São Francisco Xavier (3/12): Conselhos para um proselitismo eficaz

Santo do Dia, 15 de março de 1974, sexta-feira

A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de exposição verbal do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, e não passou por revisão do autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo”, em abril de 1959.

 

 

Eu tenho um trecho que é muito bonito entre Santo Inácio de Loyola e São Francisco Xavier, e que diz respeito a uma pergunta que se pode fazer facilmente à TFP e que já na reunião passada eu abordei e que é a seguinte: a TFP deita muita importância nos estudos de opinião pública e considera esses estudos um elemento de alta, de grande alcance para o acerto de sua atuação. A esse respeito se poderia fazer uma objeção que é a seguinte:

“Afinal de contas, os elementos da TFP deitam essa importância. Isto aí é falta de espírito sobrenatural. Tivesse alguém verdadeiro espírito sobrenatural, ponha em qualquer lugar um padre bem santo, distribuindo os sacramentos, pregando, ensinando; ou, se quiser, um apóstolo leigo bem santo, trabalhando e fazendo apostolado em qualquer lugar, o sobrenatural  chove em torno dele e ele conquista todas as almas com toda a facilidade. Esse conhecimento, portanto, de doutrina, de sociologia, conhecimento de técnicas de apostolado, conhecimento de opinião pública, para um espírito verdadeiramente sobrenatural  não adianta, são apenas os espíritos naturalistas que pensam assim”.

Qual é a resposta da TFP a uma pergunta dessas – que seria uma objeção eminentemente “heresia branca” – qual a resposta que a TFP teria que dar?

Evidentemente não se nega que, em princípio, aonde está um santo pode haver uma grande fecundidade apostólica. Mas isto não quer dizer que a Igreja não deva ir dotando ao longo dos séculos, os seus santos e os seus apóstolos – eclesiásticos ou leigos – de meios cada vez mais ricos para penetrarem no interior das almas. A objeção que assim se faz poderia fazer-se também contra São Tomás de Aquino. Dizer que toda a Suma Teológica com toda aquela filosofia, com toda aquela teologia era uma coisa supérflua. Bastava por um santo bem santo em algum lugar sem saber tanta filosofia que cairiam as graças em torno dele e ele santificaria muitas almas.

O que era verdade em grande parte e continua a ser verdade em grande parte, antes durante e depois de São Tomás. Mas é claro que a Igreja podendo facilitar a difusão da graça, derrubar obstáculos à difusão da graça, por meio de um conhecimento cada vez mais aprofundado de sua doutrina e de seus métodos de ação, Ela deve fazê-lo porque está na economia da Providência que a graça encontre obstáculos naturais; e está na economia da Providência que esses obstáculos removidos facilitam a ação da graça.

Mais ainda. A mesma graça que fecunda a ação  de um padre que não é grande sociólogo, grande manipulador de opinião pública, um leigo, pode secundar também o que o é. Então tem duas vantagens, ele sabe manipular e de outro lado a graça o ajuda.

Então os senhores tem um esplêndido trecho referente a esse assunto em São Francisco Xavier e que é tirado do seguinte livro: 5ª edição do livro “São Francisco Xavier” de Daurignac, Livraria Apostolado da Imprensa, Porto, 1959, págs. 309, 310 e 311. Deu-me um eremita. São trechos de instruções de São Francisco Xavier dadas por escrito ao Pe. Gaspar Barzeu na sua partida para a missão em Ormuz, datada de Goa, 1549. Então fala São Francisco Xavier:

“Em qualquer lugar em que estejais, embora de passagem, procurai saber, pelos habitantes mais honrados e considerados, não somente quais são os crimes que se comentem mais de ordinário na cidade, e as fraudes mais usadas no comércio, como vos recomendei para Ormuz, mas também as inclinações do povo…”

A opinião pública.

“…os costumes do país, a forma de governo, as opiniões e tudo que lhes diz respeito à vida civil”.

É bem a recomendação que se poderia dar ao apóstolo da TFP quando vai viajar.

“Crede-me, o conhecimento destas coisas é da maior importância e utilidade para o missionário, a fim de dar remédio pronto às doenças espirituais”.

Então, notem bem a frase: “o conhecimento destas coisas é da maior importância e utilidade para o missionário”. Por que não há de ser para o apóstolo leigo do século XX?

“…a fim de dar remédio pronto às doenças espirituais. Quer dizer, quem quer dar remédio pronto às doenças espirituais usa com muita vantagem desses  conhecimentos de opinião pública, etc.

“…e achar-se sempre preparado para fazer bem a todos aqueles que se lhe apresentarem. Adquirido este conhecimento, nada vos surpreenderá, nada vos causará admiração; manejareis mais facilmente os corações”.

É bem a definição de um ativista: “manejareis mais facilmente os corações”.

“Tereis mais autoridade sobre eles…”

Quer dizer, mais influência.

“…sabereis sobre que pontos deveis basear vossa argumentação e o que deveis recomendar com mais instância na confissão”.

Quer dizer, é só transpor para as condições do apóstolo leigo, é tal e qual! Que melhores conselhos dar, que melhores coisas dizer, é por um conhecimento da opinião pública, o conhecimento dos costumes do lugar. É isto que leva a alma a ter um apostolado fecundo.

“Desprezam-se muitas vezes os avisos e conselhos dos religiosos, sob pretexto de que eles desconhecem o mundo e lhes falta experiência dele; mas quando se encontra um que sabe viver e que tem inteira experiência das coisas humanas, admiram-no como a homem extraordinário, entregam-se a ele, violentam-se voluntariamente sob a sua direção; os seus conselhos por mais espinhosos, são executados. Tal é o fruto maravilhoso da ciência do mundo.”

“…o fruto maravilhoso do conhecimento do mundo”. Quer dizer, um que ignore tudo de tudo, os conselhos não são seguidos. Quando vê que esses conselhos são dados por alguém que está com a “mão na massa”, os conselhos tem outra autoridade, outra influência, é evidente!

Os senhores estão vendo aí, quão bem anda a TFP, portanto, recomendando que seus apóstolos procurem conhecer bem essas coisas.

“Não é somente nos manuscritos e nos livros impressos que se adquire aquela ciência; é nas relações com as pessoas de caráter firme e inteligente. Com esta ciência colhereis mais fruto do que com todos os raciocínios dos doutores e todas as subtilezas das escolas”.

Eu não ousaria dizer isso. São Francisco Xavier disse. Quer dizer, quem conhece a manipulação das almas e da opinião pública tem mais facilidade para converter as almas do que com todos os raciocínios das escolas. Eu não ousaria dizer isso, mas ele disse e está dito. É ir longe, hein! Eu acho até que isso deve ser entendido cum granu salis, mas então fica “cum granun salis” (com os devidos matizes, n.d.c.). Mas aqui está.

Depois que interessante isso: “não é só nos manuscritos e nos livros impressos que se adquire a ciência; é nas relações com pessoas de caráter firme e inteligente”. Quer dizer, com os bons informantes. Quer dizer, não adianta sociologia de papel, não adianta psicologia de papel. A prática, o contato, a observação viva, este é o fundamento de nossos conhecimentosIsso é de São Francisco Xavier, o grande São Francisco Xavier, um dos maiores missionários de todos os tempos. Ele continua:

“Não espereis chegar a Ormuz para pregardes; começai no mar, logo que embacardes”.

[Que] beleza, já no navio, não é?

“Não vos esmereis em prover a vossa erudição ou memória, citando muitos textos de autores antigos; citai poucos e escolhei convenientemente as citações. Interessai-vos sobretudo em pintar ao vivo o estado das almas abandonadas ao mundo e ao pecado, de modo que elas possam ver reproduzidas nos vossos sermões, como num espelho, as suas inquietações, seus artifícios, seus projetos frívolos e suas vãs esperanças”.

Os senhores estão vendo a idéia dele. Quer dizer, o verdadeiro militante deve falar ao homem de seu tempo de maneira que o homem de seu tempo se sinta denunciado, sinta entendido, visto e denunciado. É um verdadeiro tratadinho de como fazer apostolado individual, de como tratar com a opinião pública. Não conheço trecho melhor do que esse nessa matéria.

“Mostrai-lhes o abismo que assim cavam; descobri-lhes as armadilhas que são tecidas pelo espírito do mal; ensinai-lhes os meios de as evitar, acrescentando que tem tudo que perder se se deixarem prender por elas. Por este modo cativareis a atenção, porque é sempre escutado quem fala interessando o auditório”.

Do contrário é “pau” (cacete, n.d.c.). Eu pergunto: os senhores não estão vendo retratados muitos sermões que os senhores ouvem por ai?

“Atraireis vossos ouvintes representando-os a eles próprios; mas para isto é necessário tê-los observado e aprofundado. É necessário conhecê-los bem. Estudai-os como livros vivos”.

A doutrina do “livro vivo” é doutrina da TFP, por excelência.

“…e neles sabereis os meios, etc. Não vos proíbo que consulteis a Sagrada Escritura…”

A expressão também… se não fosse São Francisco, eu não ousaria dizer. Francamente. A gente deve entender isto com todo respeito devido a São Francisco, com uma boa “colherada de sal” e não (com) um grão (de sal). Mas vejam a frase:

“Não vos proíbo que consulteis a Sagrada Escritura, os Padres da Igreja, os sagrados cânones, os livros de piedade, os tratados de moral, Deus me livre disso! Eles vos fornecerão provas sólidas para estabelecer as verdades cristãs, remédios soberanos contra as tentações, exemplos heróicos de todas as virtudes. Mas…”

E aqui que é o duro:

“…tudo isto é frio para os espíritos pouco dispostos a recebê-los, e não consegue mover convenientemente senão pelo sistema que vos indiquei, de conhecer o homem por um profundo estudo, pintá-lo fielmente e colocar o quadro em tal luz que cada um possa reconhecer-se”.

Aí os senhores tem como a tradição católica corrobora sempre a orientação da TFP. Para mim foi uma surpresa quando esse eremita do São Bento me deu esse trecho. Eu estava à espera de uma ocasião para apresentá-lo aqui aos senhores. Sirva ele de ânimo aos senhores e de firmeza nas atitudes que tomaram e na compreensão de que a TFP fazendo tanto cabedal que os senhores conheçam a opinião pública, diagnostiquem, exemplifiquem, a TFP segue a trilha de um dos maiores missionários de todos os tempos, o grande São Francisco Xavier.

Nota: O Papa São Pio X, a 25 de março de 1904, constituiu São Francisco Xavier Patrono de todos os missionários.

Contato