com os assuntos da Igreja. São meus amigos particulares, nós nos reunimos em nossas casas ou numa pequena casa que alugamos, não formamos nenhuma associação religiosa. A minha vida privada não pode ser contrariada, desde que não se lhe possa fazer nenhuma objeção quanto aos bons costumes ou à boa doutrina. Havendo alguma objeção, eu serei o filho obediente da Igreja. Mas não é este o caso. Qualquer que seja o preço monetário desse arranjo, eu não posso aceitar [302].

O fato concreto é que, apesar desse reconhecimento, o Cardeal chegou a pedir ao governo do Estado que não me nomeasse como catedrático para uma Universidade oficial, possibilidade esta que estava muito bem encaminhada [303].

2. Tentando juntar os restos do naufrágio. Várias tendências

Dentro dessa reclusão, nós tomávamos os restos do desastre e com os fios que restavam da bandeira estraçalhada, procurávamos tecer outra bandeira, ou tecer todo um estandarte.

Dos pequenos elementos que nos restavam de cá, de lá e de acolá, tentamos reaproximar vários antigos amigos, mas eles tiravam o corpo dessa reaproximação, amedrontados e apavorados ao verem as sanções de que tínhamos sido objeto.

Alguns desses, mais do que amedrontados e apavorados, estavam postos em uma dúvida cruel ao verem que, aqueles que haviam tomado essa atitude hostil para conosco, eram homens que falavam em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo. E diziam de si para consigo a meu respeito: “Ele não era quem nós imaginávamos”.

Outros, apesar de compreenderem a nossa posição, tomavam infelizmente uma atitude movida ao pé da letra pelo medo vil e covarde.

Assim, não era raro eu encontrar nas ruas do centro de São Paulo vários conhecidos, os quais me abraçavam e diziam baixinho ao ouvido: “Plinio, muito bem, continue”. Equivalia a afirmar, no fundo: “Plinio, leve na cabeça para ver se salva a causa de que eu gosto, mas com você não tomo outro compromisso senão um abraço rápido e um elogio cochichado”.

Apesar de tudo, era ao menos uma meia simpatia, que ficava cintilando em meio às trevas e que poderia se manifestar favoravelmente de futuro, numa situação crítica que se pusesse [304].

3. Pontos de apoio para futuras lutas

Nesse ambiente catacumbal, não nos esquecíamos da luta externa. Ela era tocada por nós a partir de pontos mínimos de apoio de que dispúnhamos, e que conservávamos quanto podíamos.

Um deles era a nossa relação com o Padre Mariaux, que conhecia o Padre Leiber [305], o qual por sua vez era íntimo de Pio XII.

Outro ponto de apoio eu já mencionei: o Bispo de Bragança, Dom José Maurício da Rocha.

Havia ainda vários outros pontinhos assim. E desses pontos de apoio começaram a renascer os arvoredos [306].

Capítulo XIII

Estruturação e consolidação do pequeno grupo

1. Necessidade de sobreviver ao naufrágio

Nós percebíamos que mais cedo ou mais tarde iríamos perder o Legionário. E surgiu para nós um problema: onde nos reunirmos, caso isto aconteça? O grupo tinha que sobreviver [307].

Em 1946 éramos ainda muito moços: o mais velho de nós, Dr. José de Azeredo Santos, tinha 39 anos e o mais novo, 22. E constituíamos um grupo pequeno, composto apenas de dez pessoas [308]: Dr. Adolpho Lindenberg, Professor Fernando Furquim de Almeida, Dr. José de Azeredo Santos, Dr. José Benedito Pacheco Sales, Dr. José Carlos Castilho de Andrade, Dr. José Fernando de Camargo, Dr. José Gonzaga de Arruda, José Gustavo de Souza Queiroz (que pouco depois faleceria), Dr. Paulo Barros de Ulhôa Cintra, e evidentemente eu [309].

Tínhamos também em Santos o Dr. Antonio Ablas Filho, que era um dos melhores cirurgiões da cidade, creio que dois ou três anos mais novo do que eu, ou talvez da minha idade.

Pai dedicado, comendador da Santa Sé e professor de Medicina Legal na Faculdade de Direito de Santos, ele tinha conosco a maior intimidade e a maior ligação [310].

2. Sede da rua Martim Francisco

A Sede da Rua Martim Francisco, atingida por bomba terrorista na madrugada de 20 de junho de 1969

Para termos um lugar onde nos reunir, alugamos o andar térreo da rua Martim Francisco, número 665.

Dr. Adolpho Lindenberg herdara algum dinheiro de seu pai, que acabara de morrer. E os outros ganhavam alguma coisa por mês, com o que podíamos ajudar na manutenção da sede.

Compramos também alguns móveis, arranjamos tudo de um modo modesto, decente, agradável e com bom gosto. E ali nos instalamos [311].

Como a sede da Martim Francisco era uma casa alugada, ninguém nos tiraria dali. Se o grupo não dispusesse daquele lugar onde se reunir, ele teria se dispersado. A instalação dessa sede assegurou a nossa sobrevivência enquanto grupo. E fizemos dela uma espécie de catacumba onde respirar e viver.

Certo dia um dos nossos viu o secretário do Cardeal passar muito devagar em um automóvel e observar atentamente a casa. Ele talvez quisesse ver como era a toca da onça... [312]

3. Reuniões diárias: coesão no pensar, no sentir e no agir

Esse grupo era tão pequeno que se contentava em ocupar o andar térreo daquele prediozinho [313]. Apenas três salas, depois uma cozinha e no fundo uma área minúscula [314].

Foi uma coisa terrível sair da direção e da liderança de um Movimento Católico espalhado pelo Brasil inteiro, e ficar reduzido a uma coisinha pequena como aquela [315].

Mas ali nos reuníamos todas as noites, sem exceção.

Recordação, sem amargura nem orgulho, das glórias da imolação dos dias idos. Análise solícita e entristecida, da deterioração discreta e implacável da situação religiosa. Estudos doutrinários em comum. Convívio fraterno e cordial.

Assim, a Providência colocava as condições ideais para nos unir.

Veio daí um tal enrijecimento de nossa coesão no pensar, no sentir e no agir, como mais seria difícil imaginar. Escondida em terra, a semente germinava.

A nosso lado, organizava-se a solidariedade preciosa e discreta de um pugilo de moças que conosco lutara na Ação Católica contra o progressismo nascente, e também se retirara conosco para o ostracismo [316].

Eram as antigas dirigentes da Ação Católica, que passaram a constituir um grupo orientado pelo Cônego Mayer e vivendo com vida própria, distinta das associações religiosas, para não perdermos aquelas colaboradoras que nos prestaram depois muitos bons serviços [317].

4. Vida de sede: TFP em germinação

Todos nós trabalhávamos para nos manter. De maneira que a sede, de dia, ficava habitualmente vazia [318]. Mas, à noite, terminado o jantar, todos confluíamos para a sede da rua Martim Francisco.

...havia o costume de irmos visitar um pequeno oratório que se situava numa sala do fundo, e onde instalamos a imagem de Nossa Senhora Auxiliadora que está hoje na capela do prédio da rua Maranhão 341...

Quando chegávamos, havia o costume de irmos visitar um pequeno oratório que se situava numa sala do fundo, e onde instalamos a imagem de Nossa Senhora Auxiliadora que está hoje na capela do prédio da rua Maranhão 341. Ela nos acompanha desde os tempos iniciais do Legionário.

Após as orações, voltávamos para a sala onde iniciávamos as nossas conversas.

Os assuntos eram os mais variados.

Em geral começavam por coisas banais da vida da sede, ou pelos ecos do que ouvíamos sobre a marcha da heresia progressista que lavrava em São Paulo.

Também tratávamos de alguma notícia mais importante ou menos do dia, ligada à política nacional ou internacional.

Por fim, entrávamos nos temas de caráter mais intelectual. Aí as conversas subiam muito de nível e eram abordados assuntos verdadeiramente elevados. Éramos todos principiantes, e uma porção de temas hoje ultra surrados, naquele tempo despertavam em nós um real interesse [319].

*   *   *

Em certo momento o Professor Fernando Furquim de Almeida começou a estudar a história de Louis Veuillot [320], o infatigável paladino do jornalismo católico na França [321]. E trouxe ao nosso conhecimento o fato de que na Europa, durante todo o século XIX, a disputa dos católicos ultramontanos e dos católicos liberais era muito análoga à que havia entre nós e a Arquidiocese.

Os liberais tinham do seu lado Montalembert, e os ultramontanos Louis Veuillot. Saber disso foi para nós uma forma de alento.

O mesmo Professor Furquim foi estudando depois a história dos católicos do século XIX e revelando outros nomes e movimentos: De Maistre, Balmes, De Bonald, Donoso Cortés, o carlismo na Espanha, a Amicizia Cristiana de Pio Bruno Lanteri e ainda outros. Constituía para nós um alento, porque compreendíamos que éramos continuadores de uma certa tradição de luta pela Igreja [322].

*   *   *

Tomei a meu cargo incrementar o quanto pudesse a devoção a Nossa Senhora. Então, longos comentários sobre São Luís Maria Grignion de Montfort e sobre a espiritualidade dele.

Eu tratava muito com meus companheiros do tema da Revolução Francesa [323], por considerá-la, quando bem estudada, a grande parábola da história do Ocidente cristão decadente. Como tal, ela foi um acontecimento emblemático que continha lições para todos os séculos.

Mostrando a eles como as situações políticas de hoje repetiam de algum modo situações análogas da Revolução Francesa, eu os levava à consideração do processo revolucionário na História [324].

Dr. Pacheco Sales, homem muito inteligente, brilhante, que no fim da década de 1950 infelizmente se afastou do Grupo, cuidava muito da questão da sociedade orgânica e do ponto de equilíbrio entre o individualismo e o socialismo. Eram exposições muito bem apanhadas. Ele tinha talento para isto e desenvolvia superiormente bem o assunto.

Dr. Adolpho Lindenberg era ainda muito mocinho, Dr. José Carlos Castilho de Andrade também. Eles prestavam pequenos serviços, não tinham ainda iniciado a fase da contribuição intelectual que depois deram para o Grupo.

Quando batia onze e meia da noite, saíamos apressadamente para tomar um sorvete ou comer alguma coisa antes da meia-noite, pois o jejum eucarístico naquele tempo se iniciava a essa hora até a comunhão do dia seguinte.

Chegada a meia-noite, pagávamos a conta e saíamos. E todos íamos dormir [325].

*   *   *

Nossa vida interna começou assim a se estruturar aos poucos em bases novas.

Fazíamos habitualmente reuniões baseadas numa seleção de notícias compiladas em recortes de jornais sublinhados por nós, tradição essa que trouxemos desde o tempo do Legionário. Mas combinamos que tais reuniões não seriam dadas durante a semana, mas numa reunião especial, em dia fixo, na sexta-feira à noite [326]. Íamos ao Belenzinho e fazíamos essa reunião junto com o Cônego Mayer. E ela ficou conhecida em nosso Grupo, e depois na TFP, como a Reunião de Recortes [327].

As Reuniões de Recortes tinham como finalidade analisar, com base no noticiário de imprensa, os acontecimentos nacionais e internacionais à luz dos princípios que depois foram expostos no ensaio Revolução e Contra-Revolução [328].

Como São Paulo começou a adotar o sistema da semana inglesa [329], combinamos de, aos sábados à tarde, nos encontrarmos para visitar alguma exposição bonita que se abrisse, ou fazer alguma excursão de automóvel, ou qualquer outro entretenimento que nos servisse de distração.

Assim, aos poucos, foi-se delineando uma estruturação, uma institucionalização da vida interna ao nosso Grupo. Era a estruturação da TFP que ia nascendo. Nossa Senhora ia favorecendo essa estruturação [330].

5. Esboço do serviço de documentação

Como não podia deixar de ser, nossos trabalhos estavam voltados para a nossa luta.

Instalamos na sede da rua Martim Francisco uma pequena seção de leitura de jornais e revistas progressistas que se publicavam no Brasil.

Durante meses e meses, eu lia essa documentação católica liturgicista e nela sempre encontrava novos erros doutrinários [331].

E era nessas publicações brasileiras do Movimento Litúrgico e da Ação Católica que eu acabava encontrando material interessante e ilustrativo sobre os rumos da revolução progressista dentro da Igreja, muito mais do que em revistas e jornais europeus importantes.

Isto tinha uma explicação. Os padres seculares, que haviam feito seus cursos em Roma ou em outras grandes cidades européias, voltavam ao Brasil encharcados das idéias novas. E mantinham correspondência com centros da mesma índole no Velho Continente, os quais sempre lhes enviavam livros e publicações que não circulavam publicamente aqui.

Assim, eles recebiam tudo quanto havia de mais ousado. E esses padres reproduziam essas matérias nos tais jornaizinhos para dar formação a seus grupos de progressistas.

O mesmo processo se repetia com os padres regulares, dentro das mais variadas ordens religiosas, incluindo a Companhia de Jesus. Todas essas ordens tinham alguns alunos formados nas universidades eclesiásticas mantidas pelas respectivas ordens na Europa. Quando regressavam, voltavam intoxicados, e através dos condutos dessas ordens no Brasil faziam o mesmo serviço.

Vários leigos também recebiam do Clero esse material arrojado, e publicavam artigos de caráter progressista no jornalzinho local da ordem religiosa, da paróquia ou da cidade.

E eu então lia e assinalava tudo isto [332].

6. Serviço fotográfico: “tiros na lua”

Esses documentos selecionados eram depois fotografados por Dr. José Fernando de Camargo, Dr. José Carlos Castilho de Andrade e Dr. Adolpho Lindenberg, num laboratório que funcionava na sala dos fundos da rua Martim Francisco.

Naquele tempo não havia nada das sutilezas das fotografias de hoje. Eram fotografias em papelões enormes, que nós, fazendo economia, comprávamos.

Eu punha um comentário junto [333] e mandávamos para os mais altos páramos de Roma, até mesmo para a mesa do Papa Pio XII, por intermédio de pessoas que nós conhecíamos muito pouco, mas que nos prestavam este serviço. Dizia o Dr. Paulo que aquilo era “dar tiros na lua” [334].

Esse conduto funcionava? Funcionava! [335]. Mas em nossa catacumba não recebíamos resposta [336].

Tive a comprovação de que funcionava, na viagem que fiz a Roma em 1950, quando verifiquei que na Santa Sé tomavam muitíssimo em conta o material que mandávamos [337].

Mandávamos por meio do Padre Dainese, por meio do Padre Mariaux, por meio do Padre Castro e Costa [338] e de outros condutos que eu fui conhecendo [339].

Depois, em 1950, o Padre Mariaux deu-me uma carta de apresentação ao Padre Leiber, confessor do Papa, e que era o destinatário desses documentos. Falarei da audiência com o Padre Leiber mais adiante. Na ocasião, ele me disse, “os seus documentos estão aqui guardados”. E deu-me a entender que ele os encaminhava para Pio XII.

De fato, no Vaticano tomei depois vários contatos e constatei que os documentos que enviávamos para ele, todos circulavam.

Assim, no andar térreo da rua Martim Francisco, tudo parecia “trancado”, mas — sempre foi a conduta característica da Providência para conosco — havia um tubo que dava para o mais puro ar. De lá, os documentos iam para a mesa de Pio XII.

Isto explica em larga medida a posterior nomeação de Dom Mayer e Dom Sigaud como Bispos, a carta de aprovação ao meu livro e outras coisas mais [340].

7. “O período mais bonito de nossas vidas”

Mas, sem saber de tudo isso, os componentes de nosso grupo participavam das mesmas idéias, dos mesmos ideais, das mesmas esperanças, da mesma mentalidade e sobretudo da mesma Fé Católica Apostólica Romana. Por isto sentiam-se todos muito unidos entre si [341].

Sabíamos que remávamos contra toda a maré. No entanto, esperávamos contra toda a esperança [342].

Vendo hoje esses fatos retrospectivamente, confesso que foi o período mais bonito de nossas vidas. Fazíamos uma série de coisas que pareciam absurdas, mas era o que estava ao nosso alcance fazer. E todas essas coisas deram depois um resultado espetacular.

Foi um tempo de provação tremenda, mas foi também um tempo de perseverança [343]. Nesse andar térreo da rua Martim Francisco o Grupo e depois a TFP começaram verdadeiramente a nascer [344].

Capítulo XIV

Reabilitação, reviravolta e contra-ofensiva

1. Padre Sigaud nomeado Bispo de Jacarezinho

Depois dessa enxurrada de desastres, fatos auspiciosos começaram a acontecer [345].

Ainda me lembro de um dia de janeiro de 1947 [346], em que noticiei aos meus amigos que, segundo uma emissora, Pio XII nomeara Bispo de Jacarezinho o Padre Sigaud.

Como? O quê? A nossa alegria era grande, mas a dúvida ainda maior [347].

Ele tinha sido removido de São Paulo por pressão do Sr. Cardeal Motta, e mandado pelos superiores para a Navarra, na Espanha, como missionário. E agora se tornara Bispo!? [348]

A razão de minha dúvida se explicava. Em geral, a nomeação de um Bispo era noticiada pelos jornais. E a nomeação de Dom Sigaud só tinha sido divulgada pelo rádio. Fiquei desconfiado de que houvesse algum equívoco.

Para tirar bem a limpo a veracidade da notícia, telefonamos para a Navarra.

Naquele tempo, era dificílimo conseguir uma ligação para a Europa, então muito cara. E nosso dinheiro estava para lá de escasso.

Dom Sigaud veio ao telefone. Ele não sabia quem estava falando. A telefonista não dizia e apenas o informava de que era do Brasil.

Do outro lado do fio eu dizia:

— Padre Sigaud! Padre Sigaud!

E ouvi de longe:

— O que é?

— É Plinio quem fala!

— Ah! Plinio. Como vai você?

E eu apressando-me, pelo medo de que a ligação caísse de um momento para outro. Perguntei-lhe:

— Queria saber se é verdade que o senhor foi nomeado Bispo de Jacarezinho!

— Que éééééé?

— O senhor foi nomeado Bispo de Jacarezinho ou não foi?

— Fui, sim. Estou preparando minha volta ao Brasil [349].

Voltaria então? Sim, voltaria [350].

Grande alegria, porque era uma vitória, uma espécie de endosso da Santa Sé para a boa orientação de nosso livro* [351].

*  Depois desse telefonema, Dr. Plinio escreveu a Dom Sigaud contando as reações havidas em São Paulo a respeito de sua nomeação:

“Dom Ernesto [de Paula] ficou radiante: a primeira coisa que fez foi telegrafar a Dom Attico [Arcebispo de Curitiba] felicitando-o. Entre os Jesuítas nem é bom falar: Padre Riou, Padre Felix, Padre Dainese, Padre Arlindo Vieira, Padre Santini exultaram. De Pindamonhangaba, Monsenhor João de Azevedo veio a São Paulo nos abraçar. O Cônego Silvio [Matos], o Cônego Geraldo, o Padre Benigno [de Brito] não couberam em si de contentes. No Seminário do Ipiranga, entre os Professores ‘foi uma bomba’, disse-me o Padre Veloso. No Oiseaux (curso secundário) e na Santa Mônica, o júbilo foi grande. Eu felicitei vivamente Mère Saint Ambroise porque era o primeiro catedrático de lá a ascender ao Episcopado. [...] Dom Pedro Henrique ficou muito alegre e me disse que queria vir à sagração. De Roma, o Padre Castro e Costa [...] escreveu ao Padre Riou sobre sua nomeação dizendo ‘que esplêndido triunfo do Legionário’. A miuçalha da JEC [a quem Padre Sigaud dirigia enquanto assistente eclesiástico] está radiante. Em suma, é um regozijo geral” (carta de Dr. Plinio a Dom Sigaud, 16/12/46).

*   *   *

Lembro-me que fomos ao Rio de Janeiro esperar o navio que vinha trazendo Dom Sigaud da Europa *.

* Ele embarcara em Barcelona no navio Cabo Hornos no dia 4 de março de 1947, e atracou no Rio no dia 20 do mesmo mês, após um ano de ausência de nosso País.

Do Rio viemos com ele para São Paulo. Pouco mais de um mês depois realizou-se a sua sagração* [352].

* Essa sagração episcopal deu-se no dia 1° de maio de 1947.

Dom Sigaud convidou o Núncio Dom Carlo Chiarlo para sagrante, porque não queria convidar o Sr. Cardeal. E era seu desejo fazer a sagração aqui em São Paulo, na Basílica do Carmo.

O Núncio veio, fez a sagração, tendo como consagrantes Dom José Maurício da Rocha e Dom Manuel da Silveira d‘Elboux [353].

*   *   *

 

Demos publicidade a essa sagração através dos jornais e do Legionário [354]. Era nossa intenção mostrar que não se tratava de um grupinho, nem de uma manifestação contra ninguém, embora deixássemos claro que o passado de Dom Sigaud na Ação Católica não era um capítulo duvidoso de sua biografia e agora relegado a uma espécie de esquecimento penitencial, mas um autêntico florão de sua coroa.

Neste ponto, ponderei com Dom Sigaud que era preciso muita clareza, do contrário nossos adversários iriam espalhar que o Santo Padre havia imposto a ele uma “retratação”, e que Dom Sigaud se vira forçado a ingerir “calmantes” em Roma.

Por isto, os convidados para a homenagem foram escolhidos entre os melhores elementos — social, intelectual e moralmente falando — do laicato católico e mesmo da sociedade de São Paulo *.

* Estavam presentes à cerimônia o governador de São Paulo, Sr. Ademar de Barros e seu secretário, Comendador Mario Antunes Maciel Ramos. Ele teve como paraninfos o governador do Paraná, Sr. Moisés Lupion, S.A.I.R. Dom Pedro Henrique de Orleans e Bragança, Dr. Plinio Corrêa de Oliveira e o Dr. Lucas de Proença Sigaud. De Jacarezinho vieram para a cerimônia o Sr. Prefeito, Juiz de Direito e o Delegado. Também presentes o Vigário Geral da Arquidiocese de São Paulo, Monsenhor Manuel Macedo Freire, Monsenhor Luiz Gonzaga de Almeida, Dom Aidano Ebert, prior do Mosteiro beneditino de Santos, e os representantes do Cabido Metropolitano, os Srs. Cônegos Benedito Marcos de Freitas, Antonio de Castro Mayer, Antonio Leme Machado, Luiz Geraldo do Amaral Mello, Francisco Cipulo e o Cônego João Pavesio, que oficiou como cerimoniário.

Assim, mais do que homenagens pessoais, a cerimônia foi a expressão da vitalidade de uma tendência que se afirmava diplomaticamente [355].

No fundo, todo mundo ficou entendendo que era um sinal de que a Santa Sé queria nos reabilitar [356].

*   *   *

Fui depois até Jacarezinho, acompanhando Dom Sigaud para as cerimônias de posse na Diocese [357]. Se não me engano fiz discurso na ocasião [358].

2. Nova grande vitória: a encíclica “Mediator Dei”

Ainda em 1947, tivemos outra grata surpresa, que representava uma nova e grande vitória: a publicação por Pio XII da encíclica Mediator Dei [359].

A doutrina condenada pela encíclica era, ponto por ponto, tão idêntica à que professavam os liturgicistas no Brasil, que sou levado a admitir como certo que o Sumo Pontífice teve sob os seus olhos, pelo menos em parte, o nosso País [360].

Sem dúvida, essa encíclica constituía de si, de alguma forma, uma carta de alforria que nos libertava das algemas em que estávamos colocados.

Podíamos afinal falar, podíamos denunciar o erro. Já não havia mais as "prudências" que pudessem destruir essa conquista, não havia mais "armistícios" que permitissem reduzir ao silêncio apenas um dos lados contendores, deixando que o outro escrevesse, sussurrasse, falasse e urrasse à vontade [361].

*   *   *

Eu absolutamente não acreditava que os liturgicistas iriam desanimar ou renunciar às suas idéias.

E não me enganei: essa encíclica foi recebida pela "ala esquerda" com frieza, publicada sem entusiasmo nem pressa (O Diário, órgão católico de Belo Horizonte, levou mais de um mês para a publicar), e foi tratada pelos inovadores como um documento sem importância. Mais ainda, arranjaram um jeito de distorcer o seu sentido, trombeteando contra toda a evidência que o Papa havia condenado energicamente, nela, certos brasileiros que combatiam o movimento litúrgico. E que ele queria, dali por diante, que o movimento litúrgico se intensificasse muito mais* [362].

* Essa mesma convicção, Dr. Plinio a manifestou em carta ao Padre Dainese:

"O clã liturgicista continuará a agir (às escâncaras? na sombra? eis a questão!), e não perderá nem as influentes proteções de que gozou até aqui, nem os órgãos de imprensa e os meios de ação de que presentemente dispõe. A pergunta que se põe, portanto, é esta: qual a reação dos liturgicistas? (Carta de 31 de dezembro de 1947).

*   *   *

De nossa parte, o que nos competia fazer, fizemos, que era difundir a encíclica.

E escrevi um artigo dizendo que [363], no momento em que a encíclica vinha dirimir questões de tão funda repercussão em nossa vida religiosa, dois deveres se impunham ao católico: um para com a Verdade, outro para com a Caridade [N. do Site: o artigo chamava-se "Na casa do Pai comum", publicado no Legionário Nº 801, de 14 de dezembro de 1947 e pode ser lido aqui].

Para com a Verdade: acima de tudo e antes de tudo, devíamos cuidar de combater o erro e difundir a sã doutrina. A este dever primordial, tudo se devia sacrificar.

Mas a Verdade venceria atraindo a si os que erraram. E isto se faz com Caridade.

Assim, pois, era preciso difundir a Verdade com Caridade. E, se seria falso manter a Caridade calando ou velando a Verdade, seria igualmente falso difundir a Verdade com espírito de orgulho ou vã glória.

Há na Igreja duas situações inteiramente distintas, a da inocência e a da penitência. Mas quem ousaria ver no inocente um vencedor orgulhoso, e no penitente um vencido cheio de opróbrio?

A Igreja não dá tréguas nem quartel ao pecador impenitente. Mas basta que este reconheça seu erro, repare humildemente o escândalo, queime à vista de todos o que adorou, e adore o que queimou, para que estejam abertas de par em par diante dele as portas do lar paterno.

Ninguém, é certo, tinha autoridade para dispensar o que Deus não dispensa, e confundir o penitente com o impenitente. A Igreja, bem o sabemos, ama demais seus filhos penitentes para os injuriar com esta confusão.

A Igreja, aos que erram pede tão somente que façam o que o camelo tinha de fazer para transpor as portas baixas das cidades, que no Oriente se denominavam “buracos de agulha”: deponham a carga de seus erros, e façam-se pequeninos pela humildade. Quando os reerguer o perdão da Igreja, ver-se-á que eles se tornaram gigantes porque nada engrandece mais do que a verdadeira penitência.

Não havia o menor motivo para que os que erraram se sentissem obrigados a silenciar vergonhosamente sobre seus próprios erros. Pelo contrário, cobrir-se-iam de glória mencionando-os e refutando-os. Nem estes erros deviam ser tratados por nós com um silêncio “caridoso”, que seria, no fundo, essencialmente desdenhoso porque insinuaria cruel e insidiosamente que a nódoa continuava. A solidariedade entre o homem que errou e seus erros pretéritos era inteiramente destruída pela penitência.

Ao pecador penitente em aberto conflito com seus erros passados, a Igreja ama com entranhas de mãe: ai de quem o moleste por aquilo que Deus perdoou!

Ninguém tinha, pois, o direito de achar que os ataques desferidos contra o erro podiam humilhar os que do erro se retratassem [364].

Dom Sigaud escreveu também um artigo para o Legionário, dizendo que a encíclica era uma confirmação de toda a nossa linha de apostolado e da denúncia feita pelo livro Em Defesa da Ação Católica* [365] .

* Nesse artigo, publicado sob o título A Encíclica Mediator Dei e um pouco de história da Igreja no Brasil, o Prelado dizia que “era uma grande consolação lembrar neste momento o livro magistral do Diretor do Legionário, Dr. Plinio Corrêa de Oliveira”, o qual “foi um brado de alarme e um cautério. Brado de alarme, impediu que milhares de fiéis se entregassem, em sua boa fé, aos erros e desmandos do Liturgicismo que avançava como uma onda avassaladora”. O livro “abriu os olhos a muitos fiéis já envoltos nas ondas do ‘liturgicismo’ e os reconduziu ao caminho que a Igreja aponta como o certo e tradicional”. Ao terminar seu artigo, dizia que “fomos testemunha da história de que este livro foi o centro. Hoje damos graças a Deus por ter surgido tão oportunamente este brado de alarme, que preservou e salvou para a Verdade e Vida tantas ovelhas de nosso rebanho” (art. cit., Legionário n° 803, de 28/12/47).

3. Semana seguinte: Cardeal retira o “Legionário” das mãos de Dr. Plinio

O resultado foi que, na primeira hora da madrugada de 31 de dezembro, quando Dr. José Carlos Castilho de Andrade, como de costume, se dirigiu à tipografia para os serviços comuns de acompanhamento da edição da semana seguinte, já em fase de composição gráfica, foi informado de que todo o material necessário para a confecção do jornal havia sido removido para a tipografia dos Padres Paulinos, e que o Legionário não mais seria impresso ali.

Diante da gravidade dessa comunicação, Dr. Castilho me pôs logo a par do ocorrido [366].

Procurei imediatamente pelo Machado, que era o diretor administrativo e financeiro do Legionário [367]. Não consegui encontrá-lo. Ele foi localizado muito mais tarde pelo Cônego Mayer por telefone, a quem informou que não tinha mais nada com o assunto, pois o Legionário estava agora nas mãos da Cúria. Como diretor-financeiro havia passado todos os títulos de propriedade para o Cardeal [368].

Eu então me comuniquei com o Vigário Geral, Monsenhor Luís Gonzaga de Almeida, a quem indaguei se essa medida provinha de ordens do Sr. Cardeal. Ele respondeu que de nada sabia, e que Sua Eminência estava em Belo Horizonte, não podendo ele dar nenhuma informação.

Telefonei então para a Cúria Metropolitana e pedi para falar com o chanceler, que era então Monsenhor Loureiro.

Ele me disse que lamentava o ocorrido e que não tivera nenhuma participação no fato. Sabia apenas que o Dr. Luís Tolosa de Oliveira e Costa Filho [369] fora incumbido pelo Sr. Cardeal de dar todas as providências para a execução dos desejos de Sua Eminência no atinente ao Legionário.

Então comentei com Monsenhor Loureiro que um fechamento brusco do jornal, num momento em que fazíamos a divulgação da encíclica Mediator Dei, só favoreceria os fautores do erro, com evidente desdouro do diretor e redatores do Legionário, expulsos ignominiosamente de uma folha onde trabalharam gratuitamente durante 13 anos [370].

E por fim afirmei:

— Monsenhor Loureiro, em relação aos que são hereges, esse Cardeal não é pai, mas é mãe. Em relação àqueles que são fiéis à doutrina da Igreja, esse Cardeal não é pai nem padrasto, mas é carrasco. Porque, desde o dia em que ele pisou em São Paulo até agora, ele não teve nenhum gesto de pai, ele só teve crueldade de carrasco. Esta é a verdade! E a razão do fechamento do Legionário veio do fato de sermos favoráveis à doutrina da Santa Sé. Transmita isso a ele da minha parte.

O Monsenhor Loureiro me respondeu: “Meu amigo, eu não posso aceitar isso” [371].

*   *   *

Dr. Castilho recolheu, no próprio dia 31 de dezembro de 1947, um depoimento do chefe das oficinas. Ficava claro que a ordem de recolhimento do material tinha sido tão clandestina, que nem os próprios tipógrafos a conheciam. No tal depoimento do funcionário ele atestava até a hora em que tinham recebido de Dr. Castilho os originais para a composição [372].

Documentamo-nos bem, para que ficasse claro que o Legionário não tinha sido fechado por nós. Uma das provas era a de que, na gráfica, a matéria havia sido composta pela metade, e as chapas já compostas tinham sido recolhidas.

*   *   *

Na noite de 31 de dezembro, quase na virada do Ano Bom de 1947 para 1948, quando eu ainda estava jantando, recebo um telefonema do Monsenhor Loureiro dizendo que o Cardeal havia regressado inesperadamente de Minas e mandava me dizer que estava à minha disposição se eu quisesse falar com ele. Acabei de jantar, tomei o automóvel e parti para o Palácio.

Ele me recebeu em companhia do Cônego Loureiro, dizendo que o tinha trazido para presenciar a nossa conversa. E se manifestou nos seguintes termos:

— Eu queria dizer ao senhor que o Francisco Monteiro Machado procurou-me espontaneamente para oferecer a propriedade do jornal, como liquidante da sociedade. E também queria lhe dizer que não fui eu quem dei ordem para fechar o jornal. Como ele me entregou a propriedade do jornal e eu não quero que o senhor continue na direção, eu lhe tirei o jornal.

Ele estava muito trêmulo. Compreendi que uma briga não convinha a ele, mas também não convinha a nós [373].

Limitei-me a dizer que não oporia nenhuma resistência à determinação dele, mas que manifestava-me profundamente chocado com o modo pelo qual fora coagido a sair [374]. Além do mais, atraía a atenção dele para o fato de que a situação criada com a transferência de propriedade do Legionário era ilegal segundo as leis do País [375], pois a deliberação da assembléia dos sócios de liquidar a Legionário S. A. [376] não havia sido cumprida pelo Machado. E que ele, Dom Carlos Carmelo, mandasse um advogado imparcial estudar a questão.

O Cardeal respondeu que não se incomodava com isso. E me despedi debaixo dos votos de bom Ano Novo que ele me desejava *.

* Nesta conversa, o Sr. Cardeal havia dito que confiaria aos padres paulinos, dali por diante, a edição do jornal. Com efeito, no número de 29 de Fevereiro de 1948 apareceu um editorial em que se anunciava o início de uma "nova fase" na existência do semanário, resumida no mote final do artigo, não assinado: "Incipit vita nova". Nem uma palavra sobre Plinio Corrêa de Oliveira, que havia dedicado ao Legionário, com imensa generosidade, quinze anos da sua vida (cfr. Roberto De Mattei, O Cruzado do século XX — Plinio Corrêa de Oliveira, op. cit.). Nessa "nova fase", é claro, nenhuma referência houve mais aos desvios progressistas.

Dr. Plinio escreveu em seguida a Dom Sigaud (carta de 5 de janeiro de 1948), contando o que tinha havido: "As notícias que envio hoje a V. Excia. são bem tristes. O Legionário foi fechado. [...] Sobre a Mediator Dei, aqui, reina o mais absoluto silêncio. Púlpitos, tribunas, nas reuniões das associações, tudo se cala”.

Uma coisa ficava clara: o Legionário foi tirado de nossas mãos porque havíamos publicado comentários e notas à Mediator Dei. E porque aproveitamos o jornal para dar todo o realce à encíclica [377].

E foi justamente enquanto esses estudos e notas vinham sendo publicados, que o Cardeal Motta resolveu retirar, do modo mais brusco, a direção da folha de nossas mãos. Transferiu-a a pessoas como o Padre Enzo de Campos Gusso [378], inteiramente afeito às idéias novas.

O Legionário, mudando de diretor, mudou inteiramente de feitio e de aspecto, bem como de orientação. A campanha de difusão da encíclica Mediator Dei se encerrou ipso facto e inteiramente [379].

Algumas matérias nele publicadas passaram a apresentar uma tendência pronunciada para a esquerda em matéria social, e outras atacavam vivamente e em traços caricaturais os costumes religiosos antigos, com o fito de insinuar uma era religiosa nova e moderna. Também exprimiam com clareza a penetração da mentalidade laxista e modernizante naquele órgão oficial da Arquidiocese* [380].

* Foi tal a rotação ideológica do jornal, que a revista Vozes de Petrópolis publicou a certa altura o seguinte comentário: “"Há um ano mais ou menos, no fascículo Maio-Junho dessa Revista, manifestamos a nossa surpresa sobre algumas manifestações de liberalismo impresso no hebdomadário católico de São Paulo, O Legionário. Hoje experimentamos a mesma surpresa, vendo nova manifestação aparecida no número de 10 de Setembro passado daquele periódico" (Vozes, setembro-dezembro de 1950).

4. O Cônego Mayer elevado a Bispo de Campos

No Carnaval do ano de 1948, fomos fazer um passeio em São Pedro [381].

Na volta, enquanto visitávamos o Salto de Piracicaba, comentávamos com o Cônego Mayer nossa situação humanamente perdida, e manifestávamos a disposição de ir até o fim do caminho, permanecendo fiéis até a morte.

*   *   *

Dias depois, de volta à sua paróquia do Belém, o Cônego Mayer recebe a visita de Dom Siqueira [382], que veio lhe oferecer seus préstimos para efetivá-lo na paróquia.

O Cônego Mayer conversou com naturalidade com Dom Siqueira, mas já tinha no bolso, naquele momento, um convite para ser Bispo Coadjutor de Campos. Mas ele não disse nada a esse respeito ao Prelado.

*   *   *

Pouco depois, aparece o Cônego Mayer em meu escritório e começa uma conversa assim:

— Se eu fosse convidado para Bispo, você acha que eu deveria aceitar qualquer diocese do Brasil?

Fiquei com muita pena do Cônego Mayer: “Coitado, pensando nesse assunto numa situação tão miserável como a nossa”. Em todo o caso, providencialmente respondi:

— Cônego Mayer, marque uma periferia que, para o Norte, não passe da cidade de Campos. Mais distante do que Campos não me parece que convenha.

Ele conversou um pouco mais e despediu-se.

Em seguida, recomecei a trabalhar e o assunto passou.

*   *   *

Dias mais tarde, chego à nossa sede da rua Martim Francisco e encontro o Dr. Pacheco elétrico:

Episcopus habemus!

Ele estava numa tal vibração, que eu pensei que tivesse sido nomeado algum padre péssimo.

Ele me disse:

— O Cônego Mayer foi eleito Bispo Coadjutor de Campos!

Nesse ínterim, foram chegando os outros rapazes do grupo, e nós nem conseguimos nos sentar. Esperamos que todos viessem e fomos direto ao Belenzinho em três táxis. Um dos nossos levou até duas garrafas de vinho para comemorar.

De lá mesmo o Dr. José Fernando de Camargo telefonou a O Estado de S. Paulo, pedindo a publicação da notícia, que de fato saiu no dia seguinte [383] na seção religiosa do jornal. E ficamos imaginando o efeito-bomba dessa notícia no Palácio Pio XII.

Soubemos depois que, pela manhã, o Cardeal mandou o Cônego Enzo Gusso, seu secretário, ler os jornais. E este lhe deu a notícia.

O Cardeal estava tão pouco informado sobre essa nomeação que perguntou: “Será notícia oficial?”

*   *   *

Houve então a cerimônia de sagração de Dom Mayer [384].

Sagrante, o Núncio, e consagrantes Dom Sigaud e Dom Ernesto de Paula, tendo como padrinho Dom Pedro Henrique de Orleans e Bragança.

Grande festa! O Núncio cordial.

Com a sagração de Dom Mayer, muitas coisas subiram de ponto. E tudo isto animou muito o nosso grupo [385].

5. Três encíclicas de Pio XII mostram o acerto do “Em Defesa

Quando publicamos o Em Defesa, nossos adversários criaram em torno de nós uma atmosfera em que ficávamos apontados como caluniadores da autoridade eclesiástica, rebeldes contra ela, infectados de heresia. E diziam que em relação a nós era preciso que todo bom católico se afastasse o quanto possível [386].

Ora, no seu conjunto, três documentos pontifícios enunciavam, refutavam e condenavam os principais erros sobre que versava o livro: Mystici Corporis Christi, Mediator Dei e Bis Saeculari Die.

Mystici Corporis Christi - A encíclica Mystici Corporis Christi apareceu em 29 de junho de 1943 [387].

Isto pouco antes ou pouco depois de um Congresso de Ação Católica realizado em Belo Horizonte, em que uma das resoluções foi de que, se houvesse erros doutrinários entre os fiéis, as pessoas que tomassem conhecimento de tais erros porventura existentes os comunicassem às comissões de vigilância das respectivas dioceses. Ficava proibido aos fiéis combaterem eles próprios tais erros.

Mas como, de outro lado, ditas comissões de vigilância não existiam nem foram ulteriormente criadas, praticamente o combate aos erros dos inovadores ficou impedido pela carência do órgão a que a denúncia deveria ser feita. Aliás, o próprio fato de não haverem sequer sido criadas ditas comissões revelava um desinteresse bem próprio a desanimar os fiéis no combate ao erro.

Os inovadores, com os imensos meios ao seu alcance, puseram em circulação:

1.    que tais erros nunca existiram no Brasil;

2.    que a principal preocupação da Santa Sé consistia em difundir a devoção ao Corpo Místico, e não em destruir os erros porventura existentes em outros países sobre o assunto;

3.    que, em conseqüência, discrepavam da mente do Pontífice os que se sentissem alarmados ou preocupados com tais erros;

4.    que, ademais, a repressão a tais erros competia ao Episcopado;

5.    e que os sacerdotes ou leigos que chamassem a si combater tais erros se mostravam, com isto, pouco confiantes em relação à Autoridade, insubmissos, orgulhosos, provocadores de discórdia etc.

Foi nessa atmosfera que apareceu a encíclica.

*   *   *

Mediator Dei - Quatro anos depois, em 20 de novembro de 1947, veio a Encíclica Mediator Dei.

Repetindo as condenações da Mystici Corporis e estendendo muito o campo de visão dos estudiosos para novos erros, era uma oportunidade incomparável para o combate a esses erros.

Porém, também esta encíclica foi alvo da mesma campanha de silêncio.

O Diário católico de Belo Horizonte, o Correio da Noite, órgão católico do Rio de Janeiro, e demais jornais da mesma corrente, levaram meses sem publicar o documento, o que evitou que seu texto fosse conhecido na efervescência das primeiras notícias. Quando o publicaram, já o primeiro interesse em torno do assunto havia passado.

Única exceção foi o Legionário, que começou a apresentar a encíclica (a idéia era publicar a matéria em números sucessivos) com numerosos comentários, dando-lhe o máximo realce. Quando o primeiro número saiu com essa matéria, o Sr. Cardeal Dom Carlos Carmelo retirou de nossas mãos, conforme já dissemos, a direção do jornal,.

Dentro em breve, não se falou mais da Mediator Dei, que teve o mesmo sepultamento que a Mystici Corporis Christi [388].

Bis Saeculari Die - Por fim, em 1948 veio a lume a Constituição Apostólica Bis Saeculari Die, da qual passo a falar em seguida.

*   *   *

6. Antecedentes da publicação da “Bis Saeculari Die” no Brasil

Julgo que melhor seria recordar os antecedentes, para melhor entender a celeuma causada.

Antes de aparecer essa Constituição Apostólica, os próceres da mentalidade nova apregoavam que outras associações religiosas que não fossem a Ação Católica não tinham mais razão de ser.

Segundo eles, a nova situação jurídica desse movimento só competia aos leigos inscritos nas associações ditas da Ação Católica stricto sensu, ou seja, a JFC, a JEC, JIC, JOC, JUC etc. E as Congregações Marianas e outras associações religiosas deveriam ser apenas toleradas pela Igreja, e tenderiam a desaparecer *.

* Dom Mayer, já Bispo, confidenciou ao Padre Leiber, em carta enviada antes de sua viagem a Roma em 1950, que “ouvi pessoalmente do falecido Arcebispo de São Paulo, Dom José Gaspar de Affonseca e Silva e de vários dirigentes da Ação Católica de outros bispados, a tese de que, segundo a mente do Santo Padre, as associações religiosas deviam ir morrendo por inanição. ‘A Santa Sé é muito sábia, de maneira que não extingue as associações, mas deixa que elas morram por si’ [dizia Dom José].

Alimentando essa tendência, os elementos dirigentes da Ação Católica trabalhavam implicitamente para dispersar e reduzir ao silêncio todos aqueles que não acertassem o passo com a corrente inovadora. Em suas mãos, a Ação Católica passou a ser uma trincheira de guerra contra tudo quanto no Brasil representasse o bom espírito ou a tradição.

Daí o colorido muito particular que o problema das relações entre a Ação Católica e as Congregações Marianas tomou entre nós.

Antes da Bis Saeculari Die, havia a tal questão jurídica entre Congregações Marianas e Ação Católica, que em si mesma não apresentava interesse primordial pela circunstância de que a Ação Católica estava densamente infiltrada dos erros que já apontamos, e se ela chegasse a suprimir as Congregações Marianas e outras associações, todas dotadas de espírito tradicional, a mentalidade dos inovadores teria dominado inteiramente o laicato católico do Brasil.

7. Publicada a “Bis Saeculari Die”. Desagrado do Cardeal de São Paulo

Em 27 de setembro de 1948 foi publicada por Pio XII a Constituição Apostólica Bis Saeculari Die.

O documento definia tão claramente a situação das Congregações Marianas, que desfazia definitivamente qualquer tentativa progressista de imolá-las em favor da Ação Católica [389].

*   *   *

O texto dessa Constituição chegou até nós por intermédio do Padre Dainese.

E tal foi o nosso entusiasmo, que resolvemos passar, em nome próprio, um telegrama ao Santo Padre, felicitando-o.

Qual não foi a nossa surpresa ao sermos informados, alguns dias depois, que o Cardeal Dom Carlos Carmelo estava enfurecido contra nós.

Por quê? Porque, contra toda a expectativa, Monsenhor Montini havia telegrafado a ele dizendo que Pio XII recebera o nosso telegrama, e solicitava ao Sr. Cardeal que, em nome da Santa Sé, agradecesse aos signatários da mensagem.

O Sr. Cardeal ordenou então que fosse aberto um inquérito para saber quem havia passado telegrama ao Papa em nome da Federação Mariana sem falar com ele. E censurou fortemente o Bispo Auxiliar, Dom Siqueira, por haver deixado ocorrer fato “tão grave” à sua revelia.

Sabendo disso, procurei logo Monsenhor Loureiro e expliquei-lhe que o telegrama havia sido enviado em nosso próprio nome e não em nome da Federação [390].

Tudo elucidado, seria normal que o texto da resposta pontifícia fosse dado a conhecer aos congregados autores do telegrama, entre os quais eu, pois disso o Sr. Cardeal fora incumbido pela Santa Sé. Mas esse texto jamais nos foi comunicado.

O fato, que de si não tem muita importância, entretanto revela de modo expressivo o ambiente em que estávamos vivendo [391].

*   *   *

No domingo seguinte, durante uma Concentração Mariana em Santo André, um congregado mariano ligado a nós citou vários trechos da Bis Saeculari Die.

Novas dificuldades, pois um congregado havia ousado citar um documento pontifício do qual a Cúria ainda não tomara conhecimento.

Demos então, na Federação das Congregações Marianas, uma resposta categórica, afirmando que o Santo Padre tem jurisdição direta sobre todos os fiéis e os documentos pontifícios não precisam do imprimatur da Cúria.

8. A “Bis Saeculari Die” no Congresso Eucarístico de Porto Alegre

Assim que recebemos o texto completo do Osservatore Romano, traduzimo-lo.

Ele foi mimeografado e depois levado para o Sul por Dom Mayer e por Dom Sigaud, e distribuído no V Congresso Eucarístico Nacional de Porto Alegre de 1948. Ninguém lá o conhecia.

Durante esse Congresso, o Bispo de Uberaba, Dom Alexandre do Amaral, fez um discurso em que restringia o sentido da Bis Saeculari Die, dizendo que as Congregações Marianas eram Ação Católica lato sensu e não stricto sensu, desvirtuando desse modo o alcance das palavras do Papa *.

*  Abria campo a esse gênero de desvirtuamento a confusão que pairava sobre o conceito da palavra Ação Católica, confusão esta explicitada por Dom Antonio de Castro Mayer em documento enviado ao Sr. Cardeal Dom Jaime de Barros Câmara, em 19 de março de 1956, a propósito das Conclusões da I Conferencia Geral do Episcopado Latino Americano, realizada no Rio de Janeiro entre 25 de julho e 4 de agosto de 1955. Dom Mayer ponderava que as relações entre a Ação Católica e outras associações com fins e forma de apostolado, como por exemplo as Congregações Marianas, era matéria “inçada de dificuldades decorrentes, em não pequena parte, de servirem as palavras Ação Católica para designar ao mesmo tempo um conceito abstrato (colaboração dos leigos no apostolado hierárquico), e uma das tantas entidades, nas quais se concretiza aquele conceito (a associação chamada ‘Ação Católica’). Daí a facilidade com que qualquer texto referente à Ação Católica se tem prestado a dúvidas de intelecção entre os especialistas”.

Declarava Dom Alexandre do Amaral que aquela Constituição Apostólica nada vinha alterar, mas apenas reafirmar doutrinas já expostas pelo Santo Padre. E portanto se deveria entender que o Papa declarava as Congregações Marianas ação católica no sentido lato, uma vez que enquanto Secretário de Estado este mesmo Papa as distinguira da Ação Católica no sentido estrito.

Portanto — concluía S. Excia. — as Congregações Marianas continuariam como sempre foram, ou seja, meras auxiliares da Ação Católica *.

* Nesse discurso, pronunciado na 2ª sessão solene do V Congresso Eucarístico Nacional realizado em Porto Alegre entre os dias 28 a 31 de outubro de 1948, o Bispo de Uberaba, ante o fato de que suas idéias restritivas a respeito das Congregações Marianas se viam agora desautoradas pela nova Constituição Apostólica, procurava forçar uma interpretação labirintiforme do texto da Bis Saeculari Die, que não contundisse sua posição progressista. E para isso utilizava uma antiga carta escrita pelo Cardeal Pacelli, quando Secretário de Estado de Pio XI, a respeito da Ação Católica, e o próprio texto de Pio XI. Dizia ele: “Ainda agora, no último documento pontifício, a Constituição Apostólica sobre as Congregações Marianas, Sua Santidade fez questão de conservar intata aquela linha de delimitação da A.C. em face das suas venerandas e preciosas auxiliares, que ele mesmo estabelecia quando, em carta luminosa, explicava o discurso incisivo de Pio XI de 30/3/30. Pio XII era então Secretário de Estado de Pio XI. Este discurso e esta carta permanecem plenamente em vigor”. E, tentando minimizar o alcance da Bis saeculari, afirmava: “Não se pode negar às Congregações Marianas, como às demais associações que se entregam ao apostolado social, ‘característica alguma das que distinguem a A.C.’, enquanto se considera, em sentido lato, na definição mais descritiva de Pio XI: ‘o apostolado dos fiéis que se põem a serviço da Igreja e de certo modo a ajudam a cumprir seu ministério’” (Transcrição datilografada enviada a Dr. Plinio pelo Padre Walter Hofer, SJ, professor e, entre 1951-1954, diretor do Colégio Anchieta de Porto Alegre).

9. Concentração mariana paralela ao Congresso Eucarístico. Discurso de Dom Sigaud

Acontece que os congregados marianos haviam organizado, durante o mesmo Congresso Eucarístico, uma Concentração Mariana no Teatro São Pedro de Porto Alegre, à qual compareceram Dom Sigaud, Dom Mayer e cerca de trinta outros Bispos, dos setenta que estavam na cidade [392].

Era de esperar que, após a Bis Saeculari Die, os Srs. Bispos procurassem aproveitar a ocasião e mostrar apoio a um movimento tão do agrado do Romano Pontífice. Nada disso! Ambos os Srs. Cardeais — tanto o do Rio como o de São Paulo — estiveram ausentes. E o próprio Arcebispo de Porto Alegre lá não apareceu [393].

Durante a sessão, Dom Sigaud fez um discurso em que leu vários trechos da Bis Saeculari Die, com comentários sustentando a perfeita equiparação entre as Congregações Marianas e a Ação Católica. Terminou sugerindo aos congregados marianos que passassem telegrama ao Santo Padre agradecendo o documento.

Vários Bispos presentes abandonaram o recinto enquanto Dom Sigaud falava. Mas nos meios marianos o discurso causou intenso júbilo *.

* Esse discurso de Dom Sigaud, pronunciado no dia 30 de outubro de 1948, repercutiu cerca de um mês depois em Roma, recebendo menção elogiosa no Osservatore Romano, edição de 6 e 7 de dezembro do mesmo ano:

“S. Excia. Monsenhor Geraldo de Proença Sigaud, Arcebispo de Jacarezinho, pronunciou um inspirado discurso comentando a recente Constituição Apostólica ‘Bis saeculari’ sobre as Congregações Marianas, que, por sua exatidão e fidelidade no interpretar a letra e o espírito do documento pontifício, merece ser por nós referido”.

*   *   *

Logo depois do discurso de Dom Sigaud, Dr. Paulo Barros de Ulhôa Cintra e Dr. José Fernando de Camargo, presentes em Porto Alegre, procuraram a redação do Jornal do Dia e conseguiram a publicação das teses aprovadas na Concentração Mariana * [394].

* De fato, no dia seguinte, 31/10/48, o jornal publicou um resumo fidedigno desse discurso. E registrou a presença de 35 Bispos, sob a presidência do Sr. Arcebispo Primaz da Bahia, o qual quis prestigiar o evento. O jornal destacava também o trecho no qual Dom Sigaud dizia que “Sua Santidade o Papa gloriosamente reinante declara que as Congregações Marianas devem ser tidas na mesma categoria que as demais associações aplicadas à finalidade apostólica, e define de ‘pleno jure’, isto é, de pleno direito [que] são as Congregações Marianas verdadeira e legítima ação católica”. E transcreveu a lista de teses das Conclusões apresentadas por Dom Sigaud e aclamadas com prolongada salva de palmas, texto este que seria distribuído depois a todas as Federações de Congregações Marianas do Brasil “para fiel e cabal cumprimento da Constituição Apostólica”.

*   *   *

Depois dessa divulgação, a reação contra o discurso de Dom Sigaud foi vivíssima.

O Sr. Arcebispo de Porto Alegre, Dom Vicente Scherer, proibiu sua divulgação na imprensa católica* [395].

* Esta informação havia chegado a Dom Mayer através de carta do Padre Antonio Loebmann, SJ, reitor do Seminário Central de São Leopoldo, em que este dizia:

“Não sei se V. Exc. já sabe que o Arcebispo de Porto Alegre proibiu a publicação da conferência de Dom Geraldo Sigaud em jornal, como também se expressou aborrecido com a publicação das Conclusões da Concentração Mariana” (doc. cit., de 3/12/48).

E em carta a Dom Sigaud, datada de 3 de novembro de 1948, esse mesmo sacerdote narra detalhes pasmosos da meticulosa proibição:

“Hoje de manhã (4ª f) o Sr. Arcebispo de Porto Alegre visitou o nosso pobre Padre Jorge Sedelmayer, doente no hospital, Diretor da Federação das CC MM [Congregações Marianas], não para lhe agradecer o bom termo e a vibrante concentração Mariana, mas para deixar o seu enérgico protesto contra dita concentração, proibindo terminantemente a publicação de coisa alguma, aqui em Porto Alegre, sobre a nossa concentração, em particular proibiu a publicação do comentário de V. Exc. Revma. sobre a Constituição pontifícia, como também a oração do Senador Apolônio Sales como sendo cantos inconvenientes e provocantes de uma vitória obtida!! Diz ele ter sido uma Providência [sic] não ter estado presente na dita concentração, porque ele teria protestado contra a oração de V. Exc.... Também a publicação das conclusões ele teria impedido se tivesse sabido delas...” (grifos do original).

Por iniciativa do Padre Leme Lopes, jesuíta e professor na PUC do Rio, o Jornal do Commercio publicou (em 6/11/48) o texto completo do discurso de Dom Sigaud.

O Sr. Cardeal Dom Jaime Câmara manifestou-se profundamente desgostoso com o que se passara. Acrescentou que, embora não censurasse a substância do discurso de Dom Sigaud, notara nele alusões ao “caso de São Paulo”, o que, segundo ele, podia desedificar, dando a idéia de que havia uma cisão no Episcopado.

O fato concreto era que, observando-se as atitudes dos dois Cardeais e de Dom Scherer, notava-se nelas um traço comum fundamental: o desejo de abafar o discurso de Dom Sigaud, e o de afirmar a coesão do Episcopado.

Eles pareciam não ter conseguido definir bem a situação criada pelo discurso de Dom Sigaud, e a linha de conduta que deviam seguir. Daí uma atitude de contemporização e de vacilação, quer em São Paulo quer no Rio. A posição tomada por eles parecia ser de expectativa, limitando-se a comentar o menos possível o assunto, e abafar tudo.

Tanto é que, na reunião do clero o Sr. Cardeal não disse uma palavra sobre a Constituição, limitando-se a ler um documento pontifício do ano anterior, sobre os homens da Ação Católica, acrescentando que “cumprir as diretrizes deste documento, isto sim, é obedecer ao Papa”. E ficou nisto [396].

10. Artigo e discurso de Dom Mayer

No mês seguinte, novembro de 1948, foi a vez de Dom Mayer entrar em cena.

No dia 22 saiu um artigo dele para o Santos Jornal, em que, à luz da Bis Saeculari Die, firmava diversos conceitos que permaneciam mais ou menos obscuros nos tratadistas da Ação Católica.

Em 19 dezembro, fez ele um momentoso discurso no interior de São Paulo, durante uma concentração mariana em Piracicaba: analisou detalhadamente a Bis Saeculari Die, impugnou as interpretações incorretas que circulavam sobre o documento e ao mesmo tempo pôs em evidência todo o enorme alcance daquela Constituição Apostólica [397].

O discurso agradou tanto que foi objeto de publicação em Roma pelo Boletim Acies Ordinata, do Secretariado Mundial das Congregações Marianas. No Brasil, foi publicado pelo Jornal do Commercio do Rio, edição de 19 de abril de 1949, o que despertou viva repercussão* [398].

* Dom Mayer recebeu cartas elogiosas de Bispos, sacerdotes e leigos de todo o Brasil, que o cumprimentavam pela clareza do discurso e coragem de o fazer. Padre Arlindo Vieira, por exemplo, dizia que “os argumentos apresentados por V. Exc. são irrespondíveis, embora não hajam de persuadir aqueles que interpretam a seu modo a palavra do Papa” (Carta de 2/5/49).

*   *   *

Pouco tempo depois, veio a réplica do Cardeal de São Paulo, Dom Carlos Carmelo, que publicou uma Carta Pastoral na qual procurava refutar os pronunciamentos dos dois Bispos, citando ad verbum o de Dom Sigaud em Porto Alegre e in genere o de Dom Mayer *.

* Frei Batista Blenke, sacerdote carmelitano muito amigo do grupo do Legionário e que na época estava em Roma, na Casa Generalícia da Ordem do Carmo, escreveu a Dom Mayer em abril de 1950, contando o seguinte:

“V. Exc.ia pode ficar tranqüilo. Parece que esta vossa atitude foi comunicada ao S. Padre. O S. Padre está ao par das cousas brasileiras; disseram-lhe que houve alguma dúvida a respeito da ‘Bis Saeculari’; ele respondeu (admirado): ‘mas como é: eu falei com tanta clareza!’

“Porém seria muito oportuno se V. Exc.ia e Dom Sigaud viessem a Roma e falassem claramente e explicassem tudo ao S. Padre (assim falou Padre Danti S.J.). Pois o Papa gosta de ouvir os Snrs. Bispos e toma nota do que dizem. Também houve boas referências a respeito de vossa atitude; parece que o Srn. Núncio escreveu neste sentido também a S. Santidade” (Carta de Frei Batista Blenke a Dom Mayer, 12/4/50).

11. A questão da tradução da “Bis Saeculari Die”

Novo problema na Federação Mariana.

Como éramos membros da diretoria da Federação Mariana de São Paulo, julgamos de nosso dever dar divulgação à Bis Saeculari Die.

Então alguns dos nossos distribuíram em folhas mimeografadas a tradução de alguns tópicos do documento.

O presidente da Federação, Dr. José Amadei, repreendeu-os por isto, alegando que deveríamos ter antes pedido licença à Autoridade eclesiástica local para fazê-lo* [399].

* Dom Antonio Alves de Siqueira, designado em 1948 pelo Sr. Cardeal de São Paulo para substituir os jesuítas na direção da Federação das Congregações Marianas, e o Padre Boaventura Cantarelli, sacerdote salvatoriano que era seu braço direito, afirmaram que a tradução continha erros, e que ouviram no Palácio São Luís a informação de que a publicação tinha sido feita como um acinte a Sua Eminência (cfr. Palestra sobre Memórias (X) 15/8/54).

Ao mesmo tempo, pessoas chegadas ao palácio cardinalício avisavam à diretoria da Federação Mariana que era preciso ter muito cuidado na divulgação do documento pontifício, porque “estava fazendo sofrer nosso Cardeal” (cfr. Memorando para o Cônego Antonio Leme Machado, data provável 1948).

*   *   *

Pouco depois, outro incidente.

Quando levantamos a necessidade de publicar no Boletim da Federação a íntegra do documento pontifício, houve da parte do presidente da Federação má vontade e protelações, que seria longo narrar aqui.

Foi mesmo necessário que um membro da diretoria lembrasse ao presidente que incorriam em excomunhão, pelo Código de Direito Canônico, as pessoas que impedissem a difusão dos documentos pontifícios [400].

Vencidas essas dificuldades, foi impresso por fim, no número de outubro de 1948, o texto latino da Constituição Apostólica com a respectiva tradução portuguesa, feita de modo muito fiel pelo Padre Augusto Magne S.J., um conhecido latinista [401].

A edição foi avidamente recebida pelos congregados marianos, e se esgotou logo.

*   *   *

Fez-se então uma segunda edição.

Estava ela sendo distribuída quando o presidente da Federação, em reunião da diretoria, declarou que o Padre Enzo Gusso, enquanto secretário do Sr. Cardeal, lhe transmitira ordem para suspender essa edição [402], mandando recolher todos os exemplares que traziam a nossa tradução, porque o Sr. Cardeal iria publicar um texto oficial [403].

Pouco depois, o mesmo Padre Enzo Gusso enviou, para ser publicada em terceira edição, uma tradução substancialmente idêntica à primeira, exceto num ponto absolutamente capital, este adulterado [404].

A alteração era a seguinte.

O texto latino, oficial, afirmava, em síntese, que, como as Congregações Marianas são reconhecidas pelos sagrados pastores, são Ação Católica.

Já o texto adulterado dizia que as CC.MM. são Ação Católica “desde que sejam recebidas nas fileiras da milícia apostólica pela Hierarquia Eclesiástica e dela dependam em iniciar e realizar os trabalhos de apostolado”.

Essa tradução transferia jeitosamente aos Bispos o poder de reconhecer ou não as Congregações Marianas como Ação Católica [405]

Os Congregados recusaram-se a divulgar esta versão com o sentido tão gravemente adulterado.

Dr. José Fernando de Camargo apresentou então ao Padre Boaventura Cantarelli o nosso texto em português da Bis Saeculari Die. Este o entregou a Dom Siqueira para apreciação.

Dom Siqueira, de posse das traduções — a oficial da Arquidiocese, adulterada, e a nossa, equivalente à da Poliglota Vaticana [406] — disse que considerava certa a nossa tradução publicada pelo boletim da Federação das Congregações Marianas. Mas que, “em homenagem ao Sr. Cardeal”, aceitássemos colocar, na terceira edição, a que ele estava mandando. E acabou exigindo que fosse publicada tal qual [407]. E essa versão, com o sentido adulterado*, nunca foi retirada de circulação no Brasil [408].

* Uma curiosidade. No site do Vaticano (vatican.va) por nós recentemente consultado, aparecem em latim todas as constituições apostólicas emanadas durante o pontificado de Pio XII, e também as traduções em algumas línguas, em geral feitas pelo departamento competente da Cúria Romana. Da Bis Saeculari Die, a única tradução existente é... para o português! Isto parece indicar que essa Constituição Apostólica tinha especial interesse para o Brasil. O que, por sua vez, mostra como a Santa Sé acompanhava com atenção a polêmica que aqui se travava a respeito do tema.

*   *   *

Esses embates nas reuniões da diretoria da Federação Mariana de São Paulo foram tão comprometedores para os adversários da Bis Saeculari Die, que eles fizeram desaparecer por muito tempo o livro das atas, pelo que foi impossível registrar metodicamente as ocorrências durante as reuniões.

Sob pretexto de brevidade, fez-se uma ata sumária relativa ao período em que o livro estivera “perdido”. Essa ata “sumária” omitia tudo quanto pudesse prejudicar os inovadores, e era tão tendenciosamente redigida que acabou não sendo aprovada pela diretoria [409].

12. Comissão Episcopal se arroga o privilégio de interpretar os documentos pontifícios

Outro fato significativo.

Pouco depois do V Congresso Eucarístico de Porto Alegre, a Comissão Episcopal de Ação Católica, composta pelos Srs. Cardeais Dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta e Dom Jaime de Barros Câmara, pelos Srs. Arcebispos Dom Augusto Álvaro da Silva, de Salvador e Dom Antonio dos Santos Cabral, de Belo Horizonte, e pelo Sr. Bispo Dom João da Matha de Andrade Amaral, de Niterói, fez publicar um edital, datado de 3 de novembro de 1948, dizendo que a interpretação dos documentos pontifícios cabia apenas àquela Comissão *.

* Era uma afirmação de suma gravidade, pois a Comissão Episcopal extrapolava de seu papel ao chamar a si a interpretação de um documento pontifício. Além do mais, ela não tinha nenhum poder legislativo sobre os Bispos e só podia falar em nome deles para todo o Brasil com o assentimento unânime de todos e de cada um dos Bispos brasileiros.

No comunicado oficial está dito que a Comissão Episcopal da A.C. “determina” [sic!] oficialmente ao Episcopado que, “para salvar a unidade de orientação, ela “se reserva, naquilo que se refira ao apostolado externo, a interpretação oficial da ‘Bis Saeculari Die’ no âmbito nacional”. Assinava pela Comissão Episcopal da A.C.B. o seu secretário, Dom João da Matha de Andrade Amaral, Bispo de Niteroi.

A repercussão desse documento em certos círculos vaticanos parece não ter sido nada boa, a se julgar pelas informações do seminarista Amaury Castanho, futuro Bispo de Valença (RJ) e depois de Jundiaí (SP), então estudante no Pio Brasileiro.

Dizia ele numa carta de 17/2/50 para um destinatário ignoto: “Depois das dissensões surgidas por causa daquele item da Comissão Episcopal da A.C. que se reservava o direito de interpretar a Carta Apostólica do Santo Padre, Dom Jorge [Marcos de Oliveira] ficou encarregado de consultar a Santa Sé sobre o que se deveria fazer entre nós. Lá por agosto do ano passado a resposta seguiu para o Brasil. A respeito do teor da resposta, somente se conseguiu saber por aqui que ‘è stata favorevolissima alle Congregazioni’ [‘foi favorabilíssima às Congregações Marianas’]. [...] Houve conveniência em não divulgar no Brasil a resposta da Santa Sé? Parece que houve pelos seguintes motivos: 1) a solução ou carta mandada por Roma foi só para o Episcopado. 2) Não terá sido favorável à ala oposicionista [à Carta Apostólica] e pois estava fadada, a tal resposta, ao arquivo. [...] Dentro do mesmo assunto Dom Jaime, quando esteve em Roma quis tirar as coisas a limpo. Pediu soluções às dificuldades que tinha ao Sr. Cardeal Pizzardo, que praticamente não respondeu por si a Sua Eminência. Foi quando Dom Jaime interrogou diretamente o Santo Padre. Ele, o Santo Padre, respondeu simplesmente ao Sr. Cardeal, nós só fomos informados disso por Dom Jaime (!), que ‘Soltanto il Papa ha il diritto di interpretare la Lettera Apostolica’ [‘somente o Santo Padre tem direito a interpretar a Carta Apostólica’]. Conseguintemente, aquele item da Comissão Episcopal foi prematuro. Aliás, há bem uns anos que o Código [de Direito Canônico] não deixava dúvida sobre quem pode interpretar um documento pontifício!!!”

Tomando conhecimento dessa circular da Comissão Episcopal, Dom Mayer e Dom Sigaud enviaram, cada um por seu turno, uma carta* ao secretário Dom João da Matha de Andrade Amaral, em que sustentavam não ter a Comissão Episcopal o poder de impor determinada interpretação dos documentos pontifícios: somente o Papa podia fazê-lo.

*  Na carta de Dom Mayer, datada de 18 fevereiro de 1949, ele afirmava:

Diz essa DD. Comissão Episcopal que se reserva a ‘interpretação oficial’ da Constituição Apostólica no plano nacional. Com toda a reverência, permita, Sr. Bispo, que declare que não posso reconhecer à Veneranda Comissão Episcopal o direito de ‘interpretar oficialmente’ a palavra do Santo Padre. A interpretação autêntica da palavra pontifícia só à Santa Sé pertence. [...]

“Como é bem evidente, os dois princípios que dominam o assunto são: a) a suprema, inteira e direta jurisdição do Santo Padre sobre cada Bispo e cada fiel; b) a autonomia do Bispo em sua diocese — ressalvadas as disposições canônicas com relação ao Metropolita — no governo de sua grei com relação aos poderes que não sejam do Santo Padre, e o conjunto de organismos que constituem a Santa Sé e que, sob dependência do Sumo Pontífice, constituem o governo da Igreja.

“Do primeiro princípio decorre, como já lembrei, que, em tudo que se relaciona com atos do magistério ou governo supremo da Igreja, a situação da Comissão Episcopal é, como a de qualquer Bispo, meramente obediencial. Não pode nem sequer interpretar autenticamente a palavra do Pontífice.

“Mas — e passo para o segundo princípio — esta função obediencial não se exerce sobre os Bispos e fiéis a título governativo. Em outros termos, não compete à Comissão Episcopal dar ordem aos bispos no que diz respeito ao cumprimento de determinações emanadas da Santa Sé”.

13. Resultado do esforço: a “Bis Saeculari Die” ficou conhecida no Brasil

Narro ainda um último episódio.

Em 1950, quando estive em Roma, apresentei as provas das resistências e manobras dos que procuravam cercear os efeitos do documento papal, e Dom Mayer apresentou um relatório oficial como Bispo.

No ano seguinte, quando Dom Sigaud por seu turno ia partir em viagem a Roma, de passagem pela Nunciatura no Rio, ouviu o seguinte do Sr. Núncio, na época Dom Carlo Chiarlo:

— V. Excia. vai a Roma? Muitos brasileiros têm ido lá entregar uns pedacinhos de papel à Secretaria de Estado. E, por causa disso, eu recebi recentemente a maior repreensão de minha vida diplomática. Eu não posso compreender porque mandam esses recortes para Roma e não me entregam aqui. Para que levar a Roma?

Dom Sigaud ouviu, despediu-se e tudo ficou em ordem *.

* Mal sabia o Sr. Núncio que Dom Sigaud não estava levando apenas “uns pedacinhos de papel” a Roma, mas um substancioso relatório de 123 páginas datilografadas, para cuja elaboração teve a ampla colaboração de Dr. Plinio. A data desse relatório é 10 de junho de 1951.

*   *   *

Assim, com todos esses esforços, foi possível evitar que a Bis Saeculari Die não fosse conhecida no Brasil.

Mas também ficou patente a luta que houve para se conseguir publicar aqui um documento pontifício [410].

Capítulo XV

Santa Sé elogia o “Em Defesa”

1. Boicote do Cônego Enzo Gusso a um recado da Santa Sé?

Anos antes de eu receber da Santa Sé a carta de elogio ao meu livro, havia acontecido um fato muito grave.

O Padre Veloso [411] comunicou-me que havia recebido uma carta do Padre Castro e Costa, meu antigo professor no Colégio São Luís, muito sentido comigo por eu não ter respondido a uma carta muito importante que ele havia me enviado por intermédio do Cônego Enzo Gusso, que acompanhara o Cardeal Motta à Europa [412].

Padre Costa e eu éramos muito amigos, e sempre conservamos boas relações. Ele se tornou ardente protetor do meu livro em Roma [413].

Escrevi então ao Padre Costa*, dizendo que não havia recebido a carta que ele entregara em confiança ao Cônego Enzo Gusso.

* No post scriptum dessa carta ao Padre João de Castro e Costa, SJ, diz Dr. Plinio: “Relendo a carta, vejo que omiti o seguinte: Padre Enzo disse ao Padre Veloso que reconhece haver recebido do Sr. a dita carta, que, chegando a São Paulo, ele pôs no correio, com endereço a mim! Esta carta não me chegou às mãos, como o Sr. vê” (Carta ao Padre João de Castro e Costa, SJ, 7/8/46).

Padre Costa enviou-me então uma outra carta do mesmo teor, na qual ele me dizia que Monsenhor Lombardi, então encarregado dos assuntos brasileiros na Secretaria de Estado, mandava dizer-me que meu livro havia sido examinado pela Secretaria de Estado e considerado rigorosamente ortodoxo. Dizia também que [414] não iria mandar uma carta da Secretaria de Estado, pois isso iria melindrar o Sr. Cardeal Arcebispo de São Paulo e outros prelados. O Padre Costa, além disso, pediu-me a mais estrita reserva sobre as informações que estava fornecendo [415]: não deviam ser publicadas, e eram dadas só para a tranqüilidade de minha consciência. E que esperava da minha discrição que eu nada dissesse.

*   *   *

Por coincidência, no mesmo dia em que eu recebi a nova carta do Padre Costa, encontrei-me com o Cônego Enzo Gusso na rua. Perguntei-lhe então se não havia recebido uma carta do Padre Costa para me entregar.

Muito atrapalhado, ele disse que recebera sim, e que havia colocado um selo nela e posto no correio, endereçando-a a mim aqui em São Paulo.

Eu disse:

— Mas o senhor recebe uma carta em Roma para trazer a mim e a põe no correio de São Paulo?

Ele:

— Eu não tenho obrigação de levar carta em sua casa.

— Realmente, e eu não discuto isto: bastaria o senhor me telefonar, que eu a mandaria buscar.

— É, eu não tive essa idéia.

— Porque a carta extraviou-se... Extraviou-se, mas eu recebi cópia.

Naturalmente, logo depois seguiu um relatório para Roma, contando o sucedido.

2. Conversa com o provincial dos jesuítas. Nossos documentos chegavam à Santa Sé

Alguns dias antes [416] de ter eu recebido a carta de aprovação de meu livro, ainda em março de 1949, fui chamado pelo Padre Arturo Alonso, provincial dos jesuítas [417].

Para se saber que orientação tinha este Padre Arturo Alonso, basta dizer que os Padres César Dainese e Arlindo Vieira haviam sido destinados por ele a cargos em que automaticamente ficavam afastados de mim e do grupo do ex-Legionário [418].

Ele havia chegado há pouco de Roma e o encontrei acamado, com a perna fraturada. Ele me disse:

Não adianta continuar a cutucar a Santa Sé com os sucessivos relatórios que manda para Roma, visando crucificar este pobre Provincial da Companhia [419].

E abrindo teatralmente os braços em forma de cruz, disse:

— Eu vi os seus relatórios na mesa do Papa.

Para mim, ouvir aquilo foi interiormente um júbilo.

Ele continuou:

— Sei que o senhor quer a aprovação do seu livro. Não insista, pois a Santa Sé nunca jamais aprovará o seu livro. Está preparado um golpe da Santa Sé a favor das Congregações Marianas. Se o senhor soubesse de que natureza é, o senhor iria ficar muito contente. Mas esse golpe não acarretará a aprovação de seu livro [420].

Depois explicou:

— A atitude que os jesuítas têm tomado, de não mover nenhuma luta, tem explicações transcendentais que eu não posso dar ao senhor. E por isto não adianta o senhor me apontar nos seus relatórios como homem que atraiçoa a Igreja.

Eu respondi:

— Padre Alonso, eu não tenho autoridade para dizer-lhe o que eu penso a seu respeito. O senhor não é meu súdito. Mas, uma vez que o senhor foi ler cartas dirigidas a quem eu tenho, segundo o Código de Direito Canônico, o direito de me dirigir, eu devo dizer que, o que o senhor leu lá, é exatamente o que eu penso a seu respeito.

— Então, o velho Plinio é sempre o mesmo, inflexível contra mim?

— Enquanto o senhor for inflexível nessa atitude de flexibilidade para com o erro, eu serei inflexível contra o senhor [421].

— E o senhor acha que o senhor foi justo comigo?

— Padre, eu pergunto ao senhor: nesses relatórios há algum argumento que seja falso? Algum fato que seja errado? Alguma coisa que não esteja bem raciocinada? Se houver, estou disposto a dar a mão à palmatória. Mas, “amicus Plato, sed magis amica veritas” — “Platão pode ser nosso amigo, mas a verdade é mais nossa amiga do que Platão”. Quer dizer, o senhor pode ser meu amigo, mas eu sou mais amigo da verdade do que do senhor.

— É, Dr. Plinio, nem tudo é lógica, muita coisa na vida é coração.

— Padre, é exatamente com o que eu não estou de acordo. O coração contra a lógica não vale nada. Um coração contra a lógica é um coração torto e errado. Ou é lógica ou é nada [422].

— O senhor não enxerga que a gente deve se contentar com o mal menor, quando não se pode conseguir tudo? Os golpes que o senhor quer dar nos adversários nunca surtirão bons resultados. O senhor quer o impossível.

E por aí foi a conversa, muito longa, mais de uma hora. Mas achei muito esquisita a insistência dele de sempre me recomendar que não insistisse pela aprovação de meu livro [423].

Nunca mais vi esse homem. Mas fiquei encantado de ver que o conduto por onde enviávamos nossos documentos a Roma funcionava e que Pio XII tinha mandado chamá-lo para apertar [424].

3. Em nome de Pio XII, carta de louvor de Monsenhor Montini

Um belo dia [425], lá pelo mês de março de 1949, Frei Jerônimo Van Hinten, um carmelita que tinha se aproximado de nós em 1946 ou 1947, portanto no período da desgraça, telefonou-me [426] na hora do almoço dizendo o seguinte:

— Recebi uma carta vinda de Roma dirigida ao senhor. É da Secretaria do Estado da Santa Sé, mas está fechada. O senhor quer que faça o quê?

— Abra e leia a carta.

Ele leu e era uma carta de aprovação da Santa Sé ao livro Em Defesa da Ação Católica. Uma carta oficial em latim, assinada por Monsenhor João Baptista Montini, que dirigia então a Secretaria de Estado.

Eu caí de várias nuvens e disse a ele:

— Frei Jerônimo, isso é fantástico! [427]

Eis seu texto em português:

Palácio do Vaticano, 26 de fevereiro de 1949

Preclaro Senhor,

Levado por tua dedicação e piedade filial ofereceste ao Santo Padre o livro “Em Defesa da Ação Católica”, em cujo trabalho revelaste aprimorado cuidado e aturada diligência.

Sua Santidade regozija-se contigo porque explanaste e defendeste com penetração e clareza a Ação Católica, da qual possuis um conhecimento completo, e a qual tens em grande apreço, de tal modo que se tornou claro para todos quão oportuno é estudar e promover tal forma auxiliar do apostolado hierárquico.

O Augusto Pontífice de todo o coração faz votos que deste teu trabalho resultem ricos e sazonados frutos, e colhas não pequenas nem poucas consolações.

E como penhor de que assim seja, te concede a Bênção Apostólica.

Entrementes, com a devida consideração me declaro teu muito devotado

(a) J. B. MONTINI

Subst.*

* Esta carta da Santa Sé, com o timbre da Secretaria de Estado, chegou às mãos de Dr. Plinio acompanhada de uma outra carta de Frei Batista Blenke, em que este explicava porque havia mandado a correspondência através de seu irmão de hábito, Frei Jerônimo (Frei Batista tinha sido o primeiro pároco da igreja, depois Basílica, de Nossa Senhora do Carmo da rua Martiniano de Carvalho, em São Paulo, e posteriormente Procurador Geral da Ordem em Roma).

Em sua carta a Dr. Plinio, Frei Batista dizia: “Tenho o prazer de passar às suas mãos a carta que o Santo Padre lhe manda por intermédio do Monsenhor Montini. Peço desculpa por mandá-la por este caminho [através de Frei Jerônimo]; porque o endereço ut supra seja talvez errado, achei mais prudente enviá-la ao convento do Carmo. Conforme ao seu pedido, tentei obter a opinião do Santo Ofício, mas não foi possível, porque este Dicastério não costuma manifestar-se nesse sentido. Faço votos que a bênção do Santo Padre seja um estímulo para continuar seus trabalhos com o intuito de fazer Cristo sempre mais e mais conhecido e amado no Brasil” (carta de Frei Batista Blenke a Dr. Plinio, de 4/3/49)

Por uma carta anterior do mesmo Frei Batista a Frei Jerônimo, datada de 21 de fevereiro de 1949, constatamos que, se Frei Batista não foi o único a fazer chegar o livro Em Defesa à Secretaria de Estado, foi pelo menos um dos que o encaminharam àquela alta Secretaria, e o que teve o encargo de transmitir a aprovação da Santa Sé a Dr. Plinio.

Na referida carta de Frei Batista, ele diz a Frei Jerônimo: “Escrevi-lhe a respeito do livro ‘Em Defesa da Ação Católica’. Dr. Plinio me pediu no ano passado mandar o livro para o Santo Ofício e ver se havia possibilidade de obter a opinião do mesmo Dicastério. Fiz alguma coisa nesse sentido, mas não foi possível; na mesma ocasião o Sr. Plinio me disse que já tinha mandado antes o livro ao Padre Costa S.J., que está no Colégio Brasileiro em Roma, para oferecê-lo ao Santo Padre e ver se havia possibilidade de obter alguma coisa neste sentido; porém o mesmo Padre Costa não havia dado resposta. Eu por mim pensava que fossem talvez motivo de ordem por assim dizer ‘diplomática’ que o livro não foi introduzido na Secretaria de Estado, pois, como sabemos, no Brasil não faltaram as ‘críticas’. Portanto não quis imediatamente fazer alguma coisa neste sentido, pois nestas coisas precisamos de usar da maior prudência. Tomei diversas informações etc. Agora está assim: o livro já está na Secretaria de Estado; eu espero qualquer resposta. Se vier uma resposta, i. é, uma carta, mandarei ao Sr. [...] Infelizmente não pude oferecer o livro na sua própria forma: deveria ser encadernado com couro branco, e com a inscrição em letras douradas; não sabia disso. [...] Naturalmente suponho que venha qualquer resposta da Secretaria de Estado”.

Significativa também é a carta de agradecimento que Dr. Plinio enviou a Frei Batista, da qual destacamos o seguinte trecho: “Tudo isto me leva, prezado Frei Batista, a sentir o mais comovido reconhecimento pela amizade com que V. Revma. me prestou seu valiosíssimo e decisivo auxílio neste passo importante de nosso apostolado. Todos os meus amigos do ‘ex-Legionário’ e muito particularmente Dom Mayer e Dom Sigaud participam comigo, intensamente, desse reconhecimento. Vejo um requinte de bondade de Nossa Senhora no fato de tão grande graça haver chegado a mim, modesto noviço carmelita da Ordem Terceira, pela única e direta interferência do Procurador de nossa Ordem” (carta sem data conhecida, provavelmente de março de 1949).

Curiosa é a carta dirigida a Dr. Plinio por Monsenhor Pascoal Gomes Librelotto (1901-1967), Major Capelão do 1º Grupo de Caça e da FEB, e também 1º Capelão da FAB (cfr. http://www.sentandoapua.com.br).

Nesta carta, ele narra a audiência privada que teve durante mais de uma hora com Pio XII, na qual falou-se sobre o livro Em Defesa da Ação Católica:

“Em 1944 segui para a guerra como Ten. Cel. Capelão Chefe da FAB, e a pedido do Santo Padre fiz um Relatório sobre a situação da religião no Brasil em 19 páginas papel almaço à máquina, que apresentei aos 21 de Março de 1945 em audiência privada que durou mais de hora.

“Escrevi um Capítulo inteiro sobre o tema: - Como eu entendo a Ação Católica — que o Santo Padre aprovou com estas palavras: - ‘È proprio così’ [‘É exatamente isto’]. — No Relatório fiz um apelo ao Santo Padre mandasse examinar o seu livro e o do Padre Cândido Santini S.J., e, caso houvesse neles algo menos certo, fossem disso notificados os autores que certamente fariam a correção.

“Disse, e por escrito, que uns condenavam como falso o seu livro, outros silenciavam e outros o aprovavam e aplaudiam, e que eu, pertencendo aos últimos, o achava ótimo, digno de ser conhecido” (carta de 18/5/49).

Em carta a Dr. Plinio (7/9/46), o Padre João de Castro e Costa conta que Monsenhor Librelotto o havia alertado sobre rumores de que o livro Em Defesa seria condenado pela Comissão Episcopal da Ação Católica brasileira.

Desta vez, tudo se tornava cristalino. Pio XII louvava e recomendava o livro do kamikaze [428].

Era um triunfo enorme. Um triunfo que deixava muito mal os nossos adversários, sobretudo o Arcebispo de São Paulo, Cardeal Dom Carlos Carmelo.

Eu nem almocei. Fui diretamente de automóvel pegar a carta no Convento do Carmo [429].

Fiquei evidentemente muito contente, senti um alívio como se uma série de pressões que se exerciam contra mim se descomprimissem [430].

Na sede, fizemos em conjunto grandes orações a Nossa Senhora, para agradecer a Ela este imenso favor.

E naquela mesma noite organizei um jantar para os meus companheiros de luta, num dos melhores restaurantes de São Paulo.

*   *   *

No dia seguinte, a primeira providência foi redigir uma notícia a respeito. E a distribuímos a todos os jornais de São Paulo.

Dois ou três publicaram a notícia, dando um resumo da carta. Era o que podíamos fazer como publicidade. Mas foi uma bomba! Ninguém imaginava isso [431].

Mandei também uma carta muito respeitosa ao Cardeal, através de Monsenhor Loureiro, comunicando o recebimento do documento da Santa Sé, e colocando-me inteiramente à disposição dele como o menor dos servidores. Carta esta que ficou sem resposta [432].

Por fim, enviei a Monsenhor Montini a seguinte carta:

“São Paulo, 19 de março de 1949

“Excelência Reverendíssima,

“Apresentando-vos minhas homenagens muito sinceras, eu vos agradeço a carta que Vossa Excelência Reverendíssima me fez a honra de escrever, ao transmitir os augustos sentimentos de benevolência do Santo Padre em relação ao meu livro ‘Em Defesa da Ação Católica’.

“Compus este meu trabalho com o único desejo de tornar conhecidas as sábias diretivas da Santa Sé no assunto Ação Católica, e de as defender contra as interpretações verdadeiramente perigosas. Nada, pois, pode me tocar mais profundamente do que saber que meu livro foi honrado pela augusta aprovação do Soberano Pontífice.

“Suplico a Vossa Reverendíssima de ter a condescendência de depositar aos pés do Vigário de Jesus Cristo meus sentimentos do mais humilde e do mais filial reconhecimento.

“Possa Deus conceder-me a graça de servir ao Santo Padre em todos os instantes de minha vida, e de derramar meu sangue por Ele, se a ocasião se apresentar.

“Conto, para isto, com as preces de Vossa Excelência Reverendíssima, e aproveito a ocasião para vos apresentar, Monsenhor, os protestos de minha respeitosa consideração.

“De Vossa Excelência Reverendíssima, o

“mais devotado em Nosso Senhor” etc. [433].

 

4. “Quem é de Deus, una-se a nós”

Nossa situação começou assim a se recompor, e um problema pôs-se para nós.

Percebia-se que uma multidão de católicos continuava a não ter a mínima idéia da crise medonha que lavrava dentro da Igreja e, portanto, não estava acumpliciada com essa crise.

Se nós de algum modo tivéssemos possibilidade de agir, ainda poderíamos salvar uma boa parte desse contingente. E aos que eu chamaria de católicos intermediários, poderíamos fazer o convite de São Luís Maria Grignion de Montfort: Quem é de Deus, una-se a nós! [434]

Agora, como fazer isto?

Um dos primeiros passos foi dar uma clarinada, para fazer entender a esse público que todos os ideais defendidos e sustentados no Em Defesa da Ação Católica continuavam de pé. E que aquela corrente que se reunia em torno do livro, já agora em novas fortificações, oferecia um reinício de batalha.

Para isto, foram adotadas algumas medidas.

5. Carta de Dr. Ablas ao Padre Helder Câmara

Uma importante providência que tomamos foi uma declaração de guerra ao lado progressista, para que este sentisse que a batalha havia recomeçado, pois cortava-lhe espaços. Consistiu no seguinte.

Dr. Antonio Ablas Filho era presidente da Ação Católica de Santos e muito meu amigo. Quando viajávamos a Santos, todas as noites íamos à sua casa, tínhamos longas conversas com ele e com Dª Julinha Guimarães Ablas, sua esposa. Os filhos, ainda muito pequenos, ficavam ali ouvindo a conversa.

Sem fazer rodeios, porque a posição dele para conosco era muito leal, eu propus o seguinte:

— Ablas, você poderia nos prestar um favor? Escrever um ofício, enquanto presidente da Ação Católica de Santos, ao Monsenhor Helder Câmara, que é assistente eclesiástico da Junta Nacional da Ação Católica no Rio, dizendo a ele que havia chegado tal aprovação da Santa Sé ao meu livro. E que seria conveniente que a Ação Católica, indo ao encontro dos desejos do Santo Padre manifestados de modo claro ao se referir à difusão de tal trabalho, recomendasse oficialmente a leitura da obra aos seus membros.

Ablas gostou muito da idéia e dentro de poucos dias a carta estava em mãos do Monsenhor Helder *.

* O primeiro ofício foi enviado pela Junta Diocesana de Santos no dia 30 de março de 1949, e levava a assinatura de Dr. Ablas enquanto presidente e do Sr. Ítalo Sartini enquanto secretário. Como não viesse resposta, Dr. Ablas mandou um segundo ofício, datado de 23 de junho de 1949, reiterando o mesmo pedido. Dizia que, “procedendo desta forma, empenha-se esta Junta Diocesana única e exclusivamente em ir de encontro dos desejos do Santo Padre Pio XII, gloriosamente reinante, manifestados de modo claro e insofismável ao se referir a tão importante e oportuno trabalho”.

Não tendo ainda desta vez obtido resposta, Dr. Ablas telefonou diretamente a Monsenhor Helder Câmara (em 20/1/50), o qual era o assistente geral da Junta Nacional de Ação Católica, mantendo o seguinte diálogo:

- É Monsenhor Helder Câmara?

- Sim senhor.

- Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo!

- Para sempre seja louvado.

- Aqui quem fala é o Dr. Ablas Filho, presidente da Junta Diocesana de Ação Católica de Santos. A sua bênção, Monsenhor.

- Deus lhe abençoe. O que o senhor deseja?

- Monsenhor, eu desejo saber algo sobre aqueles dois ofícios que lhe foram enviados, um pelo correio, outro pelas mãos de pessoa amiga aí do Rio.

- O que o senhor pede naqueles ofícios é uma coisa muito delicada!

- Como delicada? Não há a respeito uma carta do Santo Padre?

- Vou me dirigir à comissão episcopal de AC para então lhe responder a respeito.

- Sim, Monsenhor, eu preciso de uma resposta, pois penso que, seja qual for a resposta, os tais ofícios precisam tê-la. Pelo menos me responda que recebeu os ofícios.

- Sim senhor, lhe responderei muito breve.

Dr. Ablas se despediu dele, pediu sua bênção, mas o assunto não andou (cfr. relatório do dia 30/1/50, feito pelo próprio Dr. Ablas).

Monsenhor Helder não respondeu, mas ficou sentindo que a contra-ofensiva recomeçara. Foi como naquelas batalhas medievais, em que um dos lados sai, canta um hino e depois começa a guerra. Assim também nós levantamos a luva [435].

6. Resultados do “Em Defesa” a longo prazo

O Em Defesa foi um livro cujo alcance é muito mais fácil de se perceber hoje do que no tempo em que foi escrito. Naquela época estava em estado de vagido o bramido que hoje o progressismo dá no mundo inteiro [436]. Os perigos que nele indiquei eram apenas a semente do que depois tomou corpo, se ampliou e deu no que vemos atualmente [437].

Na relativa modorra do ambiente religioso daquela época, era difícil para um católico acreditar que se gestava uma heresia, a qual se anunciava como um bom e normal desenvolvimento da vida da Igreja. Ou seja, a Ação Católica se apresentava como uma novidade, quando de fato era uma revolução que estava nascendo.

Nos seminários, nas universidades mantidas pelo Estado ou pela Igreja, na imprensa católica, na direção das grandes associações católicas, essas idéias foram introduzidas a um tempo, e aceitas geralmente pelas mesmas pessoas, e vieram a constituir o programa vastíssimo de transformações eclesiásticas, políticas e sociais propugnadas por uma imensa e poderosa corrente, cujo chefe leigo era Tristão de Athayde.

E esta corrente difundia seus erros ora de modo explícito, ora de modo implícito. E era muito mais clara em suas doutrinas na propaganda verbal do que na escrita [438].

Por isso, na época, muita gente católica julgou que o quadro que eu traçara era forçado demais.

Esses católicos achavam que, depois da Contra-Reforma e da definição do dogma da infalibilidade papal, não havia nem poderia haver dentro da Igreja espaço para desenvolver-se um movimento herético. E eriçaram-se contra o livro.

Mas, à medida que a crise interna da Igreja foi-se acentuando, ficou patente aos olhos dessas incontáveis pessoas que era de fato a trama profunda de uma revolução na Igreja no século XX o que havia sido denunciado [439].

O livro foi perseguido porque furava essa conspiração que iria fazer prevalecer esse estado de coisas na Igreja Católica várias décadas depois [440].

7. Lutamos para mudar o curso da História

Nesta situação, parecia-me como certo que o único meio de disputar terreno ao adversário consistia em abrir a luta de viseira erguida, combatendo mais uma vez a tática da confusão pela tática da definição.

Tenho como certo que, se não tivesse sido publicado o Em Defesa da Ação Católica, a heresia que acabou penetrando por toda parte teria penetrado muito mais, e já naquela época seria senhora do País.

E se é verdade que hoje ela está espalhada de um modo tremendo, também é verdade que, por ter sido denunciada no seu início, ela caminhou limitada, mal à vontade e com o passo cambaleante, por ter havido alguma coisa que a freou. Disto eu tenho certeza [441].

Quando a Ação Católica foi trazida da Europa para o Brasil, a intenção era transformá-la em um viveiro de revolução. E seu contingente era para ser tirado das Congregações Marianas, ou seja, dos jovens católicos mais fervorosos, mais entusiasmados, que iriam entrar na revolução religiosa. Revolução religiosa essa que faria por sua vez, mais tarde, o papel de viveiro para a Democracia Cristã. Os melhores da Ação Católica seriam depois transferidos — como foram! — para a Democracia Cristã, e em parte passariam a apoiar o comunismo.

Neste processo [442], a influência de Jacques Maritain foi bastante grande. Ela atingiu seu auge entre os anos de 1940 a 1960.

Esses meios deram origem ao esquerdismo católico que apoiou Goulart e quase deitou o Brasil por terra. Na era, pós-goulartiana, continuam atuando em correntes centristas ou esquerdistas [443].

*   *   *

Temos então o seguinte balanço: nós lutamos para impedir o curso dessa revolução. E, com o favor de Nossa Senhora, contribuímos para mudar o curso da História! [444]

Esta tese fica mais clara se imaginarmos como as coisas teriam corrido se simplesmente tivéssemos cruzado os braços [445].

Devemos tudo evidentemente a Nossa Senhora. Mas podemos dizer que fomos os instrumentos d’Ela. E damos graças a Ela por ter querido servir-se de nós. Mas em algo correspondemos à graça. E a tarefa foi feita [446].


NOTAS

[1] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[2] SD 16/6/73.

[3] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[4] SD 16/6/73.

[5] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[6] SD 16/6/73.

[7] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[8] SD 16/6/73.

[9] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[10] SD 16/6/73.

[11] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[12] SD 16/6/73.

[13] — Estas nomeações foram oficialmente anunciadas na reunião do Clero do dia 11 de março de 1940 (v. Legionário n° 392, de 17/3/40). A cerimônia de posse realizou-se no dia 12 de maio do mesmo ano, no salão nobre da Cúria Metropolitana (v. Legionário n° 401, de 19/5/40).

[14] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[15] SD 16/6/73.

[16] Entrevista à Rádio São Miguel de Uruguaiana, 21/6/90.

[17] SD 16/6/73.

[18] SD 5/8/94.

[19] SD 16/6/73.

[20] Palestra sobre Memórias (VI) 11/8/54.

[21] Jantar EANS 9/4/87.

[22] SD 14/4/79.

[23] Jantar EANS 9/4/87.

[24] SD 7/7/73.

[25] Jantar EANS 9/4/87.

[26] SD 2/7/88.

[27] Jantar EANS 9/4/87.

[28] — V. Legionário nº 300, 12/6/38 (o site http://www.pliniocorreadeoliveira.info disponibiliza este artigo, bem como outras colaborações de Plinio Corrêa de Oliveira para o Legionário).

[29] SD 2/7/88.

[30] Jantar EANS 9/4/87.

[31] SD 2/7/88.

[32] Em Itaici, Legionário n° 609, 9/4/44.

[33] Jantar EANS 9/4/87.

[34] SD 2/7/88.

[35] Jantar EANS 9/4/87.

[36] SD 2/7/88.

[37] Jantar EANS 9/4/87.

[38] SD 2/7/88.

[39] SD 14/4/79.

[40] Jantar EANS 9/4/87.

[41] SD 14/4/79.

[42] SD 2/7/88.

[43] Jantar EANS 9/4/87.

[44] SD 7/7/73.

[45] Jantar EANS 9/4/87.

[46] Jantar EANS 16/6/82.

[47] SD 2/7/88.

[48] Jantar EANS 16/6/82.

[49] SD 17/6/89 e SD 7/7/73.

[50] SD 17/6/89.

[51] Jantar EANS 9/4/87.

[52] SD 17/6/89.

[53] Jantar EANS 9/4/87.

[54] SD 17/6/89.

[55] Almoço EANS 16/6/82.

[56] SD 17/6/89.

[57] Jantar EANS 9/4/87.

[58] SD 7/7/73.

[59] Almoço EANS 9/4/87.

[60] — Dom André Arcoverde nasceu em Pesqueira-PE, no dia 15 de dezembro de 1878 e faleceu em Taubaté, a 20 de junho de 1955, de onde foi Bispo entre 1936 e 1941.

[61] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[62] Memorando para o Cônego Antonio Leme Machado, data provável 1948.

[63] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[64] — Monsenhor João José de Azevedo foi Vigário Capitular de 1941 até a nomeação do novo Bispo, Dom Francisco Borja do Amaral, no ano de 1944, o qual prescindiu de sua colaboração na Diocese.

[65] — Madre Maria Teresa de Jesus Eucarístico, no século Dulce Rodrigues dos Santos (1901-1972). Seu pai, Brasílio Rodrigues dos Santos (tio-avô de Dr. Plinio) foi catedrático de Direito Comercial na Faculdade de Direito de São Paulo, tendo exercido o cargo de deputado estadual e depois federal. Sua mãe, Helena Herold, era filha de imigrantes alemães. A congregação foi fundada em São José dos Campos, Estado de São Paulo, onde está localizada a casa-mãe do Instituto das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada.

[66] — Esta circular ao Clero da Província Eclesiástica de São Paulo, alertando contra os excessos do liturgicismo, é de agosto de 1942 (cfr. Elói de Magalhães Taveiro, Para evitar as prescrições da História, Catolicismo n° 150, de junho de 1963).

[67] Palestra sobre Memórias (VI) 11/8/54.

[68] — O Cônego Mayer, na citada carta-relatório ao Sr. Cardeal do Rio, Dom Sebastião Leme, punha-o a par de alguns desses desvios:

"A respeito dos padres, [essas moças] achavam que eles não entendiam nada de A.C. e apostolado, de maneira que era necessário por meio de suaves infiltrações 'convertê-los'.

"Com relação à austeridade que apresentavam nossas moças das associações religiosas, opinavam que eram atitudes reprováveis, pois só serviam para afastar as pessoas de Nosso Senhor. O necessário era apresentar um semblante alegre, jovial, acompanhar as ideias novas, pois que somente dessa maneira é que se poderia obter algum resultado no apostolado.

"Ao lado desse liberalismo na Moral, professavam um laicismo no apostolado: o padre deveria restringir suas funções à administração dos Sacramentos, o apostolado era com elas: os padres fazem o que nós não podemos fazer, dar Comunhão, confessar etc. [...] E quanto às religiosas, não se admitia que frequentassem os círculos dos membros da Ação Católica, porque a A.C. era só de leigos".

Encontramos ecos dessa carta a Dom Leme, embora sem se referir concretamente a ninguém, na página 7 do Legionário n° 478, de 9 de novembro de 1941, coluna Federação Mariana Feminina - Cruzada contra o mundanismo, escrita pelo Cônego Mayer.

[69] — Dom José, nessa circunstância, foi para Araxá-MG, que, além de ser uma estação de águas, era também sua cidade natal e onde residiam seus familiares (cfr. carta a Dom Leme, já citada).

[70] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[72]O Portal MiniWeb Educação (http://www.miniweb.com.br), ao apresentar a biografia de Edith Junqueira Azevedo Marques, fundadora do Centro Social Leão XIII, confirma, vista de outro ângulo, a narração de Dr. Plinio:

“Dom Castro Mayer, Bispo responsável pela Ação Católica em São Paulo, depois de várias divergências, demitiu toda a diretoria leiga do movimento [Ação Católica], para instituir outra de sua confiança. (Segundo Clarisse Wey e Genoefa Frederico todas foram expulsas). O Arcebispo da época [...] Dom José Gaspar de Affonseca e Silva (amigo de Dª Edith), chamou-a na Cúria e pedindo desculpas pelo acontecido com Dom Mayer, solicitou criasse outro grupo para continuar a auxiliar as operárias. Assim, nos idos de 1940, Dª Edith [Junqueira Azevedo Marques] e suas companheiras do movimento, Heloisa Prestes Monzoni, Helena Junqueira, Lucy Montoro, Clarisse Wey, Genoefa Frederico, Maria Kiehl, Albertina Ramos, estas ultimas fundadoras da primeira Escola de Serviço Social do Brasil — Escola de Serviço Social de São Paulo — alugaram uma casa na Av. Celso Garcia, 755, bairro operário do Brás”.

[73] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[74] SD 16/6/73.

[75] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[76] SD 2/7/88.

[77] SD 16/6/73.

[78] SD 2/7/88.

[79] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[80] Discurso no 25° aniversário do Em Defesa, 8/6/68.

[81] Jantar EANS 8/4/87.

[82] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[83] SD 2/7/88.

[84] Discurso no 25° aniversário do Em Defesa, 8/6/68.

[85] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[86] SD 2/7/88.

[87] Jantar EANS 8/4/87.

[88] SD 16/6/73 e SD 2/7/88.

[89] SD 16/6/73.

[90] SD 2/7/88.

[91] SD 16/6/73.

[92] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[93] SD 16/6/73.

[94] Carta de Dr. Plinio ao Núncio Dom Masella, 4/8/42 — Por uma carta do Cônego Mayer ao Padre Dainese, que seguiu junto com outra carta de Dr. Plinio encaminhando o relatório, ambas datadas de 5 de setembro de 1941, pode-se deduzir que houve certa vacilação se o referido relatório deveria ser apresentado em nome de Dr. Plinio ou do Cônego Mayer:

“O Dr. Plinio disse-me que o Sr. havia pedido informasse a Nunciatura a respeito da situação aqui em São Paulo. Como, por ser leigo, ele tem certo receio de o fazer da maneira como o Relatório composto [...] o faz, pediu-me ele licença para apresentá-lo em meu nome, ou melhor, que eu o apresentasse. O Padre Dainese pode facilmente ver que a coisa não é simples. De minha parte não me negarei a nada que possa concorrer para aliviar a situação da Arquidiocese. Mas não fui interrogado, talvez choque o Sr. Núncio um Relatório desses. [...] Por tudo, peço instantemente ao Padre Dainese que reflita, e depois de rezar resolva como achar que melhor condiz com os interesses da Igreja em São Paulo”.

À carta do Cônego Mayer, Dr. Plinio juntou a sua, em que referia ao Padre Dainese os “apontamentos que julguei mais típicos acerca da situação da Arquidiocese de São Paulo”, pedindo àquele sacerdote que fizesse “a caridade de os apresentar ao Exmo. Revmo. Sr. Núncio Apostólico” e de ser “meu intérprete junto a S. Excia. Revma.”. Ao mesmo tempo tratava, nesta missiva, da conveniência de manter o incógnito com referência à autoria do documento.

Parece que Padre Dainese optou por apresentar o relatório em nome do próprio Dr. Plinio, tanto pela narração deste em suas reuniões de memórias, quanto à documentação existente.

Vale a pena deixar registrado, para se compreender esse pedido de Dr. Plinio no sentido de D. Mayer assumir a autoria do texto, que, dada a íntima relação de amizade e o senso do serviço a uma causa comum então existentes entre D. Mayer e Dr. Plinio, como também D. Sigaud, era corrente e mesmo freqüentíssimo Dr. Plinio escrever para uso dos dois Bispos textos de sua lavra, cuja autoria eles meritoriamente assumiam, e não menos meritoriamente Dr. Plinio a ela renunciava, por conveniência dessa mesma causa, numa colaboração e entendimento mútuos que muito serviu à Igreja. Aliás, este é um procedimento comum também nas instituições de alto nível, inclusive na Santa Sé, em que os documentos pontifícios são frequentemente elaborados por assessores do Papa.

[95] — Dom Benedetto Aloisi Masella (1879-1970) foi, por indicação de Pio XI, Núncio Apostólico no Brasil desde 26 de abril de 1927, continuando a sê-lo sob Pio XII. Proclamado Cardeal no consistório de 18 de fevereiro de 1946, deixou o Brasil após 19 anos de permanência em nosso País, assumindo o cargo de Prefeito da Sagrada Congregação para a Disciplina dos Sacramentos. Durante o Concílio, fez parte do Coetus Internationalis Patrum.

[96] SD 16/6/73.

[97] SD 2/7/88.

[98] SD 16/6/73 — Em carta enviada ao Sr. Núncio no dia 27 de novembro de 1941, Cônego Mayer confirmava isto, dizendo que “várias pessoas chegadas aos círculos heterodoxos daqui faziam constar que o Sr. Arcebispo me afastaria, no fim do ano, das funções de Assistente Geral da Ação Católica”.

[99] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[100] SD 16/6/73.

[101] — Este convite foi feito no dia 25 de novembro de 1941, pois na referida carta enviada ao Sr. Núncio no dia 27, o Cônego Mayer dizia que “anteontem o Exmo. Revmo. Sr. Arcebispo me convidou para a Vigaria Geral [e] já me disse que minha nomeação implicaria em meu afastamento da Assistência Geral da Ação Católica”.

[102] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[103] Palestra sobre Memórias (VI) 11/8/54.

[104] Palestra sobre Memórias (V) 10/8/54.

[105] Com singular complacência, Legionário nº 505, 17/5/42.

[106] Memorando para o Cônego Antonio Leme Machado, data provável 1948.

[107] Palestra sobre Memórias (VI) 11/8/54.

[108] SD 11/7/81.

[109] Palestra sobre Memórias (VI) 11/8/54.

[110] SD 11/7/81.

[111] Palestra sobre Memórias (VI) 11/8/54.

[112] SD 11/7/81.

[113] Palestra sobre Memórias (VI) 11/8/54.

[114] Telefonema Nova York 7/1/92.

[115] Palestra sobre Memórias (VI) 11/8/54.

[116] Reunião com os mais antigos do movimento 20/8/78.

[117] SD 11/7/81.

[118] Almoço 1/7/93.

[119] SD 11/7/81.

[120] Almoço 1/7/93.

[121] SD 11/7/81.

[122] Telefonema Nova York 7/1/92.

[123] MNF 16/7/82.

[124]Ernesto Pereira Carneiro era jornalista, político e empresário, tendo em 1918 adquirido o Jornal do Brasil. Em 1935, fundou a Rádio Jornal do Brasil. Foi deputado constituinte em 1933, e reeleito deputado em 1935 (cfr. http://biografias.netsaber.com.br/ver_biografia_c_1606.html).

[125] — Trata-se de um neologismo (“mineirou”) nascido da palavra mineiro, ou seja, pessoa natural do Estado de Minas Gerais, o qual se explica pela habilidade política atribuída à população desse Estado, no sentido de resolver os conflitos jeitosamente, evitando os confrontos diretos desnecessários. Dom José era mineiro, da cidade de Araxá.

[126] Palestra sobre Memórias (VI) 11/8/54.

[127] CM 29/4/90.

[128] SD 16/6/73.

[129] SD 2/7/88.

[130] SD 16/6/73.

[131] Discurso no 25° aniversário do Em Defesa, 8/6/68.

[132] SD 16/6/73.

[133] Discurso no 25° aniversário do Em Defesa, 8/6/68.

[134] SD 16/6/73.

[135] SD 2/7/88.

[136] SD 16/6/73.

[137] — No livro Um homem, uma obra, uma gesta, assim vem delineada a figura de José Carlos Castilho de Andrade (1924-1988): “advogado, militante católico firme e entusiasmado desde sua juventude, foi secretário de redação do Legionário, propulsionador e diretor do jornal Catolicismo. Sócio-fundador da TFP. Homem de grande dignidade pessoal e cheio de zelo pela causa da Igreja, dotado de qualidades invulgares de lucidez e precisão ao par de notável saber jurídico, exerceu de maneira exímia o cargo de diretor vice-superintendente da Diretoria Administrativa Financeira Nacional da TFP até sua morte edificante”.

Em mais de uma ocasião, Dr. Plinio o elogiou publicamente. Por exemplo, em artigo para a Folha de S. Paulo (1º/7/73): “José Carlos Castilho de Andrade, excelente amigo de todos os tempos, e brilhante diretor da TFP”. E, em seu Auto-retrato filosófico, escreve: “o advogado, escritor e redator exímio, José Carlos Castilho de Andrade, sob cujas mãos os artigos e textos de Catolicismo alcançavam um brilho e uma correção inexcedíveis”.

[138] SD 2/7/88.

[139] Discurso no 25° aniversário do Em Defesa, 8/6/68.

[140] Um homem, uma obra, uma gesta, cit.

[141] Almoço EANS 8/4/87.

[142] Discurso no 25° aniversário do Em Defesa, 8/6/68.

[143] SD 2/7/88.

[144] SD 16/6/73.

[145] SD 2/7/88 — Felizmente este elogio ao livro foi encontrado nos guardados de Dr. Plinio. É textual.

[146] SD 16/6/73.

[147] Jantar EANS 19/6/82.

[148] Palestra sobre Memórias (VI) 11/8/54.

[149] Jantar EANS 19/6/82.

[150] SD 2/7/88.

[151] Carta de Dr. Plinio ao Padre Dainese, 23/12/42.

[152] SD 16/6/73.

[153] Carta de Dr. Plinio ao Padre Dainese, 23/12/42.

[154] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[155] Carta de Dr. Plinio ao Padre Dainese, 23/12/42.

[156] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[157] SD 16/6/73.

[158] SD 9/7/88.

[159] SD 16/6/73.

[160] Carta de Dr. Plinio ao Padre Dainese, 23/12/42.

[161] SD 9/7/88.

[162] SD 2/7/88.

[163] SD 16/6/73.

[164] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[165] SD 16/6/73.

[166] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[167] Entrevista à Rádio São Miguel de Uruguaiana, 21/6/90.

[168] SD 16/6/73.

[169] SD 9/7/88.

[170] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[171] — Os seguintes Bispos enviaram carta de apoio: Dom Helvécio Gomes de Oliveira, Arcebispo de Mariana, Dom Ático Eusébio da Rocha, Arcebispo de Curitiba, Dom João Becker, Arcebispo de Porto Alegre, Dom Joaquim Domingues de Oliveira, Arcebispo de Florianópolis, Dom Antonio Augusto de Assis, Arcebispo-Bispo de Jaboticabal, Dom Otaviano Pereira de Albuquerque, Arcebispo-Bispo de Campos, Dom Alberto José Gonçalves, Arcebispo-Bispo de Ribeirão Preto, Dom José Maurício da Rocha, Bispo de Bragança, Dom Henrique César Fernandes Mourão, Bispo de Cafelândia, Dom Antonio dos Santos, Bispo de Assis, Dom Frei Luís de Santana, Bispo de Botucatu, Dom Manuel da Silveira D’Elboux, Auxiliar de Ribeirão Preto, Dom Ernesto de Paula, Bispo de Jacarezinho, Dom Otávio Chagas de Miranda, Bispo de Pouso Alegre, Dom Frei Daniel Hostin, Bispo de Lajes, Dom Juvêncio de Brito, Bispo de Caetité, Dom Francisco de Assis Pires, Bispo de Crato, Dom Florêncio Sisinio Vieira, Bispo de Amargosa, Dom Severino Vieira, Bispo do Piauí, Dom Frei Germano Vega Campón, Bispo Prelado de Jataí (cfr. artigo Para evitar as prescrições da História, cit.).

Muitos sacerdotes também elogiaram o livro. Destacamos, a título de exemplo, o Padre João Batista Lehmann, SVD, do Rio de Janeiro, que assim se manifestou: “Teve o Dr. Plinio Corrêa de Oliveira a feliz inspiração de pôr a serviço da periclitada Ação Católica, seu rico saber de sociólogo experimentado, sua têmpera de católico militante, seu preparo e indiscutível valor de apologista ativo, seu acendrado amor à Igreja Católica e elaborar um suculento estudo sobre a matéria que se compendia na esfera da Ação Católica [...] Linguagem clara e desapaixonada, argumentação nítida e convincente, sã doutrina, caracterizam o trabalho” (cfr. Legionário, nº 601, 13 de fevereiro de 1944).

[172] Carta de Dr. Plinio ao Padre João de Castro e Costa, SJ, 30/5/47.

[173] — Este anúncio foi estampado na primeira página do Legionário n° 562, de 16 de maio de 1943.

[174] SD 9/7/88.

[175] SD 16/6/73.

[176] Entrevista à Rádio São Miguel de Uruguaiana, 21/6/90.

[177] SD 9/7/88.

[178] SD 16/6/73.

[179] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[180] SD 9/7/88.

[181] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[182] Para evitar as prescrições da História, cit.

[183] A Igreja ante a escalada da ameaça comunista — Apelo aos Bispos Silenciosos, Ed. Vera Cruz, São Paulo, 4ª edição, 1977 — Dom Alexandre do Amaral pretendeu refutar o Em Defesa da Ação Católica dizendo que via predominante no livro a “preocupação negativa da destruição do erro”, sem considerar “o elemento positivo”, somado ao fato de que “são muitos os erros de Plinio, ao lado do feitio superficial com que ele preferiu examinar questões tão graves”. À maneira de ver do Prelado, o livro “documenta muito bem [...] a carência dos conhecimentos mais elementares da doutrina da A.C. no seu aventureiro autor”.

A contrario sensu, em 1949, menos de dez anos depois, veio para Dr. Plinio uma carta da Secretaria de Estado da Santa Sé, em nome de Pio XII, dizendo: “Sua Santidade regozija-se contigo porque explanaste e defendeste com penetração e clareza a Ação Católica, da qual possuis um conhecimento completo”.

Dr. Plinio replicou as críticas de D. Alexandre do Amaral, desmontando de forma respeitosa, porém pormenorizadamente, as objeções levantadas pelo Sr. Bispo, em um documento de 40 laudas datilografadas que foi entregue ao Prelado.

[185] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[186] Memorando para o Cônego Antonio Leme Machado, data provável 1948.

[187] — A Semana de Estudos teve duas sessões, cada uma para uma turma diferente de participantes: a primeira entre os dias 25 a 28 de maio, e a segunda entre os dias 8 e 11 de junho de 1943 (cfr. Legionário n° 565, 6 de junho de 1943).

[188] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[189] SD 16/6/73.

[190] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[191] SD 18/6/88.

[192] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[193] SD 18/6/88.

[194] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[195] SD 4/1/95.

[196] SD 16/6/73.

[197]A expressão “émigré à l'intérieur” designa, no linguajar político da monarquia de Julho da França dos anos 1830, os nobres legitimistas que deixavam suas residências parisienses e iam viver em seus castelos do interior da França. Esses nobres legitimistas se abstinham de tomar parte na vida política em sinal de protesto contra a ascensão ao trono do Duque de Orleans, a justo título considerado por eles revolucionário e usurpador.

[198] SD 4/1/95.

[199] Chá ESB 7/3/95.

[200] SD 4/1/95.

[201] — Refere-se do salão da Sociedade Humanitária dos Empregados no Comércio, fundada em Santos no ano de 1879.

[202] SD 7/7/73.

[203] SD 9/7/88.

[204] — Nas já referidas notas de Dr. Plinio do 2° semestre de 1943, além da deposição da Junta Arquidiocesana da Ação Católica, encontramos o seguinte registro de outras resoluções tomadas por D. José Gaspar nessa mesma época:

“1. desligou a JUC e a JOC (ambas masculinas) da direção de Monsenhor Mayer, para tirar da jurisdição deste a D. Paulo Pedrosa, D. Teodoro Kok e Padre Eduardo Roberto, salesiano, assistentes eclesiásticos da JUC os dois primeiros, e da JOC este último;

“2. começou a dirigir pessoalmente, mediante reuniões diretas com ele e os assistentes eclesiásticos, tudo quanto se refere à Ação Católica;

“3. Deu provas públicas de desagrado ao Legionário, mandando na Cúria e no Palácio que suspendessem a remessa para o Legionário de notícias distribuídas a todos os jornais, de maneira que dos jornais de S. Paulo, os matutinos, só o Legionário ficava impedido de dar esse noticiário;

“4. Procurou evitar qualquer interferência de Monsenhor Mayer na Federação das Congregações Marianas, declarando-se ele pessoalmente diretor da mesma após a morte do Padre Cursino”.

[205] — O rompimento desse contrato deu-se no dia 18 de agosto de 1943, segundo registro encontrado entre os papéis de Dr. Plinio.

[206] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[207] Palavrinha 23/8/91.

[208] SD 9/7/88.

[209] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[210] SD 16/6/73.

[211] Telefonema Estados Unidos 17/2/95.

[212] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[213] Palavrinha 23/8/91 — A Água das Carmelitas é também conhecida como Água de Melissa.

[214] Telefonema Estados Unidos 17/2/95.

[215] SD 16/6/73.

[216] Telefonema Estados Unidos 17/2/95.

[217] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[218] — Dom Manoel Pedro da Cunha Cintra (1907-1999): Reitor do Seminário Central da Imaculada Conceição do Ipiranga e Visitador Apostólico dos Seminários do Brasil, foi eleito em 1948 1° Bispo da Diocese de Petrópolis, até a sua resignação em 1984.

[219] — O episódio aqui referido é da Sagrada Escritura. Sansão, aprisionado pelos filisteus pela traição de uma mulher, teve seus olhos furados. Segue a narração da Bíblia, na tradução da Editora Ave Maria:

“Ora, os príncipes dos filisteus reuniram-se para oferecer um grande sacrifício a Dagon, seu deus, e celebrar uma festa. Nosso deus, diziam eles, entregou-nos Sansão nosso inimigo. Também o povo, vendo isso, louvava o seu deus, dizendo: O nosso deus entregou-nos o nosso inimigo, aquele que devastava nossa terra e matava tantos dos nossos. E estando eles de coração alegre, exclamaram: Mandai vir Sansão para nos divertir! Tiraram-no da prisão, e Sansão teve que dançar diante deles. Tendo sido colocado entre as colunas, Sansão disse ao jovem que o conduzia pela mão: Deixa que eu toque as colunas que sustêm o templo, e que me apóie a elas. Ora, o templo estava repleto de homens e mulheres, e estavam ali todos os príncipes dos filisteus; havia cerca de três mil pessoas, homens e mulheres, que do teto olhavam o prisioneiro dançar. Sansão, porém, invocando o Senhor, disse: Senhor Deus, rogo-vos que vos lembreis de mim. Dai-me, ó Deus, ainda esta vez, força para vingar-me dos filisteus pela perda de meus olhos. Abraçando então as duas colunas centrais sobre as quais repousava todo o edifício, pegou numa com a mão direita e noutra com a mão esquerda, e gritou: Morra eu com os filisteus! Dizendo isso, sacudiu com todas as suas forças o edifício, que ruiu sobre os príncipes e sobre todo o povo reunido. Desse modo, matou pela sua própria morte muito mais homens do que os que matara em toda a sua vida” (Juízes, 16, 24-30).

[220] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[221] — Dom Alfredo Vicente Scherer (1903-1996) foi Arcebispo de Porto Alegre entre os anos 1946-1981. Na Revolução de 1930, acompanhou como capelão as tropas revolucionárias de Getúlio Vargas. Paulo VI o elevou ao cardinalato em 29 de março de 1969.

[222]Padre João Baptista Reus (Johann Baptist Reus) nasceu a 10 de julho de 1868, na cidade alemã de Pottenstein. Em 1883 tornou-se sacerdote jesuíta e veio para o Brasil em 1900. Morreu a 21 de julho de 1947, na cidade de São Leopoldo, com fama de santidade. Seu processo de beatificação, aberto em 1958, sofreu uma pausa em 1974, em parte devido à resistência do Cardeal Dom Vicente Scherer, que enviou carta a Paulo VI desaconselhando a beatificação. Mais tarde, em 1993, Dom Scherer mudou de ideia e julgou melhor apoiar uma carta de 26 Bispos gaúchos pedindo essa beatificação (cfr. http://www.derradeirasgracas.com, título O Padre Reus).

[223] Palavrinha da noite 12/6/82.

[224] Despachinho 9/12/93.

[225] SD 9/7/88.

[226] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[227] SD 16/6/73.

[228] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54.

[229] Memorando para o Cônego Antonio Leme Machado, data provável 1948.

[230] Palestra sobre Memórias (VII) 12/8/54 — Esta encíclica de Pio XII foi publicada em 29 de junho de 1943 e a morte de Dom José Gaspar deu-se um pouco menos de dois meses depois, a 27 de agosto de 1943.

[231] Veneração e tristeza da Igreja enlutada, Catolicismo nº 95, novembro de 1958.

[232] — Este Congresso Eucarístico, realizado entre os dias 16 e 20 de agosto de 1944, reuniu dignitários eclesiásticos de todo o Brasil, e no dia 17 Dr. Plinio discursou sobre o tema “A Eucaristia e o Sacerdócio” (cfr. Legionário n° 628, 20/8/44).

[233] — As relações entre Dr. Plinio e Tristão de Athayde já estavam muito estremecidas nessa época, devido ao lançamento do livro Em Defesa da Ação Católica e à polêmica que se lhe seguiu.

[234] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[235] Jantar EANS 8/4/87.

[236] SD 16/7/88.

[237] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[238] SD 8/4/89.

[239] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[240] SD 16/7/88.

[241] Jantar EANS 8/4/87.

[242] SD 16/7/88.

[243] SD 8/4/89.

[244] — Nomeado Arcebispo de São Paulo em 13 de agosto de 1944, tomou posse por procuração no dia 7 de setembro, mas só chegou a São Paulo a 16 de novembro. A cerimônia de entronização realizou-se no dia 18 do mesmo mês (cfr. Legionário n° 641, de 19/11/44).

[245] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[246] SD 8/4/89.

[247] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[248] Carta de Dr. Plinio ao Padre Arlindo Vieira, 31/12/44.

[249] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[250] SD 16/7/88.

[251] Carta de Dr. Plinio ao Padre José Antonio Labúru Olascoaga, SJ, 30/4/48.

[252] Jantar 31/12/93.

[253] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[254] SD 15/12/73.

[255] — A data desse encontro foi no dia 13 de janeiro de 1945, pois, em carta ao Padre Dainese datada do dia 14, o Cônego Mayer dizia-lhe ter sido chamado “ontem” pelo Arcebispo: “fui chamado ontem pelo Sr. Arcebispo, que, com imensa estranheza e pesar meus [...] me disse que possuía contra mim denúncias, a respeito das quais passaria a me interrogar”, pois era seu desejo “vingar a memória de seu antecessor”.

[256] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[257] Carta de Dr. Plinio ao Núncio Dom Masella, 1/1/46.

[258] Carta de Dr. Plinio ao Padre José Antonio Labúru Olascoaga, SJ, 30/4/48.

[259] Palavrinha 30/6/92 — Esse embarque deu-se na Estação Roosevelt no dia 22 de janeiro de 1946, seguindo o Sr. Arcebispo para o Rio em trem especial, acompanhado de uma comitiva de Bispos, sacerdotes e de representantes do governo do Estado. Aí embarcou em navio para Roma, onde participou do Consistório de 18 de fevereiro de 1946 (cfr. Legionário n° 703, de 27/1/46).

[260] Carta de Dr. Plinio a D. Carlos Carmelo de Vasconcellos Motta, 24/1/46.

[261] — A partida do Padre Sigaud de São Paulo foi no dia 13 de março de 1946 (cfr. Legionário n° 711, 24/3/46).

[262] — Anselm Stolz (1900-1942), beneditino alemão, foi professor no Pontifício Ateneu de Santo Anselmo, em Roma. Para se ter idéia da inspiração panteísta de suas obras, em sua Théologie de la Mystique (Éditions des Bénédictins d’Amay, Chevetogne, Bélgica, 1939) ele sustentava que no princípio era o Abismo, o Silêncio eterno, a quem nós chamamos de Pai, fonte primordial e insondável do ser divino, e que repousa em si mesmo, encerrado em seu próprio ser na mais absoluta indeterminação [sic]. É na Segunda Pessoa, o Filho, que o ser divino se concretiza, se determina, tomando consciência de si mesmo (cfr. estudo do Padre Benigno de Brito Costa, Síntese esquemática da doutrina e da prática do liturgicismo moderno, 1950, feito para uso de D. Mayer em sua viagem a Roma em 1950).

Já Romano Guardini (1885-1968) foi um sacerdote, teólogo e filósofo de origem italiana, mas radicado na Alemanha, para onde sua família se mudou quando ele tinha um ano de idade. Caminhou ombro a ombro com teólogos progressistas como Henri de Lubac, Karl Rahner e Hans Urs von Balthasar e é considerado um dos maiores protagonistas do movimento liturgicista e ecumênico, sendo sua doutrina apreciada tanto por protestantes como por católicos de idéias novas. Paulo VI quis fazê-lo cardeal em 1965, mas ele recusou. Foi professor em Tübingen e depois em Munique, sendo um de seus alunos nesta última cidade o jovem Joseph Ratzinger, futuro Bento XVI.

[263] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[264] Almoço EANS 16/6/82.

[265] SD 16/6/73.

[266] Carta de Dr. Plinio a D. Carlos Carmelo de Vasconcellos Motta, 22/9/45 (adaptação).

[267] Carta de Dr. Plinio ao Padre João de Castro e Costa, SJ, 10/10/46.

[268] Carta de Dr. Plinio ao Padre Sigaud, 16/12/46.

[269] — Esta reunião foi no último dia de maio de 1946 ou inicio de junho.

[270] Almoço EANS 16/6/82.

[271] SD 16/7/88.

[272] Almoço EANS 16/6/82.

[273] SD 16/7/88.

[274] Almoço EANS 16/6/82.

[275] Carta-circular de Dr. Plinio aos Bispos reunidos no Rio, 31/5/46 (adaptação).

[276] Carta de Dr. Plinio aos Bispos amigos, juntada à carta-circular ao Episcopado, 31/5/46 (adaptação).

[277] SD 7/4/79.

[278] SD 4/11/72.

[279] Carta de Dr. Plinio ao Padre João de Castro e Costa, SJ, 10/10/46.

[280] Almoço EANS 16/6/82.

[281] Palavrinha canadenses 17/8/93.

[282] SD 4/11/72.

[283] Carta de Dr. Plinio ao Padre João de Castro e Costa, SJ, 10/10/46.

[284] SD 16/6/73.

[285] Almoço EANS 16/6/82.

[286] SD 16/6/73.

[287] SD 7/4/79.

[288] — Célebres palavras de um discurso do primeiro-ministro britânico Winston Churchill, convocando os ingleses a enfrentarem de cabeça erguida as agruras da guerra contra a Alemanha nazista.

[289] Carta de Dr. Plinio a D. Sigaud, 8/8/47.

[290] Carta de Dr. Plinio ao Padre João de Castro e Costa, SJ, 16/10/47.

[291] Carta de Dr. Plinio a D. Sigaud, 8/8/47.

[292] Carta de Dr. Plinio ao Padre João de Castro e Costa, SJ, 16/10/47.

[293] — Pierre Corneille, Le Cid, Ato IV, cena 3.

[294] Carta de Dr. Plinio a D. Sigaud, 8/8/47.

[295] Carta de Dr. Plinio ao Padre João de Castro e Costa, SJ, 16/10/47.

[296] Memorando para o Cônego Antonio Leme Machado, data provável 1948.

[297] Carta de Dr. Plinio ao Padre João de Castro e Costa, SJ,16/10/47.

[298] Memorando para o Cônego Antonio Leme Machado, data provável 1948.

[299] Carta de Dr. Plinio ao Padre João de Castro e Costa, SJ,16/10/47.

[300] Memorando sobre a crise progressista brasileira por ocasião do 36° Congresso Eucarístico Internacional (Rio, 1955).

[301] Carta de Dr. Plinio ao Padre João de Castro e Costa, SJ,16/10/47.

[302] Despacho Itália 26/3/92.

[303] Carta de Dr. Plinio ao Padre João de Castro e Costa, SJ, 10/10/46.

[304] SD 14/4/79.

[305] — Padre Robert Leiber (1887-1967), jesuíta alemão, professor na Pontifícia Universidade Gregoriana. Foi também assistente pessoal e secretário privado do Cardeal Eugenio Pacelli, depois Papa Pio XII, entre os anos 1924 e 1958. Trabalhou como diplomata do Vaticano nos contatos secretos com a resistência alemã contra o nazismo. Ele apoiou o escritor e diplomata austríaco Ludwig von Pastor na preparação da célebre História dos Papas.

[306] Almoço EANS 16/6/82.

[307] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[308] Simpósio 24/1/91.

[309] Um homem, uma obra, uma gesta, cit.

[310] SD 7/7/73.

[311] SD 9/7/88.

[312] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[313] Simpósio 24/1/91.

[314] SD 9/7/88.

[315] Palavrinha 16/1/91.

[316] Nasce a TFP, Folha de S. Paulo, 22/2/69.

[317] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[318] Simpósio 24/1/91.

[319] Almoço EANS 16/6/82.

[320] SD 7/7/73.

[321] Um grande passo, Diário de São Paulo, 8/3/35.

[322] SD 7/7/73 — O primeiro Legionário que publicou artigo do Professor Fernando Furquim sobre o assunto é de 9 de fevereiro de 1947. Catolicismo, desde o seu primeiro número, retomou o tema e publicou uma longa série desses artigos históricos, primeiramente usando o pseudônimo de Bertrand de Poulengy, depois assinando com seu próprio nome, a partir do número 13, de janeiro de 1952.

[323] Almoço EANS 16/6/82.

[324] Reunião Normal 9/7/71.

[325] Almoço EANS 16/6/82.

[326] SD 8/4/89 e Almoço EANS 16/6/82.

[327] SD 8/4/89.

[328] Guerreiros da Virgem: a réplica da autenticidade — A TFP sem segredos, Editora Vera Cruz, São Paulo, 1985, p.160, nota 7.

[329] — Outrora, no Brasil, a semana de trabalho ia de segunda-feira ao fim do dia de sábado, restringindo-se o dia de descanso apenas ao domingo. Com a semana inglesa, aplicada primeiramente no Rio de Janeiro em 1945, esse período de descanso passou a vigorar já no sábado à tarde.

[330] Almoço EANS 16/6/82.

[331] SD 7/7/73.

[332] RR 3/2/90.

[333] SD 7/4/79.

[334] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54 e SD 2/7/88.

[335] SD 2/7/88.

[336] SD 17/6/89.

[337] Almoço EANS 16/6/82.

[338] — Padre João de Castro e Costa, sacerdote jesuíta, havia sido professor de religião de Dr. Plinio no Colégio São Luís e com quem este mantinha correspondência. Naquele momento ele exercia a função de Reitor do Colégio Pio Brasileiro em Roma.

[339] SD 16/6/73.

[340] Almoço EANS 16/6/82.

[341] Palestra para Neocooperadores 26/2/95.

[342] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[343] Palestra sobre Memórias (VIII) 13/8/54.

[344] Discurso no 25° aniversário do Em Defesa, 8/6/68.

[345] Almoço EANS 9/4/87.

[346] — Na verdade, tendo Dom Sigaud sido designado pela Santa Sé Bispo de Jacarezinho em 29 de outubro de 1946, a notícia chegou a Dr. Plinio em meados de novembro desse mesmo ano. Tanto é que a designação foi notícia de primeira página do Legionário n° 745, de 17/11/46.

[347] Nasce a TFP, cit.

[348] Chá ESB 7/3/95.

[349] SD 17/6/89.

[350] Nasce a TFP, cit.

[351] SD 16/6/73.

[352] SD 17/6/89.

[353] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[354] SD 16/6/73 — A reportagem da sagração em São Paulo foi estampada no n° 769 do Legionário, de 4/5/47. E a da tomada de posse em Jacarezinho no n° 770, de 11 de maio do mesmo ano.

[355] Carta de Dr. Plinio ao Padre Sigaud, 16/12/46.

[356] SD 16/6/73.

[357] — A tomada de posse foi no domingo, dia 4 de maio de 1947. Dr. Plinio discursou, em nome da comitiva que viera de São Paulo, durante almoço oferecido no Palácio Episcopal às pessoas gradas e aos membros dessa comitiva.

[358] Palavrinha 30/1/94.

[359] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54 — A encíclica Mediator Dei, de 20 de novembro de 1947, era mais uma confirmação da Santa Sé dos desvios que haviam se introduzido na sagrada liturgia.

Em um de seus trechos, Pio XII acentuava: “Notamos, com muita apreensão, que há algumas pessoas muito ávidas de novidades e que se afastam do caminho da sã doutrina e da prudência. Na intenção e desejo de um renovamento litúrgico, esses inserem muitas vezes princípios que, em teoria ou na prática, comprometem esta santíssima causa, e frequentemente até a contaminam de erros que atingem a fé católica e a doutrina ascética”.

Pio XII remarcava ainda a importância da piedade particular, ao apontar as “novas teorias sobre a ‘piedade objetiva’, as quais [...] desejariam descurar ou atenuar a ‘piedade subjetiva’ ou pessoal”. E considerava “completamente falsas, insidiosas e perniciosíssimas” as idéias dos que julgavam que se deveria “descurar as outras práticas religiosas não estritamente litúrgicas, e realizadas fora do culto público”. Dizia também que “o fato de tomarem os fiéis parte no Sacrifício Eucarístico não significa entretanto que eles gozem de poderes sacerdotais”. E condenava vários outros erros que o livro Em Defesa havia apontado no liturgicismo. O Legionário saudou essa encíclica com júbilo e publicou-a em duas partes, nas edições nºs 801 e 802, respectivamente de 14 e 21/12/47.

[360] Carta de Dr. Plinio ao Padre José Antonio Labúru Olascoaga, SJ, 30/4/48.

[361] Carta ao Padre Dainese 31/12/47.

[362] Carta de Dr. Plinio ao Padre João de Castro e Costa, SJ, 2/2/48.

[363] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[364] Legionário n° 801, de 14/12/47 — O artigo tinha como título Na casa do Pai comum, publicado, junto com a primeira parte da encíclica, no n° 801 do Legionário, de 14/12/47. O n° 802, de 21/12/47, estampava a segunda e última página do documento pontifício. E o n° 803, de 29/12/47, trazia Notas e comentários à encíclica Mediator Dei, em que Dr. Plinio ressaltava os trechos da Encíclica que condenavam a corrente litúrgico-progressista. Isto foi a gota d’água para o que veio em seguida. Este mesmo número estampava o artigo de D. Sigaud de que se fala em seguida.

[365] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[366] Relatório ao Sr. Nuncio Dom Carlo Chiarlo sobre a perda do Legionário, 30/1/48.

[367] — Francisco de Paula Monteiro Machado era o diretor financeiro e contábil do Legionário S.A., empresa proprietária legal do jornal. Para garantir a independência deste e sua fidelidade ao pensamento católico, havia ficado assente, ainda na década de 30, que a maioria das ações ficaria nas mãos de um sacerdote. O Sr. Arcebispo Dom Duarte escolheu para isso o Cônego Antonio de Castro Mayer, o qual fez um testamento deixando à Mitra a propriedade de suas ações, em caso de morte. Como o Sr. Francisco Monteiro Machado era considerado bom católico, irmão de vários congregados marianos e ligado por relações pessoais a muitos outros congregados, ele mereceu uma confiança à qual, em vários episódios posteriores, não correspondeu. Para dar a ele mais liberdade de movimento na direção financeira, o Cônego Mayer transferiu em seu favor a propriedade das ações de que era portador. Tendo depois ficado patente certas irregularidades de conduta da parte do Sr. Francisco Machado, o Cônego Mayer e Dr. Plinio exigiram a dissolução da Sociedade, ficando nas mãos do Machado o encargo de levar a termo a liquidação. Essa liquidação foi longamente protelada e, sem que fosse concluída, o Sr. Francisco Machado transferiu para a Cúria a propriedade do jornal. E daí a sequência inexorável dos fatos que vieram em seguida.

[368] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[369] — Luís Tolosa de Oliveira e Costa Filho era um conhecido católico, e íntimo do Sr. Cardeal Dom Carlos Carmelo.

[370] Relatório ao Sr. Nuncio Dom Carlo Chiarlo sobre a perda do Legionário, 30/1/48.

[371] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[372] Relatório ao Sr. Nuncio Dom Carlo Chiarlo sobre a perda do Legionário, 30/1/48.

[373] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[374] Relatório ao Sr. Nuncio Dom Carlo Chiarlo sobre a perda do Legionário, 30/1/48.

[375] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[376] Relatório ao Sr. Nuncio Dom Carlo Chiarlo sobre a perda do Legionário, 30/1/48.

[377] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[378] — Cônego, e mais tarde Monsenhor Enzo Campos Gusso (nascido em 1919) era homem de confiança do Sr. Cardeal e havia sido designado por este como assistente de setores da Ação Católica, especialmente a JUC. Sob esta sua assistência, a JUC ficou tristemente famosa por sua atuação comuno-progressista nos anos 1960, a qual desaguou na formação da AP — Ação Popular, cujo caráter maoísta-leninista levou-a até à ação armada e ao terrorismo. Ele foi também professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e diretor da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras São Bento.

[379] Memorando para o Cônego Antonio Leme Machado, data provável 1948.

[380] Carta de Dr. Plinio ao Padre José Antonio Labúru Olascoaga, SJ, 23/1/50.

[381] — A cidade de São Pedro, situada a 190 km da capital paulista, é uma estância turística e termal do Estado de São Paulo.

[382] — Dom Antonio Maria Alves de Siqueira (1906-1993), Bispo Auxiliar de São Paulo em 1943, Bispo Coadjutor desta mesma cidade em 1957, Bispo Coadjutor com direito à sucessão de Campinas em 1966 e por fim Arcebispo de Campinas em 1968. Era pessoa de confiança de Dom José Gaspar de Affonseca e Silva e também de Dom Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta.

[383] — Esta notícia foi publicada na coluna Movimento Religioso, edição de 18 de março de 1948.

[384] — D. Antonio de Castro Mayer foi nomeado Coadjutor com direito à sucessão por Pio XII, a 6 de março de 1948. Sagrado no dia 23 de maio do mesmo ano, o Núncio sagrante foi Dom Carlo Chiarlo, e os assistentes — Dom Ernesto de Paula e Dom Geraldo de Proença Sigaud — foram respectivamente o Bispo de Piracicaba e o Bispo de Jacarezinho. Em 1949, com o falecimento de Dom Otaviano Pereira de Albuquerque, D. Mayer tornou-se Bispo Diocesano de Campos até sua resignação no ano de 1981.

[385] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[386] Chá 10/11/94.

[387] Para evitar as prescrições da História, cit.

[388] Memorando para o Cônego Antonio Leme Machado, data provável 1948.

[389] Memorando sobre a crise progressista brasileira por ocasião do 36° Congresso Eucarístico Internacional (Rio, 1955).

[391] Relatório enviado por Dr. Plinio ao Padre Labúru, SJ, data provável 1950.

[392] Palestra sobre Memórias (X) 15/8/54.

[393] Relatório enviado por Dr. Plinio ao Padre Labúru, SJ, data provável 1950.

[394] Palestra sobre Memórias (X) 15/8/54.

[395] Relatório enviado por Dr. Plinio ao Padre Labúru, SJ, data provável 1950.

[396] Carta de Dr. Plinio a Dom Sigaud, 1949, sobre os efeitos imediatos da Bis Saeculari Die.

[397] Memorando sobre a crise religiosa brasileira por ocasião do 36° Congresso Eucarístico Internacional (Rio, 1955).

[398] Palestra sobre Memórias (X) 15/8/54.

[399] Relatório enviado por Dr. Plinio ao Padre Labúru, SJ, data provável 1950.

[400] — Referência ao anterior CDC (Código Pio-Beneditino), então em vigor, cuja elaboração foi feita no pontificado de São Pio X e promulgado por Bento XV em 1917. Diz o cânon 2.333: “Os que recorrem ao poder laical para impedir as encíclicas ou qualquer espécie de documentos que foram dimanados da Sé Apostólica ou de seus legados, e os que direta ou indiretamente proíbem sua promulgação ou execução, ou por razão deles causam dano ou aterrorizam, já seja àqueles que possuem as encíclicas ou os documentos, já seja a outros, caem ipso facto em excomunhão reservada de um modo especial à Sé Apostólica”.

[401] — Padre Augusto Magne (1887-1966), nascido no Langedoc francês, emigrou para o Brasil aos 17 anos, aqui ingressando no seminário da Companhia de Jesus e tornando-se cidadão brasileiro em 1908. Fez seus estudos superiores em Roma, sendo doutor em filosofia e teologia pela Universidade Gregoriana. Foi diretor da Faculdade de Filosofia da PUC do Rio, membro da Sociedade Linguística de Paris e da Indogermanische Gesellschaft. Escreveu cinco dicionários sobre filologia e diversas outras obras. Além do francês, do português e do latim, conhecia bem o grego, o alemão, o inglês, o italiano, o espanhol e os dialetos provençal e romeno (cfr. Jornal do Brasil, 22/7/66).

[402] Relatório enviado por Dr. Plinio ao Padre Labúru, SJ, data provável 1950.

[403] Palestra sobre Memórias (X) 15/8/54.

[404] Relatório enviado por Dr. Plinio ao Padre Labúru, SJ, data provável 1950.

[405]Nota voltada especialmente para os estudiosos do assunto. Para que se possa constatar a diferença entre a tradução correta promovida pelas Congregações Marianas, de um lado, e, de outro lado, a versão modificada pelo Sr. Cardeal, transcrevemos primeiramente o texto latino do trecho questionado, em seguida as traduções mencionadas, às quais acrescentamos a da Poliglota Vaticana:

Versão latina, oficial: “Quapropter, cum et ab Ecclesiastica Hierarchia inter apostolicae militiae copias excipiantur ab eaque in operibus adoriendis et perficiendis plane pendeant, jure meritoque, ut quondam notavimus, hierarchici apostolatus cooperatrices sunt dicendae”.

Tradução difundida pela Federação das Congregações Marianas: “Portanto, admitidas pela Hierarquia Eclesiástica nas fileiras da milícia apostólica e dependendo claramente dela, tanto em aceitar como em levar a termo qualquer atividade apostólica, com pleno direito — como já tivemos ensejo de notar — são cooperadoras do Apostolado Hierárquico”.

Tradução da Poliglota Vaticana: “Por isso, visto serem recebidas entre os esquadrões da milícia apostólica pela hierarquia eclesiástica, e dela inteiramente dependerem na iniciativa e realização das suas atividades, com razão, como noutra ocasião advertimos, se devem denominar cooperadoras do apostolado hierárquico”.

Versão modificada aprovada pelo Cardeal: “Pelo que, por justo título, (como tivemos ensejo de notar) devem ser ditas cooperadoras do apostolado hierárquico, desde que sejam recebidas nas fileiras da milícia apostólica pela Hierarquia Eclesiástica e dela dependam em iniciar e realizar os trabalhos de apostolado” (grifos nossos).

Portanto, aquilo que o Santo Padre afirmava, com sua autoridade, que era de fato Ação Católica, na interpretação de S. Emcia. o Cardeal Motta ficava dependendo do beneplácito dos Bispos. E se o Bispo não quisesse receber a Congregação Mariana nas fileiras da milícia apostólica, não seria Ação Católica.

A discussão se cinge a como interpretar, no texto latino, a conjunção cum seguida de verbos no subjuntivo: “cum ... excipiantur ... ab eaque ... pendeant”. Na tradução do Cardeal Motta, esse cum foi traduzido por desde que. Porém, quando seguida de subjuntivo, a conjunção cum introduz uma proposição causal e deve ser traduzida por dado que, ou posto que, modismo latino vigente desde a época clássica, como indicam as boas gramáticas da língua latina (cfr., por exemplo, Simone Deléani et Jean-Marie Vermander, Initiation à la langue latine et à son système — Manuel pour grands débutants, publié sous la direction de Jean Beaujeu, Société d’Édition d’Énseignement Supérieur, Paris, 8ª ed., 1975, vol. I, pp. 144 e 269). Assim, a tradução da Federação das Congregações Marianas e a da Poliglota Vaticana, que se equivalem, são as corretas.

[406] Palestra sobre Memórias (X) 15/8/54.

[407] Relatório enviado por Dr. Plinio ao Padre Labúru, SJ, data provável 1950.

[408] Palestra sobre Memórias (X) 15/8/54.

[409] Relatório enviado por Dr. Plinio ao Padre Labúru, SJ, data provável 1950.

[410] Palestra sobre Memórias (X) 15/8/54.

[411] — Padre José Francisco Versiani Velloso (1919-1972) foi em 1966 nomeado primeiro Bispo de Itumbiara, Goiás, permanecendo no cargo até sua morte, em 1972.

[412] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[413] Carta de Dr. Plinio ao Padre Sigaud, 16/12/46.

[414] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[415] Carta de Dr. Plinio a um Prelado, data desconhecida, seguramente da segunda metade de 1948.

[416] — Em carta datada de 22/3/49 e dirigida ao Padre Riou que se encontrava em Roma, Dr. Plinio diz: “Estando há dias em visita ao Padre Alonso, ouvi dele que o ambiente do Vaticano não autorizava a menor esperança de que meu livro ‘Em Defesa da A.C.’ fosse objeto de alguma apreciação ou declaração da Santa Sé. Recebi a notícia com conformidade, não porém sem tristeza. [...] Pode, pois, V. Revma. aquilatar minha surpresa e meu júbilo, quando, pouco depois, recebi do Exmo. Revmo. Monsenhor Montini a carta cuja cópia junto”.

[417] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[418] Relatório apresentado por Dr. Plinio a Monsenhor Valentini no ano de 1950, em Roma.

[419] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[420] SD 2/7/88.

[421] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[422] SD 2/7/88.

[423] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[424] SD 2/7/88.

[425] SD 4/11/72.

[426] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[427] Almoço EANS 17/6/82.

[428] Nasce a TFP, cit.

[429] SD 4/11/72.

[430] Chá 26/2/89.

[431] Palavrinha 26/2/89.

[432] Palestra sobre Memórias (IX) 14/8/54.

[433] Carta de Dr. Plinio a Monsenhor Montini, 19/3/49.

[434] — Essa conclamação feita por São Luís Maria Grignion de Montfort é retirada da Sagrada Escritura, quando Moisés, encolerizado pelo fato de o povo ter se entregue à adoração do bezerro de ouro, exclamou: “Si quis est Domini, jungatur mihi” (Ex, 32,26). Juntaram-se então a ele os membros da tribo de Levi, aos quais Moisés ordenou que passassem ao fio da espada os idólatras. Eles assim procederam e por isso Moisés lhes disse que tinham atraído sobre si uma bênção.

[435] Jantar EANS 17/6/82.

[436] RR 15/1/77.

[437] SD 12/12/85.

[438] Memorando sobre a crise religiosa brasileira por ocasião do 36° Congresso Eucarístico Internacional (Rio, 1955).

[439] RR 15/1/77.

[440] RR 6/10/90 — No livro Rapporto sulla Fede, o Cardeal Ratzinger (futuro Bento XVI), apontava erros graves existentes na Igreja. Se tomarmos os erros apontados por ele e os erros denunciados pelo Em Defesa, há uma grande simetria. A diferença é que, no Em Defesa, Dr. Plinio detectou esses erros no seu nascedouro, ainda em âmbito nacional; e, no Rapporto sulla Fede, o Cardeal tratou dos erros já desenvolvidos em âmbito universal.

[441] Chá ENSDP 2/12/91.

[442] MNF 17/7/87.

[443] Sobre um cão imaginário, Folha de S. Paulo, 15/12/74.

[444] Chá ENSDP 2/12/91.

[445] Reunião com os mais antigos do movimento 8/6/86.

[446] Chá ENSDP 2/12/91.