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Plinio Corrêa de Oliveira
Projeto
de Constituição angustia o País
1987 |
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Capítulo IV – A esquerda, minoritária, se articula para impor ao País
uma Constituição radical
1.
O Anteprojeto Arinos serve de “cola” para os Constituintes
esquerdistas
Já antes de instalada a Constituinte, tinha a
esquerda uma grande esperança: era o Anteprojeto elaborado pelo senador
Afonso Arinos. Deveria ele servir de base para os trabalhos da atual
Constituinte. Por razões não inteiramente claras, isso não se deu. O próprio
Arinos – segundo informa “O Globo” – não comenta, mas nunca
compreendeu por que o anteprojeto ... não foi indicado à Constituinte como
parâmetro. Se isso não ocorreu, seu Anteprojeto, entretanto, acabou servindo
de cola, debaixo da carteira, para muitos Constituintes, segundo
confidenciou um deles ao senador Arinos (“O Globo”, 28-6-87). 2. Por serem minoritárias, as
esquerdas devem lutar por mudanças graduais
Ao descrever a atuação das esquerdas na
Constituinte, o primeiro ponto a ressaltar é o caráter minoritário delas: O
fato mais visível é o caráter nitidamente minoritário da esquerda na
Constituinte, declara Francisco Weffort, representante de uma corrente de
intelectuais e de elementos chegados à CNBB no PT. Segundo seus cálculos,
se o PT, o PCB e o PC do B, o PSB e parte dos parlamentares
‘progressistas’ do PMDB e PDT formassem uma frente única, seria um grupo
de um pouco mais de 50 deputados, 10% da Constituinte. Por isso o
articulista defende a tese de que as esquerdas devem lutar, dentro do
sistema, para mudá-lo gradativamente (Hugo Studart, “O Estado de S.
Paulo”, 22-3-87). O comunista Alberto Goldman, que recentemente
retornou do PCB ao PMDB, não tem receio de patentear a tática das esquerdas:
É preciso tentar consolidar os ganhos, antes de tentar avançar, para não
perder o que se conseguiu. Taticamente é manter a esquerda com o centro
democrático e construir uma maioria sólida que possa escrever uma
Constituinte que permita os avanços futuros (“Folha de S. Paulo”,
17-2-87). Afinado com essa tática, o líder da bancada
corpuscular do PCB na câmara, Roberto Freire, acha que querer dar um cunho
socialista à nova Carta ‘seria muita ingenuidade’, acrescentando que o
importante para os comunistas ‘é isolar setores mais reacionários da
Constituinte’ (“O Globo, 19-4-87). 3. A esquerda, ativa,
articulada, audaciosa, sabe o que quer e a que vem
Progressistas do PMDB em primeiro mandato,
e parlamentares do PDT, PT, PSB [Partido
Socialista] e PC do B estão articulando o bloco das esquerdas na
constituinte. O movimento é uma conseqüência da reação das bases
eleitorais desses constituintes, que ‘estão nos fazendo sérias cobranças
pela nossa inércia na Constituinte’... confessa a deputada Raquel
Capiberibe (PMDB-AP) ... O imobilismo da Constituinte, segundo avalização
desses políticos, choca-se com a ansiedade da população, que quer
pressa nos trabalhos e medidas progressistas (“Jornal do
Brasil”, 21-3-87). Como se vê, os deputados de esquerda não perdem
o vezo de apresentar como ansiedade da população e medidas
progressistas, as do agrado da corrente ideológica que demonstrou
possuir tão minguado contingente eleitoral no pleito de 1986 (cfr. Parte II,
Cap. IV). De qualquer modo, o bloco esquerdista foi o que se
mostrou, desde o início, mais organizado: Quem tem uma proposta, tem uma
vantagem. Temos um referencial – diz Roberto Freire, líder do PCB (Robson
Barenho e Luís Lanzetta, “O
Globo”, 8-2-87). Adotando esse princípio, as esquerdas se
apresentaram bem preparadas, com propostas definidas e audaciosas. Alguns elementos mais ativos da esquerda passaram,
pois, a metralhar a Assembléia com sugestões. Os três únicos deputados do
minguado PCB apresentaram em conjunto 451 emendas. A média (150,3) é a
mais alta, entre todos os partidos (“Correio Braziliense”, -7-87). O “Jornal do Brasil” (29-5-87) descreve o
desembaraço com que vêm atuando dois líderes de extrema-esquerda: Roberto Freire, líder do PCB,
e José Genoíno, vice-líder do PT são os coringas da esquerda na
Constituinte que agem em quase todas as comissões buscando avançar as teses
progressistas. ... Agiram na subcomissão da Reforma Agrária,
onde impediram a aprovação de um anteprojeto ao gosto dos conservadores. Foi
assim também na Subcomissão dos Direitos e Garantias Individuais, onde
conseguiram ... suprimir do relatório original o termo ‘subversão da
ordem’... E nessas duas subcomissões Freire e Genoíno não figuravam
sequer como suplentes. ... Genoíno atuou em sete subcomissões
durante 48 horas e só no final de semana apresentou 80 emendas, enquanto
Freire percorreu mais de 15, distribuindo mais de 200 emendas (“Jornal do Brasil”, 29-5-87). A receita, segundo Genoíno: Montar a armadilha
e deixar várias pontas soltas. No decorrer do trabalho vamos amarrando essas
pontas da maneira mais conveniente (“Folha de S. Paulo”, 29-5-87). Para o ex-guerrilheiro, hoje vice-líder do PT, é
preciso paciência no trabalho. Primeiro se colocam as idéias básicas e
irredutíveis, e mediante sucessivas questões de ordem, tenta-se ganhar os
indecisos. Quando não funciona a tática, espera-se um ‘cochilo’ da
maioria e tenta-se votar. ‘Se mesmo assim não conseguir o que se quer,
pede-se para votar com destaque as emendas que vão modificar o item aprovado
que não nos agrada’ comenta Genoíno (“Jornal do Brasil”, 12-6-87). 4. A publicidade garantida dos
PCs
Essa tática, proporciona aos deputados da extrema
esquerda uma vantagem suplementar: a de permanecerem sempre na ordem do dia,
atraindo para si uma publicidade que lhes é habitualmente bastante generosa: não
há um só noticiário cotidiano que não dedique vastos espaços ao que diz,
ao que faz e ao que pensa a ... médica Jandira Feghali (do PC do B), ou o seu
colega, do PC pernambucano, Roberto Freire. Os ‘gatos pingados’ da
extrema-esquerda tenham assim maiores espaços na televisão e nos jornais e
todo mundo fica pensando que não se fará jamais uma nova Constituinte sem
que nela sejam incluídas as habituais teses [da esquerda].(Nertam Macedo,
“O Estado de S. Paulo”, 13-2-87). Exemplo característico dessa publicidade é a
prestigiosa reportagem Deputado operário aprende política na Constituinte,
assinada por Dora Tavares de Lima no “Jornal do Brasil” (6-3-87), sobre o
deputado Edmilson Valentim (PC do B-RJ)[1]. Também o “Diário da Constituinte”, ‘elaborado
pelo Congresso Nacional e apresentado diariamente nas emissoras de TV, nos horários
nobres’, entrou nesse coro publicitário, segundo “O Estado de S.
Paulo” (20-6-87): Uma amostragem do programa nos meses de abril e maio
revelou, por exemplo, que o deputado Aldo Arantes (PC do B-GO) deu cinco
entrevistas, a deputada Cristina Tavares (PMDB-PE), também cinco e Artur da Távola
(PMDB-RJ), seis. Com apenas 15 constituintes, o PT deu mais de 20 entrevistas,
enquanto o PTB, com 19 parlamentares, só deu seis, e Fernando Henrique
Cardoso apareceu quase diariamente. O deputado José Egreja critica o mesmo “Diário
da Constituinte”: não só faz propaganda dos parlamentares esquerdistas,
como difunde suas idéias através de reportagens. Segundo ele, esse programa vem
sendo manipulado por grupos de esquerda coordenados pelo Deputado Marcelo
Cordeiro (PMDB-BA), com o objetivo de promover a reforma agrária e a intervenção
do Estado na economia. – Ele [o deputado Marcelo Cordeiro] ordenou
uma série de reportagens mostrando alguns assentamentos que teriam dado
certo, mas a informação é manipulada de forma que se mostra um assentamento
que deu certo, generalizando completamente o tema, como se a reforma agrária
fosse salvação para os problemas sociais (“O Globo”, 16-7-87). 5. Vitoriosa flexibilidade tática
da minoria esquerdista
A minoria esquerdista adapta rapidamente suas táticas
às necessidades do momento: A superioridade numérica dos conservadores e
privativistas na Constituinte já provocou uma mudança de tática do grupo
oposto, classificado de estatizante ou progressista. Por orientação de
Covas, os anteprojetos das comissões serão menos radicais que os
produzidos pelas subcomissões (“Jornal da Tarde”, São Paulo,
27-5-87). Essas manobras nem sempre passam despercebidas,
como mostra “Zero Hora” (9-6-87): O deputado Mendes Ribeiro (PMDB-RS)
denunciou a existência de uma máquina de comunicação insuspeitadamente
montada para cubanizar o Brasil. Segundo ele, a esquerda festiva, com
menos de 120 votos, consegue aparentar o inexistente, graças a manobras,
golpes de mão e espalhafato. Para Mendes Ribeiro, a esquerda festiva está
apostando na desorganização da maioria. ... A preponderância das minorias
tem a malícia das ditaduras. A flexibilidade tática da esquerda é apontada em
comentário de José Nêumanne Pinto: Os pequenos partidos de esquerda e a
ala ‘xiita’ do PMDB mostraram ser raquíticos de corpo e membros, mas ágeis
e hábeis pela organização cerebral (“Jornal do Brasil”, 15-4-87). 6. Verdadeira “patrulha
ideológica” procura influenciar o rumo das decisões
No país dos rótulos e das siglas – escreve Gilberto Souza Gomes Job no “Jornal do Brasil” (28-5-87)
– se formaram as conhecidas ‘patrulhas ideológicas’. No caso específico
da Assembléia Constituinte – continua o articulista – esse patrulhamento
é efetuado por uma parcela numerosa de jornalistas que, embora não
representem a opinião do jornal em que trabalham, acabam por influenciar os
políticos de forma subliminar ou por via direta, já que espalham sua
ideologia desde a crônica política até as matérias de cunho científico.
Daí o paradoxo de agredirem a semântica, utilizando a palavra progressista
para nomear os parlamentares de formação estatizante, enquanto picham de reacionários,
ventríloquos ou, com muita boa vontade, conservadores, aqueles que
acreditam na liberdade de iniciativa como pressuposto das demais liberdades. “O Estado de S. Paulo” (25-6-87) fornece
outros detalhes sobre o modo de agir dessas patrulhas: Idéias e propostas
liberais são defendidas com alguma timidez, enquanto as colocações
‘progressistas’ (para dizer claramente, de fumaças marxistas) são feitas
às escâncaras porque as ‘patrulhas’ cobram eficientemente e as galerias
trovejam em uníssono, conduzindo votos e refazendo opiniões. O “Jornal do Brasil” (6-6-87) alerta: Ao
aproximar-se a hora decisiva para o Brasil, na Constituinte, a realidade
convoca a presença ativa da maioria que, até agora, se manteve calada. ...
além de calada, foi silenciada por um patrulhamento. O Cardeal-Arcebispo do Rio de Janeiro, D. Eugênio
Sales, em artigo intitulado A Ditadura das Minorias (“O Globo”,
4-7-87), também adverte: Infelizmente, o patrulhamento ideológico atingirá
seus objetivos se não houver oposição das pessoas sensatas. 7. Ante a possibilidade de uma
Constituição menos avançada, a ameaça da mobilização popular
As esquerdas receiam, entretanto, que o texto
final da Constituição seja menos radical do que os Anteprojetos inicialmente
elaborados. A razão é que, segundo pondera Plinio de Arruda
Sampaio, apesar de os relatores esquerdistas orientarem o trabalho das Comissões
temáticas, uma Assembléia predominantemente conservadora o bombardeará e
o desfigurará com emendas reacionárias. O resultado, nesta hipótese, só
poderá ser uma Constituição ‘Frankenstein’ (“Folha de S.
Paulo”, 25-4-87). A solução para o caso, prossegue Arruda Sampaio,
é a mobilização popular, a qual apresentando uma forte pressão da massa
popular sobre os grupos hoje dominantes, fará com que uma Assembléia
conservadora vote uma Constituição progressista. Essa é a ameaça das esquerdas: Para
o deputado Wladimir Palmeira (PT-RJ), se o entendimento não for possível, só
resgatará aos ‘progressistas’ mobilizar as forças populares para
sensibilizar o plenário da Comissão, na votação final (“O Globo”,
28-5-87). O “Jornal do Brasil” (20-6-87) noticia que diversos
partidos, como o PCB, estão organizando caravanas nos Estados para garantir a
participação popular nas votações. O senador Afonso Arinos já se expressara no mesmo
sentido: Um milhão de pessoas, vindas de todas as
partes do país, viajando de ônibus, carros,
por todos os meios de transportes, estarão concentradas na Praça dos Três
Poderes, em frente ao Congresso, em Brasília, no segundo semestre deste ano,
quando a Constituinte começar a discutir e votar a futura Constituição. A previsão do senador Afonso Arinos (PFL-RJ)
dá a medida da sua expectativa de uma participação popular intensa e
decisiva na definição dos pontos fundamentais da Constituição da Nova República
(Villas-Bôas Corrêa, “Jornal do Brasil”,
15-3-87). Outras formas de pressão vão sendo preparadas.
João Amazonas, presidente do PC do B, em conversa com o senador Covas,
disse ter sido alertado pela Contag de que ocorrerão invasões anárquicas de
terras se a reforma agrária não ficar estabelecida na Constituição, o que
criaria uma instabilidade institucional muito grande no País (“O
Globo”, 29-5-87). Prevendo essa possibilidade, os Constituintes da
esquerda radical ameaçavam não assinar a Carta Magna, se ela não
corresponder às suas metas: Não assinamos e ainda faremos uma grande
campanha para que, em plebiscito popular, a nova Constituição não entre em
vigor’, afirma José Genoino, do PT (“Folha de S. Paulo”, 19-6-87). [1] Eis como a reportagem destaca atuação do deputado comunista na Constituinte: Até
agora, Edmilson viveu momentos de decepção e de absoluta perplexidade na
Constituinte, mas confessa que aprendeu como nunca em seus 23 anos de
vida. ... Aprendeu
também que quem quer falar não pode simplesmente se inscrever e ficar
sentado no fundo do plenário esperando a vez. ‘Tem que ir lá fazer
barulho, mostrar que sabe qual é a sua vez’.... Depois
de um mês, durante o qual passou noites em claro debruçado sobre a
proposta de regimento interno da Constituinte, Edmilson está mais à
vontade em Brasília, diz que conseguiu vencer parte de sua timidez
natural e não fica mais no fundo do plenário: ‘Vou para o bolo, junto
com os outros’. ... Aos poucos Edmilson aprende a adaptar sua postura combativa de militante sindical ao jogo de cintura necessário o parlamentar. |