Plinio Corrêa de Oliveira
É quarta-feira, à noite. Ainda não se conhecem os nomes dos futuros ministros. Entretanto, veio-me a vontade de dirigir a dois deles — o da Justiça e o das Relações Exteriores — uma carta. Será, por certo, a primeira a lhes ser enviada enquanto titulares das respectivas pastas. Pois seus nomes talvez nem sequer tenham sido fixados nas cogitações do futuro presidente. Espero que o magro mérito de constituir uma primícia fixe sobre minha missiva a atenção de seus ilustres destinatários.
Perguntar-me-á o leitor porque os chamo de ilustres se não lhes conheço os nomes. — Em via de regra, um futuro ministro é ilustre. E, se não o é, quando chegar a ser ministro acabará alcançando a ilustração. Respondida essa pergunta, resta o problema do endereço. É contra os estilos endereçar-se uma carta ao “Sr. Futuro Ministro da Justiça” ou ao “Sr. Futuro Ministro do Exterior”. E depois, onde moram eles? Mas a dificuldade se obvia, confiando a carta às páginas desta folha. Isto posto, senhores ministros ignotos, permiti que eu entre no assunto.
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Para ser polido, serei breve. E para ser breve serei esquemático. Desejo tratar da imunização do Brasil contra o perigo comunista.
O perigo comunista consiste na atuação, não só do Partido Comunista, mas de todas as suas forças propedêuticas ou auxiliares, de rótulo marxistóide, socialista ou esquerdista. A evidência dos fatos mostra que tal perigo está muito menos no PC, diminuto e esfrangalhado, do que nestas forças auxiliares. Pois só elas têm capacidade de penetração em nosso ambiente. E, para ser inteiramente preciso, entre essas forças auxiliares, a única a ser realmente tomada em conta é a “esquerda católica”. O Evangelho nos previne contra os lobos vestidos com pele de ovelha (Mat. 7,15). A mais eficiente das peles de ovelha é o hábito talar do sacerdote. Ou, por analogia, a reputação de líder católico…
Entendo por “imunização” aquilo que possa fazer cessar o perigo. E, como só se elimina um perigo quando se fazem cessar as suas causas, quero eliminar a influência da esquerda católica.
Notem Vossas Excelências que não falo em privar da liberdade os elementos que constituem essa esquerda. Nem em expulsar do país os seus componentes estrangeiros. Essas medidas poderão ser ou não ser justas e úteis, conforme cada caso concreto. Elas podem atenuar o perigo. Não porém eliminá-lo. Acrescento que, em alguns casos, elas podem ser contraproducentes. A esquerda católica vive da influência que lhe vem do rótulo católico. Essa influência não se lhe tira só com medidas legais e judiciárias. Mais do que tudo, é preciso, tirar-lhe o rótulo. Nisto está a solução.
No Brasil só houve uma questão religiosa. Foi o conflito entre o governo imperial, de um lado, e, do outro, D. Vital e D. Macedo Costa. Os valorosos bispos de Olinda e do Pará — obedecendo às prescrições da Santa sé — proibiram aos seus diocesanos que pertencessem à maçonaria. O governo imperial reputou ilegal a proibição e prendeu os bispos. Esta violência despertou o entusiasmo geral em favor dos prelados feridos em suas imunidades eclesiásticas só por cumprirem seu dever. O governo imperial teve de capitular. O gabinete Rio Branco caiu. E a pedido de Caxias, os bispos foram indultados. Uma mesma ovação geral acolheu o gesto justiceiro e sábio do grande Caxias e a vitória dos dois bispos.
Se não queremos repetir o erro trágico do gabinete Rio Branco — erro do ponto de vista religioso e do ponto de vista civil — temos de agir com justiça, firmeza e sagacidade.
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Ora, sucede que, entre o caso dos bispos de Olinda (o do séc. XIX, é claro…) e o do Pará, e o caso da hodierna esquerda católica, há uma diferença radical e incomensurável. É que os dois gloriosos prelados do Império tinham toda a razão do próprio ponto de vista católico. Por isto, Pio IX, então reinante, lhes deu inteiro ganho de causa. Pelo contrário, a esquerda católica não exprime o pensamento da Igreja. E como tal não merece o apoio, nem da hierarquia, nem do povo católico.
Sei o que escrevo. E sei que ninguém, no Brasil, terá a coragem de me contestar. Afirmo que o comunismo é incompatível com a doutrina católica, não só porque ele se baseia em uma filosofia materialista e nega a instituição da família, como porque elimina a propriedade individual. E isto de tal forma, que não é possível a existência segura e livre da Igreja, sob um regime comunista. Foi o que sustentei em um ensaio intitulado “A liberdade da Igreja no Estado Comunista“, editado em 8 línguas, e calorosamente elogiado por uma carta da congregação dos Seminários e Universidades da Santa Sé. Ali dou os argumentos desta assertiva. Claro está que são, por motivos análogos, incompatíveis com a Religião o socialismo e outros subprodutos da propaganda comunista.
O que nos grandes centros de todo o Brasil se sabe, isto é, que há um ativo bolsão comunista ou comunistizante em meios católicos brasileiros, é apenas vislumbrado em muitos centros médios e pequenos. Pois peço a vossa excelência, sr. ministro da Justiça, que organize — com base nos documentos apreendidos pela polícia — um documentário farto que prove esta triste realidade; e que providencie uma larga distribuição dele por todos os recantos do Brasil.
E a vossa excelência sr. ministro do Exterior, sugiro que, apoiado pelo clamor da imensa maioria do país peça à Santa Sé medidas aptas a desautorar, em nome da Igreja, os Comblins de toda a casta que da Igreja se servem para demolir o Brasil.
O caso de D. Vital e D. Macedo Costa repercutiu no mundo inteiro. V. excelência, sr. ministro da Relações Exteriores, bem pode imaginar que imensa repercussão teria no mundo — a fortiori — o gesto do Brasil de hoje, ameaçado pela subversão pedindo a Paulo VI medidas canônicas urgentes e decisivas, que tirassem à esquerda as aparências de estar falando em nome da Igreja?
Seria algo como a quadratura do círculo, imaginar que Paulo VI se mantivesse insensível a tão justo pedido. A só considerar as coisas no plano diplomático, quão terrível seria, aos olhos do mundo, a situação do pontífice que se recusasse a tomar todas as medidas para salvar do colapso e do caos a mais populosa das nações católicas do globo? Verificada essa hipótese abstrusa poder-se-ia dizer que o mundo estaria rolando para o despenhadeiro final!
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Os pessimistas mais empedernidos — e não creio que vossas excelências estejam entre estes, srs. ministros — só poderiam objetar contra as medidas que proponho, que seriam de utilidade duvidosa.
Concordo só “argumentandi gratia” — Será então isto motivo para não as tomar? Pois se elas podem dar um resultado magnífico, e nada custam, por que não as experimentar?
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Rogo-lhes, pois, srs. ministros, que apresentem — com meus respeitos — esta sugestão ao novo chefe de Estado. Estou certo de que incontáveis compatriotas a acharão justa, oportuna e eficaz. E meu coração de brasileiro me leva a crer que, ainda que seja só por isto, o preclaro general Garrastazu Medici dará à proposta uma simpática atenção.
Para vossas excelências aqui ficam, com meus agradecimentos, os cumprimentos muito atenciosos de um patrício que pede à Providência lhes assegure o maior êxito nas respectivas pastas, para segurança, prosperidade e glória do Brasil cristão.