Mais um dos “iludidos generosos” (a “revolução dos cravos” de 25-4-1974 em Portugal)

“Folha de S. Paulo”, 6 de outubro de 1974

Plinio Corrêa de Oliveira

 

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Parece-me chegado o momento de comentar o caso de Portugal. Pois todas as ilusões a que o golpe de 25 de abril deu curso, se esvaziaram, deixando ver a nua realidade.

Portugal estava em ordem, pelo menos relativamente. Contra essa ordem levantou-se um movimento que prometia melhorar as coisas, afiançando que continuaria a manter a ordem e, de acréscimo, daria também a liberdade. Um semestre decorrido, o epílogo aí está: os revolucionários começaram por reduzir a frangalhos a ordem, e agora eliminam o que havia de liberdade.

Saldo negativo, portanto.

Afastados do poder os “moderados”, à testa do país só permanecem as esquerdas coligadas. Ou seja, os comunistas argutos e disciplinados, disfarçados detrás de uns socialistas complacentes, moles e desorganizados.

Em meio a tudo isso, o império colonial português se esboroou, a segurança das populações brancas e das maiorias negras da África lusa está gravemente ameaçada por punhados de agitadores, bafejados por Moscou.

A Europa estremece de ver o comunismo na iminência de se implantar no Tejo, e os EUA sentem um calafrio ante a possibilidade dos aeroportos de Portugal continental e insular passarem para o serviço da aviação militar russa.

Em suma, à catástrofe interna de Portugal soma-se uma verdadeira calamidade internacional

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“Esses comunistas…” rabujará algum simpático leitor anti-soviético. Na realidade, os grandes culpados por toda essa derrocada não foram entretanto os comunistas, mas os ditos moderados. Sim, sempre eles a abrirem, por toda parte, as portas ao comunismo. Na Itália como no Chile. Em Portugal como no Brasil.

Na gênese dos infortúnios de Portugal, talvez seja o caso de colocar antes de tudo certos políticos e intelectuais “generosos” da era Marcello Caetano, os quais – iludidos pela falaciosa distinção entre o PC dito pacífico e intelectual, e a fermentação revolucionária promovida pelos mais jovens do Partido – continuaram a apoiar a repressão policial contra estes, mas promoveram a entrega de certas posições aos primeiros. O resultado aí está. Na hora do ataque, uns comunistas e outros se uniram contra o regime. A ilusão dos “generosos” desfechou na mais amarga das decepções.

Subindo ao poder, o governo eclético presidido pelo general Spínola acentuou, aliás em outro estilo, a política das “generosas ilusões”. Muitos conservadores, julgando possível uma contemporização com as esquerdas, se acercaram do Governo, ajudando-o a implantar-se e a dar os primeiros passos.

O processo de descolonização, que veio brutal, caudaloso e destruidor, quando os moderados o esperavam refletido, lento e habilidoso, não bastou para que essas “generosas ilusões” se desfizessem.

Pensavam os “generosos” que, a piorar o curso das coisas, a personalidade do general Spínola e o peso incontrastável da grande maioria conservadora haveriam de frear os acontecimentos.

As coisas pioraram, e o general Spínola tentou coligar a grande maioria silenciosa. Foi em vão. O general teve que reconhecer que, com ou sem personalidade, o vazio se fizera em torno dele nas Forças Armadas. E a maioria silenciosa, intimidada por agitadores de rua e por uma facção de militares, teve que voltar a seu silêncio.

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Fala-se, é verdade, de eleições. É óbvio que, se elas se realizarem corretamente, a derrota das esquerdas será espetacular. Pergunto-me, porém, se haverá eleições, e, em caso afirmativo, se serão corretas.

Com a imprensa garroteada, os oposicionistas aterrados pelo despotismo policialesco, os chefes políticos encarcerados ou refugiados no Exterior, como poderá haver eleições corretas?

Portugal entrou, talvez, num ocaso melancólico como o da Checoslováquia, Hungria e Polônia. – Os grandes culpados?Os homens das “generosas ilusões”, do estilo de Kerensky e Frei, que abrem as portas ao comunismo.

Mas os homens das “generosas ilusões” não são amigos dos anticomunistas? – Se o fossem, eu faria meu o gemido de Voltaire: “livrai-me, Deus, dos meus amigos, que dos meus inimigos livro-me eu”.

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