Radio Hotel, Serra Negra (Estado de São Paulo), 19 de junho de 1983
A D V E R T Ê N C I A
Gravação de mensagem do Prof. Plinio para Correspondentes Esclarecedores da TFP norte-americana, não tendo sido revista pelo autor.
Se Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:
“Católico apostólico romano, o autor deste texto se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto, por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.
As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá Dr. Plinio em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo”, em abril de 1959.
Meus caros sócios, cooperadores e correspondentes da TFP norte-americana. Eu vos sei reunidos em Nova Iorque para tratar de vários assuntos concernentes à Tradição, Família e Propriedade na imensa nação norte-americana, e por esta ocasião não queria deixar de vos apresentar antes de tudo as saudações de minha simpatia e de minha estima profunda.
Eu estou muito contente com o desenvolvimento que a TFP está tendo nos Estados Unidos e acho que ainda muito mais se pode esperar desse desenvolvimento, com a proteção de Nossa Senhora, nos dias que vão se aproximando.
Com efeito, as circunstâncias da TFP são tais que ela só tem a lucrar com a definição das posições e dos campos. É no terreno das ambiguidades, das molezas e das indiferenças que não há clima, não há recuo ótico para que ela seja vista adequadamente. Mas, pelo contrário, na medida em que as circunstâncias se vão tornando difíceis e caminham até para o trágico, no momento em que se percebem os passos de Deus, nas vias da História, que se aproximam e que fazem sentir aos homens que a hora das grandes decisões e das grandes deliberações dEle chegou, é neste momento, meus caros, que as almas mais facilmente se voltam para aquilo que é de Deus. E, portanto, para esta TFP que eu tenho certeza que a Providência Divina suscitou, a rogos de Maria, para o serviço da Igreja e da Cristandade, na época difícil em que estamos vivendo.
Para fazer apanhar num só golpe de vista a situação da TFP, talvez uma metáfora lhes seja útil, e com esta metáfora vai minha contribuição para o acerto e brilho da semana de estudos que está sendo inaugurada.
Nós poderíamos imaginar uma situação assim: uma rainha de uma formosura incomparável, de uma majestade maior ou igual, proporcionada à sua formosura, de uma bondade proporcionada à sua majestade e à sua formosura. Esta rainha governa pacificamente sobre povos inteiros que se inclinam encantados e reverentes diante dos acenos de seu cetro de mãe.
De repente, no meio desses povos se levanta o inimicus homo, percebe-se que é a mesma serpente maldita que uma vez no Paraíso causou a perda dos homens, essa mesma serpente começa a se movimentar no meio das massas e das multidões. E a rainha se sente mal à vontade para governar estes ou aqueles setores de seu imenso império.
Com o curso dos tempos, as partes do império fiéis a ela vão se reduzindo, e ela acaba reduzida à presença no seu próprio palácio. O inimigo vai penetrando, o descontentamento vai tocando por toda parte, e acaba sendo que no próprio palácio ele penetra. E penetrando no palácio, penetra por fim até na sala do trono. A hora da tragédia chegou. A rainha está de pé, majestosa. Ela cinge sua coroa, tem na mão o cetro, o manto real lhe desce dos ombros até os pés, ela cintila de jóias, mas cintila sobretudo de grandeza, de majestade, de implícitas promessas de bondade. Mas ela enfrenta o adversário que avança.
A sua sala está cheia de cortesãos. Infelizmente estes cortesãos não correspondem à expectativa da rainha. Ela esperava que ao menos desse punhado de fiéis que, refluindo de todas as partes da terra, se agrupou em torno dela, ao menos desses partisse o brado da fidelidade perfeita e começasse uma reação indispensável diante de um tão grande descalabro. Mas infelizmente isso não se dá. Na imensa sala do trono, onde todos estão, o alarido do adversário se faz ouvir. Arrebentam-se as portas e o adversário entra. E os cortesãos da rainha que deveriam jogar-se entre ela e o adversário, estão de braços cruzados.
Uns por medo, outros por sono, outros porque querem um lugar na ordem de coisas que o adversário maldito vai implantar e por causa disso não se interessam pela rainha. O adversário ousa mais, aproxima-se. Depois ousa mais ainda, cerca a rainha com cordas, prende-a e ela está imóvel, pronta para ser arrastada. Seu olhar implora aos cortesãos que pouco ou nada fazem em favor dela, que apenas dão alguns soluços de tristeza inútil ou esboçam algum gesto de protesto mole ou nada fazem. Ela implora a eles que tenham coragem, que andem, que se pronunciem, que se declarem. Pelo olhar, já estando com a boca vedada e não podendo falar, pelo olhar ela lhes diz tudo isso.
E infelizmente as derrotas da rainha vão se sucedendo umas às outras, ela está no momento em que ela está para ser arrancada do trono. Um bandido ata uma corda em torno do pescoço dela e puxa a corda para ela cair. No momento em que isto se dá, a extrema infâmia do acontecimento produz também o extremo da indignação de alguns bons. Eles se levantam e bradam: “Isto não! Isto não havemos de permitir!” e se atiram em defesa da rainha.
A sua indignação, protegida por Deus, lhes centuplica as forças, a reação começa. A reação acorda os adormecidos, ela dá coragem aos medrosos, ela envergonha os oportunistas. Por toda a parte simpatias vão nascendo e uma grande contra-ofensiva se esboça. Antes do sol se pôr, há de novo paz e ordem no palácio da Rainha. Ela, encantada ao ver que filhos fiéis a salvaram na hora do perigo extremo, lhes distribui com uma bondade materna que não se pode ter uma ideia adequada a não ser vendo a cena, lhes distribui recompensas mais esplêndidas do que eles jamais sonharam.
E é nesta atmosfera que a noite desce e com a noite a paz sobre o palácio da rainha. No dia seguinte outras batalhas começarão e começa a reconquista do reino. A ordem de coisas, o Reino de Maria se reiniciará. Mas então com que glória, com que esplendor, porque a rainha no momento extremo – já que foi ela a grande vencedora –, no momento extremo, a rainha, por um olhar a alguns últimos fiéis, venceu todos os seus adversários, em todo seu reino revoltado.
Meus caros, a metáfora tem a sua aplicação. Ao longo do processo revolucionário que começou com o Protestantismo, passou da esfera religiosa para a política com a Revolução Francesa; da esfera política contaminou a esfera econômica social é a 3ª Revolução que é a revolução comunista. E vai passando de todos os modos para a 4ª esfera, que é a esfera de todos os imponderáveis da vida, esfera de todos os imponderáveis do homem. A Revolução que poderíamos chamar autogestionária, poderíamos chamar a Revolução ecológica, poderíamos chamar talvez – e de preferência – a Revolução dos bruxedos e do demônio, a Revolução hippie e punk, esta Revolução está invadindo a terra, e dos últimos restos da glória de Maria pela terra quase nada existe.
Existem alguns fiéis daqui, de lá e de acolá. Vários deles estão nessa verdadeira sala do trono de Maria que é a TFP e ali estão vendo a Rainha que está sendo ultrajada. Mas o olhar dEla, aflito, régio, maternal, cheio de promessas, mas faiscando ameaças contra o adversário – promessas para os filhos e faíscas de ameaça para os adversários – nesta hora extrema, tocou-nos a nós. E nós nos levantamos e começamos a luta, e essa luta é a luta da TFP por toda a terra.
Aquela frase da Escritura que Santo Antônio Maria Claret escolheu para o símbolo da sua congregação religiosa, os Filhos do Imaculado Coração de Maria, aquela frase me vem ao espírito quando eu falo isso. Ele colocou, ele fez seu escudo de um fundo azul, que é a cor do Sapiencial e Imaculado Coração de Maria; sobre esse fundo azul, um coração rubro encimado por uma chama – é o próprio Coração Imaculado de Maria –, adornado por um cinturão de flores brancas que representam a virgindade da Virgem Mãe, e uma espada de dor que a transpassa, porque a dor é a glória da Mater Dolorosa, que compartilhou com Nosso Senhor Jesus Cristo a ação redentora do Calvário. Ela é chamada pelos teólogos a co–redentora dos homens. Sobre este escudo tão belo há um cavaleiro medieval completamente armado e que representa São Miguel, e ao pé do escudo essa frase lindíssima: “Filii ejus surrexerunt et beatissima praedicaverunt – Seus filhos se levantaram e A proclamaram muito bem-aventurada”.
É nossa tarefa, meus caros, sermos as pessoas armadas dos pés à cabeça, com as armas da fé, com as armas do sobrenatural, com todas as armas que a justiça e o Direito põem ao nosso alcance, armados para nos levantarmos à face da terra e proclamar Aquela que é muito Bem-Aventurada. Essa é, meus caros, a aurora do Reino de Maria!
Com essas palavras eu vos saúdo e peço à Virgem Santíssima que com todas as graças presida ao vosso simpósio.