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Plinio Corrêa de Oliveira
Projeto
de Constituição angustia o País
1987 |
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Parte
II – Congênita carência de representatividade na Constituinte, melancólico
resultado da “eleição-sem-idéias” de 1986
Uma vez analisadas as condições remotas e próximas
da autenticidade, no processo de representação democrática, cumpre
agora verificar como se passaram os fatos, com vistas a emitir um juízo
sobre a representatividade da Constituinte resultante das eleições de 15
de novembro de 1986. A matéria analisada nesta Parte II tem caráter
preponderantemente histórico. E repousa, em conseqüência, sobre a
veracidade dos fatos nela mencionados. Para documentar tal veracidade, uma
Comissão de Estudos da TFP selecionou certa quantidade de depoimentos
publicados em nossos órgãos de comunicação social. No conjunto, formam
eles uma enorme massa de 14.815 recortes de
imprensa, que permitem ao autor fundamentar com segurança suas
diversas asserções. A transcrição completa de todos os documentos
daria a este trabalho uma proporção incompatível com as dimensões
editoriais recomendáveis para uma publicação da natureza desta. Assim, cada asserção não é apoiada, em geral,
senão em um ou dois pronunciamentos de nosso mundo político, social,
religioso, cultural ou jornalístico. Em raríssimos casos, em nenhum,
quando o aspecto tratado é por demais evidente ou notório. Em compensação,
para a fundamentação das teses mais importantes, aduziu-se maior número
de depoimentos, a fim de que o leitor sinta a solidez do panorama que lhe
é apresentado[1]. Capítulo
I – A propaganda eleitoral, longe de propiciar ao eleitor uma adequada
informação para formular bem o seu voto, o desinteressou e desorientou
1. Ignorância do que seja uma
Constituinte
O despreparo da população para as eleições foi
tão grande que a imensa maioria do eleitorado nem sequer sabia o que é
uma Constituinte. A propósito, informa a “Folha de S. Paulo”
(2-7-86): Em cada grupo de onze estudantes da Universidade de Brasília – considerada um dos
melhores estabelecimentos oficiais de ensino superior no Brasil – apenas
dois sabem corretamente o que seja Constituinte. Por sinal, a UnB
(Universidade Nacional de Brasília) promoveu debates em torno do assunto,
no ano passado, a fim de estimular a participação da sociedade na busca
de soluções para os problemas brasileiros. Mas foi insignificante a
presença, nos debates, dos estudantes e da comunidade brasiliense, que, a
rigor, vive em constante contato com os acontecimentos da política
nacional. É razoável supor, em conseqüência das
cifras registradas em Brasília, que a situação não seja muito
diferente no resto do país e que talvez até seja pior no tocante à
imensa parcela da sociedade que não teve ou não tem acesso aos cursos
superiores. “O Globo”(4-8-86) acrescenta, que, a apenas três
meses e meio das eleições, a maioria dos eleitores brasileiros (75
por cento) ainda não sabe em quem votará no dia 15 de novembro e não
tem a mínima idéia do que é uma Assembléia Nacional Constituinte (72
por cento). Como pode uma Assembléia,
eleita nessas condições afirmar-se representativa do pensamento dos
eleitores a respeito dos dispositivos que devem figurar em nossa Carta
Magna? 2. A eleição para
governadores absorveu as atenções
Ademais, a eleição para governadores, feita
concomitantemente, absorveu de tal forma a atenção do eleitorado, que a
escolha dos representantes para a Constituinte ficou marcadamente
subestimada em sua importância. Esta constatação levou o Cardeal D. Paulo
Evaristo Arns, Arcebispo de São Paulo, a afirmar que o maior erro
cometido pelo governo do presidente Sarney ...foi o de não ter convocado
a Assembléia Constituinte pura, independente da eleição geral. Foi um
erro histórico de incalculável conseqüências para o nosso futuro
(Ricardo Kotscho, “Jornal do Brasil”, 9-11-86). 3. Prévias partidárias
Como foi visto, as eleições prévias, dentro dos
partidos, deveriam ser feitas em condições tais que assegurassem a
representatividade dos candidatos escolhidos (cfr. Parte I, Cap. V, 1).
Entretanto, as convenções partidárias foram de modo geral manipuladas
pelas cúpulas diretivas, de forma a favorecer (e por vezes garantir) a
vitória de certos candidatos protegidos por grupos influentes dentro do
partido. No que diz respeito a seu partido – o PMDB – o
senador Fernando Henrique Cardoso dá testemunho de que existe nele a
tendência à proteção dos ‘eleitorados cativos’, o que faz com que
candidaturas que poderiam fortalecer a legenda sejam afastadas para
beneficiar outros candidatos mais capazes de exercerem pressão junto à
Executiva regional. E é compreensível que se a escolha de candidatos for
restrita à decisão de poucos líderes, estes acabem naufragando no mar
de pressões (“Folha de S. Paulo”, 10-7-86). Por isso, a “Folha de S. Paulo”(22-7-86) pôde
afirmar que as convenções partidárias recém-realizadas estão
demonstrando, mais uma vez, em diversos pontos do país, que o controle da
maioria dos partidos políticos brasileiros cabe, em geral, a pequenos
grupos de próceres profissionais ou em fase adiantada de profissionalização.
Esse fenômeno decorre, segundo acreditam os observadores, da falta de
participação habitual da sociedade nas organizações partidárias e
também das falhas da legislação política brasileira. 4. Alianças surpreendentes
O caráter a-ideológico das eleições teve eloqüente
expressão no jogo das alianças surpreendentes, e por vezes até
desconcertantes, que nos diversos Estados, coligou ora uns, ora outros
partidos, sem nenhuma coerência doutrinária, nem político-partidária. Consignando o fato, J. O. de Meira Penna escreve: O
personalismo que caracteriza a vida política neste país ... explica
entre outras coisas as alianças mais estapafúrdias, tais como PDS e PDT,
ou PFL e PCB, ou Julião aliado dos grandes latifundiários em Pernambuco
para derrotar Arraes, e outros acordos de legendas no gênero (“Jornal
da Tarde”, São Paulo, 1º-12-86). 5. Despreocupação dos
eleitores em dar um voto coerente
A miscelânea ideológica dos partidos perturbou e
confundiu também o eleitorado que, em diversas partes do País, não
trepidou em preencher a cédula eleitoral com nomes de candidatos de
chapas diversas e de posições claramente antagônicas. Assim, em São Paulo, tanto apuradores como
fiscais confirmaram a ocorrência, em abundância, de votos para a
dobradinha Lula/Afanásio, o primeiro de orientação claramente
esquerdista, e o segundo apresentado como direitista (cfr. “Jornal da
Tarde”, São Paulo, 18-11-86). No Rio de Janeiro, segundo “O Globo”
(19-11-86), Jandira Feghali do PC do B, não quer, agora, criar uma
imagem de Deputada presa à estrutura partidária. ... Perdendo em votos
apenas para dois candidatos a Deputado Federal, - Álvaro Valle e Sandra
Cavalcanti -, Jandira tem surpreendido com cédulas onde há votos também
para candidatos conservadores, entre eles Amaral Neto e o General Newton
Cruz, ambos do PDS”. 6. Falta de radicação dos
partidos
Na verdade, grande parte do eleitorado não se
sente representada pelos partidos políticos atualmente existentes. Pesquisa da “Folha de S. Paulo” realizada
entre os dias 27 e 29 de setembro de 1986 mostra que 45% dos paulistas e
47% dos fluminenses declaram não ter preferência partidária (cfr.
“Folha de S. Paulo”, 6-10-86). Pesquisa do Ibope de fins de julho,
abrangendo 23 Estados e o Distrito Federal, chegou a uma conclusão
equivalente: 45% (cfr. “O Globo”, 10-8-86). Esta realidade arrancou expressões amargas do
professor (hoje senador) Afonso Arinos: Este período registra talvez o
último instante de desmesurado personalismo, que é uma das causas do
naufrágio dos partidos. Partidos, na sua conceituação sociológica, jurídica
e política não estão existindo, mas sim agremiações que se podem
transformar em valhacoutos de egressos de situações lamentáveis ou em
chocadeiras de pessoas que virão a dominá-las. Estamos, portanto,
operando com um sistema que se chama democracia de partidos quando eles
não existem. Os partidos estão naufragando dentro dos portos: em
Minas, em São Paulo, no Rio de Janeiro, por toda a parte. ... Não há
espaço para a discussão de idéias mas de pessoas (Villas-Bôas Corrêa,
“Jornal do Brasil”, 30-8-86). Em editorial sugestivamente intitulado Democracia,
ano zero, a “Folha de S. Paulo”(1º-1-87) lamentava: É
bem distante da verdadeira democracia a situação de debilidade
institucional e liquefação partidária que se testemunhou durante o ano.
... O pequeno enraizamento dos partidos políticos, assim como a sua
ainda presente indefinição, são sinais da insipiência dos
mecanismos democráticos. ... Partidos fracos, Congresso fraco, debate
fraco, rigor inviável na determinação das regras eleitorais
compuseram um quadro político de entristecedora esterilidade. 7. Decepção com a “classe
política”
Tal fenômeno parece não ser senão a conseqüência
de um outro: a opinião pública em geral se sente profundamente
decepcionada com a chamada classe política, constituída por políticos
profissionais. É o que registrava, entre muitos outros, o
jornalista Claudio Abramo, da “Folha de S. Paulo”(20-4-86), há pouco
falecido, o qual não ocultava o seu pessimismo: Criou-se na cabeça
das massas brasileiras e sobretudo nas de São Paulo, a noção
segundo a qual os políticos profissionais não prestam e os partidos não
passam de um entrave incômodo e desnecessário à vida do
cidadão. ... A desilusão da maioria dos cidadãos com os partidos
e com os políticos ... é tão profunda que pertencer ao chamado universo
político é hoje candidatar-se a um insulto ou expor-se a olhares de
indisfarçado e desconfiado desdém. A primeira objeção ouvida a propósito
de algum político é o fato de ser político como se o objeto da conversa
fosse portador de Aids. “O Globo” (2-11-86), por sua vez, observa: Cidadão
incrédulo, o eleitor indeciso acredita muito pouco nos políticos de
uma maneira geral. Para ele, os candidatos não são sinceros, tergiversam
quando questionados e prometem tudo para conquistar o voto. Essa gente, em
estado de dúvida, rotulada pelos institutos de pesquisa como indefinida
ou indecisa, perdeu o apreço pelo voto. Vai às urnas mais para
cumprir uma obrigação e menos pelo interesse cívico de influir nos
destinos de sua terra. 8. Propaganda eleitoral vazia
Evidentemente, não contribuiu para remediar essa
situação, a propaganda eleitoral desenvolvida em 1986, a qual se
caracterizou pela quase absoluta falta de idéias e de programas. O Pe. Paul Eugène Charbonneau, também falecido
recentemente, descreveu-a com palavras cáusticas: Qual é essa democracia que
repousa ... sobre um desfile de candidatos cujas figuras patibulares e
discursos ridículos dão-nos a lamentável impressão de que nosso país
será entregue a um exército de incompetentes,
de nulos, de políticos débeis e de irresponsáveis incorrigíveis, por não
terem matéria-prima cerebral? Assim, nós nos encontramos – e cada
vez mais – perante a desmesurada e catastrófica inflação da palavra
vazia. As palavras não dizem nada, os discursos não são mais do que
ruídos alucinantes, e com uma retórica inchada, que se caracteriza,
entre outras coisas, pelo mau gosto, somos mergulhados no mais completo
niilismo político. Nenhum programa sério foi mostrado. No lugar de
programas estruturados e racionais, que deveriam ser propostos, vemos
promessas que todos sabem que jamais serão cumpridas (“Folha de S. Paulo”,
14-11-86). 9. Os candidatos foram
cautelosos sobre os temas-chave da Constituinte
Sobre quase todos os grandes temas-chave face aos
quais era iniludível definir-se
a Constituinte, especialmente em se tratando de matérias sócio-econômicas,
a atitude da generalidade dos candidatos foi cautelosa, quando não
esquiva, o que contribuiu para acentuar ainda mais o caráter a-ideológico
das eleições. Acerca desses temas, como a tríplice reforma –
agrária, urbana e empresarial – da qual tanto e tanto cuidaram os mass
media desde muito antes da abertura da campanha pré-eleitoral e,
depois, ao longo desta – era indispensável que os candidatos se
afirmassem pró ou contra de modo claro e corajoso. Ademais, teria sido
indispensável que bom número deles tivesse utilizado largamente a
televisão, o rádio e a imprensa, para expor com argumentação vigorosa
e convincente, a respectiva posição. Debates de grande fôlego, entre os
representantes mais qualificados de uma e outra posição, teriam
concorrido para dar ao tema a dramaticidade e o calor indispensáveis à
difusão dos argumentos de um e de outro lado. Slogans expressivos
ainda poderiam ter enriquecido até seu
termo final a controvérsia. Ora, quase nada ou nada disto se viu. Os
candidatos freqüentemente se omitiram de tomar posição perante tais
temas. Quando chegaram a tomar posição, o fizeram muitas vezes inibidos
pelo medo e pelo oportunismo. E, quanto a exposições e debates de grande
envergadura, indicando de parte dos candidatos lógica, erudição ou até
mesmo cultura, pouco, muito pouco ou nada, houve, conforme acima já foi
afirmado. Notou-o com perspicácia o então presidente do
senado, José Fragelli, conforme noticia o “Correio Brasiliense”(19-11-86):
Na campanha eleitoral não foram discutidos temas relacionados com
as reformas sociais, segundo advertiu Fragelli. Os defensores da reforma
agrária não a defenderam em praça pública, pelos mesmos motivos que os
seus adversários não a combateram – porque não queriam
perder votos. Nada disso impediu um
resultado surpreendente. As urnas demonstraram que o PCB, o PC do B, e
outras correntes ou agrupamentos políticos da chamada “esquerda
ortodoxa”, tinham eleitorado muito menor do que certa publicidade fez
crer à grande maioria dos candidatos como também ao público em geral.
Em conseqüência do mito
assim criado, o conjunto dos poucos e fracos pronunciamentos feitos pelos
candidatos durante a propaganda eleitoral foi muito mais esquerdista do
que o resultado das votações provou serem os eleitores. 10. Propaganda-Show
Ao vazio das idéias levadas ao público pela
propaganda eleitoral se tentou remediar com a propaganda-show, na qual não
faltaram sequer aspectos francamente circenses. Típico dessa propaganda-show, que se tornou moda
por todo o Brasil, é o comício de encerramento da campanha do candidato
a governador vitorioso em Pernambuco, assim descrito pelo “Jornal do
Brasil” (27-10-86): Recife – Cerca de 80 mil
pessoas aplaudiram ... Miguel Arraes, que recebeu durante um dos maiores
shows-comícios do estado o apoio de mais de 20 artistas de renome
nacional, entre atores, cantores e cineastas. ... Na festa de Arraes quase não houve espaço
para discursos. ... O ator Mário Lago recitou três quadras e
pediu para que o povo repetisse, verso a verso, uma proclamação na qual
pede voto para Arraes, ‘porque Pernambuco merece’. Depois dele
alternaram-se atores, cantores e os integrantes da chapa majoritária do
PMDB. Teca Calazans cantou, acompanhada pela multidão, o hino da campanha
– uma paródia de Chico Buarque para a música ‘Tou voltando’, de
Maurício Tapajós. ... Durante os discursos políticos, quem mais
falou foi o candidato Miguel Arraes, não indo, entretanto além dos cinco
minutos. 11. Efeito da propaganda pela
TV
A publicidade gratuita feita através da TV, que
poderia e deveria servir de veículo a uma adequada informação quanto a
idéias e programas dos candidatos, contribuiu, pelo contrário, para uma
ainda maior desorientação do eleitorado. É o que afirma Villas-Bôas Corrêa no “Jornal
do Brasil” (13-10-86): Os grandes partidos entenderam que a TV
substitui os comícios ultrapassados e fizeram o impossível para
contratar assessoria competente para o aproveitamento hábil de seu tempo.
Nunca a propaganda foi tão sofisticada, criativa, movimentada com
esquetes, montagens, encenações. Pois, apesar de tanto empenho, o
eleitor continua apático. Curioso é que os índices de audiência
dos programas gratuitos não são baixos. Ao contrário, são
surpreendentemente estimulantes. Mas os reflexos não aparecem nas ruas, não
se espelham no comportamento do eleitor. ... Uma tentativa de explicação identifica
na falta de debates, a razão do desligamento do eleitor que vê mas não
se emociona, nem se importa com o monólogo de candidatos, em desfile
interminável, e de uma mortal monotonia. Realmente, ficou difícil,
impossível para o eleitor decidir o seu voto na comparação de discursos
idênticos ou muito parecidos e que escorrem em duas horas diárias do
rádio e da TV na toada de ladainha. ... O povo preparou-se
psicologicamente para engajar-se na campanha, conhecer candidatos, fazer o
seu julgamento e decidir o seu voto assistindo o debate solto e vivo entre
os candidatos ..., e foi uma tremenda decepção. [Esta é] uma campanha marcada pela
frustração e pelo receio das suas conseqüências, projetadas no
Congresso-Constituinte. 12. Agravos mútuos entre os
candidatos
A campanha eleitoral, que não se caracterizou por
diálogo de alto nível, nem por substanciosa e brilhante polêmica sobre
idéias e programas divergentes, degenerou com freqüência em acusações
e agravos mútuos, alguns até do mais baixo nível moral. A imprensa abunda em comentários do gênero, como
este de um editorial da “Folha de S. Paulo” (8-10-86): A campanha
eleitoral para o governo de São Paulo, que de início ... já dera sinais
de que não se caracterizaria pela contraposição de idéias, vê-se
neste momento cada vez mais próxima das páginas policiais. Denúncias
localizadas, comuns em períodos pré-eleitorais e importantes como mais
um subsídio para a escolha a ser feita pelos cidadãos, estão
monopolizando toda a discussão ... e disseminam pobreza político-ideológica
pelo processo eleitoral”. Não obstante, nem acusadores nem acusados parecem
ter levado muito a sério as denúncias feitas: A escalada de
xingamentos e acusações na campanha eleitoral devassou a vida particular
dos candidatos no Brasil inteiro e serviu apenas para desmoralizar os políticos,
pois ninguém foi sequer processado. Se fossem condenados às penas máximas
pelos principais crimes de que são acusados, os candidatos seriam elegíveis
para 157 anos de cadeia. Os acusadores também poderiam ser processados,
se não provassem o que afirmam. E nesse caso as condenações chegariam a
mais de 50 anos de prisão (“Jornal do Brasil”, 2-11-86). A impressão produzida, por tudo isso, sobre o
eleitorado, foi em conseqüência: a pior possível, como mostra editorial
da “Folha de S. Paulo” (14-11-86): O término da campanha eleitoral em São
Paulo ... traz certo alívio. Desperdiçada a última oportunidade para
que um mínimo de compostura e racionalidade atingisse o confronto entre
os candidatos, ... encerra-se a mais deprimente campanha eleitoral da
história recente. O expressivo salto constatado este ano na
qualidade técnica dos programas eleitorais foi acompanhado por uma
vigorosa degradação do nível da discussão política – que de política,
aliás, pouco teve. ... O eleitor vê chegar o dia 15 não com a
perspectiva de exercer um direito democrático – no Brasil, ainda
confundido com um dever cívico – mas sobretudo com a preocupação de
extinguir-se uma campanha que se tornou um martírio. 13.
Motivações pueris para a escolha do candidato
Na geral ausência de idéias, despontou até a
beleza física como motivação para o voto do eleitor. O que se passou em Brasília é arquetípico,
conforme narra Maria do Rosário Caetano, da Editoria de Cultura do
“Correio Braziliense” (19-11-86): Juventude e beleza. Quem diria que estes
dois ingredientes teriam forte peso nas eleições brasilienses? Pois –
pasmem os eleitores que só crêem na força da ideologia – tiveram.
... É tolice num País sem tradição partidária,
acreditar em voto puramente ideológico. Na escolha da maioria absoluta dos
eleitores pesam dados como a juventude e beleza de Augusto e Campanella, a
amizade familiar, a origem geográfica ... a afinidade religiosa, as relações
de vizinhança, etc. 14. Êxito eleitoral de
radialistas e apresentadores de TV
Nessa propaganda eleitoral marcada pelo show,
era natural que obtivessem especial êxito os candidatos radialistas e
apresentadores de TV. Não admira – comenta
a revista “Visão” (3-12-86) - ...que de maneira geral os
candidatos que já conviviam com os eleitores em programas de rádio e
televisão colhessem uma enxurrada de votos no dia 15. O Rio Grande do Sul
oferece casos exemplares. Aí os chamados comunicadores que se
candidataram às eleições somaram votos diretamente proporcionais às
audiências de seus respectivos programas no rádio ou na televisão.
Elegeram-se, por exemplo, os dois candidatos do PMDB ao Senado, José
Paulo Bisol, e José Fogaça. Ambos poderiam até dar-se ao luxo de
dispensar o horário gratuito, uma vez que são apresentadores de
programas da TV gaúcha. De modo semelhante, os três candidatos mais
votados à Câmara dos Deputados, também pelo PMDB, são o radialista Sérgio
Zambiase, o apresentador do Jornal do Almoço (RBS-TV), Jorge Alberto
Mendes Ribeiro, e o jornalista Antônio Britto, ex porta-voz do falecido
presidente Tancredo Neves. O fenômeno se repetiu em todo o país: no Rio,
elegeram-se o jornalista da Rede Manchete, Roberto D’Avila (PDT), e
Sandra Cavalcanti (PFL), também da Manchete – ambos para a Câmara dos
Deputados; em Brasília, um radialista, Meira Filho, elegeu-se senador
pelo PMDB; em São Paulo, além da espetacular votação do radialista
Afanásio Jazadji (PDS) para a Assembléia Legislativa, já está eleito,
para um mandato de deputado federal, o jornalista Arnaldo Faria de Sá
(PTB), da TV Record; e em Minas, o jornalista Hélio Costa conseguiu uma
cadeira na Câmara Federal pelo PFL. 15. O voto “contra”
O voto “contra”, ou voto no “menos ruim”
foi a conseqüência, para a grande maioria do eleitorado, dessa campanha
eivada de tantos vícios de representatividade democrática. Comenta Fernando Pedreira de “O Estado de S.
Paulo” (9-11-86): Talvez o traço mais marcante destas eleições
de sábado seja o seu caráter predominantemente negativo:
trata-se de um pleito em que a preocupação maior dos eleitores é
menos eleger uns, do que derrotar outros. Evitar o pior. [1] Os recortes selecionados para este trabalho foram extraídos não só dos grandes órgãos de imprensa das principais capitais brasileiras e de revistas de circulação nacional, como de jornais de importantes cidades interioranas, revistas e boletins noticiosos de entidades oficiais ou privadas, e de organismos religiosos, totalizando 60 publicações. O total acima mencionado (14.815 recortes) abrange o período de 1º de janeiro a 31 de dezembro de 1986. Além destes, a Comissão de Estudos da TFP selecionou 18.662 recortes, cobrindo o período de 1º de janeiro a 30 de setembro de 1987, utilizados para elaborar as teses da Parte III deste trabalho, totalizando assim 33.477 recortes. Aos estudiosos do assunto, ou a quem quer que manifeste interesse, a TFP franqueia o acesso ao conjunto dos documentos que coletou. Podem eles ser vistos na sede do seu Serviço de Imprensa, à Rua Martim Francisco 669, CEP 01224, São Paulo, telefone (011) 221-8755, das 13 às 20 horas, onde poderão ser xerografados por conta do interessado. |