Diferenças entre cuidar da vida espiritual e “espiritualite”. Como tratar desta última

Sala do Reino de Maria, Reunião Extra, 25 de janeiro de 1973

A D V E R T Ê N C I A

Gravação de exposição do Prof. Plinio para sócios e cooperadores da TFP, não tendo sido revista pelo autor.

Se Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá Dr. Plinio em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo”, em abril de 1959.

 

Nós devemos aqui fazer uma explicação a respeito de um ponto. Os senhores ouviram falar, naturalmente, do livro de Dom Chautard, “A alma de todo apostolado”. Este livro desenvolve a tese muito verdadeira, muito santa, de que nós devemos cuidar de nossa vida interior mais do que de todas as outras coisas e que, se nossa vida interior for bem cuidada, o apostolado florescerá.

[Sino e orações do “Angelus”]

[Aparte inaudível]

Pois é, eu ia propor até ao senhor [?] que está mais familiarizado com as coisas da casa, se o Sr. podia abrir aquela veneziana e a janela também de modo categórico e estável, de modo a fazer uma corrente de ar também eficiente…

Por exemplo, nada disso é linguagem romântica: abrir uma janela de um modo “categórico e estável”, o romântico não diz isso assim. “Você poderia me abrir mais um pouco a janela?…” É o dito romântico.

Outra coisa: “uma corrente de ar eficiente” também não. “uma corrente de ar mais amena”, isso é a linguagem romântica. Mas nós não somos românticos, não é?

Então eu volto à tese de Dom Chautard. Dom Chautard dá a tese de que nós devemos cuidar de nossa vida interior antes de tudo. Essa tese é muito verdadeira. Mas todas as teses a respeito da santificação estão expostas ou são sujeitas a um abuso. E dentro da TFP tem nascido um abuso a este respeito, sobre o qual eu devo chamar a atenção dos senhores, embora eu esteja informado de que várias vezes, no decurso da SEFAC [Semana Especializada para a Formação Anticomunista, n.d.c.], esse assunto já foi tratado. E a coisa é um pouco ligada com o romantismo. E por causa disso que eu acho que não foi inteiramente inútil o tempo empregado em tratarmos aqui do romantismo.

Os senhores me permitirão que eu fale como um pai para os filhos e, portanto, com toda franqueza, sem entrar com meias palavras e nem meias medidas, dizendo tudo como é.

Com o tumulto da vida contemporânea, com o modo de ser dos homens de hoje, a maior parte – para não dizer a totalidade – dos membros da TFP entra para a TFP sem nunca ter tido quem de fato se interessasse pela alma deles, nem [pelo] que se passe pelo interior deles.

Na maior parte das famílias, educar é o seguinte: dar comida, cuidar da saúde, pagar colégio, ensinar uma meia dúzia de regras de educação e alguns dos preceitos do Decálogo, com a condição de que a criança não tome muito a sério os preceitos do Decálogo: os pratique um pouco, não os pratique demais. E aqui está feita a educação.

Mas um pai ter a paciência de chamar seu filho e entrar na mentalidade do filho, na psicologia: «O que é que você está sentindo? O que é que você entende? Como é sua alma?», procurar entrar nas vias interiores do filho para orientá-lo, eu acho que a maior parte dos pais nem têm ideia de que isso é possível, nem que seja desejável. E muito poucas são as mães que têm esta ideia; das poucas que têm, ainda poucas se dão ao trabalho de fazer.

De maneira que cada um dos senhores quando entra para a TFP é uma espécie de floresta virgem: nunca ninguém entrou por aqueles matagais interiores que todo homem carrega dentro de si mesmo.

Na TFP vem uma surpresa agradável: é a direção espiritual. Alguém que entra conosco dentro de nós mesmos, presta atenção em nós, resolve conversar conosco a respeito de nós mesmos uma hora, uma hora e meia; nos dá conselhos, nos ajuda a resolver nossos casos.

Todo “geração nova” é profundamente inexplicável para si mesmo. E essa “inexplicabilidade” pesa profundamente sobre o geração nova. Ele encontrar alguém que desça os degraus desta escada interior e o ajude a explicar-se a si próprio, é para ele uma surpresa maravilhosa.

A partir deste momento, abre-se o caminho da correspondência: aceitar os conselhos e pô-los em prática. É um caminho duro.

Abre-se também o caminho do romantismo. Não o romantismo afetivo em relação ao diretor espiritual, não é isso. Mas é um romantismo no seguinte sentido: “Agora eu vou apreender a decifrar a mim mesmo. Como é interessante eu viver prestando atenção em mim mesmo e viver voltado para dentro de mim mesmo”. Então levar uma vida voltada só para si: “O que eu pensei, o que eu achei, o que eu fiz, o que eu quis, o que eu não quis etc. etc.”

E o polo da vida acaba sendo – não propriamente o que nós chamaríamos a vida interior no sentido espiritual da palavra, quer dizer, vida de virtude – mas é uma introspeção contínua, exagerada e ociosa.

Eu insisto: “contínua”, quer dizer, alguns não param um momento de prestar atenção em si mesmo. “Exagerada”, porque é uma superatenção, quer dizer, ao menor fatinho dão uma atenção enorme. “Ociosa”, porque não é um exame feito à luz dos Mandamentos, os Mandamentos entram quase como pretexto. É um contínuo distrair-se, em se olhar a si próprio, o gosto de sentir-se a si mesmo e de sentir a sua própria alma, e de se pôr mais ou menos num plano olhando-se a si próprio.

Eu conheci um principiante da TFP (há muitos anos atrás; ele, hoje, é um dos membros mais modelares da TFP) que tinha de tal maneira este vício de conceber a vida como um teatro, e ele a figura central da cena, que quando ele me falava a mim a respeito de si mesmo, em direção espiritual, ele começava dizendo: “Eu fiz, eu quis”. E, em certo momento, ele estava dizendo: “Ele… ele quis, ele disse…”

Não sei se os senhores entendem este “ele” o que quer dizer: é que ele se desdobrava a si mesmo, e olhava para si mesmo, quase como se fosse uma outra pessoa, de tal maneira ele se inebriava de olhar-se para si próprio – “Ele quis, Ele fez, Ele disse, etc.”

Pelos risos que eu estou vendo na sala, eu estou vendo que não é tão incompreensível que isto se dê, e que talvez um ou outro seja propenso a uma coisa dessas.

Dá então numa espécie de vida interior que não é vida interior, porque não é feita para amar a Deus, mas para sentir-se a si mesmo.

Há certo gênero de gente… – uma vez vi uma pessoa dizer isto: que ele gostava de sentir cócegas [picazones, em castelhano] para ter o prazer de sentir-se a si mesmo se coçando; que ele gostava de espirrar para ter o prazer de sentir as ventas e esta parte interior se aliviar.

Há muita gente que tem o prazer de ter problemas, e fica fazendo uma espécie de artesanato com os próprios problemas, não para resolver o problema, mas para ter o prazer de estar remexendo dentro de si mesmo.

Isto está bem compreendido, meus filhos, ou não? Os que entenderam, levantem o braço.

E, evidentemente, isto nós devemos evitar, porque isto tem um inconveniente muito grave que eu vou mostrar daqui a pouco qual é.

Os senhores são quase todos por volta de 20 anos para menos, portanto estão no período do auge da saúde. Eu tenho certeza de que, se cada um dos senhores agora for se perguntar se não está sentindo no próprio corpo qualquer coisa de anormal, se está digerindo bem, se não está com um pouquinho de dor de cabeça, se não está com alguma coisa, vários vão levantar o braço e dizer que estão, porque o corpo humano é feito assim; sempre sente alguma coisinha. É natural.

Mas há uns maníacos de introspecção física, que passam o dia inteiro analisando a dor de cabeça que tem, o “esternudo” [espirro, em espanhol, n.d.c.] que deu, o resfriado que está começando, o que é que fez ou não fez mal no almoço, o pé que está doendo, o reumatismo que tem na mão. E daí para fora.

E os senhores sabem uma coisa engraçada que os médicos dizem que essas pessoas que prestam demais atenção nessas coisinhas acabam doente de fato, acabam resvalando para a doença; quer dizer, ampliam os problemas e acabam ficando doentes.

Eu conheço gente que, porque sente um caroço aqui, vai para o médico do câncer. Basta ele achar aquilo um pouco esquisito, ele diz: “Não, o senhor tem que fazer uma vivissecção”. Então leva o coitado para um hospital, põe uma roupa toda branca no homem, para não infeccionar, e tira o pedaço dele. E diz: “O senhor volta daqui a 3 dias, que eu vou dizer se o senhor está com câncer ou não”.

Para o maníaco da doença, são três dias de aflição deliciosa, porque ele fica à espera daquele resultado: se tem ou não tem câncer. Quando chega o resultado: Não tem! Diz o médico: “O senhor foi muito bem. E outra qualquer bolinha que o senhor tenha no corpo, o senhor apareça”.

O médico vai acabar fazendo com que este sujeito tenha câncer. Porque estas coisas são assim.

As coisas da alma também. Se a gente à toda hora está: “Eu tive tal coisa, senti tal coisa tereté-té.”, nós criamos o problema.

Quer dizer, entra nisto um exagero com o qual nós precisamos ter todo cuidado, e que é, no fundo, uma forma de “pereza” [preguiça]. Esta forma de “pereza” [preguiça] o que é que é? É um desejo de não estar prestando atenção na vida fora, não estar trabalhando, não estar lutando, não estar agindo, mas estar só pensando em si.

De maneira tal que os senhores considerem isto dentro da TFP. Em geral, quando tem um sujeito mole, preguiçoso, que não trabalha, preste atenção: ou ele é sentimental ou ele tem mania de introspecção; ou são as duas coisas ao mesmo tempo. Não escapa! Pelo contrário, quando o sujeito vai indo para frente na vida espiritual, ele trabalha, ele se entusiasma, ele se enleva.

Esse gênero de gente não tem enlevo verdadeiro; tem enlevo literário: “Eu vi Doutor Plinio fazer uma conferência e fiquei tão enlevaaaadoooo…” Esse enlevo – olha aqui – pode cancelar! Isso não é enlevo, [é] enlevo consigo; é gostoso sentir-se enlevado a propósito de uma conferência de Dr. Plinio, mas é sentir-se a si mesmo, não é o “vorwärts”, o «para frente» alemão: pam! Não é isso, não! É uma meleira… Não sei se se diz “meleira” em castelhano; uma coisa melada. Diz? Então é isso. É uma meleira.

E nós precisamos, meus caros, combater isto energicamente. Mas energicamente!

Combater por quê?

Nós não podemos fazer o papel de uma sentinela que está parada com o fuzil na mão e pensando nos seus problemas interiores supostos: “Eu agora… “Ele” agora está sentindo tal coisa, assim, assado. Mas se ele respondesse tal coisa agora, se ele encontrasse com seus círculos mundanos, o que ele faria?…” Este, na hora do combate, não dá um tiro, sai fugindo. Porque isto é a fábrica dos medrosos. Isto não serve para nada! Não é matéria prima humana para nada.

Dá para luta quem? Aquele que faz do centro de sua vida interior o nosso ideal. Qual é o nosso ideal? É o ideal da TFP. Qual é o ideal da TFP? É a Santa Igreja Católica e a Civilização Cristã. Ou seja, Nossa Senhora e Nosso Senhor Jesus Cristo. Isto aí é o ideal da TFP!

Então, o membro da TFP verdadeiro, sério, aquele que queira ser um verdadeiro cavaleiro, destemido, ufano, este tem que ser um homem que está a toda hora se pondo outra pergunta: “Se agora me vier um sacrifício, eu estou disposto a fazer? Agora, no momento, os meus deveres não me impõem um sacrifício? Eu estou disposto a fazer os sacrifícios que os deveres me impõem? Eu não tenho algum dever que eu deveria estar fazendo e que eu não estou fazendo por preguiça, por “pereza”? Eu não tenho alguma ocupação que eu estou adiando sem nenhuma razão de ser? Eu não estou deixando as minhas orações para a noite, à toa? Meu exame de consciência, eu não estou deixando de lado, à toa?”

O homem que verdadeiramente quer ser um cavaleiro de Nossa Senhora na “Bagarre” (*) que se aproxima, este deve pensar o seguinte: “Eu sempre farei o meu trabalho o mais cedo possível. Quer dizer, sempre, antes de descansar eu trabalho, e só descansarei depois de ter feito os meus trabalhos. Na hora de fazer os trabalhos, eu farei antes os mais difíceis, os mais desagradáveis e depois os mais fáceis. E, por fim, pararei de trabalhar. E, quando eu parar de trabalhar, eu devo me lembrar que eu parei de trabalhar para me preparar para o trabalho”.

Há duas formas de repouso. Uma forma de repouso na qual o sujeito fica com horror ao trabalho: essa não vale nada. A outra forma de repouso na qual o indivíduo fica com vontade de trabalhar mais. Esta é que vale.

Nós devemos compreender que na vida de todos os dias nós devemos ter este heroísmo do dever cumprido imediatamente, com intransigência, sem meleira, sem romantismo, sem acessos de introspeção.

É por esta forma que ele adquire a vontade rápida, enérgica, aquela forma de saúde de alma por onde o indivíduo acha agradável trabalhar, acha agradável lutar, o que é próprio do homem normal.

O homem normal, quando anda, não anda como um bicho preguiça, mas ele anda contente de andar, contente de exercitar-se. O homem normal, quando ele trabalha, ele trabalha satisfeito de trabalhar. E, quando ele luta, ele luta satisfeito de lutar, tem a alegria da luta.

Assim, meus caros, eu quisera que nós fôssemos. E para nós sermos assim, temos que seguir esta ordem de valores que nós dissemos.

E isto faz parte – já que um dos senhores me pediu para tratar disto, eu insisto um pouco no assunto – isto faz parte do romantismo.

Há uma concepção romântica do heroísmo pela qual o sujeito fica sentado numa cadeira se abanando por causa do calor e dizendo: “Bom, eu agora não vou escrever aquela carta à máquina, ou não vou pedir um donativo, ou não vou telefonar para tal rapaz que tento aproximar”. Por quê? “Porque agora eu não estou com vontade. Mas eu – quando chegar a “Bagarre” – eu vou ser um herói! Eu tenho umas vontades em mim, uma coisa fabulosa!…”

Eu tenho vontade de dizer: desista! Eu não te tomo a sério. E, por favor, não se tome a sério a si próprio, porque isto não é sério!

Por quê? Porque a virtude da fortaleza é uma! O heroísmo é uno! E ninguém é heroico numa parte da alma e medroso na outra parte da alma.

A doutrina católica nos ensina que a gente tem uma virtude íntegra ou não tem virtude, e que a virtude íntegra deve ser praticada sob todos os seus aspectos. Esta é a doutrina católica. Ou a Igreja católica não é verdadeira religião ou é assim que as coisas têm que ser consideradas. Não há outro modo de considerar as coisas.

Eu não posso admitir, por exemplo, o seguinte: um sujeito vem me dizer o seguinte: “Dr. Plinio, eu, em matéria de olhares, eu sou muito puro; mas, pensamento, sim, eu tenho pensamentos indecentes; mas meu olhar é de querubim!” – Meu caro, não venha com essa! Porque não é possível! Quem cai numa, cai noutra.

Eu também não posso admitir que um sujeito seja habitualmente e estavelmente – porque a questão é isto – habitualmente e estavelmente um grande batalhador na hora do “dilúvio vermelho” [castigos previstos por Nossa Senhora em Fátima, n.d.c.] se ele não é habitualmente e estavelmente um cumpridor dos seus deveres na hora do “dilúvio azul” [ambiente mole e otimista, n.d.c.]. Porque isto não é verdade! Não é real!

O que eu compreendo é outra coisa: a constância é uma. Ou o sujeito é constante em todas as ocasiões da vida, ou não é constante nunca…

Agora por quê? Eu volto ao princípio: toda virtude é una e ninguém pode possuir autenticamente uma virtude em partes. Não há uma meia castidade, uma meia castidade chama-se uma impureza não completa se quiser, mas é uma impureza. E o sujeito vai para o Inferno!

Não há uma meia preguiça como, por exemplo, não há um meio espírito de oração. As coisas não são assim. É, é! Não é, não é! Aliás, está dito isto por Nosso Senhor no Evangelho: “Seja vossa linguagem, sim, sim; não, não!”

Pergunta: “Você tem coragem de telefonar para um rapaz e fazer um apostolado e de “morrer” nesse apostolado para este rapaz entrar para a TFP?” [Resposta:] – “Sim, sim… não, não… Nos dias que este escravo de Maria amanhece com dor de cabeça…”

Não preciso. Porque estar dependendo de sua dor de cabeça…

Os senhores imaginem se a TFP dependesse de minha dor de cabeça para andar ou não andar! Os senhores imaginem o desapontamento dos senhores se chegam aqui, vão ter reunião comigo: “Dr. Plinio não pode fazer reunião” – “Por quê?” – “Ele hoje propriamente não está com boa disposição; ele está preferindo ler um álbum sobre história da Índia. Está na sala ao lado lendo o álbum sobre história da Índia”. Acabou Dr. Plinio! Acabou!…

Mas, isto vale para os senhores também, não vale só para mim. Claro, claríssimo! É ou não é evidente? Então vamos aceitar esta provação do “dilúvio azul” com alma de cavaleiros, com intenção de nos prepararmos para a “Bagarre”.

Há um modo horroroso de levar o “dilúvio azul”, que é  como quem diz: “Ó como é azul o meu dilúvio”… E se põe na “compota”. Isto é horroroso! “Eu vou bater minha cartinha à máquina; vou fazer o meu servicinho burocrático. Graças a Deus, por enquanto, não chegou o “dilúvio vermelho”…” Isto é horrível!

São os dois pontos de desequilíbrio; um é: “Graças a Deus não chegou o “dilúvio vermelho”, eu vou viver do “azul”!” Outro é: “Eu vou ser um “sabugo” [indolente, mole, n.d.c.] no dilúvio azul; mas, no vermelho, eu vou ser um leão”… Ambas as coisas são desonestas.

A posição é: treinar, no dilúvio azul, a constância, a energia nos deveres da vida de todos os dias, compreendendo que isto nos fará admiráveis cavaleiros de Nossa Senhora no dilúvio vermelho, e ansiando para que chegue logo o dilúvio vermelho. Esta é a verdadeira posição de alma.

Com isto, meus caros, sem fazer literatura, numa reunião simples, numa reunião que eu tive intenção de me abrir inteiramente aos senhores, eu devo dizer o seguinte: que eu fiz esta explanação com a intenção de ser [útil] para os senhores, porque os senhores exatamente têm o mérito de serem um pouquinho veteranos, mas que na idade dos senhores, já parece veteraníssimo.

Uma vez eu ouvi dizer de um novo a quem se perguntou “O senhor já está há muito tempo na TFP?” Ele responder: “Sim, há muito tempo,  há 6 meses que estou na TFP…”

Assim também quando a gente está há 2 anos, há 3 anos na TFP, a gente já se sente veterano pelo menos em relação a uns novos que vieram. E, um pouco, é mesmo. E essa é um pouco a “doença” do veterano; o veterano cai um pouco nestes defeitos. E acha que o trabalho, a luta, as obrigações são para o novato: que ele carregue! O veterano fica de lado, um pouco “senador”, se abanando ou então – num clima mais frio – se colocando junto ao aquecedor, junto à lareira, e cuidando da sua alma como se tivesse vencido mil batalhas. Isto é a frustração de uma vida!

Ou cada ano que passa os senhores são mais corajosos e mais ardorosos, ou estão perdendo a sua vida, porque a santificação é cada vez mais ardor e cada vez mais coragem. Eu desejo isto aos senhores.

Os senhores são novos. Quando os senhores forem velhos, no Reino de Maria, há muito tempo eu terei deixado de existir. Quando os senhores forem velhos, é possível que alguns que estão aqui já não estejam inteiramente em serviço; como são, por exemplo (…) e os outros. É possível que estejam também meios pengós. Os senhores é que estarão na plena produção.

O que é que vai ser do Reino de Maria se os senhores não estiverem no seu auge? E como é que os senhores poderão estar no seu auge com 50 anos? Se os senhores com 2 ou 3 anos de Grupo estão amolecendo, em que grau de moleza chegarão aos 50 anos?… Não pode ser.

Nós temos que nos tornar cada vez mais enérgicos, valorosos, combativos. Que Nossa Senhora os ajude a isto.

Não se zanguem de eu ter tratado da questão tão claramente. Os senhores veem bem que eu falo com transbordamento de afeto para cada um dos senhores, que eu me tenho na conta do pai de cada membro da TFP.

Mas os senhores conhecem um dito do Profeta Isaias a respeito do pai que odeia seu filho, não conhecem não? Os que não conhecem, levantem o braço. O Profeta Isaias tem uma frase: “O pai que poupa a vara a seu filho, odeia a seu filho”. Sabem o que é “vara”? “El padre que ahorra la vara a su hijo, odia su hijo”.

Então, também o Presidente da TFP que de vez em quando não aperta um pouco, este não é pai dos filhos que tem na TFP…

Então fica aqui um apertãozinho como despedida; mas, ao menos, um apertão dado com toda alma e num transbordamento de afeto sério e honesto em relação a cada um.

(Pergunta: – O senhor poderia dizer qual é o obstáculo que o romantismo coloca para a incondicionalidade?)

O romantismo liquida a incondicionalidade porque ele é de si a condição. O indivíduo que se entrega ao romantismo fica todo cheio de sensibilidades, de susceptibilidades e de dores. A gente não pode tocar nele que ele, inteiro, estremece. Então ele é o condicional.

Vamos dizer que um dos senhores me fizesse a seguinte pergunta (eu vou me colocar na posição de um perguntante e fizesse a seguinte pergunta): “Mas, Dr. Plinio, é tão difícil, na prática, seguir isto que o Sr. está dizendo, porque são normas interiores, são todas elas coisas doutrinárias interiores e se esfumaçam nas nossas mãos. Que norma prática o Sr. daria para nós seguirmos o que o Sr. está dizendo?”

Os que acham que a resposta a essa pergunta seria útil, levantem o braço.

Eu dou a resposta; é simplicíssima: a obediência nos salva de tudo, acaba com romantismo, acaba com tudo.

Esta norma, meus caros, é a norma de ouro. Com o prático-prático tudo se resolve, sem o prático-prático não se faz nada.

Isto está bem claro ou não?

Zero! Seria a mesma coisa, um automóvel sem rodas… Como é que pode haver? Não. Mas é um lindo… não sei que marca de automóvel possa haver… não sei… Peugeot, por exemplo. Um lindo Peugeot. Bem, não importa, se não tem rodas, fica de lado, é um traste! Prático-prático é o que faz as coisas andarem.

Alguém me dirá: É duro! Eu digo: Meu filho, é o contrário: é bom!

Imaginem um Paxá, sentado no Oriente, no meio de almofadas, fumando narguilé – aaaah! – sem coragem. Vem um professor de ginástica e ensina ele a jogar Karatê. No começo é duro. Mas, no fim, o Paxá virou: é outro homem; está mais magro, está decidido, está esperto, está saudável, está alegre; não precisa estar sempre com gente em torno dele com leque espanando as moscas e cheirando mais um perfume, e comendo mais uma tâmara senão ele se esvai… Quer dizer, assim que é a vida!

Está claro isto, ou não? Bom meus caros, eu agora vou encerrar.

Notas: Consulte também o “Santo do Dia” (com áudio e texto) de 15 de abril de 1989 e intitulado  “Sem o livro de Dom Chautard, eu teria perdido a minha alma”

(*) “Bagarre” é uma palavra francesa que indica uma situação de confusão, devida a uma disputa ou uma rixa. O Prof. Plinio a utiliza como neologismo para se referir ao castigo que espera a humanidade se esta não se converter, conforme advertiu Nossa Senhora em Fátima.

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