Meditação sobre o inferno segundo Santo Inácio de Loiola, Fundador dos jesuítas

Santo do Dia, 22 de setembro de 1973, sábado

 

A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo”, em abril de 1959.

 

A meditação de Santo Inácio que escolhi para hoje tem como tema o inferno. Primeiramente darei o fio da meditação e depois o esquema, de maneira que se possa acompanhar e fixar bem o pensamento sobre a meditação.

Para se entender bem o assunto, é preciso colocar como fundo de quadro dois ou três pontos da doutrina da Igreja sobre o inferno, que Santo Inácio pressupõe. Ele não os indica, mas os pressupõe.

PRESSUPOSTOS

O inferno é um lugar onde verdadeiramente há fogo

O primeiro ponto é o seguinte: o inferno é um local onde verdadeiramente há fogo. Há uma porção de gente que pensa: “As almas não vão para o inferno, porque a alma não ocupa lugar; o inferno não é um lugar”. Isso não é verdade, o inferno é um lugar, e um lugar material, onde há fogo, mas fogo mesmo, fogo que queima de verdade. Essa é a verdadeira doutrina católica.

No inferno o homem sofre tudo o que é possível sofrer

O segundo ponto é que, no inferno, o homem sofre no corpo e na alma tudo aquilo que lhe é possível sofrer. O que significa “tudo aquilo que lhe é possível sofrer?”

Há um certo nível de sofrimento que o homem não consegue suportar, e pelo qual ele pode vir a morrer de dor. Por exemplo, o enfarte cardíaco. Eu tenho ouvido dizer que o enfarte não mata porque perturba o organismo, mas mata porque a dor é tão intensa que a pessoa não a suporta.

No inferno não há essa dor mortal, porque o homem no inferno não morre. Há, isto sim, toda dor que seja imaginável ao homem, na alma e no corpo, mas que não vai além daquela que a pessoa agüenta sem morrer.

Para termos uma idéia, imaginemos por exemplo uma máquina que esmaga a falange do dedo de um homem. Ela pode ocasionar uma grande dor, mas ao final, esmagada a falange, chega um momento em que acaba de doer. O sofrimento pode durar um tempo maior ou menor, mas tem um fim. Agora imaginemos uma falange triturada, não por uma máquina, mas por um peso: por exemplo, o Pão de Açúcar. Simplesmente o Pão de Açúcar virado com a base para cima e o cone para baixo, apoiado na falange de um homem; e a falange fica íntegra, com o Pão de Açúcar pesando em cima. É uma coisa que pode nos dar uma idéia desse conceito de “tudo quanto é possível sofrer”. Aliás, nós não podemos nem um pouco ter a idéia, nem imaginar tudo quanto é possível sofrer, tanto na alma quanto no corpo.

Sofrer eternamente

Terceiro ponto: o inferno é eterno. Em que sentido ele é eterno? No sentido em que ele nunca passa. As dores do inferno são fixas, nunca diminuem em absolutamente nada. Quer dizer, a pessoa que está lá não pode ter nenhuma esperança de melhora, em sentido algum da palavra, porque se a tivesse caberia nisso uma alegria.

Vamos dizer, por exemplo, um homem que tivesse o Pão de Açúcar pesando sobre a falange, e lhe vêm avisar que terá só meio Pão de Açúcar daqui a quinquilhões de anos. Ele passa quinquilhões de anos esperando a hora em que aquilo vai pesar um pouco menos, porque para ele será um pequeno alívio. Pois bem, isto não há no inferno. As dores são contínuas por toda eternidade.

São estes os pressupostos da meditação sobre o inferno.

 OS SOFRIMENTOS DO INFERNO

 Hierarquia dos sofrimentos da alma e do corpo

Santo Inácio de Loyola nos fala dos sofrimentos da alma e do corpo. Nós vamos sondar um pouquinho quais são os sofrimentos da alma, e depois os do corpo.

Pode parecer à primeira vista que os sofrimentos da alma são mais suaves do que os do corpo. Eu ouvi falar de uma pessoa que fez uma operação de laringe, extraiu as amígdalas. Ele disse que isso doeu tanto, que pensava assim: “Meu Deus, dai-me qualquer sofrimento na alma, contanto que eu não sofra do corpo!” Esse coitado não tinha nunca sofrido verdadeiramente na alma, porque os sofrimentos da alma são mil vezes mais atrozes do que os do corpo.

A moderna arte de torturar – Não houve época que levasse, tão longe quanto a nossa, a arte de torturar as almas. Nós sabemos que os carrascos de campos de concentração nazistas, comunistas, etc, a levaram até o inimaginável. Eles aplicam injeções, que produzem delírios horríveis: a pessoa vê figuras monstruosas, fica com pânicos pavorosos, sente angústias, por onde tem vontade de sair de dentro da própria pele, sua frio, geme e brada. Tudo isto, mas como efeitos puramente dos nervos e da sensibilidade da alma, em que a pessoa depois é descomprimida. Por exemplo, eles aplicam outra injeção, e a pessoa arrebenta de dar risadas; dão uma outra e a pessoa se arrasa de chorar. O corpo não foi tocado em nada, são apenas os efeitos dos nervos sobre a alma, que produzem uma tortura perto da qual qualquer tortura do corpo – dizem os que passaram por esses tormentos – é insignificante, por mais terrível que seja.

Isso é compreensível, porque a alma é o princípio mais nobre do ser humano e o que tem mais vida. Portanto, é o que tem mais capacidade de sofrer, pois aquilo que é mais vivo, tanto é capaz de gozar mais quanto de sofrer mais.

Tomemos como exemplo uma planta. Ela tem menos vida do que um animal, e portanto não sofre, pois não tem sensibilidade. O homem tem mais vida do que um animal. Logo, ele sofre muito mais, porque a inteligência faz o homem sofrer muito mais do que o animal irracional.

Os hospitais – Tomemos outro exemplo. Nos hospitais os sofrimentos são físicos, a pessoa está lá porque o corpo está doente. Entretanto, há sofrimentos maiores. Em grande números de casos o horror que a alma sente à vista do sofrimento do corpo é maior do que o próprio mal físico. Em geral, as pessoas sofrem mais com o medo da morte do que com a própria morte. Há, inclusive, casos de gente que se mata de medo de morrer.

O medo de morrer, pior às vezes que a própria morte – Em uma cidade do interior do Estado de São Paulo, no começo deste século, um cometa muito brilhante apareceu. Aquele pessoalzinho do povo meteu-se na cabeça que era o fim do mundo. Um preto que havia na cidade jogou-se num poço, para morrer, de medo de morrer. Quer dizer, o pavor da morte leva o indivíduo a sofrer mais do que com a própria morte.

Tomem como exemplo a execução capital de Luís XVI. Contam-nos que ele acordou de manhã na hora de costume, e o criado lhe disse: “Senhor, chegou a hora”. Ele estava na prisão, e pôs-se a rezar. Luís XVI ouvia, de todas as distâncias da cidade de Paris, tambores batendo, sinos tocando, cornetas soando. Era o poviléu revolucionário, que estava se armando para ir à praça assistir à morte dele. Ele saiu de carro, rezando no breviário a oração dos agonizantes. Quando chegou à praça – hoje chamada da Concórdia, e onde estava a guilhotina -, viu aquele povo imenso. No que é que ele sofreu mais: nisto, e chegar até a guilhotina, ou na hora em que a guilhotina caiu e cortou o pescoço dele? Evidentemente, essa perspectiva da morte é algo que apavora muito mais o homem do que a própria morte.

Há condenados à morte que têm uma espécie de pressa em morrer logo. É o tormento de alma que o homem sente pelo medo da morte, tormento este que lhe parece pior do que o do corpo.

Ora, no inferno o homem tem todos os tormentos de alma e de sensibilidade possíveis. Ao lado disto existem todos os possíveis tormentos do corpo. Veremos, daqui a pouco, no que esses tormentos consistem, e com isso o auge da infelicidade que é o inferno, a coisa verdadeiramente monstruosa que é o inferno. Esta é a ordem que Santo Inácio de Loyola põe na meditação.

As dores do corpo

Parece, entretanto, mais psicológico falar primeiro dos tormentos do corpo, e depois dos tormentos da alma, já que assim nós os realizamos melhor na imaginação. Depois poderemos nos aprofundar nos tormentos das almas.

Em que consistem os tormentos do corpo? O corpo humano é capaz de toda espécie de sensibilidade. Há a dor, a indisposição, o mal-estar, há mil formas de sofrimento de que o corpo é capaz.

Todas as doenças juntas – O corpo, no inferno, sente todas as indisposições de um indivíduo que tivesse todas as doenças possíveis, juntas, ao mesmo tempo. Quer dizer, tivesse no coração a dor do enfarte; tivesse nos olhos o tormento produzido por um tumor em cada olho; tivesse na espinha dorsal, e com reflexo em todo o aparelho sensitivo, os efeitos de um canivete de foto que estivesse continuamente cortando a espinha de alto a baixo, e triturando e esmigalhando, com todos aqueles colapsos e aquelas dores; tivesse no estômago todas as náuseas possíveis (a náusea é uma das sensações mais desagradáveis que pode haver), mas ao mesmo tempo tivesse no fígado toda a sensação de uma pedra enorme que não passa, e que o congestiona; tivesse todo o mal estar de um homem com o sangue altamente infeccionado, no qual corressem continuamente as piores toxinas e os piores venenos; das narinas saísse continuamente o pus mais asqueroso; nos ouvidos houvesse vermes roendo continuamente os tímpanos, e produzindo dores de estalar, continuamente. Em uma palavra, que houvesse em cada célula de sua sensibilidade a maior dor de que aquela célula é capaz, de maneira que ele sentisse continuamente, eternamente, sem noite e sem dia de interrupção, milhões de martelos se descarregando sobre ele, comprimindo e chagando continuamente o seu corpo.

Pois bem, tudo isso é uma imagem irreal, uma fraca imagem dos tormentos que o corpo sente no inferno, porque os sofrimentos do inferno são incomparavelmente piores do que esses. Estes são tormentos que nós podemos imaginar, mas os tormentos do inferno são estritamente inimagináveis.

O fogo do inferno e o fogo da Terra – Para se ter uma idéia disso, Santo Inácio de Loyola faz a comparação entre o fogo do inferno e o fogo da Terra.

Todos certamente já viram aquela chama da Petrobrás na descida de Santos. Quando se vai à noite, causa uma certa impressão. Ninguém gostaria de ser condenado a viver dentro daquela chama, queimando-se eternamente. Bastaria propor a alguém que pusesse a mão na chama, ou somente o dedo indicador, que ele sustentaria uma batalha de anos para evitar isto. Pois bem, diz Santo Inácio que o fogo do inferno é mais devorador do que o fogo da Terra, de tal modo que, se colocasse um rochedo (podemos pensar no Pão de Açúcar) no fogo do inferno, ele se consumiria imediatamente, a ponto de não restar senão um monte de cinzas. Esse é o fogo do inferno. Agora imaginemos um corpo vivo – porque o que vai para o inferno não é o cadáver, é o corpo ressuscitado e com toda a vida – posto eternamente num fogo capaz de, num segundo, liquefazer e queimar completamente o Pão de Açúcar. Este é o castigo que sofre um homem jogado no fogo do inferno. E isto por toda a eternidade.

O corpo não se desintegra – Ele é continuamente queimado, e nunca o seu corpo se desintegra, nunca morre, nunca acaba. De maneira que a chama ao mesmo tempo o torra e o mantém íntegro. O tormento que ele tem, ao cabo de cinco quinqüilhões de anos, é o mesmo que ele tem no primeiro momento em que tocou naquele fogo. É aquela chama devoradora, que não pára, não pára, não pára! Por cima do homem queimado, as dores internas e externas. Além dessas dores, as sensações desagradáveis: sons horríveis, cheiros pútridos, coisas trágicas de ver, cacofonias monstruosas, dores nos sentidos. No paladar, a sensação de comer as matérias mais purulentas e asquerosas, continuamente. Esta é a situação de um condenado no inferno.

O que pode acontecer a uma pessoa em estado de pecado mortal que, ao atravessar uma rua, de repente é pega por um automóvel? O automóvel pega, e dá-se aquilo que todos sabem. Um exclama: “Coitado! Ah, já morreu! Chamem um padre para dar uma absolvição”. Depois o corpo vai para o velório, enterram. Todo mundo fica vendo apenas o cadáver, o que aliás já é uma coisa trágica de olhar.

O Juízo de Deus, em que não há escusas – Aquele se vê, de repente, colocado diante do juízo de Deus. Passou a hora da misericórdia. O olhar de Deus, com furor inexprimível, com ódio infinito – porque em Deus tudo é infinito – o julga num relâmpago. Os defeitos dele aparecem imediatamente, e ele não tem escusa. Ele é apanhado e jogado na geena, já sabendo que é por toda a eternidade! Qual a causa? É um desastre de automóvel, é um fato qualquer.

A morte vem como o ladrão – Um amigo nosso pereceu afogado. Moço ainda, não tinha doença nenhuma, ao menos que se soubesse. Por um acidente, afogou-se de repente. Em poucos minutos ele compareceu diante de Deus. Nós temos todas as razões para achar que ele foi para o Céu, e que a sua alma está rezando por nós.

Podem imaginar o pânico, se esse rapaz se visse no perigo do inferno? Imaginem um rapaz nessas condições, que se sabe em estado de pecado mortal, sem padre para absolvê-lo. Ele sente que não está se arrependendo por amor de Deus, mas apenas por medo do inferno. Sabe, portanto, que vai para o inferno que ele teme. Aquilo foi um flash, e num instante ele cai dentro do inferno. Minutos antes, era cheio de saúde, força, juventude, bons odores, esperança de prazer e de alegrias. Passam-se dois minutos, um minuto, cai desse auge de bem estar para o precipício de todas as dores e de todos os horrores.

Há gente que morre dormindo. E acontece até com gente moça. Uma vez eu perguntei isso a um médico, professor de medicina muito conceituado: “Um homem completamente são, e moço, pode morrer sem doença?” Ele disse: “Pode. Pode ser que isso aconteça. A medicina não estudou ainda qual é a razão, mas de repente vem a morte e colhe alguém”.

De fato, meus caros, pode colher a mim, que estou para fazer 65 anos. É natural. Mas pode de repente, nesse auditório enquanto eu falo, um dos Srs. cair morto. Se cair, será julgado. Como é que está essa alma? Alguém pode ter idéia disso?

Por que razão a pessoa morre? É porque Deus tem para cada um a Sua medida. A certo momento, a pessoa encheu a medida, Deus lhe tira a vida. Imaginemos um desastre de avião. Em certo momento pega fogo no avião, e é uma coisa tão imediata, que os corpos são encontrados carbonizados, sentados. Subitamente morreu! Foi julgado! Se a medida estava cheia, caiu no inferno! E a partir daquele momento é aquela dor que não pára mais.

Se quisermos ter um pouco a idéia do que significa um homem sofrer em todos os seus membros tudo quanto pode sofrer, imaginemos um corpo humano que seja, em todas as suas espessuras milimétricas, continuamente cortado por uma máquina de cortar frios. Mas cortado em tudo: cortado nos olhos, cortado no nariz, nos pés e nas mãos, em fatias da espessura de um papel de seda. Essa máquina continuamente o está retalhando, de maneira que quando umas rodas atravessam de um lado, outras já vão atravessando de outro. Esse homem sente então a dor do corte de todos os modos, em todas as direções, continuamente. Imaginemos ainda que sejam lâminas de metal incandescente, que queimam o homem enquanto o estão cortando.

Por aí temos uma idéia, mas uma idéia que não corresponde à realidade, que é uma imaginação. A realidade é muito pior do que se possa pensar sobre o fogo do inferno. Dessa forma compreendemos o que seja o castigo de um pecado mortal.

“A mim não vai me acontecer” – Alguém poderia ter a seguinte sensação de segurança, pensando: “Bom, a mim isso não vai acontecer”. Eu digo que grande número dos que estão no inferno achava que com eles não ia acontecer. Em certo momento aconteceu, caíram no inferno.

Por isso a Igreja, na ladainha das rogações, tem a súplica seguinte: “Mala et æterna morte, libera nos Domine“. Meu Senhor, livrai-me da morte repentina, da morte em que a pessoa não teve tempo de se preparar. Por causa disso, a alma pode cair no inferno, ou pode cair em um purgatório terribilíssimo.

Os males da alma

Depois de ter visto os males do corpo, vamos passar a considerar os males da alma.

Bastaria a alma estar ligada a um corpo que sofresse eternamente assim, para ela sofrer o inimaginável. A alma ligada a um corpo recebe o contragolpe deste, e sofre profundamente.

Se imaginamos uma pessoa que está sendo martirizada, de maneira que lhe estão atravessando o corpo com uma espada incandescente, ela sofre na sua alma as repercussões do que o corpo está sofrendo; e só isto já criaria para a alma condições terríveis.

O instinto de sociabilidade contrariado brutalmente – Mas há sofrimentos de alma muito maiores. Por exemplo, a dor que a pessoa sente quando se vê só, ou então quando é muito odiada. Uma pessoa que é objeto de perseguição, que todo mundo odeia, todo mundo calunia, todo mundo persegue. Ela tem instinto de sociabilidade, e quando esse instinto é tão contrariado por essa perseguição universal, por esse desprezo universal, por esse isolamento em que ninguém a compreende, a pessoa tem a sensação de que a vida para ela não tem mais sentido. Se a pessoa não ama e não teme a Deus, é capaz de matar-se. Assim é a sensação de isolamento de um indivíduo na Terra.

No inferno a pessoa tem a pior das sensações de isolamento, porque lá todos se odeiam inteiramente e eternamente. Os demônios se odeiam entre si inteiramente.

Este “inteiramente” significa que cada demônio odeia tanto o outro que, se pudesse, o eliminaria. Cada precito – é este o nome que se dá ao homem que vai para o inferno – odeia o outro e odeia os demônios inteiramente. Eles se abominam, e por causa disso se injuriam constantemente de modo brutal, sentindo cada um, em si, a carga do ódio de todos os outros. Mais ainda, eles se maltratam, se espancam, de maneira que o inferno é uma espécie de câmara de tortura, em que todo mundo detesta todo mundo, e todo mundo tortura todo mundo.

Imaginem que os Srs. fossem condenados a viver até a morte em um navio, onde todos os seus tripulantes se detestassem e se injuriassem continuamente, e se pudessem matar-se, matar-se-iam. Quem quereria uma coisa dessas? Não seria uma tortura tremenda para a alma? Isto, entretanto, é nada em comparação com o inferno.

Na desgraça, lembrar-se da felicidade – Mas há pior do que isso. Dante diz que não há dor maior do que, na desgraça, lembrar-se da felicidade. Por exemplo, um homem que teve fortuna, e que está reduzido a mendigar. Sentado na sarjeta, vê passar um lindo automóvel; lembra-se de que o automóvel dele era assim; dentro, um antigo amigo olha para ele e faz um muxoxo. Isso equivale ou não a uma punhalada?

Outro exemplo. Um homem que ficou leproso, e que está todo se desfazendo e se corroendo de modo nojento. Ele passa junto a uma roda de parentes, que antigamente eram companheiros seus de jogos e de alegrias, e estes se afastam horripilados, e ainda rindo e dizendo dele: “Olha como ele está horrível”. A tentação não seria de correr atrás e de abraçá-los, para lhes passar a lepra? Seria um pecado, mas a tentação era a de contagiar. Por quê? Porque o indivíduo se lembra de que poderia estar naquela roda, gozando daquela alegria, e não está. Ele está posto de lado, e ainda mais, desdenhado dos outros.

Ora, no inferno o condenado se lembra da vida que teve na Terra e dos deleites dos pecados que o levaram para o inferno. Lembra-se da alegria que teve em tal roda, do prazer que teve em tal pecado, em tal outro; das risadas que ele deu, das gargalhadas, como aquilo tudo era gostoso. Agora tudo isto está perpetuamente terminado, não há mais prazer, não há mais alegria, acabou para sempre.

Por uma gota de mel envenenada – E depois disso ele faz a dosagem: “Por que é que eu vim parar no inferno? Foi por causa daquela alegria de um minuto, por causa daquela satisfação de um instante, por causa daquela amizade que me deu uma satisfação de um segundo; uma vaidade, uma megalice, um ato de orgulho, e minha alma começou a decair. Decaiu e eu cheguei até onde cheguei, e agora estou aqui. Aquilo era um prazerzinho pequeno, em comparação dos insondáveis tormentos que pesam sobre mim. O que é que eu fiz? Recebi o pior dos tormentos por causa de uma alegriazinha que, afinal de contas, duraria tão pouco, duraria só cinqüenta anos, só oitenta anos, só noventa anos”.

Para um condenado ao inferno, noventa anos são nada, milhões de anos são nada, quanto mais noventa anos. Se para eles a vida de um homem é como um dia, como um minuto, tanto menos será a duração de um pecado, a duração de um prazer, que passa como uma figura na tela de um cinema, como um quadrinho nos milhares de quadrinhos do filme, projeta-se na tela e sai. Essa é a vida de um homem, vista por um condenado no inferno.

Ele então se atormenta e se irrita, se levanta e grita; e odeia, e brame, pois por causa de um prazer de um instante ele foi levado ao inferno. É compreensível, é perfeitamente compreensível.

O condenado considera a alegria dos bem-aventurados – Mas ainda há pior. O precito sabe a alegria dos bem-aventurados, e que os homens que praticaram a virtude em sua presença estão no Céu. Ele sabe disso, e pelo horror que sofre, calcula a alegria que o outro tem, porque o Céu é o contrário do inferno: é a felicidade plena do corpo e da alma em todos os pontos, eternamente, sem diminuição.

Ele pensa: “Aquele que eu julguei um ‘poca’, aquele de quem eu ri porque o julgava inferior, porque ele era doente, era ininteligente, era desprezado por ser um contra-revolucionário, ou qualquer coisa assim, eu o desprezei, e agora ele está no Céu, banhado numa felicidade que não acaba mais, uma felicidade igual ou maior do que o meu infortúnio. Oh, eu louco, que caçoei dele! Oh, eu doido! E ele vê do alto do Céu onde é que eu estou, e encontra um conforto nessa idéia: fez-se justiça, o miserável que riu de mim está no inferno; Deus o está esmagando inteiramente, pelo pecado que fez contra mim, e eu estou aqui gozando no Céu, de minha inocência e de minha tranqüilidade”.

Quer dizer, o condenado no inferno sente-se derrotado por todo mundo com quem ele conviveu, e que se salvou. Ele se sente humilhado, pisado, estraçalhado. Para termos um pouco a idéia, imaginemos um grupo de cinco rapazes que estão fazendo um estudo, e inesperadamente descobrem uma coisa qualquer fantástica, pela qual ganham o prêmio Nobel. Aos vinte e um, vinte e dois anos, ficam célebres no mundo inteiro, ricos, etc. Um deles, por vagabundagem, não participou dos estudos, só estava com eles na hora do divertimento. Os quatro vão para a Suécia, receber o prêmio, e o quinto fica atendendo o telefone para aqueles quatro. Foi o vagabundo que não estudou, o mole que não tinha méritos. Resultado: os outros recebem o prêmio, e ele fica honrando-se, pois a vaidade dele é dizer que fazia parte daquela turma:

          – Sabe, eu fazia parte daquela turma também”.

          – Ah, fazia? Mas você estudou?

          – Ah, não! Eu era apenas muito íntimo deles.

É ou não verdade que lhe dá uma depressão tremenda? Voltam os quatro da Suécia e o encontram: “Bom dia! Eis o vagabundo que não nos seguiu”. Se isso acontecesse com um dos Srs., poderia dar vontade de andar pela cidade batendo o pé, sem saber para onde ir. Pois bem, isso é uma gotinha do desdém que os bem-aventurados têm em relação àqueles que tentaram levá-los para o pecado, ou com quem eles se deram, e que pecaram na presença deles.

Alguém dirá: “Mas eu pensei que o bem-aventurado tivesse bom coração, pensei que ele não se alegrasse com a tristeza dos outros”. Devagar! Se Deus se alegra com o fato de os condenados estarem no inferno, os bem-aventurados também têm uma fonte de alegria em pensar nos tormentos que, por justiça, os outros estão sofrendo. Dessa forma eles participam da justiça de Deus. Porque eles amam a Deus, e se rejubilam vendo que Ele está se vingando naquele que O ofendeu.

Qualquer um de nós deseja que todos vão para o Céu, mas se soubermos que um líder comunista qualquer foi para o inferno, diremos: “Deus mandou, não é verdade? Faça-se a Sua santa vontade”. Nós pedimos que a Sua santa vontade seja que ele vá para o Céu, mas se a santa vontade de Deus é de que ele vá para o inferno, nós nos alegraremos também. Do contrário, nós não estaremos de acordo com Deus. Não há como escapar.

A privação de Deus – Podemos imaginar como os condenados devem ficar aborrecidos e irritados com isso. Mas há pior: é a privação de Deus.

Imaginem que não fosse eu que estivesse falando aqui, mas um anjo: um anjo luminoso, brilhante, incomparável, dizendo coisas admiráveis, tocando músicas fabulosas, enchendo a todos de deleites, e, além do mais, interessantíssimo, de maneira que todos ficassem num suspense de atenção no que o anjo estivesse dizendo.

Imaginem que, antes de aparecer esse anjo, os Srs. dissessem para quem está de fora: “Agora nós faremos correr a cortina, porque vai aparecer um anjo, e não queremos que vocês o vejam. Fecharemos a porta, as janelas, as cortinas, porque vocês não podem ver”. Os que estivessem do lado de fora ouviriam de vez em quando exclamações como esta: “Que admirável!”, mas não veriam nada. Não é certo que eles ficariam contrariados, revoltados? É evidente.

O tormento que o condenado tem, nesse ponto, é incomparavelmente pior. Anjo nenhum tem beleza que se compare com Deus, ou bondade que se compare com a de Deus; o mais alto dos anjos é nada em comparação a Deus. Para os Srs. terem uma idéia: Uma vez um Anjo da Guarda apareceu a uma santa (os Srs. sabem que os Anjos da Guarda são os anjos de menor categoria no Céu). Ele era tão luminoso e tão belo, que ela se ajoelhou, pensando que fosse Deus. E ele era a “franja de baixo”! O que dizer dos anjos mais altos? Entretanto, mesmo esses são nada em comparação com Deus.

Mas, por ser Deus infinitamente sábio, infinitamente bom e infinitamente belo, é infinitamente interessante: Deus atrai, Deus empolga, Deus interessa. A pessoa fica ávida de ver todos os Seus movimentos, tudo quanto se passa dentro de Sua essência, que iremos contemplar face a face. De maneira que tudo quanto o Céu tem de belo é nada em comparação com o que contemplaremos diretamente em Deus.

O demônio sabe que todos os bem-aventurados estão vendo a Deus. Ele, porém, não pode, está mantido à margem, é o escorraçado, para quem isto foi proibido porque não é digno, está jogado de lado. Os Srs. podem imaginar o tormento que isso deve causar nele, que é cheio de inveja e cheio de ódio. Aí os Srs. podem ter uma idéia dos mil tormentos que percorrem a alma de um demônio.

O olhar iracundo de Deus – Mas há ainda pior. É que, se a privação da presença de Deus é tão admirável, é terrível sentir a sua cólera. O ódio de Deus é infinito. Se nenhum de nós gosta de ser odiado, o que será sentir eternamente a cólera de Deus fixada sobre si, compreendendo que todos os tormentos que sofre, é porque Deus quer que ele sofra, porque Deus o odeia, Nossa Senhora o abandonou, não tem mais nada de comum com ele, pois ele é um excomungado, um rejeitado, um miserável. Esse ódio de Deus pairando sobre ele, dizem os doutores, é um sofrimento pior do que todas as chamas e tudo quanto eu descrevi. É o ápice, o que liquida.

LOUCURA DO PECADO

Santo Inácio, depois de ter pintado os castigos e as chamas do inferno, nos convida a meditar sobre o pecado. Eu já havia me referido a isso de passagem. Por que bagatelas as pessoas se arriscam a ir para o inferno: um olhar impuro, uma quantia que se roubou, uma calúnia que se fez, uma inveja grave dos dons de alguém, e a alma está arriscada a ir para o inferno.

Passar a vida brincando com o inferno

Os homens passam a vida brincando com o inferno, como se ele não existisse. Os Srs. tomem esta cidade: A esta hora, quanta gente está cometendo pecado mortal em São Paulo! Quanta gente está pecando contra a pureza, contra a sabedoria, praticando ações insensatas, dementes, que não têm razão de ser! Quanta gente peca contra a sabedoria tomando tóxicos, quantos outros pecam por gula, embriagando-se. Quantos pecam a esta hora da noite, conjurando a Revolução! Outros, porque deveriam cumprir um dever e não o estão cumprindo; deveriam guardar uma fábrica, uma coisa qualquer, e estão relaxando; deveriam estar à cabeceira de um doente para quem têm obrigações, e não estão; deveriam socorrer uma pessoa aflita, e não o fazem; deveriam estar dando um bom conselho a alguém, e não o estão dando.

Os Srs. podem calcular, em seis milhões de almas que há em São Paulo, que quantidade de pecado sobe continuamente a Deus, como uma fumaça de desafio e de insulto. Compreende-se então como essa gente brinca com o inferno, e como está exposta a de um momento para outro ir para o inferno.

Esta cidade tem idéia disso? Sobrevoem-na de avião a esta hora: luzes brilhantes, anúncios luminosos, automóveis que percorrem as ruas, sensação de prazer. O que seria se acontecesse como em Pompéia? Os Srs. sabem que, quando houve a explosão das lavas do Vesúvio, os cadáveres foram enrijecidos pela lama nas atividades mais comuns da vida quotidiana. Por exemplo, em um grupo de sacerdotes pagãos reunidos em torno de uma mesa, podiam-se encontrar até os peixes que eles estavam comendo. Era hora do almoço, estavam comendo. De repente, tudo passou. Os Srs. imaginem um sacerdote desses, que estivesse pegando um peixe – comia-se com a mão, antigamente – e, antes de pô-lo na boca, ficou imobilizado. Está liquidado!

Imaginem isso em uma cidade como São Paulo. Pode acontecer uma explosão da bomba atômica. Os Srs. viram, com certeza, a fotografia da sombra do soldado em Hiroshima. Explodiu a bomba atômica quando o soldado ia descendo uma escada. Ele estava ao longo de uma parede, e a bomba o desintegrou. Mas, como a figura dele serviu de anteparo, a parede não mudou de cor, e o perfil dele ficou na parede, como um negativo. Mostra-se isso aos turistas, etc. É uma coisa tremenda: o soldado se desintegrou, quando descia uma escada.

O homem, por uma bagatela, expõe-se a qualquer momento ao pior dos tormentos, e passa a vida brincando com o pecado. Causaria espanto se, em determinado momento, a cólera de Deus se descarregasse sobre ele?

Agravante: o abuso da misericórdia

Uma das agravantes é o abuso que o indivíduo faz da misericórdia, pelo que será especialmente triturado.

Houve um bispo em São Paulo, no tempo do Império, D. Antonio de Mello, que era de uma grande virtude. Ele fez o seguinte raciocínio em uma sua pastoral: “A misericórdia de Deus tem mandado mais almas para o inferno do que a sua Justiça”. É um paradoxo, mas o que ele quer dizer é que têm ido mais pessoas para o inferno por abuso da misericórdia de Deus do que por temor excessivo da sua Justiça.

O homem que abusa da misericórdia de Deus faz um raciocínio infame: “Farei a Deus um insulto horrível, porque sei que Ele é bom e vai me perdoar”. A bondade dEle, em vez de ser motivo para eu O amar, é motivo para O insultar. Imagine que um indivíduo me dê uma bofetada horrível. Eu reclamo, e o indivíduo diz: “Ah, eu sei que você é muito bom e costuma perdoar! Por causa disso vou lhe meter uma bofetada cada vez que o encontrar”. Resultado: “Então acabarei com isso, e já! Eu não vou permitir que se abuse assim da minha bondade”.

Ouvi contar o caso de um homem que morreu com cento e oito anos, em Minas Gerais. Esse, parece que era um homem muito bom, mas imaginem que levasse uma vida de pecado. Cento e oito anos atingindo a Deus. Chega um momento em que Deus diz: “Agora basta! Há cento e oito anos você Me ofende porque Eu sou bom. Agora, chegou a hora de Eu me vingar”. Quer dizer, a consideração da própria misericórdia nos deve deixar apavorados. Não abusar da misericórdia de Deus!

O PROVEITO A TIRAR DESTA MEDITAÇÃO

Como é que uma meditação dessas pode fazer bem? É cada um tomar esses pontos e imaginar-se nessa situação. Não é imaginar o outro, mas como isso pode acontecer com cada um de nós.

Olhar, por exemplo, para a própria mão bem lavada, bem cuidada, e imaginá-la leprosa, paralítica, tumefata de um modo medonho. Imagine-a encarquilhada ou cheia de dores, como se estivesse laminada. Imaginar da mesma forma todas as partes do corpo. Vá diante do espelho e olhe o próprio rosto. Imagine-o transformado em um rosto minúsculo, ou em um rosto todo lanhado, todo cortado. É assim que se devem considerar as penas do inferno, procurando sentir na própria pele, porque é a cada um que isso pode acontecer.

Uma objeção final: “Doutor Plinio, habitualmente tão bondoso, tão amável, de repente nos sai com esse gládio de chama, ameaçando-nos com todas as cóleras do inferno. Aonde é que foi parar a sua bondade?”

Meus caros, eu não tenho nenhuma vantagem em fazer aos Srs. esta meditação. Eu interrompi a leitura de um livro muitíssimo interessante, a história de um Conde de Narbonne de Narray, francês, absolutamente superior. Estava muito bem instalado em minha casa, com frio e sem desejo de sair. Eu vim aqui pelo afeto que tenho aos senhores, estou fazendo esta meditação pelo calor do desejo de que nenhum se perca. Esta meditação só pode ter como conseqüência afastá-los do fogo do inferno; é um ato de sumo afeto, é um ato de suma estima. Eu teria remorso de consciência se, em nosso tão longo convívio, de vez em quando não lhes falasse a esse respeito.

Há uma frase da Escritura que serve de pórtico à Regra de São Bento: “O temor de Deus é início da Sabedoria”. Quem teme a Deus começa a ficar sábio, começa a ter critério; para todos nós, o temor de Deus é o que destroi os obstáculos que nos afastam do amor de Deus. E assim nós poderemos voar no céu azul do amor de Deus. Temamos, e então amaremos.

Uma impressão sobre o auditório? Vejo-os muito impressionados, olhos arregalados, cara comprida e pensando o seguinte: “Eu não pensei que a coisa fosse tão séria. Isso envolve, isso pega, isso arrasta, e é terrível!” Pensamento entremeado com o seguinte, do lado ruim de muitos: “Ainda bem que eu tomo essas notas; mas quando eu sair, lá fora já estarei longe das chamas do inferno, e tudo quanto me apavorou aqui, lá fora vai tornar-se ligeiro, e darei um grande suspiro”. Eu digo: “Meu filho, se você der um grande suspiro, terá dado um passo para o inferno. É uma graça ter ouvido essa meditação, e esquecê-la é um caminho para a perdição”.

Se lhes foi dada para se salvarem, por que pegam e jogam num bueiro? Já vão sôfregos ao primeiro lugar em que possam esquecer. É ou não é verdade que muitos dos que estão no inferno, estão porque ouviram uma meditação como esta e procederam assim? D. Bosco, num retiro espiritual que pregou para vinte banqueiros da cidade de Turim, se não me engano (vejam como o mundo de cem anos atrás era diferente: os banqueiros faziam retiro com os santos), afirmou: “Um dos que aqui está, até o próximo ano estará morto, e terá prestado contas a Deus pelo que tem feito”. D. Bosco já tinha fama de santo, e os Srs. podem imaginar como se sentia cada um dos vinte. (…)

Não é bom termos sempre esta meditação diante dos olhos? Não valeria a pena, ao menos uma vez por mês, tomarmos uma parte desta meditação e fazermos uma pequena statio [recolhimento em silêncio], pensando a respeito dela? Tudo se pode arranjar, desde que se trate de tirar as almas do inferno. Não há jeito melhor de o homem ir para o Céu, do que pensar continuamente no inferno.

Diante de todo esse quadro terrível, pode alguém ter ficado espantado, por não ter idéia da maldade do pecado: por que, por um pecado mortal, cair no inferno eterno com todas essas dores? Eu espero poder fazer outra meditação, sobre a malícia do pecado. Mas nós não devemos fazer o seguinte raciocínio: “Só por um pecado recebeu tudo isso?” Mas sim o contrário: “Se Deus, que é infinitamente justo, faz o indivíduo sofrer só por um pecado, quão horrível é o pecado!”

Um Santo viu no inferno uma criança que, já tendo atingido a idade da razão, cometeu um só pecado mortal e lá se precipitou. Deus não tolerou mais nada. Ela será eternamente infeliz por causa de um pecado, de tal maneira o pecado ofende a Deus. Mas isso será tema de outra meditação. (…)

Quantas vezes eu vejo alguém brincar com a misericórdia, e procuro chamar ao bom caminho por meio de uma misericórdia ainda maior. Mas eu não posso impedir que, em certo momento, a cólera de Deus considere a medida cheia. Como é que posso impedir isso? A vida na TFP é uma chuva contínua de misericórdia. Há sempre, de nossa parte, a mesma afabilidade, a mesma consideração, a mesma ajuda, a mesma paciência, sempre feita com toda a alma e de muito bom grado. Eu perdôo, e os outros que comigo dirigem a TFP, ou nela vivem, perdoam também. Mas eu não posso evitar que em certo momento Deus considere que é hora de encerrar a conta. Até peço a Ele que tenha pena, inclusive dos que estão fora, e que, ao encerrar a conta, o faça pela misericórdia. Mas não posso impedi-lo de encerrar a conta.

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