Muitos aspectos da realidade que o estrondo publicitário anti-TFP na Venezuela omitiu

Catolicismo, N.° 408, Dezembro de 1984

O DIARIO caraquenho “El Universal” publicou em sua edição de 15-10-84 um comunicado sob o titulo: “Resistência dá a público límpidos e serenos esclarecimentos”.

Desse vigoroso documento transcrevemos abaixo o item “VIII — Muitos e muitos outros aspectos da realidade que o estrondo omite”, que é o tópico mais importante:

CHEGOU O MOMENTO de dizer algo, não mais sobre os jovens de “Resistên­cia” e das respeitáveis famílias inconfor­mes com esta última, mas acerca da pró­pria “Resistência”, que é, junto com as gloriosas TFPs, a grande caluniada em toda esta campanha.

É bom começar situando-a na Vene­zuela contemporânea. Nosso País, aberto a todos os ventos que sopram inclemen­tes sobre a humanidade, está engajado no processo de contínuas transforma­ções daí decorrente.

Diversas correntes de opinião

Essas transformações são livremente avaliadas pelas diversas tendências da opinião pública. Umas as aplaudem, ou­tras as aceitam nas suas linhas princi­pais, contestam-nas em pontos secundá­rios, e as quereriam em uma velocidade inferior. Muito poucas são as pessoas que, face a elas, desejariam uma imobi­lidade absoluta. Diversas são as corren­tes que, baseadas na fixidez inabalável da doutrina católica, a qual tomam como pedra de ângulo de seu pensar, querer, sentir e agir, recusam todas as inovações opostas a esta e dão livre curso às demais.

Entre estas correntes se encontra “Re­sistência”.

Tensões até entre os católicos declarados

Sem embargo, mesmo entre os cató­licos que são ou se reputam fiéis, o desa­cordo está implantado. De fato, em que reside precisamente o núcleo das verda­des inabaláveis que a Igreja ensina? Glo­balmente talvez não seja difícil dizê-lo. Mas, quando se trata deste ou daquele ponto desse mesmo núcleo, o furor das inovações tem audácias, algumas das quais superam as do modernismo, tão severamente condenadas em princípios do século pelo angélico pontífice São Pio X.

Daí tensões até entre os católicos mais declarados e também entre muito altas personalidades eclesiásticas. É o que se viu e se está vendo em nível sul-ameri­cano na crise espetacular da “Teologia da Libertação”, condenada em vários de seus aspectos pela Sagrada Congregação da Doutrina da Fé.

TFP, uma “direita” pacifica e abnegada

“Resistência” não é uma associação erecta e dirigida pela autoridade eclesiás­tica. Ela se constitui entretanto de cató­licos praticantes, que se inspiram nos ensinamentos tradicionais do Supremo Magistério no que diz respeito a seu pensamento e a sua ação.

É o que se lê em tudo quanto ela tem difundido de sua própria obra ou de suas gloriosas coirmãs, as TFPs.

Fazendo uso da liberdade de que todos gozam, ela se põe em uma posição que, por analogia, se poderia chamar de definidamente “direitista”, face aos problemas existentes dentro e fora da Igreja.

E, sem jamais transgredir a obediên­cia devida às leis de Deus e às dos homens, tem feito propaganda dessa posição.

Quando se considera o rumo geral das coisas de hoje, se percebe o que há de abnegado e corajoso nessa tomada de posição que, por amor à Fé, está exposta a toda espécie de atritos e choques.

Mais omissões do estrondo

O estrondo maneja também aqui as omissões. Pois ele não diz ao público se os pais inconformes com “Resistência” têm uma posição pessoal diante desses problemas, e qual seja essa posição. Temos todas as razões para supor que, pelo menos em vários desses pontos, tal posição diverge de “Resistência”. Pois, do contrário, a exacerbação que alguns de­les têm mostrado, dificilmente se expli­caria.

“RESISTÊNCIA” ante a transformação dos costumes

Tanto mais é isto provável quanto, muito explicavelmente, os jovens que deixaram a posição mundana ou indife­rente que tinham antes de conhecer “Resistência”, mudam de atitude depois de nela ingressar. O que, em matéria de conduta pessoal, tem inevitável reflexo sobre a família. Com efeito, os costumes sociais, eles os analisam do preciso ponto de vista moral que era adotado pela maior parte da hierarquia eclesiástica do mundo inteiro há cerca de 20 anos.

“RESISTÊNCIA” e a vida da família ante as transformações dos costumes

Entretanto, em certos ambientes cató­licos acentuadamente modernizados, a condescendência nestas matérias está muito distante do que as autoridades eclesiásticas prescreviam naquela época.

Daí decorre que, por exemplo, mesmo em famílias praticantes, as apreciações e a conduta dos membros de “Resistência” em matérias como televisão, trajes balneários, danças etc., podem divergir mui­to das de outras pessoas de suas famílias. Como também das dos amigos que ti­nham antes de conhecer “Resistência”.

Tensões: solução verdadeira — solução falsa

Daí, explicavelmente, discussões às vezes acaloradas de uma parte e de outra, e certa medida de tensão e mal-estar. Desaparece assim, a unidade das famílias? É o caso de tomar medidas contra os responsáveis por tal catástrofe?

Essas perguntas dão um caráter de melodrama a situações que, em todas as épocas, ocorreram no seio de muitas famílias, sem que por isto a unidade delas desaparecesse.

Tensões em matéria doutrinária, ou pessoal, não são raras no dia a dia da vida familiar. Elas não chegam a esses extre­mos nas famílias em que reina um arejado bom senso. E neste caso não impe­dem uma convivência doméstica cordial. Toca sobretudo aos pais conservar uma posição serena, mantendo a harmonia entre os elementos discrepantes.

Quem quisesse substituir esta ação moderadora dos pais por uma ação estatal repressiva de todas as causas de tensão, chegaria em rigor de lógica a extremos de autoritarismo que os srs. pais inconformes não aceitariam. Seria neces­sário, por exemplo, reprimir também a propaganda por assim dizer “neocatólica”, porque pode trazer análogas tensões em lares católicos tradicionais. Por aná­logas razões, seria necessário proibir a propaganda das seitas protestantes em países católicos. E a da Igreja Católica em países protestantes.

Mais ainda, seria necessário proibir a propaganda comunista, ou socialista, em países capitalistas. E justificar que nos países comunistas se proíba a propaganda da religião e da propriedade privada.

Evitando um ditatorialismo férreo

Onde se iria parar com tudo isso? No mais férreo regime ditatorial. A Igreja condenou o princípio “cujus regio ejus religio”, segundo o qual os súditos deve­riam aceitar sempre a religião do rei. Ela jamais aceitará o princípio de que os filhos tenham obrigatoriamente as opi­niões religiosas dos pais, de maneira que, para saber se é ortodoxa ou heterodoxa certa doutrina apresentada como cató­lica, os filhos não têm que tomar como decisivo o pensamento da Igreja, mas sim o dos pais. Contudo, é este o absur­do a que se chegaria caso, por exemplo, os membros de “Resistência” fossem obrigados a pensar automaticamente co­mo seus pais em matérias religiosas.

Indefinição prejudicial

Suponhamos que o critério de refe­rência não fossem os pais, mas a maioria das pessoas da família. Se uma parte delas toma em certas matérias um rumo que a outra parte afirma contrário às leis de Deus; e se a outra parte faz análoga censura à primeira, que remédio há para isso? O mal está na indefinição em que se encontram hoje tantas coisas na Igreja. Queira Nossa Senhora obter de seu Divi­no Filho que essa indefinição cesse o quanto antes.

A unidade da família, bem indizivelmente precioso. União com Deus, bem supremo

Sem embargo, note-se bem, o remé­dio não está, e nunca poderá estar, em que uma parte se resigne a ofender a Deus para seguir a outra parte, e assim salvar a unidade da família. Esta unidade é por certo indizivelmente preciosa. E “Resistência” tem a firme consciência de haver colaborado muitas vezes para ajudar a mantê-la. De onde, como foi ante­riormente observado (item IV), não haver sido publicada até agora qualquer queixa de pais inconformes sobre atitudes gros­seiras ou agressivas dos respectivos fi­lhos.

Entretanto, quando se põe irremedia­velmente para um jovem a alternativa entre seguir um hábito “avançado”, repu­tado contrário à imutável doutrina da Igreja, ou tomar uma atitude face à qual se cindam as opiniões na família, mais vale para a alma dele aceitar essa cisão do que romper ele sua própria união com Deus, perdendo o estado de graça (cfr. São Tomás de Aquino, Suma Teológica, II-II, q. CI, a. 4°.).

 

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