Erros de Roosevelt na Segunda Guerra Mundial

Plinio Corrêa de Oliveira

Catolicismo n° 1, janeiro de 1951

 

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Libertando a bandeira americana… – Soldados americanos alçam a bandeira de sua pátria na ilha de Iwo Jima, logo depois de arduamente conquistada aos japoneses. Esta fotografia que poderia inspirar uma obra de escultura, foi considerada a melhor da guerra. Traz ela ao espírito a recordação das esperanças do povo norte-americano na última fase do conflito: a liderança ianque sobre o mundo.

Um bem? Um mal? Certamente um mal; mas em todo caso um mal muito e muito menor do que seja o perigo de uma ditadura soviética, à qual nos deixou expostos a inconcebível imprevidência do Presidente Roosevelt.

 

É inegável que a Rússia Soviética ocupa nas vésperas do desencadeamento do novo conflito, que irá envolver novamente o mundo inteiro, uma posição estratégica vantajosíssima.

Uma pergunta que se impõe ante este fato é saber como se chegou a tal ponto. De que maneira perderam os Estados Unidos, em favor do aliado vermelho, seu posto de hegemonia no concerto das nações?

A este propósito, extraímos alguns dados de alto interesse, de um artigo publicado pelo profundo pensador e escritor francês Henri Massis nos números de Outubro, Novembro e Dezembro da revista “Écrits de Paris”.

O auxílio norte-americano à União Soviética

O Presidente Roosevelt, que já havia falhado na preparação do seu povo para a guerra, em virtude de sua tendência isolacionista, ao entrar na luta não soube tirar proveito das circunstâncias que no momento lhe eram francamente favoráveis no front europeu. Os exércitos alemães e russos haviam começado a entrechocar-se; e já se percebia claramente que o auxílio americano era condição indispensável para a sobrevivência da Rússia.

Roosevelt estava em posição de superioridade para exigir de Stalin, em troca da ajuda que lhe seria fornecida, garantias bem especificadas no que se referisse à política de após guerra na Europa e na Ásia.

Deixou, entretanto, o chefe do governo americano escapar das mãos essa oportunidade preciosa. Em vez de tirar partido da preponderância que desfrutara, ofereceu ao exército russo, cuja situação era desesperadora, o apoio material maciço e inestimável da produção de guerra americana, sem nada exigir em troca, sem tomar mesmo qualquer precaução. Aceitava, pois, Roosevelt o risco de uma assinatura em branco num tempo em que nem os acordos solenemente assinados eram respeitados…

Reação ante as exigências territoriais russas

Diante das primeiras e intempestivas manifestações do expansionismo soviético, o Departamento de Estado norte-americano, em lugar de opor uma resistência enérgica, favoreceu-as indiretamente com a sua atitude passiva.

Já em Dezembro de 1941, quando o Ministro do Exterior britânico, Anthony Eden, esteve em Moscou, Stalin teve a audácia de lhe perguntar se a Inglaterra concordaria com a anexação pelos Soviets da Estônia, Lituânia, Letônia, de alguns territórios da Finlândia, da Rumânia e de toda a Polônia Oriental. Segundo relato de Cordell Hull em suas Memórias, o Departamento de Estado se limitou a declarar que «a prova da boa fé americana para com a União Soviética não residia em reconhecer um alargamento de fronteiras, mas antes na determinação dos Estados Unidos de lhe enviar todo o equipamento e provisões que lhes fosse possível».

Um programa de “cooperação democrática” com a Rússia

Roosevelt, tendo percebido a necessidade de tomar atitude perante o problema do imperialismo soviético, optou pela mais desastrosa das soluções, propondo ao governo comunista uma «cooperação democrática».

Segundo o embaixador William Bullit, o Presidente acalentava a quimérica esperança de «converter» Stalin com as seguintes atitudes:

1º — Concordar com Stalin sem limites nem restrições em tudo que ele pedisse para prosseguir a guerra.

2º — Convencer Stalin a aderir a compromissos de ordem geral, tais como a Carta do Atlântico.

3º — Dar a entender a Stalin que a Casa Branca usava de sua influência para encorajar a opinião pública norte-americana no sentido de considerar favoravelmente as intenções do governo soviético.

4º — Encontrar Stalin face a face, e convencê-lo de aceitar caminhos cristãos e princípios democráticos.

Aos que procuravam alertá-lo afirmando que Stalin era um comunista penetrado da determinação de conquistar o mundo para o bolchevismo, dizia Roosevelt: «Tenho o pressentimento de que Stalin não é o homem que se crê. Hopkins confiou-me que também tem a mesma impressão e que Stalin nada mais quer senão a segurança de seu próprio país. Eis porque penso que, se se der a ele tudo o que puder dar sem nada pedir-lhe em troca, noblesse oblige, ele não poderá pensar em anexar cousa alguma, e colaborará comigo para instaurar no mundo uma paz verdadeiramente democrática… »

No afã de agradar o aliado soviético, Roosevelt fez funcionar a máquina da propaganda política da Casa Branca para anunciar aos americanos as maravilhas de uma Rússia tolerante, liberal, infensa a manobras subterrâneas. Um dos seus propagandistas mais devotados, o velho embaixador Joseph L. Davies, foi encarregado de publicar em prosa e em verso esta afirmação: «Os fatos o provam com eloquência e eu pude certificar-me pessoalmente durante a minha missão em Moscou: a palavra de honra do governo soviético é palavra do Evangelho».

Pode-se imaginar a perplexidade do povo americano quando verificou que, fora iludido com mentiras.

Comportamento de Roosevelt com relação à Inglaterra

Enquanto que o imperialismo russo não lhe inspirava o menor cuidado, o expansionismo britânico era objeto das mais severas precauções do Presidente americano.

Em seu primeiro encontro com Churchill, a bordo do Augusta, lhe declarara que «a América não ajudaria a Inglaterra nesta guerra para lhe permitir que continuasse a dominar brutalmente os povos coloniais». E acrescentara que «a paz é incompatível com a manutenção do despotismo, fosse ele qual fosse».

Com relação ao Primeiro Ministro britânico, que para Roosevelt personificava a mentalidade arcaica e ultrapassada do imperialismo dos ingleses, manifestou o Presidente uma contínua desconfiança.

Essas atitudes contribuíram para que fossem sistematicamente rejeitadas por Roosevelt muitas propostas formuladas por Churchill, que eram de grande alcance para salvaguardar a hegemonia do mundo ocidental.

Assim, não quis ele compreender as justas apreensões de Churchill, que temia uma penetração do exército russo até o coração do Ocidente. O Primeiro Ministro inglês era favorável a um ataque anglo-americano através dos Bálcãs, tendo Trieste como cabeça de ponte. Dessa forma os aliados garantiriam a posse do vale do Danúbio, contrariando as pretensões soviéticas. Quando apresentado pela primeira vez essa proposta, a reação de Roosevelt consistiu em desprezar essa possibilidade de manter o exército russo fora da Áustria, da Rumânia e da Hungria, em face da suspeita de que se tratava de uma manobra de Churchill com o fim de «proteger interesses britânicos reais ou imaginários no continente europeu».

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A Conferência de Teerã

Nas conversações realizadas em Teerã no dia 5 de Dezembro de 1943, Roosevelt se apresentou com o deliberado propósito de ganhar as simpatias de Stalin. E o papel que julgou mais adequado desempenhar para conseguir esse objetivo foi o de «árbitro entre o ditador do Kremlin e o tory de Westminster».

Roosevelt havia sido convencido pelos seus conselheiros militares de que, para ganhar a guerra com a menor perda de homens, era preciso concentrar as forças inglesas e americanas no Oeste.

Assim sendo, o seu primeiro gesto em Teerã foi estender ao chefe russo o texto do plano Overlord, de desembarque na Normandia.

«A operação Overlord, afirmou ele, está na base de toda a estratégia aliada de 1944. Nada deverá enfraquecê-la ou retardá-la. Tudo lhe deve ser sacrificado. Uma manobra no Mediterrâneo oriental dispersaria as nossas forças justamente na ocasião em que as razões estratégicas exigem a concentração dos esforços».

Churchill, embora tivesse ficado só não se deu por vencido: sugeriu a conquista da ilha de Rodes e propôs que se convidassem os Turcos a intervir, advertindo que seria então ou nunca. Stalin limitou-se a dizer: «Os turcos se recusarão. Se eles aceitassem seria pior; eles vos pediriam aviões e mantimentos e para atendê-los criaríeis a operação Overlord».

Roosevelt, completamente descuidado dos perigos futuros, abandonava os Bálcãs nas mãos da Rússia, a fim de «alcançar a vitória o mais rapidamente possível, com o mínimo risco».

A imprevidência de Roosevelt

Ao contrário de Churchill, o Presidente americano não temia as consequências do fortalecimento da Rússia. Relata seu filho Elliot esta observação acerca do Ministro inglês: «O aborrecimento é que Churchill pensa muito no após guerra e na situação em que se achará a Grã-Bretanha. Ele tem medo de que os russos se tornem muito fortes… »,

No texto que ele mesmo corrigiu e aprovou ao voltar de Teerã, reconhecia que conduzira deliberadamente as conversações em benefício de Stalin em nome da política de boa vizinhança.

E voltou a Washington cheio de otimismo e confiante no futuro, que seria «de paz e felicidade humana», convencido como estava de que «Stalin e os outros dirigentes soviéticos trarão da maneira mais leal do mundo o seu apoio e contribuição para a organização do após-guerra».

A Conferência de Yalta

Quando se deu início à conferência de Yalta, a derrocada alemã se fazia sentir em todas as frentes. Os russos ocupavam a Rumânia, a Bulgária e a Hungria e os seus exércitos estavam na fronteira austríaca. Era lógico, pois, que os debates versassem sobre a «partilha do mundo».

O primeiro caso estudado foi o da Polônia. Churchill acabara por aceitar a sugestão de Roosevelt de que as fronteiras orientais desse país fossem fixadas pela linha Curzon — o que representava a anexação à Rússia Soviética de toda a Polônia Oriental — ficando por regular possíveis retificações parciais. Mas quando Stalin pediu o avanço da Polônia para o Oeste, até o Oder e o Neisse, Churchill levantou o seu protesto, dizendo que seria loucura «fartar o novo Estado com tanta comida alemã: ele estouraria de indigestão!»

A controvérsia tornou-se mais tensa quando se tratou da composição do novo governo polonês. «A Grã-Bretanha, afirmou Churchill, declarou a guerra, pôs em risco a própria existência para que a Polônia permanecesse um Estado livre e soberano. Não aceitaremos jamais uma solução que não faça da Polônia tal Estado: é uma questão de honra». «Para mim, replicou Stalin, trata-se de uma questão de segurança. A Polônia foi sempre o corredor através do qual os exércitos estrangeiros invadiram a Rússia. É do interesse da Rússia que a Polônia seja um Estado forte e potente, capaz de fechar a porta desse corredor por seus próprios meios». Em outras palavras, a Polônia deveria ser um Estado comunista.

Qual é o procedimento de Roosevelt? Atribuindo-se o simpático papel de mediador e de árbitro, apresentou uma fórmula infelicíssima para resolver a dificuldade. Convencido de que o problema do governo polonês ficaria solucionado uma vez que se comprometessem os aliados a permitir a formação de um governo de união nacional, sugeriu que o governo de Lublin, mantido pelos russos, deveria sem demora «ser reorganizado sobre bases mais amplas, com a participação dos chefes democráticos e dos poloneses no exílio que tinham o governo em Londres». Quis ainda Roosevelt dar uma feição mais geral a essa ideia formulando uma declaração a ser subscrita pelos Três Grandes, segundo a qual «em todo Estado libertado ou satélite do Eixo, autoridades provisórias, de caráter democrático deveriam estabelecer, o mais rapidamente possível, por meio de eleições livres e sem entraves, governos que refletissem a vontade do povo». É evidente que a Rússia não teve dúvidas em concordar…

Resultado: — apesar de ter Molotov assegurado ao Presidente que as eleições se realizariam dentro de trinta dias, elas só foram feitas após vinte e três meses e debaixo de cacetes. Quanto às fronteiras ocidentais da Polônia, resolveu-se esperar o tratado de paz para traçá-las definitivamente. E até hoje continuam «provisórias».

A segunda questão discutida foi a do controle da Alemanha, após a derrota.

Roosevelt estava então sob o efeito do plano Morgenthau, que consistia em suprimir toda a indústria alemã para transformar a Alemanha num país agrícola. E assim, concordou imediatamente com o desmantelamento industrial do Ruhr e Sarre.

Em Yalta ficou também combinada a divisão da Alemanha em zonas e a formação de um estado-maior aliado com sede em Berlim. Entretanto – como afirma Pierre Frederix – embora nenhum texto publicado o demonstre, os fatos testemunham que então se decidiu conferir aos russos, «por questões de prestígio do exército soviético», a tarefa da conquista da capital germânica. Com a Conferência da Criméia aprofundou-se a fenda que dividia a Europa ao meio, e cuja existência o Departamento de Estado se obstinava em não reconhecer.

No que se refere à Ásia, a atuação de Roosevelt não foi menos desastrosa. E as concessões que fez no Extremo-Oriente feriram de forma particularmente nefasta os interesses americanos e até a própria segurança dos Estados Unidos. Firmou com Stalin um acordo secreto, no qual outorgava à Rússia uma influência dominante em Dairen, o grande porto da Manchúria, o controle total da base naval que protege Porto-Artur, bem como das estradas de ferro que ligam a URSS a Dairen e cortam o país de norte a sul. O acordo não somente sacrificava as Kurilas com o sul de Sakalina, mas permitia à Rússia estender o seu poder à China bem como mobilizar os recursos desse país em caso de guerra com os Estados Unidos. E qual era a retribuição da Rússia? Nada mais nada menos que a promessa de uma incomoda participação na campanha contra o Japão seis meses após a capitulação da Alemanha.

E assim abriu-se à influência direta de Moscou a imensa nação chinesa, assegurando-se a supremacia completa da União Soviética no Extremo Oriente.

O desencadeamento das consequências

Ao morrer Roosevelt legou aos seus sucessores uma política exterior de verdadeira bancarrota, embora nem tudo ainda estivesse perdido.

Quando Truman assumiu o poder, em abril de 1945, os exércitos americanos, britânicos e franceses, sob o comando de Eisenhower, avançavam rapidamente para o Leste. A Tchecoslováquia e a Áustria poderiam ter sido ocupadas e Berlim teria sido facilmente conquistada pelos ocidentais. Entretanto, o novo Presidente não pôde mostrar-se em Potsdam mais resistente ante Stalin do que fora Roosevelt em Teerã e Yalta.

Nem de longe pensou em tirar proveito político dos resultados do lançamento da primeira bomba atômica. Subscreveu sem titubear a anexação de Koenigsberg e de parte da Prússia Oriental pela Rússia. Ao mesmo tempo, o seu enviado Edwin Pauley concordou em que a União Soviética se apropriasse dos bens alemães na Áustria e  desmontasse, a título de reparação, na zona por ela ocupada, as instalações de sua escolha, o que viria fortalecer consideravelmente a sua potência industrial. Tal era o caos em que Roosevelt deixara a política alemã, que se podia ter a impressão de que Truman não sabia o que fazer com a Alemanha.

Na Ásia, as coisas andaram pior. O Presidente Truman decidiu continuar a política de confiar no comunismo como fizera o seu predecessor. Persuadido de que «o comunismo chinês visava simplesmente a reforma agrária e nenhuma relação tinha com Moscou», eis a palavra de ordem que dera ao general Marshall: «Pôr fim à guerra civil, reconciliando o governo nacionalista com os comunistas». Durante o armistício os revoltosos se reequiparam e rearmaram até que Mao-Tse-Tung rompeu a trégua e tomou conta de quase todo o vasto império chinês. Em outras palavras, a sorte do Extremo-Oriente estava selada.

E o lamentável é que os responsáveis pelos destinos da República norte-americana, após todos esses revezes, ainda acreditam numa paz com a Rússia. Enquanto isso os soviéticos vão ganhando terreno e consolidando as suas posições. Pouco resta ainda para salvar. Mas é necessário, sob pena de assinar a própria condenação e a da civilização ocidental, que os Estados Unidos percam essas vãs esperanças de negociar e se mostrem dispostos a enfrentar o inimigo em toda a linha e com todo o peso dos seus enormes recursos bélicos.

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