Satanás quer a igualdade total. Deus quer a desigualdade harmônica, proporcional e orgânica na sociedade

Santo do Dia, 22 de fevereiro de 1995

A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto, por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo“, em abril de 1959.

 

 

[Comentários pedidos por sócios e cooperadores da TFP ao Prof. Plinio sobre sua obra  “Nobreza e elites tradicionais análogas nas Alocuções de Pio XII ao Patriciado e à Nobreza romana”]

 

  1. O Universo, a Igreja e a sociedade civil refletem o amor de Deus numa orgânica desigualdade

Leão XIII, na Encíclica Quod Apostolici muneris (28/12/1878), ensina:

“Aquele que criou e governa todas as coisas dispôs, com a sua sabedoria providencial, que as ínfimas coisas ajudadas pelas medianas, e estas pelas superiores, atinjam todas o seu fim.

“Por isso, assim como no Céu quis que os coros dos Anjos fossem distintos e subordinados uns aos outros, e na Igreja instituiu graus nas ordens e diversidade de ministérios de tal forma que nem todos fossem apóstolos, nem todos doutores, nem todos pastores (I Cor. 12, 28); assim estabeleceu que haveria na sociedade civil várias ordens diferentes em dignidade, em direitos e em poder, a fim de que a sociedade fosse, como a Igreja, um só corpo, compreendendo um grande número de membros, uns mais nobres do que os outros, mas todos reciprocamente necessários e preocupados com o bem comum” (*).

(*) Acta Sanctae Sedis, Typis Polyglottae Officinae, Romae, 1878, vol. XI, p. 372.

Esse item é particularmente interessante porque mostra a necessidade, para a harmonia da obra de Deus, de classes sociais diversas, mas acentuando a importância também de haver classes mais modestas e, portanto, dando uma visão abarcativa de toda a ordem social.

  1. Os sectários do socialismo declaram que o direito de propriedade é uma invenção humana que repugna à igualdade natural dos homens

E pouco mais adiante declara:

“Quanto à tranquilidade da sociedade pública e doméstica, a sabedoria católica, apoiada nos preceitos da Lei natural e divina, a isso provê muito prudentemente com as suas doutrinas e ensinamentos sobre o direito de propriedade e sobre a partilha dos bens que são adquiridos para as necessidades e utilidades da vida. Porque os sectários do socialismo, apresentando o direito de propriedade como uma invenção humana que repugna à igualdade natural dos homens, e reclamando a comunidade dos bens, declaram que é impossível suportar com paciência a pobreza e que as propriedades e direitos dos ricos podem ser violados impunemente. Mas a Igreja, que reconhece muito mais útil e sabiamente que existe a desigualdade entre os homens, naturalmente diferentes nas forças do corpo e do espírito, e que esta desigualdade também existe na posse dos bens, determina que o direito de propriedade ou domínio, que vem da própria natureza, fique intacto e inviolável para cada um” (*).

(*) Idem, p. 374.

A mesma coisa; quer dizer, o direito de propriedade está aqui afirmado muito oportunamente.

* Nós temos obrigação de repetir a verdade com uma insistência ainda maior que a da Revolução ao se arrogar o direito ilusório de repetir tantas vezes o erro

Os senhores poderiam naturalmente me perguntar por que tanta repetição. Porque eu acho que jamais basta repetir. A repetição é uma arma da qual usa a Revolução a mais não poder!

Quando a gente vai ouvir as cantilenas – Deus nos preserve disso – do rádio, da televisão e todas as outras formas de propaganda revolucionária, no fundo os senhores sempre encontram os princípios que negam esses que São Francisco de Sales e os Papas aqui mencionados dão.

Eles têm o direito de repetir sob mil formas a mesma cantilena. Nós não teríamos o direito, mais ainda, a obrigação, de repetir com uma insistência ainda maior a verdade, quando eles se arrogam ao direito ilusório de repetir tantas vezes o erro?!

É preciso que todos se convençam de que esta é a doutrina católica.

* Devido à crise progressista, muitíssimos católicos ficam com a impressão de que a desigualdade entre as classes é uma injustiça e que muito poucos Papas a aprovaram

Para que isso entre bem nos espíritos é preciso também atentar para uma sutil dificuldade que devemos encontrar em nosso caminho.

No espírito de muitíssimos católicos de nossos infelizes dias, em que na crise progressista em que se encontra a Santa Igreja de Deus as coisas se passam muitas vezes de modo tão, tão e tão irregular, nós vemos muitas vezes afirmações sobre as desigualdades sociais que são uma verrina quase incessante contra os exageros das desigualdades sociais. É evidente que por onde há o exagero, pode haver facilmente uma injustiça, mas a questão é saber se em si a desigualdade social é legítima ou não. E isto é o que os Papas nos ensinam com esta abundância de argumentos que os senhores veem.

Mas como um fiel que tenha frequentado ao longo de sua vida, ao sabor das mudanças de residência, da família, do emprego ou de qualquer outra coisa, tenha frequentado paróquias diferentes, ouviu de padres diferentes, às vezes seculares, às vezes pertencentes às ordens religiosas mais diversas, a eterna cantilena da desigualdade, a interpretação quase comunista do que seria a “opção preferencial pelos pobres”, coisa que se escangalha com a apresentação desse livro, interpretação falsa que se arrasa com a documentação desse livro.

Então, de tanto ouvir isto, de repente aparece um livro – mas um livro entre dez, cem, mil, não sei quantos mil que tratam de matéria religiosa e que não tratam do problema da desigualdade, ou quando dele tratam é para afirmar a vantagem da igualdade e lançar antipatia ou formar oposição contra todas as desigualdades – [em que] nós apresentamos uma citação, duas, três, e depois dizemos: “A citação é muito clara para quem é objetante”.

Mas no fundo do espírito do objetante fica o seguinte… é uma réplica a meu ver estúpida, mas por isso mesmo muito fácil de se tornar geral, porque, como diz a Escritura, “stultorum numerus infinitus est – o número dos estultos é infinito”. É que fica a impressão de que a generalidade dos católicos não afirma isso, nem a maioria dos Papas, nem dos Doutores da Igreja afirmam a liceidade, a legitimidade, a santidade – eu digo santidade de propósito – da propriedade privada ou das desigualdades atribuíveis ao nascimento, à diferença de classe, diferença de educação etc. E que isso escapou a algum Papa, a algum Doutor da Igreja num momento de reflexão, mas que são afirmações tão raras que são como que nunca existentes, de maneira que não se deve tomá-las em consideração à vista da torrente de afirmações em sentido contrário.

Em primeiro lugar não há nenhuma torrente de afirmações de Papas em sentido contrário.

Depois, o que se poderia dizer é que “a Igreja, se Ela em uma certa ocasião afirmou os princípios socialistas e agora, através desse livro, mostraria que por vezes Ela afirmou também princípios a favor das desigualdades legítimas, então dir-se-ia que a Igreja teve um lapso. Foram coisas que afinal não se deve comentar porque fica feio à Igreja se contradizer. Mas que foram contradições tão raras dentro de um oceano de uniformidade e de correção de pensamento que a gente não deve pensar nisso e que, portanto, no total fiquemos com o grande número dos que são igualitários…”

* Este livro sobre a Nobreza dá argumentação abundante, comprovando a liceidade das desigualdades sociais

Isto é falso. Nós estamos vendo pela torrente de documentação que esse livro apresenta – documentação tirada de fontes que são inteiramente insuspeitas, documentação que não é reproduzida por parte nenhuma como prova de que existe uma conspiração feita para impedir que essas coisas se difundam – e quem lê esse livro e vê essa torrente de afirmações compreende que ou a Igreja é um fruto cortado e que entra em contradição contra si própria e não é a Igreja de Deus – hipótese absurda – ou a Igreja pensa de acordo com isso e isto não tem nenhuma contradição com outros pronunciamentos da Igreja.

* O fundamento do empenho de Dr. Plinio na divulgação deste seu livro sobre a Nobreza acima de qualquer outra atividade das TFPs: destruir o mito igualitário para instaurar o Reino de Maria

Então eu acho que é preciso insistir, insistir, insistir até que isso entre pela mente das pessoas adentro. E é essa a razão pela qual eu com tanta insistência tenho declarado o primado da campanha a favor do livro da nobreza atualmente nesses dias que correm acima de qualquer outra atividade da TFP. Acho que é o momento de pôr isto bem em linhas claras.

Quer dizer, a TFP é, antes de tudo, uma entidade que quer restaurar o Reino de Maria e o Reino de Maria se apresenta em oposição ao reino de Satanás.

Do ponto-de-vista temporal o fundamento desta oposição pela qual o Reino de Maria e o reino de Satanás são como dois navios de guerra que batem à quilha um no outro… O ponto fundamental do ponto-de-vista do contraste entre a sociedade temporal inspirada e desejada por Satanás e a sociedade temporal desejada por Nossa Senhora, ensinada por Jesus Cristo, pela Igreja Católica é este: o da igualdade e o da desigualdade.

A Revolução é toda ela fundamentalmente igualitária, e tudo quanto é fundamentalmente igualitário e nega qualquer hierarquia em qualquer terreno é revolucionário e é de Satanás.

Isso posto, aparece-nos uma oportunidade única de publicar uma coletânea como que a meu ver ninguém fez até hoje, que é essa coletânea de textos pontifícios. Eu não sei de ninguém que tenha feito uma coisa deste gênero até hoje, e ainda um comentário destes textos que corta qualquer interpretação abusiva desses textos.

De maneira que esse livro poder-se-ia chamar “Acies Ordinata”, quer dizer, “Exército em Ordem de Batalha”. [Aplausos]

É o exército do pensamento anti-igualitário, e eu não hesito em dizer, portanto, pensamento celeste, ensinado pela Igreja através de Papas, de doutores, de santos, e de uma torrente incontável de moralistas, teólogos, é ensinado pela doutrina da desigualdade harmônica – como diz um desses textos aqui – e proporcionada. Não desigualdades excessivas, berrantes, sobretudo harmônica.

Quer dizer, as classes desiguais existem para viverem em harmonia e mútua colaboração, os ricos existem para ajudar os pobres, os pobres existem para servir os ricos. Uns são necessários aos outros e acabou-se.

* Uma vez que o livro sobre a Nobreza representa uma oportunidade única de esmagar o igualitarismo, não podemos fazer outra coisa senão dar-lhe a máxima difusão

Então, aparece uma oportunidade única de lançar um livro que poderá ser mais bem escrito ou menos, revelar mais talento ou menos. O que importa não é isto. Nós não somos nenhuma academia de letras, nós não somos nenhuma organização para exibição de talentos pessoais, nós somos uma organização profética destinada a fazer aos homens de nossos dias a denúncia profética e a conclamação profética. [*]

São Luís Grignion ao fazer esta conclamação usa uma frase latina da Escritura [Êxodo 32]: “Si quis est Domini, iungatur mihi – Aquele que é do Senhor ou da Senhora junte-se a mim para que todos nós façamos uma só corrente que destrua a iniquidade”, que segundo a visão dele, objetiva e exata, já corria aos rios e aos borbotões pela sociedade do Ancien Régime.

Nós também temos a vocação de dizer: “Quem for do Senhor e quem for de Maria junte-se a nós para essa grande obra”.

Aparece para essa grande obra um livro único no gênero. Oxalá deixe logo de ser único e apareçam outros livros melhores, mas por enquanto o que temos é esse.

O que é que vamos fazer? Nós só temos um livro para o nosso objetivo supremo que na esfera temporal é a implantação do Reino de Maria pelo reino das desigualdades sociais, orgânicas, hierárquicas, bem ordenadas, e nós vamos fazer o quê? Dedicar-nos a que coisa em vez de fazer a propaganda desse livro?

* Sobre este livro paira algo de glorioso: quarenta anos de espera profética e no dia do juízo Dr. Plinio quer estar isento de culpa quanto à difusão dessa obra

No meu outono Nossa Senhora me deu a graça de publicar esse livro que dormiu engavetado e empoeirado na sua forma primeira durante eu creio que uns quarenta anos. Por ocasião dos documentos de Pio XII eu escrevi, como os senhores sabem, uma espécie de pré livro da nobreza [** vide link abaixo, n.d.c.], mas que foi acolhido com uma tal indiferença, que eu entendi que era preciso esperar. Em cima desse livro há, portanto, algo de glorioso, há quarenta anos de espera profética. [Aplausos]

Eu não quero, mas absolutamente não quero, que quando chegue para mim “dies irae, dies illa, calamitatis et miseriae”, quando chegar o dia de eu ser julgado pela justiça inquebrantável e inflexível de Deus que Ele me possa dizer: “Eu te dei tudo e te dei inclusive as graças de uma espera privilegiada, porque foi uma longa espera de quarenta anos. Ao cabo de quarenta anos afinal de contas foi possível publicar esse livro e você o que fez?

“Você tinha pessoas «X» em tantas TFPs que por minha bondade, minha graça e pelos desígnios de minha Mãe, Nossa Senhora, você espalhou por toda a Terra com o apoio dos seus filhos espirituais, dos filhos que Eu lhe dei. Aparece esse livro e na hora em que esse livro vai florescer, em que ele vai frutificar, você tinha meios de esclarecer os membros da TFP, você tinha meios de os incitar a se dedicarem de corpo inteiro a esta tarefa prevalentemente a qualquer outra, e o que é que você fez? Você teve tantas ocasiões de dirigir a palavra a eles, falou a respeito de tantos assuntos e neste ponto você não tocou? Você foi autor do livro para tudo; não foi o promotor essencial da difusão desse livro! Agora preste-me contas disso!”

Que resposta eu teria para dar?…

Não adiantaria nem olhar para Nossa Senhora, porque, no dia do Juízo, o juízo está feito e nem a prece de Nossa Senhora – coisa mais terrível – nem a compaixão de Nossa Senhora nos ajuda. É a hora do Juízo.

Eu não quero comparecer de tal maneira desvalido à hora do Juízo. Portanto, digo o que eu estou dizendo e aviso, meus filhos, que repetirei em toda a medida do que achar necessário. [Aplausos e brado]

* Embora as circunstâncias possam tornar necessárias outras atividades, não se pode consentir em que estas desviem ponderável e duravelmente a campanha de difusão desse livro

Evidentemente o que eu estou dizendo tem seu contrapeso, tem seu equilíbrio. Eu não quero dizer, por exemplo, é um “non sense”, é uma bobagem, que porque devemos cuidar antes de tudo do livro da nobreza não devemos fazer oposição a essas coisas de rock e essas coisas que andam passando por aí. Não, nós devemos fazer oposição, devemos falar, enfim, o que couber nós devemos fazer como fizemos. Mas isto é passageiramente e com o cuidado de que não determine um desvio considerável e sensível na campanha, porque do contrário anda mal. Aquele que consinta num desvio um pouco mais ponderável na campanha, ponderável como amplitude e ponderável como duração, este anda mal.

Eu acho interessante dizer isto para ficar claro aos olhos de todo o mundo que nosso fim principal deve ser objeto de nosso zelo principal.

* Em questão espiritual, a nossa primordial atenção deve estar na devoção a Nossa Senhora; em matéria temporal, na difusão desse livro

Alguém dirá: “E a devoção a Nossa Senhora?”

Eu estou falando das matérias temporais de nossa ação em favor da sociedade temporal. É bem entendido que em matéria de vida espiritual, a devoção a Nossa Senhora, Medianeira de todas as graças, fonte e canal de todas as nossas orações que sobem a Deus por intermédio de Nossa Senhora e que vêm de Deus seguidas de um atendimento benigno também por intermédio de Nossa Senhora, e tudo o mais que diz São Luís Grignion de Montfort e dizem todos os grandes santos, tudo isso ocupa um papel primacial em nossa devoção, em nossas preocupações. Mas é na ordem espiritual; na ordem temporal é isso.

Eu queria saber se consegui ser bem claro. Aqueles para quem eu fui claro.

Então, podemos encerrar. Salve Regina, Mater misericordiae…

 

[*] A respeito deste assunto, vide “Guerreiros da Virgem – A Réplica da Autenticidade – A TFP sem segredos” (Plinio Corrêa de Oliveira, Editora Vera Cruz Ltda., dezembro de 1984, CAPÍTULO IX – RESPOSTA A ALGUMAS ACUSAÇÕES ESPARSAS, n. 3, A. A TFP como entidade providencial e profética

[**] Vejam-se especialmente os artigos publicados em CATOLICISMO nos números 63, 64 e 65, respectivamente de março, abril e maio de 1956.

E para outros documentos a respeito do tema Nobreza, clique aqui.

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