Santo do Dia, 23 de maio de 1984, quarta-feira
A D V E R T Ê N C I A
O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.
Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério tradicional da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:
“Católico apostólico romano, o autor deste texto se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto, por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.
As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo”, em abril de 1959.
[Proclamação]
A entrada inesperada e magnífica da imagem de Nossa Senhora Auxiliadora nesta reunião domina todos os outros fatos anteriormente narrados. Por razões que são de tal maneira de todos conhecidas e sentidas, que se exprimiram pela magnífica salva de palmas, que eu creio que (tenha sido) a mais longa que jamais se bateu neste auditório. Durante todo o tempo em que durou o cântico de Salve Regina, as palmas estrugiram. E tenho certeza de que mais houvesse ocasião mais nós bateríamos palmas a Nossa Senhora Auxiliadora.
Há para isso tantas razões que se sobrepõem umas às outras e que nós conhecemos bem também, nós apenas podemos dizer isto: foi uma festa de família. E que a impressão que se tinha é que a mãe ausente, há muito tempo ausente, entrou na casa. A família não tinha como manifestar suficientemente a sua alegria pelo fato, seu entusiasmo, sua veneração, seu respeito, sua esperança.
“Mãe muito tempo ausente” em que sentido de palavra?
Nós acabamos de dizer que essa imagem de Nossa Senhora Auxiliadora se encontra em vários lugares, em várias sedes; foi lembrada, há pouco, a magnífica imagem de pedra de Nossa Senhora Auxiliadora na entrada de São Bento; foi lembrada esta imagenzinha aqui, que nos acompanha desde o tempo do “Legionário”, desde o tempo da Ação Católica; ela foi a imagem nossa que usávamos na sede da Ação Católica de São Paulo, enquanto afiávamos os instrumentos para desferir o “Em Defesa da Ação Católica”.
Não posso me esquecer do salão, se não me engano do 3º. andar da rua Quintino Bocaiúva, 176, esquina, se não me engano, da rua Benjamim Constant, aonde a Ação Católica, a dois passos do meu escritório que era no mesmo prédio, tinha a sua sede. Não posso me esquecer da peanha que ali estava e da imagem que eu mesmo comprei num fabricante de imagens da rua Rosa e Silva, e ali instalei e que com minhas próprias mãos levei depois para a sede do “Legionário” quando tivemos que entregar a Ação Católica ao adversário, para que a Rainha, saída de seu trono, lutasse dentro da trincheira.
Lembro-me, e com quanta emoção, de que essa imagem foi levada depois para a sedezinha – entregue o “Legionário” – foi levada para a sede da rua Martim Francisco, 669, exclusivamente andar térreo, onde tínhamos no fundo um espaço ocupado por uma parte da sala do fundo, uma capelazinha, um oratoriozinho e ali Ela tinha o seu altar. E ali nós rezamos a Ela de um modo ininterrupto até que a hora da reconquista recomeçasse.
Ligado ao antigo e benemérito grupo da rua Pará, grupo do “Legionário”, ligados os jovens do Padre Mariaux que aderiram a nós, passamos a ocupar uma sede no 6º. andar da rua Vieira de Carvalho; nós levamos de lá a imagem para a capela da rua Vieira de Carvalho, aonde foi obtido para servir a Ela o altar novo, então novo, que os Srs. o encontram hoje na capela da Sede do Reino de Maria.
Foi ali entronizada a imagem; foram rezadas inúmeras missas, distribuídas comunhões, num movimento intenso de piedade até que a reconquista marcou um outro passo. Deixando dois confortáveis andares num prédio de apartamentos, passamos para o palacete da rua Pará. Levamos nós mesmos a imagem para a rua Pará, à noite, num automóvel, rezando durante todo o tempo do percurso e instalamos a imagem no seu altar que Ela ocupava na rua Vieira de Carvalho (levamos o altar também, levamos tudo isto), para a rua Pará e ali instalamos na capela.
Solene entronização da imagem de Nossa Senhora Auxiliadora, na então sede do Conselho Nacional da TFP brasileira, atualmente sede do Instituto Plinio Corrêa de Oliveira
Na rua Pará, esteve Ela até ao momento em que passou para a maior das sedes que teve até agora o nosso Movimento e que é a sede da rua Maranhão. E ali Ela é objeto de nossa continua veneração.
No altar, a imagem de Nossa Senhora Auxiliadora
Por que falando da devoção a Nossa Senhora Auxiliadora in genere, eu passei, de repente, pelas várias etapas dos atos de piedade realizados em função ou em presença dessa imagem e de algum modo para a História da TFP? Para marcar que o sentido profundo de todas as nossas derrotas era um recuo da devoção a Nossa Senhora como valor que se exprimia, como verdade que se exprimia por todo o Brasil. Mas que também a nossa reconquista, uma reconquista da devoção a Nossa Senhora.
E que nós temos a alegria de poder afirmar que todo o terreno por nós reconquistado pelo Brasil, passo a passo, e de que os senhores tiveram um jornal falando aqui uma tal demonstração, todo esse terreno reconquistado passo a passo foi reconquistado para Ela. “Reconquistado para Ela” como é dizer pouco… foi reconquistado por Ela!
Se a todo o momento Ela não nos tivesse ajudado, se a todo o momento não tivéssemos recorrido a Ela, se a todo o momento não tivéssemos sentido o apoio maternal dEla, nós não teríamos feito coisa alguma. E quando a TFP chega aos seus píncaros e quando ela, por exemplo, comenta e proclama os belos resultados que nesta noite foram proclamados, ela deveria dizer: os feitos de Nossa Senhora nas regiões sertanejas do Brasil.
Que espécie de feitos?
Estes feitos são feitos sobretudo, e antes de tudo, nas nossas próprias almas. Quer dizer: que haja uma organização como a TFP, com um número, absolutamente falando, reduzido, mas proporcionalmente enorme de sócios, cooperadores e agora a nova onda de Correspondentes da TFP que vem se aproximando com esta mentalidade, com estes costumes, com este estilo de piedade, em toda a borrasca que existe em torno de nós, isto é bem o lírio que floresce à noite, durante a tempestade, nascido do lodo.
Acima, uma edelweiss, mencionada no texto que segue. Ela, por seu aspecto característico, se tornou símbolo da montanha, sendo seu habitat típico os pastos nos Alpes
Mas quando isto faz o lírio, não se recorre à metáfora senão para dizer que está acontecendo algo de inteiramente inverossímil, algo de inteiramente inexplicável, que é o edelweiss que brotou no arenal do Saara, que há, portanto, a Mãe de misericórdia, a Medianeira de todas as preces e de todos os favores que obteve que nossa prece fosse apresentada ao Divino Filho dEla e obteve que fosse atendida.
Qual prece? Antes de tudo a prece pela qual nós pedimos a Ela que nos dê a graça de amá-la, de sermos cada vez mais dela, de confiarmos cada vez mais nela, de pedirmos a Ela que Ela nos una cada vez mais a Ela e que Ela se una cada vez mais a nós. É a grande e fundamental prece: a devoção a Nossa Senhora. Que Maria nos torne devotos dela.
Eu vejo alguém que poderia dizer: “Mas então fica encaminhado para segundo plano a devoção suprema, o culto de latria a Nosso Senhor Jesus Cristo? Que revolta é esta?! o culto de dulia substituindo o culto de latria?!”
Eu fico com vontade de responder: “Que asneira é essa!?” Nossa Senhora é o canal necessário para chegar a Nosso Senhor Jesus Cristo; é o canal único para chegar a Nosso Senhor Jesus Cristo; e se nós de tal maneira aplaudimos a Nossa Senhora e a veneramos é ou não é porque nós adoramos Aquele a quem Ela conduz? É o caminho pelo qual Ele veio a nós; foi pelas orações dela que Ele se encarnou; foi nela que Ele se encarnou para depois remir o gênero humano; Ela foi a co-Redentora do gênero humano; e quando Ele subiu ao Céu, deixando os homens sós, Ele deixou a Mãe dele para atenuar um pouco a tristeza e o imenso vazio que Ele deixava.
Tendo tudo isto em vista, se nós nos agarrarmos bem a Nossa Senhora, iremos até Ele; se nós não nos agarrarmos a Nossa Senhora com todas as forças de nossa alma, aonde iremos? Para baixo! E nós sabemos bem quem está em baixo.
Eu me lembro: a TFP estava num de seus momentos mais cruéis, na luta do “Em Defesa”, mais “venida a menos”, eu tinha tido uma pequena esperança de que a Editora Mosca Hermanos de Montevidéu, que era uma editora (não sei se ainda existe), naquele tempo, de grande expressão e que me tinha escrito, pedindo licença para traduzir para o espanhol o “Em Defesa” (eu tinha mandado concordar), a Editora Mosca Hermanos me escreveu uma carta, dizendo que não se interessava mais pela publicação; era naturalmente a “máfia” que tinha chegado até lá.
Recebo outra carta de Montevidéu. Abro-a pensando: “que novo dissabor será esse?” Era uma carta escrita com a letra tremida de um velho, que via mal e empunhava mal a caneta. Esse velho, era um velho sacerdote jesuíta, que eu não conhecia, que me mandava dizer na sua carta, resumidamente, o seguinte: “por mais que a TFP seja combatida – ainda não era a TFP – eu amo e prezo muito e por causa disso eu lhes dou aquilo que eu lhes posso dar: as minhas orações em primeiro lugar; em segundo lugar um conselho: os senhores valem o que valem porque são muito devotos de Nossa Senhora; sejam cada vez mais devotos e não há bem que não lhes acontecerá; não diminuam jamais em um grau que seja essa devoção, porque todo o mal poderá vir sobre os senhores”.
Eu dobrei a carta e pensei: este velho moribundo, ele regou com um pouco de consolo a alma daquele que está em plena luta. Quero crer que a piedosa alma desse verdadeiro filho de Santo Inácio esteja aos pés de seu Fundador no Céu, gozando da visão beatífica, e olhando para Nossa Senhora. Peço a ele que reze por todos nós, para que nós sigamos esse conselho.
Mas para isso, meus caros, é capital um ponto: não basta não decair na devoção a Nossa Senhora; ou se sobe cada dia mais, ou se pára; e aquilo que pára, decai. Não tenhamos medo de exagerar, desde que fiquemos fiéis à doutrina católica em matéria de culto a Nossa Senhora, não tenhamos medo de exagerar, porque “de Mariam numquam satis” dizia São Bernardo: sobre Nossa Senhora ou em matéria de Nossa Senhora jamais há o que baste: mais, mais, mais e mais! Ela saberá depois premiar.
Nossa Senhora Auxiliadora! Por quê o título de Auxiliadora? Nossa Senhora Auxiliadora dos Cristãos… Nossa Senhora tem como maior glória o ser auxiliadora? Para Ela não é glória maior ser Mãe de Deus? É claro! Para Ela não é glória maior ser corredentora do gênero humano? É claro. Para Ela não é gloria maior ter sido concebida sem pecado original? É claro! Por quê então Nossa Senhora Auxiliadora? Por quê tanta insistência em torno desta invocação: Nossa Senhora Auxiliadora? Compreende-se.
Como Ela é Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo e é Nossa Mãe, Ela está permanentemente disposta a nos ajudar em tudo aquilo de que nós precisamos. São Luís Maria Grignion de Montfort tem uma expressão que parece exagerada, mas que está absolutamente dentro da verdade: ele diz que se houvesse no mundo uma só mãe reunindo em seu coração todas as formas e graus de ternura que todas as mães do mundo teriam por um filho único, e essa mãe tivesse um só filho para amar, ela o amaria menos do que Nossa Senhora ama todos e cada um dos homens.
De maneira que Ela é de tal maneira mãe de cada um de nós e nos quer tanto a cada um de nós, por desvalido que seja, por desencaminhado que seja, por espiritualmente trôpego que seja, por nada que valha, Ela é de tal maneira a Mãe de cada um que o homem se voltando para Ela, o primeiro movimento dEla é um movimento de amor e de auxílio.
Porque Ela nos acompanha antes mesmo de nos voltarmos para Ela. Ela tem ciência do que acontece com todos os homens, em todos os lugares; Ela nos vê aqui a nós falando dEla; e eu ouso esperar que pela intercessão de nossos anjos no céu, Ela sorria, quando nos vê falarmos dEla e vê os “ohhhh” e o “monumentais”, etc., estrugirem com aplausos nesta sala.
Ela conhece, portanto, nossas necessidades. E é por intercessão dEla que nós temos a graça de nos voltarmos para Ela. Ela que pede a Deus que tenhamos essa graça: Deus nos dá a graça, nós nos voltamos para Ela.
Nós nos voltamos e a primeira pergunta é: “Meu filho, o que queres?”
Eu já vi uma afirmação que a mim me parece verdadeira. Não era de um grande teólogo, mas eu tenho a impressão de que ela é verdadeira: que se o próprio Judas Iscariotes depois de ter vendido a Nosso Senhor e de estar caminhando para o lugar maldito aonde ele se enforcou, ele tivesse tido um momento de devoção para com Ela e tivesse rezado a Ela, ele teria recebido um apoio.
Se ele tivesse procurado por Ela e dito: “eu não sou digno nem de chegar próximo de Vós, não sou digno de Vos olhar, não sou digno de me dirigir a Vós, eu sou Judas, o imundo… mas Vós sois minha Mãe, tende pena de mim!…” Ela o teria recebido com bondade. Teria recebido com bondade o homem, o filho, cujo nome é sinônimo de torpeza mais baixa e mais asquerosa, cujo nome ninguém pronuncia sem nojo, sem extremos de nojo, por assim dizer, sem esgares de nojo: Judas Iscariotes… até este!
Mas nós temos dificuldade em ter isto sempre em vista. Por que? Porque nós não vemos e na nossa miséria, nós muitas vezes somos daqueles que não crêem porque não vêem. Nós não duvidamos, mas esquecemos… nos sentimos tão longe, nos sentimos tão deslocados que nós dizemos: “mas será mesmo? Depois, aconteceu-me isto, aconteceu-me aquilo, aconteceu-me aquilo outro… eu pedi a Ela e não fui socorrido; por que eu vou crer que agora vou ser socorrido? Mãe de Misericórdia… Às vezes para alguns, para mim, às vezes… mas às vezes não… nesta próxima provação, porque sei que serei socorrido? ó Mãe de Misericórdia!” É nessas horas que a gente deve dizer: Auxilium Christianorum! ora pro nobis!
Mais do que nunca é nestas horas que nós devemos dizer: Auxilium Christianorum! Nas horas em que nós não compreendermos, não temos noção de como será a saída do caso, o que vai acontecer, nós devemos repetir com insistência: Auxilium Christianorum! Auxilium Christianorum! Auxilium Christianorum!
Porque todo caso tem saída. Nós às vezes não vemos a saída que Ela deu ao caso, mas Ela está dando ao caso uma saída monumental. E quando eu lembro a história de nossas catástrofes, a história de nossos reerguimentos, a história da nossa dolorida e gloriosa “avenida de becos sem saídas”… eu me voltando para trás, me pergunto: se Ela me desse para escolher esta via dos becos sem saída ou escolher outra qualquer das vias que eu imaginava, qual eu teria preferido?
Eu teria respondido: “Minha Mãe, se Vós me derdes força – [escolho a] avenida dos becos sem saída!”
Avenida do inexplicável, avenida da aparente catástrofe, da derrota, do arrasamento… da vitória que se afirma! Como é bela a avenida dos becos sem saída!
Por que? Porque é a avenida triunfal de Nossa Senhora. Ela abre os becos sem saída! Ela é que transforma esta coisa monstruosa, uma avenida transformada em becos, avenida esquartejada em becos, Ela é que faz disso uma avenida. A gente compreende a providencia dela como vai: é uma verdadeira maravilha.
A esse título, portanto, muito especial, nós devemos repetir sempre: Auxilium Christianorum!
Nós somos tão poucos, tão perseguidos, tão isolados, muitas vezes tão provados interiormente, há tanta coisa que se passa dentro de nós mesmos, em torno de nós; sentimos tanto o adversário que ruge a toda espécie de distâncias, como é que nós não deveremos dizer sempre: Auxilium Christianorum! Auxilium Christianorum?
Pois nós somos poucos, para que fique claro que a vitória foi dEla! Nossa insuficiência proclama a vitória dEla, canta a glória dEla! Como não podermos ficar entusiasmados com a idéia de que Ela nos fez tão poucos para que Ela fosse tão largamente glorificada?! É evidente!
O resultado é que esta prece deve estar em nossos lábios a todos os momentos: Auxilium Christianorum, ora pro nobis; Auxilium Christianorum, ora pro nobis!
A batalha de Lepanto em uma pintura de Paolo Veronese (sec. XVI)
Os senhores tem um exemplo disso na batalha de Lepanto, tão ligada à festa de hoje. Se não me engano foi num 24 de maio a batalha de Lepanto, não tenho certeza… (Nota: Tal batalha se deu a 7 de outubro de 1571, cuja vitória se deu graças à devoção do Rosário, impulsionada pelo Papa da época, São Pio V, o qual inseriu a invocação “Auxilium Christianorum” na Ladainha Lauretana, como preito de reconhecimento pelo triunfo obtido. Por sua vez a festa de Nossa Senhora Auxílio dos Cristãos foi introduzida no calendário litúrgico por decreto do Papa Pio VII em 1814, como agradecimento por sua libertação e feliz retorno a Roma, após um longo e penoso cativeiro que lhe foi imposto por Napoleão Bonaparte, n.d.c.).
Na batalha de Lepanto, deu-se isto: a esquadra católica estava enormemente desproporcionada em relação à esquadra maometana. Já era uma coisa para não compreender: não seria mais compreensível que Nossa Senhora tivesse reunido uma esquadra potente, magnífica, católica para esmagar aquele ímpios seguidores de Mafoma? Por que Ela não fez isso?
Não. É uma esquadra pequena, talvez quase se pudesse dizer raquítica. Vem a esquadra muçulmana, forma a meia lua e vai apertando os católicos. A batalha começa. Durante a batalha, vários reveses dos católicos. Em certo momento, os católicos pulam para a nau capitânea e começam a atacar!
Há alguns êxitos, a esquadra maometana foge. Eles mesmos não compreendem bem porque é que fogem… Mas em anais, que foram encontrados nos próprios maometanos, está escrito: a esquadra fugiu porque uma Dama terrível apareceu no Céu e os olhava com olhar de ameaça tal que eles fugiram.
Não foi bom que eles fossem tão poucos? Não foi bom que eles passassem por tantos riscos? Não foi bom que eles lutassem como heróis de um modo mais ou menos inútil porque os outros eram muito fortes? Mas eles não deixaram de confiar em Nossa Senhora. E o resultado disso é que Nossa Senhora apareceu e Nossa Senhora os afugentou. Não há nada mais belo.
Encerremos com um dado final. Desviemos nossos olhares de Lepanto e voltemos nossos olhares para os esplendores do Vaticano. Numa sala do Vaticano, um papa santo – São Pio V – preside uma reunião de cardeais. Mas o melhor de sua atenção está posto em que ele pensava naquela esquadra que com uma dificuldade diplomática enorme ele conseguira unir.
O grosso da esquadra, naus espanholas, mas que o Filipão (Felipe II) levara demais tempo em mandar. De outro lado, um pouquinho de navios venezianos, da Sereníssima República de Veneza, e um miseré de naviozinhos da Santa Sé. Tudo junto colocado sob o comando de Dom João, dAustria. Os navios da Santa Sé sob o comando do príncipe Colonna. Tudo isto vai para aquelas regiões e ele pensa, ele pensa.
Em certo momento, não se sabe o que acontece com o papa, ele se afasta do lado de sua sala onde estava havendo a reunião dos cardeais e se põe junto à janela e se vê um tercinho que desce de suas mãos. Ele reza, reza o terço inteiro, volta e diz: “Uma grande vitória foi ganha por Dom João, a esquadra cristã está vencedora, a guerra está ganha!”
Dom João combateu, ele foi um grande guerreiro, foi um herói. Na sepultura dele, no Escorial, que eu tive a alegria de ver, está escrito como epitáfio uma frase que São Pio V disse dele: “Fuit homo missus a Deo cujus nomen erat Joannes” O que o Evangelho diz de São João Baptista, ele aplicou a Dom João dÁustria: Houve um homem enviado por Deus, cujo nome era João. Isto está no epitáfio de Dom João dAustria.
Mas quem foi o homem que obteve que a Rainha do Céu cortasse as imensidões vazias e viesse à batalha e com o olhar ganhasse a batalha? O Rosário rezado pelo santo – São Pio V – que rezava a Nossa Senhora, Auxilium Christianorum!
Meus caros: rezemos, portanto, Auxilium Christianorum! Auxilium Christianorum! Auxilium Christianorum! Em todas as circunstâncias de nossa vida e nossa vida acabará tal que na hora de morrer, quando nós estivermos no último alento e ainda dissermos Auxilium Christianorum, daí a pouco o Céu se abre para nós!
Com isto podemos encerrar a nossa reunião.
[Pedem o fatinho]
Meu bom Fernando, uma, sugestão para o fatinho….
(O Sr. poderia contar como é que nasceu no Senhor essa devoção a Nossa Senhora?)
Eu já contei tanto, que todos já sabem…
(Não, não, não…)
Eles dizem que não sabem, mas sabem…
Eu posso dizer uma coisa… bom, não é um fatinho, é um ponto de doutrina… Eu vou fazer um pouco de “Ambientes e Costumes” dessa imagenzinha que está aqui [a imagem de Nossa Senhora Auxiliadora da Sede do Reino de Maria].
As nossas condições financeiras, naquele tempo, não nos permitiam se não comprar uma imagem de um valor comercial muito corrente. E, portanto, não ter senão uma imagem comercial. Essa não é uma obra de arte: é uma imagenzinha de gesso, dessas fabricadas em série e que se encontram por toda a parte, de um tipo religioso chamado sulpiciano, que é bem conhecido e eu não vos descrever aqui.
Por que razão em comprei essa imagem? Primeiro, porque só tinha dinheiro – eu comprei com o meu próprio dinheiro – é bom que saibam, hein! essa imagem é minha propriedade particular – não a dei à Ação Católica; não a dei à minha querida TFP; não a dei ao meu querido “Legionário”; não a dei a ninguém. E nos registros da TFP é provável que ela esteja inscrita como imagem pertencente a mim.
Eu me lembro até que quando comprei a imagem, eu colei na base dela um cartão de visita, na qual eu escrevi com minha letra: “propriedade privada de Plínio Corrêa de Oliveira”, para que se alguém jamais me contestasse [a propriedade d]a imagem, eu pudesse dizer:“ Olhe aqui, a tinta está velha até: desde esse tempo a imagem é minha!”
Vou dizer mais, os senhores vão ficar pasmos com o preço que eu paguei pela imagem – acho que hoje não se compra nada por isso, mas nada: vinte e cinco cruzeiros! Lembro-me até hoje… Não há nada por vinte cinco cruzeiros… O Cruzeiro é um ente de razão, acho que desapareceu… suponho…
Por que motivo eu julguei fazer um achado encontrando esta imagem? E por que a comprei depois de uma pequena vacilação? Se me lembrarem eu explico o porque da pequena vacilação.
Eu achei a imagem de uma expressão de fisionomia, de uma serenidade interior toda ela decorrente da temperança. A temperança é aquela virtude cardeal pela qual se dá, se tem por cada coisa o grau de apego ou o grau de repúdio que é proporcional ter para com aquela coisa. De maneira que se é inteiramente adequado e proporcional a todas as circunstâncias, a todas as situações e nunca se quer nada exageradamente, nunca se quer algo menos do que merece; nunca se detesta algo exageradamente; nunca se detesta algo menos do que merece.
A inteira execração para com as coisas inteiramente execráveis faz parte da virtude de temperança.
Esta disposição de alma me pareceu reluzir muito nesta imagem. Discretamente, ela é tão calma, ela é tão senhora de si, ela está de tal maneira pronta a tomar atitude diante de qualquer coisa, de modo inteiramente proporcionado; ela é tão desapegada de si que me pareceu o próprio símbolo do equilíbrio que é o corolário da virtude da temperança.
Mas, por isso mesmo, com algo de virginal. Ela tem qualquer coisa de puro, de virginal que me encantou. E tem ao mesmo tempo algo de materno por onde ela parece estar olhando para um filho, parece estar sorrindo, e pronta a manobrar, a acionar o cetro de Rainha decisiva no sentido do pedido que se faça.
Auxilio dos cristãos, verdadeiramente: a simbologia é esta. Nossa Senhora com a coroa. Coroa aberta, porque com o Menino Jesus no braço, Ela não põe coroa fechada; a coroa fechada é próprio do Rei – em presença do Rei ninguém usa coroa fechada; Ela está de coroa aberta. Ele não está de coroa aberta, não está?
(Aberta)
Deveria ter posto fechado. Ele está no braço dEla, com os bracinhos abertos, sorrindo. Vê-se que Ela pediu e Ele sorriu; e que os braços abertos dEle são fruto da prece dEla e que Ela está olhando comprazida por ver como o pobre filho dela ajoelhado ali se encanta de ver o Filho dEla, por excelência, sorrir e abrir os braços.
É o auxílio, é Aquela que nos consegue dAquele que é o autor de todas as graças, a fonte última de todas as graças, tudo aquilo que nós pedimos.
Pareceu-me ao mesmo tempo, Ela muito régia, mas muito simples. E tudo isto junto de tal maneia que a expressão global da imagem me agradou enormemente.
A dúvida qual foi? O colorido não me gostou muito – “não me gostou” é castelhano puro – não me agradou muito. “Não me gustou” é portulhano a cem por cento. Não gostei muito do colorido. Por que? Porque é um azul esmaecido demais e o cor- de-rosa também é muito claro demais. E eu sou amigo das cores mais pronunciadas. Vejo bem, vejo bem que não caberia uma cor chibante, estaria em contradição com aquela serenidade da temperança que reluz nela. Mas me pareceria que deveria ser uma cor mais nítida, mais definida.
Perguntei, de mim para comigo: “como eu poderei fazer colorir isto?” Não conheço ninguém que saiba (…) não conheço ninguém que saiba fazer isto, e depois vai-me pedir um dinheiro que eu não tenho – porque eu tinha pouco dinheiro e isto estava raspando o meu bolso. Eu não poderei, portanto, mandar pintar. Vamos deixar assim. Se ninguém notar, eu também não falo nada. É a primeira vez, que eu me lembre, que eu estou comentando este defeito da imagem.
Mas depois que ela passou tantos anos conosco, pintá-la agora? Não cabe. Ela deve ficar como ela entrou.
O fatinho está contado, nós vamos encerrar.