Santo Elias, a denúncia profética e atualidade de sua devoção

 Palavrinha, 20 de julho de 1989

A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério tradicional da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo”, em abril de 1959.

 

 

O profeta Elias, como vocês todos sabem, viveu séculos antes de Nosso Senhor Jesus Cristo. Num período em que a humanidade estava imersa nas consequências do pecado original, ainda não resgatado por Ele. E, por outro lado, no paganismo, na imoralidade, corrupção etc. É a única pequena ilha que restava no mundo onde havia uma verdadeira fidelidade ao verdadeiro Deus, essa ilha era o povo de Israel, localizado na terra prometida, onde eles tinham chegado depois de peregrinar pelo deserto etc., como os senhores sabem.

Acontece que esse mundo pagão exercia uma espécie de pressão sobre os judeus localizados na terra de Israel, mais ou menos como uma ilha que é rasa, que não está muito acima do nível do mar, e que quando a maré sobe, as águas cobrem quase a ilha, depois, quando a maré desce, o território da ilha aparece.

Assim também, havia momentos de pressão geral do paganismo sobre o povo de Israel, com fraquezas do povo de Israel, que não queria resistir, não tinha generosidade, não tinha amor de Deus para resistir, e que por causa disso ficava quase submerso.

E nessas ocasiões Deus mandava seus profetas. Eram os homens investidos de uma missão oficial de falar em nome de Deus. De tal maneira que quem não ouvisse os profetas, pecava.

Os profetas eram em geral incumbidos daquilo que se pode chamar uma denúncia profética. O povo de Israel mergulhado na tibieza, na indiferença, na vontade de concordar com o paganismo, para não entrar em choque com o mundo inteiro – o povo de Israel tinha tendência a ir abandonando a verdadeira fé e tornar-se pagão também. Mas não queria ver de frente que estava cometendo esse pecado.

E então, os profetas apareciam para fazer a denúncia. Mostrar: “Vocês não querem ver de frente, mas vocês estão pecando, vocês estão abandonando o verdadeiro Deus, por isso, por aquilo, por aquilo outro. Olhem os seus maus costumes! A sua imoralidade é como a dos pagãos. Olhem os ritos que vocês compõem nas partes ocultas do templo; são ritos pagãos. Olhe isso, aquilo, vocês estão cedendo! Em nome de Deus eu aviso, vem os castigos, vem

Eles então profetizavam os castigos que vinham. E os castigos vinham!… se o povo não se convertesse. Às vezes o povo se convertia. Às vezes não. E os castigos vinham e desabavam sobre Israel, flagelavam duramente o povo de Israel como eles mereciam.

Mas depois, pela misericórdia de Deus, depois de um período mais longo ou menos de castigo, o povo de Israel se convertia e então Deus retirava o castigo de cima deles. Eles eram conquistados por povos de fora. Deus os fazia sair dos povos onde eles estavam escravizados, voltavam para Israel, reconstruíam a sua pátria antiga e continuavam a viver na fidelidade a Deus.

Mas ao cabo de algum tempo a coisa se repetia, eles começavam a decair de novo, e vinham profetas etc., etc.

Há alguma analogia entre essa situação e os dias presentes? Eu não preciso desenvolvê-la, mas basta ver que a situação do mundo presente é esta: o neopaganismo invadiu o mundo inteiro. Todas as nações vivem como se fossem pagãs. Mesmo as nações que são católicas de palavra, a gente vai examinar como elas vivem, como elas pensam etc., etc., elas são pagãs.

Dentro da própria Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo o demônio entrou: o Papa Paulo VI chegou a dizer que a fumaça de satanás tinha invadido a Igreja Católica. E chegou a dizer e a escrever em documentos dele, que a Igreja estava entregue a um processo misterioso de autodemolição. É uma coisa terrível! A Igreja se destrói a si própria. É uma coisa terrível!

E isto é o movimento progressista que os senhores notam por toda parte, e que está causando na Igreja o caos que os senhores conhecem.

Os católicos se conduzem em face do paganismo de hoje, igual ou pior do que os judeus em face do paganismo do tempo deles. E o número dos católicos verdadeiros que permaneciam fiéis, é como uma pequena ilha, ou são como pequenos arquipélagos, pequenas ilhas pelo mundo, que querem permanecer fiéis de todo modo. Elas mesmas têm às vezes a tentação de ceder. E nós encontramos dentro da própria TFP.

Ainda agora, quando eu vinha saindo do elevador – eu saio de costas, eu não vi quem é que falava comigo – , mas eu notei um rapaz – deve ser um dos senhores – de fala castelhana, que me disse: “Dr. Plínio, pode rezar por um “ex.” que saiu do grupo e agora está voltando?! E eu disse que sim. Realmente até já rezei…

Mas eu pensei: quanto drama doloroso este pedido tão rápido que esse rapaz me fez, contém! A gente está vendo que é algum rapaz de “tau” [uma vocação contra-revolucionária especial, n.d.c.] que entrou na TFP chamado por uma graça especial, que ali se instalou, que foi bem quisto pelos que estão com ele, e que também quis bem aos seus. Mas ao cabo de algum tempo a pressão do mundo pagão começou. Ele teve vergonha de não ser como os outros. Não teve coragem de resistir, e por isto foi cedendo. Eu estou vendo os companheiros de vocação dele assistirem entristecidos a decadência dele, dando um pequeno conselho, dando uma palavra boa, dando um exemplo ótimo, uma orientação, mas ele cada vez mais duro, afastando-se mais…

E depois começa a vir menos à sede, começa a prestar menos atenção nas reuniões, começa se interessar menos pelas coisas do Grupo. E interessar-se mais pelas coisas que se passam fora: uma conversa sobre uma marca de automóvel o interessa muito mais do que sobre a vida de um Santo. A notícia de que foi ganho um campeonato de qualquer porcaria em qualquer lugar do mundo, parece a ele muito mais interessante do que saber que a TFP fez uma campanha gloriosa. Ele acompanha os jornais falados com um olhar cada vez mais mortiço. Depois começa a dormir durante as reuniões. Um belo dia não aparece. Angústia! Mas no dia seguinte ele vai: alegria! Mas noutro dia ele já não vai. A frequência vai se tornando irregular. Um belo dia ele deixa de aparecer… Morreu! Não está mais vivo para a TFP.

Quantos dos senhores assistiram episódios desses? E é uma tristeza que se difunde como um véu escuro sobre a TFP. Assim tantas vezes as pessoas saem da TFP, porque não ousaram resistir. […]

Quantos e quantos fenômenos impressionantes nesse sentido a gente conhece! Mas simplesmente impressionantes!

De um modo ou doutro, de um modo ou doutro, alguns Nossa Senhora acaba protegendo e obtendo que eles sejam perdoados. No meio da infidelidade deles, num momento eles se sentem tocados, a graça lhes diz algo. Eles se arrependem, aparecem, pedem perdão, perseveram. Mais adiante perseveram ou não perseveram. É o drama das almas dentro dessas ilhas pequenas que são as TFPs, que são alguns conventos que ainda resistem, alguns padres que ainda são fiéis, alguma coisa assim. Mas são arquipélagos. Ilhas tão longe uma das outras, que às vezes nem se conhecem. Mal têm razão para suspeitar que talvez aquele lá ainda seja fiel dentro da desolação geral.

Qual é o papel do profeta Elias aí?

Ele viveu numa época terrível, de apostasia, de miséria e de vergonha. Em que uma rainha péssima – Jezabel, pagã – estava casada com o rei, influenciava o rei, e fazia os sacerdotes pagãos entrarem em Jerusalém, entrarem na terra do povo eleito e ali ofereceria sacrifícios pagãos.

E Elias se levantava com um calor, com uma altura de estatura moral, com um fogo de cólera contra esses pecados, em que ele fazia a denúncia profética com uma força extraordinária!

Os senhores sabem que na Igreja Católica há várias liturgias. Há a liturgia latina, que era essa rezada, enfim, mais ou menos essa que ainda se reza agora, e as liturgias de alguns outros povos orientais antigos, que a Igreja permitiu que conservassem a sua liturgia desde o tempo dos apóstolos. Por exemplo a liturgia malabar que é a liturgia na Índia constituída por São Tomé ainda e que a Igreja não permitiu que fosse alterada, pela venerabilidade desse rito. Há várias liturgias: Melquita, [com igreja] aqui perto etc.

Numa dessas liturgias, na liturgia siríaca – do povo sírio – está dito o seguinte (essa liturgia é a voz da Igreja como as outras): que Deus retirou Elias da Terra e fê-lo morar não se sabe onde. Mas Deus tirou Elias da Terra por quê? Porque a cólera dele era tão grande, que destruiria a Terra se ele ficasse aqui.

Mas ele não foi só isto. Ele não foi apenas um grande denunciador. Ele também anunciou uma coisa maravilhosa. Ele prenunciou a vinda de Nossa Senhora, e a vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo, a vinda do Messias.

O rei mandou avisar a ele que a seca estava tremenda, que não havia meio de chover etc. E ele disse que ele iria ao monte Carmelo, rezar no alto desse monte para pedir que chovesse. E depois de muito rezar, num céu destemperadamente azul em que nenhum fragmento de nuvem aparecia, em certo momento ele viu numa ponta do horizonte, uma nuvenzinha que se formava. E ele então mandou avisar com urgência ao rei, que mandasse fechar todas as casas, as janelas etc., etc., porque ia cair uma chuva sem exemplo sobre Israel, o que para Israel era uma vantagem porque a terra se fertilizava de novo. E o rei mandou fazer, e daí a algum tempo a chuva caiu tão torrencial que inundou todo Israel. Todo mundo radiante, era uma chuva de bênçãos, uma chuva de graça, obtida por Elias.

Essa chuva é tida como prenúncio de Nosso Senhor Jesus Cristo, com cujo sangue preciosíssimo foi resgatado o gênero humano. Um dilúvio de graças que o sangue dEle trouxe, a água do lado dEle trouxe. E isso foi considerado – é mesmo – a maior graça que houve até hoje na história da humanidade: o Nascimento, a pregação, os milagres, a fundação da Igreja e a Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo na Cruz.

Agora, esta chuva teve um precedente: foi uma nuvenzinha. A nuvenzinha é Nossa Senhora. Ele viu profeticamente Nossa Senhora e depois Nosso Senhor Jesus Cristo, que nasceu dessa nuvenzinha, como uma grande abundância de nuvens pode desprender-se de uma nuvem inicial pequena. Nasceu nessa nuvenzinha e cobriu todo o céu com a torrente de suas graças.

Ele era também um homem de um batalhar tal, que os sacerdotes dos pagãos que estavam em Israel quiseram fazer para ele um desafio – eu não me lembro bem o fato nos seus pormenores, mas é mais ou menos esse – que eles iriam matar quatrocentos animais em louvor aos deuses deles. E Elias ia também matar quatrocentos animais em nome de Deus verdadeiro. E iam ver qual desses sacrifícios trazia chuva. E Elias disse: “está bom, mas se for o meu, vocês vão ver o que lhes acontece!”

Eles ofereceram o sacrifício, não choveu, não aconteceu nada. Elias disse: “Está bem, eu agora vou oferecer o sacrifício ao Deus verdadeiro”. Oferecido o sacrifício… Elias fez questão, matou e mandou matar quatrocentos sacerdotes.

Bem, a última parte é desnecessária. Os senhores queriam as semelhanças nessa parte. Nós não matamos quatrocentos homens em nenhum lugar. Não matamos nem sequer um mosquito. Mas o fato é que nós temos atrapalhado a eles de um modo… E pelas bênçãos de Nossa Senhora temos criado muito obstáculo à expansão da Revolução.

Vamos ser fiéis na nossa ilha que é a TFP, e não vamos ter saudades e nem covardia dentro do mundo fora. Vamos enfrentar como Elias enfrentou… Nas horas de necessidade vamos rezar a Nossa Senhora como Elias rezava.

Aí está meus caros, atendido o pedido que me fizeram, e eu proponho que rezemos dez jaculatórias a Santo Elias, pedindo a intercessão dele, a proteção dele, para ele nos dar o espírito dele.

Como a visão que ele teve foi no Monte Carmelo, Nossa Senhora enquanto sendo prevista por Elias tem o título de Nossa Senhora do Carmo. Então vamos dizer: Virgo flos Carmeli, quer dizer: Virgem flor do Carmelo. Virgo Flos Carmeli, ora pro nobis!

Nota: Veja também:

Santo Elias (20/7), pai espiritual da Ordem do Carmo

Elias Profeta (20 de julho), amor e cólera

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