Revolução e Contra-Revolução na Igreja Católica e na opinião pública: táticas e princípios de ação

Radio Hotel, Serra Negra (São Paulo), 19 de maio de 1983

A D V E R T Ê N C I A

Gravação de conferência do Prof. Plinio com sócios e cooperadores da TFP, não tendo sido revista pelo autor.

Se Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá Dr. Plinio em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo”, em abril de 1959.

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Qual a relação entre ecologia, progressismo “católico” e tribalismo indígena como ideal para a sociedade? No que consiste a guerra psicológica revolucionária e como o comunismo a utiliza para seus fins? – Infelizmente na Igreja, os católicos verdadeiramente ortodoxos vão sendo cada vez mais marginalizados, cada vez menos bem compreendidos – Quem ganha com o movimento pacifista no mundo? – Um movimento que avança porque poucos lhe dão atenção e que emprega todo o cuidado para impedir que se preste atenção em si, reconhece implicitamente que ele não é popular. Porque quem avança escondido, entra onde não é desejado. Uma pessoa que é desejada não se esconde. Os ladrões entram escondidos; os convidados entram pela porta principal. O comunismo está “pulando a janela” do mundo ocidental. Ele transforma os costumes e as mentalidades para o mundo contemporâneo vir a ser comunista sem que o mundo se dê conta disso. – Como derrotar a Revolução?
Em entrevista, o Prof. Plinio responde a diversas perguntas a respeito dos temas acima, tendo ocasião de desenvolver diversos conceitos que estão expostos de modo sintético em sua famosa obra “Revolução e Contra-Revolução”.

 

(Locutor: O Sr. poderia nos explicar o que seja a Revolução?)

A Revolução é uma longa concatenação de movimentos que começou no século XVI com o Protestantismo e que continuou através das eras subsequentes até os nossos dias em que o aspecto mais recente dela é chamada Revolução ou autogestionária, ou punk, ou ecológica, conforme se queira denominá-la.

Esta Revolução é um movimento que fundamentalmente tende a estabelecer a supremacia do homem sobre todo o universo, ignorando a existência de Deus, transcendente e supremo. E, em vez disso, afirmando a existência de um Deus panteísta, quer dizer, de um Deus que se confunde com toda a natureza, que está disseminado em toda a natureza e que é não uma pessoa, mas é mais uma energia universal que teria originado todas as coisas. Energia esta que habitaria em nós que, portanto, seríamos divinos, como é divino tudo quanto existe.

Ao contrário disso – como nós bem sabemos – a doutrina revelada, da qual a Igreja Católica é mestra infalível, a doutrina revelada nos ensina que Deus é um ser supremo, puro espírito, eterno, infinito, perfeitíssimo e inteiramente transcendente das criaturas, as quais Ele tirou todas do nada e às quais Ele ama com um amor infinito.

Negando esta existência de um Deus extrínseco ao homem e portanto superior ao homem, a Revolução passou dessa negação velada ainda no Protestantismo, ela passou para uma afirmação no próprio Protestantismo ainda, uma afirmação igualitária de outra ordem. Ela passou a estabelecer uma alteração na forma de governo eclesiástico. Nós sabemos que segundo Santo Tomás de Aquino a forma perfeita de governo é aquela que se compõe igualmente de elementos monárquico, aristocrático e democrático. A Igreja – Leão XIII ensinou muito bem –  considera essas três formas de governo justas. Nada há que se oponha a que elas se componham ou se combinem para o bem comum. E Nosso Senhor Jesus Cristo instituindo sua Igreja, lhe deu como forma de governo a composição dessas três formas. O elemento monárquico na Igreja é representado pelo Papa; o elemento aristocrático é representado pelos Bispos; e o elemento democrático é representado pelo povo. Os três: Papa, bispos e povo constituem a Igreja católica.

Mas a Igreja católica, segundo o ensinamento de todos os Papas, e eu me lembro aqui especialmente de São Pio X condenando erros modernistas a esse respeito, a Igreja católica ensina que Ela mesma é dividida em dois setores: um é da Igreja hierárquica e outro é da Igreja dicente. A Igreja docente, hierárquica, tem o poder de ensinar, de governar, de santificar. A nós, leigos fiéis, toca sermos ensinados, governados e santificados.

Há, portanto, essa divisão fundamental na Igreja, mas depois na própria hierárquica eclesiástica há graus diferentes que chegam até à suma pessoa de sua Santidade o Papa.

O protestantismo levantou-se contra isso. E proclamou a não existência de uma diferença fundamental entre o laicato e o clero. Proclamou depois, conforme as seitas, entre os episcopalianos negou o Papa e proclamou uma espécie de república na Igreja, república aristocrática. Entre os presbiterianos ela foi mais longe e proclamou uma república aristocrática pequeno-burguesa, porque admitia apenas a existência de eclesiásticos. Mas nos quakers, nos niveladores e outros movimentos protestantes assim, ela negou até a existência dos sacerdotes. E a igualdade completa se afirmou.

Este desejo extremo da igualdade completa, subjacente e disfarçado –   subconsciente é melhor de que disfarçado –  nas várias confissões protestantes, esse desejo, entretanto, se exprime de modo mais cru e mais radical na seita dos quakers. A qual seita é como um polo para o qual vão caminhando, sem perceber, as várias seitas protestantes.

Quer dizer, se tomarmos uma igreja episcopaliana em nossos dias e formos ver quais são os poderes de um bispo episcopal, de um bispo anglicano hoje, e um bispo anglicano pouco depois da ruptura com a Igreja, vê-se que o bispo anglicano hoje pode muito menos do que outrora. Na aparência o cargo existe, mas foi erodido no seu interior, está sendo erodido cada vez mais no seu interior. Por que? Por causa da Revolução igualitária que tende a assimilar aos quakers essa igreja, como a igreja presbiteriana, como as demais. É uma tendência para a igualdade completa.

Essa tendência para a igualdade completa foi contida, no que diz respeito à Igreja católica, pela Contra-Reforma, da qual tenha sido talvez o maior vulto o grande Santo Inácio de Loyola. O Concílio de Trento conteve pela Contra-Reforma esse movimento igualitário dentro da Igreja. E muito habilmente barrado assim, e querendo afirmar-se não apenas nos países protestantes, porém também nos países católicos, o igualitarismo passou para a sociedade civil. E idéias igualitárias começaram a correr a sociedade européia no século XVII e no século XVIII, especialmente no século XVIII.

Afirmando de um ou de outro modo a necessidade de uma sociedade temporal e civil inteiramente igualitária. À sombra do absolutismo monárquico, então imperante na Europa, as idéias mais radicalmente igualitárias livremente se disseminaram. Exemplo: a liberdade com que os dois principais doutores do igualitarismo em matéria temporal naquela época, Voltaire e Jean Jacques Rosseau, puderam fazer a sua pregação igualitária e republicana, niveladora, quase sem ser perturbados pela polícia dos reis absolutos de França, durante todo o tempo que quiseram.

Essas e outras circunstâncias prepararam a sociedade européia para o grande abalo que foi a Revolução Francesa, a proclamação da república na França, a decapitação do Rei Luís XVI e  da Rainha Maria Antonieta, a extinção da nobreza, a separação da Igreja e do Estado, a negação pela república francesa do direito ao Sumo Pontífice de nomear os bispos, a dependência dos bispos de uma espécie de consenso das autoridades republicanas indicadas por sufrágio universal. Enfim, a instituição da igualdade política completa e uma tendência para a igualdade econômica completa.

Quando a Revolução Francesa ia caminhando para o seu ocaso, ela teve um estertor, e esse estertor foi uma revelação mais radical do que a própria Revolução Francesa, gemido ou blasfêmia última da Revolução Francesa moribunda: foi a revolução de Babeuf, nitidamente comunista. Hoje, aliás, muitos historiadores reconhecem que a Revolução Francesa em sua raiz era comunista, e o era mesmo.

Se nós formos admitir que todos os homens são iguais por natureza e que toda desigualdade entre eles é uma injustiça, a pergunta se impõe: por que é só injusta a desigualdade política e não é injustiça também a desigualdade econômica? Ora, a desigualdade econômica é exatamente o alvo da Revolução, filha dos princípios da Revolução Francesa, que vem a ser a Revolução comunista.

Mais uma vez nós vemos que foi em terras de absolutismo que a Revolução deu mais um passo. Ela derrubou em 1917 o tzarismo, forma muito característica de monarquia absoluta, e implantou o comunismo. O comunismo se afirmou pela concentração de todos os bens no Estado. O Estado é o único proprietário de todos os bens. E de outro lado pelo ateísmo de Estado. O Estado persegue todas as religiões, ou se as tolera é apenas por política, para evitar perturbações populares muito grandes. Mas servindo-se da própria religião para extinguir a religião.

Quer dizer, designando para a igreja greco-cismática russa, designando para ela bispos e sacerdotes formados em seminários impregnados de doutrina comunista e que em nome da religião greco-cismática pregam o comunismo. Assim, portanto, a vitória do comunismo na Rússia foi uma vitória completa.

A Rússia vai se alterando aos poucos, como todos os países detrás da Cortina de Ferro, tendem para uma nova forma de comunismo, e aparece aí a IV Revolução.

No que consiste esta nova forma de comunismo?

No afã de igualdade, a existência de um Estado ainda é algo que representa a desigualdade. Porque o Estado supõe um poder e um poder que se exerce sobre outro. E essa desigualdade revolta o senso igualitário, ateu, do comunismo. Donde uma tendência a não haver mais poderes e não haver mais leis; nem leis morais, nem leis civis.

Esta tendência se exprime na IV Revolução de que maneira? Do ponto de vista dos bens, mantendo a supressão da propriedade individual, não haverá. Em regime autogestionário, que é o regime sócio-econômico da IV Revolução, não haverá propriedade individual. Haverá apenas grupos sociais, os quais são proprietários dos bens nos quais trabalham os componentes desses grupos sociais: os operários proprietários da fábrica, os trabalhadores rurais proprietários da fazenda onde trabalham e assim por diante.

Cada grupo faz a lei para si mesmo. E, no fundo da perspectiva autogestionária, não existe Estado. Estes grupos são pequenos Estados que se entrerelacionam uns com os outros por um consenso mútuo, mas não existe mais Estado. E os mais modernos dos autogestionários afirmam que a única forma verdadeira de vida para o homem é o tribalismo indígena.

O tribalismo indígena, que por exemplo no Brasil é pregado pelo bispo missionário espanhol Dom Pedro Casaldáliga, a cerca do qual eu escrevi um livro. O tribalismo indígena que é organizado dessa maneira (as tribos norte-americanas índias também o eram assim): há um pajé que recebe comunicações das forças telúricas universais e as polariza. E com isto indica aos membros da tribo o que deve acontecer. Como essas forças universais da natureza estão em contato com cada índio, cada índio impulsionado também ele por essas forças, quer o que o pajé diz. O pajé é apenas o explicitador do que todos querem. O pajé no meio de seus cânticos, suas embriaguezes, suas convulsões, explicita o que a natureza quer no interior de cada índio, e a tribo vive no consenso. O regime tribal, com o primitivismo tribal, é a meta de chegada da Revolução igualitária. É a barbárie.

Por isso mesmo a ausência de leis, inclusive da lei moral. Os senhores veem bem como a moralidade a todo momento é contestada, diminuída e desprezada hoje. A própria lei moral deve desaparecer para ficar apenas uma ordem de coisas em que o homem, atendendo a todas as suas apetências, não destrói, entretanto, a pequena coletividade primitiva na qual está inserido. É o índio. O índio não tem – dizem eles,  eu acho a afirmação falsa – que o índio não tem moral, tem apenas apetências circunscritas e essas apetências circunscritas não chegam até à explosão.

Então é o homem inteiramente livre, que faz aquilo tudo que quer, que obedece não a um Deus pessoal, mas ao movimento geral da natureza e este homem afinal atingiu a liberdade, a igualdade e a fraternidade por inteiro.

O punk, o ecologista de hoje são isso. Ecologista não é o homem que aprecia a beleza da natureza (isso qualquer de um nós aprecia); que quer proteger contra as depreciações da sociedade moderna (todos nós o queremos). [Ecologista] é o homem que quer viver nessa comunidade com a natureza, inteiramente isolado e numa espécie de culto ou comunicação telepática com a natureza, governado por ela e arredio dos outros homens.

Essas são as quatro Revoluções sucessivas, cuja consideração de conjunto, dá aos meus caros ouvintes uma ideia global do que seja a Revolução.

(Locutor: O senhor fala na III parte no livro sobre a guerra psicológica revolucionária. O sr. poderia explicar a relação disso com o fenômeno Revolução?)

De bom grado. A guerra psicológica revolucionária está baseada num fato experimental que é o seguinte: Os homens não são governados apenas por silogismos, mas eles são governados também por reflexos, por movimentos de alma vários que os levam, os impelem de um lado para outro sem que eles racionalmente se deem conta do que estão fazendo. Isso é especialmente claro na infância, é especialmente claro na outra extremidade da vida, quando a pessoa imerge na senilidade.

Mas também é claro em muitos aspectos na alma do homem contemporâneo, tão amigo de uma “espontaneidade” que se deveria pronunciar como se estivesse escrito entre aspas, e que não é senão o realizar absolutamente livre de todos os caprichos, mesmos quando irracionais. São reflexos de alma.

Ora, esses reflexos de alma podem ser influenciados por circunstâncias externas. Isso é da experiência de todos os dias. A pessoa está alegre, entra numa sala decorada com gravidade, pode por isso sentir-se triste. Ou pode sentir convidada para a reflexão. Uma pessoa pelo contrário está muito refletida e ponderada, passa por um jardim com uma apresentação botânica muito agradável, seu estado de espírito pode mudar e ele sente-se alegre. As circunstâncias estranhas condicionam a atitude temperamental do homem.

Compreende-se também que a vontade de lutar ou a vontade de descansar, a vontade de avançar ou a vontade de fugir, enfim, os mil movimentos do instinto de conservação, ou do desejo de predomínio, esses mil movimentos possam ser condicionados por fatores extrínsecos.

Compreende-se que um homem que tenha, por exemplo, em seu escritório duas belas abarbadas cruzadas, tenha na visão desses objetos um elemento para que seu espírito polêmico se desenvolva. Mas compreende-se também que um outro que tenha um quadro representado um lindo cordeiro com uma fita azul clara amarrada ao pescoço e que está dormindo languidamente junto ao riacho, tenha nisso um elemento para se sentir propenso ao pacifismo.

Nós não podemos imaginar esse quadro presente na tenda de um grande general durante a guerra, como não podemos imaginar também as alabardas presentes num escritório de um grande diplomata perito em negociações de paz. Essas coisas produzem estados de espírito diversos.

A partir disso, que é corrente, desenvolveu-se uma ciência que visa o seguinte: conhecer quais são as circunstâncias que influenciam a vontade da pessoa, do especialista, o estado de espírito de terceiros, sem que os terceiros percebam. Esses terceiros podem ser 1, 2, 3 pessoas, que o especialista quer influenciar. Mas pode ser uma multidão também. Influenciar as multidões por meio de estímulos desses, músicas, canções, prédios, hábitos sociais – que sei eu! – até uma forma nova de sorvete, pode condicionar em algo o estado de espírito de uma multidão.

Nessas condições a gente compreende que um país possa ter eminentes especialistas que provoquem no país adversário, ou pelo menos rival, as reações temperamentais que levam a opinião pública a atitudes desanimadas, atitudes moles, atitudes frouxas, a um otimismo tolo, na hora da luta e do sacrifício. Na hora em que uma guerra está para ser travada ou na hora em que o país está batalhando, mas precisa das suas últimas energias para dar o passo decisivo e vencer a guerra. Pode ser que nessa hora que um estímulo sagaz, vindo de fora produza uma diluição dos temperamentos e uma entrega do país.

Guerrear tirando do adversário a vontade de fazer a guerra é um modo ainda de guerrear. E a isto se chama hoje em dia uma arma a mais. Todos os especialistas da guerra além da infantaria, dos tanques, da marinha, da aeronáutica, da artilharia, reconhecem como nova guerra a guerra psicológica destinada a fazer que um país vença outro país.

Agora o que é guerra psicológica revolucionária? Pode ser que uma determinada corrente empenhada em fazer uma Revolução use esses recursos contra as classes sociais ou contra as correntes ideológicas que se oponham a essa Revolução. É o caso do comunismo. Ele usa contra a burguesia toda a forma de recursos destinados a tirar da burguesia a vontade de resistir; a tirar a classe popular a conformidade e boa amizade com a burguesia e a jogá-la contra burguesia, subconscientemente, por meio de estímulos. Esta é a guerra psicológica revolucionária.

Quando se lê a história, tem-se a impressão que certos grupos históricos sempre conheceram  –  como? também não sei  –  essa arte. Porque quando vamos ver a expansão do Protestantismo no século XVI; da Revolução nos séculos XVIII e XIX, da Revolução Francesa;  e do comunismo em nossos dias, e agora do ecologismo, nós vemos que sempre tudo se passa como se essa arma fosse utilizada por eles no próprio benefício e em detrimento ao adversário. Donde essas vitórias em cadência dessas revoluções sobre os adversários. É claro que não é o fator único dessa vitória, mas é um fator muito poderoso.

(Como o Sr. vê a posição da Igreja hoje em relação ao problema da Revolução e da Contra-Revolução?)

Se por Igreja se entende o que se deve entender, quer dizer, o rebanho dos fiéis de Jesus Cristo, dirigidos pelos seus legítimos pastores, eu sou obrigado, eu como católico apostólico romano – é o título que eu mais prezo em minha vida é o de católico, apostólico, romano – eu sou obrigado a reconhecer, entretanto, que a Igreja está trabalhada a fundo pela Revolução.

A Revolução no que ela tem de lógico, de intelectual, de científico, mas a Revolução no que ela tem também de psicológico e de dependente e de manuseável pela guerra psicológica revolucionária. Toda espécie de correntes revolucionárias a percorrem num regime que nós poderíamos chamar pelo menos de meia impunidade. E este regime de meia impunidade é sempre um bafejo para o mal. Porque quando o mal é meio impune, o bom é escravo.

É mais ou menos como numa cidade onde o crime e o roubo e o crime e assassinato são meio impunes. Os homens honestos são escravos de uma malta de bandidos. Infelizmente na Igreja, os católicos verdadeiramente ortodoxos vão sendo cada vez mais marginalizados, cada vez menos bem compreendidos, enquanto cresce a área daqueles que são influenciáveis pela Revolução.

(O Peace Mouvement [movimento pacifista] está crescendo na Austrália, como também na Europa e Estados Unidos. Qual a relação disso com a Revolução?)

Eu acho que para não fazer digressões doutrinárias que enquanto longas demais cansariam os ouvintes já fartamente objeto de uma distribuição de doutrinas nessa entrevista, eu diria uma coisa muito rápida que é a seguinte: a psicologia do “peace mouvement” se pode compreender perfeitamente na tese do desarmamento unilateral. Os partidários do desarmamento unilateral são o pólo de atração para o qual convergem quase todos – para dizer “quase” – todos os partidários desse movimento de paz internacional. E a tese é de que ainda que a Rússia não se desmobilize do ponto de vista atômico, as nações do Ocidente, não comunistas, devem destruir as suas armas atômicas, inclusive as destinadas para mera defesa. Porque a guerra atômica é uma coisa tão terrível que mais vale a pena capitular ante a Rússia e aceitar o comunismo do que enfrentar a guerra.

Compreendem que essa tese só pode significar a entrega do mundo inteiro ao domínio comunista, a entrega covarde do mundo inteiro ao domínio comunista. Ora, há um princípio aplicado pelos penalistas e que não falha. E’ o seguinte: quando acontece [algo] e se que saber qual é o autor, é preciso ver a quem aproveita. Eu pergunto: A quem aproveita esse movimento de paz? A um verdadeiro entendimento entre as nações ou é a Rússia soviética que fica dominando o mundo?

A segunda hipótese é a hipótese evidente. Nós compreendemos por aí que esse “peace mouvement” não é senão um artifício de guerra psicológica revolucionária para que a Rússia possa dominar o mundo sem os riscos de uma guerra. Eis aí o que me ocorreria a dizer sobre o caso.

(Uma última pergunta: o que se pode fazer contra a Revolução?)

Meu caro, a sua pergunta cai no momento em que ainda estamos no período em que se pode rezar o Regina Coeli, até 18:15 hs. Uma boa resposta é esta: a primeira coisa que se deve fazer é rezar. Comecemos, portanto, a rezar agora aqui o Regina Coeli, do tempo pascal.

Regina Coeli laetare alleluia…

Eu explicarei dentro de um instante porque é que se deve começar por rezar. Eu quero inserir esta pergunta dentro de um quadro mais amplo. É certo que a Revolução caminha tanto, porque em geral, por um artifício da guerra psicológica revolucionária que em nossos dias chegou ao seu auge, acontece que a maior parte das pessoas se manifestam muito desprevenidas em matéria de Revolução, quer seja pelo desejo de gozar a vida e não ver o perigo, quer seja pela natural inexperiência que tem nessas matérias as pessoas que não se atém ao estudo direto – e eu quase diria especializado – desse grande fenômeno coletivo.

Seja como for, um movimento que avança porque poucos lhe dão atenção, e que emprega todo o cuidado para impedir que se preste atenção em si, reconhece implicitamente que ele não é popular. Porque quem avança escondido, entra onde não é desejado. Uma pessoa que é desejada não se esconde. Os ladrões entram escondidos; os convidados entram pela porta principal, não pulam a janela. O comunismo está “pulando a janela” do mundo ocidental. Ele entra mais ou menos escondido. Ele transforma os costumes e as mentalidades para o mundo contemporâneo vir a ser comunista sem que o mundo se dê conta disso.

É claro que à medida que ele vai chegando ao seu alvo, as pessoas vão notando e prestando atenção. E pessoas que viveriam de uma vida civil comum, chamada a atenção, começam a se organizar.

Um excelente exemplo disso é nossa reunião. Nós todos seríamos pessoas que numa época de paz nem nos conheceríamos, estaríamos cada um no seu respectivo país, cuidando de sua própria vida, santificando sua alma e nos preparando para o Céu. Mas a evidência do perigo nos aglutinou. A quantos não irá aglutinando à medida que o perigo ficar maior? Esses aglutinados constituem um certo elemento de resistência. Esse elemento de resistência pode constituir um certo elemento de vitória.

Um certo elemento de resistência, um certo elemento de vitória… A modicidade de minhas expressões indica como esse aglutinação reúne forças débeis e como essa resistência é de um êxito humanamente falando pouco provável. E eu julgo que a expressão “pouco provável” é ainda uma expressão otimista.

Humanamente falando, a meu ver, tudo o que se pode aglutinar e que pode aumentar o número dos que pensam como nós é pouco diante da imensa conspiração que está armada no mundo para entregá-lo ao comunismo.

Mas eu raciocino da seguinte maneira: é que há uma promessa de Nossa Senhora  em Fátima de que o comunismo se espalharia pelo mundo caso os homens não emendassem a sua vida. Não só eles não a emendaram do ano da aparição em 1917 para cá, não só são emendaram, mas os costumes pioraram enormemente, a impiedade progrediu sob todos os aspectos. A consagração a Nossa Senhora de Fátima não se fez como Nossa Senhora pediu, as condições não estão preenchidas.

Naturalmente o castigo virá. Mas Nossa Senhora afirmou: “Por fim o Meu Imaculado Coração triunfará”. Quer dizer, de um modo ou de outro, se os homens não vencerem a Revolução, Ela vencerá a Revolução. Mas a Revolução  será vencida, nós temos a promessa da própria Mãe de Deus, a Rainha da História, porque o cetro dos acontecimentos do mundo Deus o pôs nas mãos de Sua Mãe Santíssima.

Entretanto isso não nos dispensa a nós de nos aglutinarmos e lutarmos, porque Deus se serve dos meios humanos.

Muito simbólico é nesse o sentido o que aconteceu por ocasião da multiplicação dos pães. Todos os senhores a conhecem. A narração lindíssima do Evangelho nos está presente no espírito de todos. Nosso Senhor pregando, levando atrás de Si as multidões encantadas e empolgadas com Suas palavras e com a consideração de Sua Pessoa. Chegando no deserto não tinham o que comer. Nosso Senhor teve pena da multidão pela fome que sofria e mandou recolher todos os peixes e pães, todos os alimentos que eles tinham. E foram encontrados em toda aquela multidão apenas sete pães e sete peixes. Estes sete peixes e sete pães, Nosso Senhor se serviu deles para multiplicar esses pães e esses peixes, e para atender com sobra – mas com sobra enorme – todas as necessidades da multidão.

Esta ação Deus poderia tê-la praticado sem os 7 pães e sete peixes. Ele criou o mundo por que Ele precisava daqueles sete pães e sete peixes? Mas Ele queria que os generosos que tinham pouco desse tudo o que tinham. Com isto, e para glorificar esses generosos, Ele multiplicou depois esses pães e esses peixes.

Nosso tempo, nossa dedicação, se for preciso o risco de nossa vida – nós somos poucos – esses são os sete pães e sete peixes que nós podemos oferecer a Nossa Senhora e por meio dEla a Nosso Senhor Jesus Cristo, nessa situação crítica da história.

Lutemos com todo o empenho que Nossa Senhora saberá obter de Seu Divino Filho a multiplicação desses pães e desses peixes. Será a vitória, meu caro Maurício.

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