Santo do Dia, 9 de fevereiro de 1966
A D V E R T Ê N C I A
O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.
Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:
“Católico apostólico romano, o autor deste texto se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto, por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.
As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo”, em abril de 1959.
Notas biográficas:
São Luís Gonzaga (1568-1591) foi o filho mais velho de Fernando, Marquês de Castiglione. Unido à sua piedade precoce podia-se perceber o borbulhar belicoso do sangue ancestral. Assim o Marquês deu-lhe uma pequena armadura, elmo, espadinha e um pequeno arcabuz de verdade. E o levou ao acampamento de Casal-Major, onde deveria passar em revista as tropas que levava consigo para a guerra do rei espanhol contra Túnis.
Luís gostava de estar junto aos tercios espanhóis — das mais famosas tropas de infantaria então existentes — imitando seu passo marcial. Mas muitas vezes repetia seu jargão e as palavras às vezes inconvenientes de alguns deles. Seu tutor chamou-lhe a atenção, dizendo-lhe que aquela não era a linguagem de lábios limpos. Embora o menino de cinco anos não entendesse seu sentido, chorou amargamente essa involuntária falta, que acusará sempre como uma das mais graves de sua vida. E disse que a partir desse episódio teve início sua “conversão”!
Comentários do Prof. Plinio:
Nosso serviço mandou-me um trecho da vida de São Luís, retirado do Daurignac.
“No momento da partida, tendo chegado para o corpo de arma do exército comandado por D. Ferrante de Gonzaga, pai de São Luís, Luís foi mandado a Castiglione. Partindo de (..?..), D. Francesco del Turco subiu na carruagem do jovem príncipe. Os gentis-homens do séquito o acompanhavam a cavalo. Quando se ficou próximo ao campo raso, o governador disse a seu aluno, no tom solene e respeitoso com que lhe falava sempre: Monsenhor, há vários dias tenho uma observação importante para fazer a Vossa Senhoria. Eu quis esperar que ela tivesse deixado Casals, a fim de não estar disposto a renová-la.
– O que fiz por acaso? perguntou a criança, emocionada.
Resposta: Eis o que foi. Vossa Senhoria, durante toda a vossa estadia em Casals viveu no campo (esta era a vontade do príncipe, pai dele). Mas Vossa Senhoria trouxe palavras e expressões inconvenientes, que um príncipe do seu sangue jamais deve permitir a si próprio e que ele até deve ignorar, porque seria motivo de viva dor para a princesa sua mãe, se ela surpreendesse isto nos lábios de seu filho.
– Mas, caríssimo amigo (observe-se que São Luís de Gonzaga tinha quatro anos), eu não sei o que é. O que disse eu de mau? E o menino começou a chorar. O preceptor lembrou então a seu aluno as palavras das quais a inocente criança não tinha compreendido nem o sentido nem o inconveniente.
– Isso jamais me acontecerá uma segunda vez, meu bom amigo, respondeu São Luís, todo desolado de sua falta. Eu vos prometo de pensar nesse assunto sempre.
Ele foi fiel à sua promessa. Essa falta, toda de ignorância, São Luís de Gonzaga jamais a esqueceu. Ele a considerava como a mais lamentável que jamais tivesse feito em toda a sua vida, e confessava mais tarde que a lembrança que conservava dessa falta o humilhava profundamente”.
Parece-me que devo fazer um resumo dos acontecimentos. São Luís de Gonzaga tinha sangue espanhol, mas era filho de um príncipe semi-soberano da Itália, da casa de Castiglione, que tinha ligações de parentesco com as maiores casas soberanas da Europa, inclusive com a casa D’Áustria, a mais importante de todas elas. Tinha quatro anos de idade e um pouco antes dessa idade era já colocado em ambientes militares.
Isso parece um excesso, mas, pelo contrário, é uma coisa esplêndida. É porque as crianças são colocadas no jardim de infância desde pequenas, que acabam numa espécie de infância a vida inteira. Quando se quer que a criança mature, não se a coloca em jardim de infância, mas em jardim de homem. Tenho a impressão de que essas molezas de jardim de infância têm uma certa cumplicidade nos problemas de falta de estrutura das gerações atuais.
Maturar é o próprio da criança. Em vez de colocá-la em estágio superior, onde ela procure acelerar sua busca de um estado mais alto, faz-se, ao contrário, uma educação para comprimir. A criança fica infantil durante um longo tempo, e quando acaba isto é educada junto com as meninas: a co-educação. É o risco de dar um elemento híbrido, nem adulto nem infantil e de espírito nem másculo nem efeminado.
São Luís, portanto, não foi mandado para o jardim de infância, mas para o exército. Ora, os senhores sabem que nem sempre a linguagem dos ambientes militares é a mais pura e elevada possível. E o menino aprendeu umas tantas palavras peculiares ao palavreado militar, que não faziam parte da linguagem da casa de família e que tinham um sentido obsceno, imoral.
Aí vem o preceptor — os senhores vêem como o menino viaja, como viajava um príncipe nessa ocasião; ia numa carruagem com seu preceptor e tinha um séquito de gentis-homens, que o acompanhavam a cavalo — e só depois de ter deixado a cidade onde ele contraíra esse mau hábito, já em pleno campo, que falou com ele.
Vejam a gravidade que o preceptor atribuía à coisa. Os espíritos mais superficiais achariam essa gravidade exagerada. Ele disse que um príncipe de sangue jamais deveria aprender tais palavras e, que um príncipe de tal categoria, sequer deveria conhecer o seu sentido. São Luís perguntou o que era, ficou muito entristecido, etc.
Dir-se-á que esse preceptor foi imprudente: a criança, não sabendo o que era, não fizera mal nenhum. Pelo contrário, ele revelou uma visão profunda das coisas: a palavra é tal que, mesmo quando a pessoa não sabe o que quer dizer, algum mal essa palavra faz. Por exemplo: uma pessoa que tem o hábito de soltar uma exclamação blásfema. Será inútil corrigi-la? De modo nenhum: a palavra intrinsecamente tem um sentido mau e os lábios de um filho de Nossa Senhora não devem sujar-se pronunciando palavras obscenas.
E agora a humildade de São Luís: a humildade é a verdade e a verdade o leva a considerar seu pecado tão grave que foi o mais grave de sua vida. E aí transparece uma inocência, uma santidade, que é uma coisa de cegar.