A Primeira Comunhão de Plinio Corrêa de Oliveira – Recordações

    *27 de agosto de 1994

A D V E R T Ê N C I A

Gravação de breve conversa do Prof. Plinio com cooperadores da TFP, não tendo sido revista pelo autor.

Se Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras “Revolução” e “Contra-Revolução”, são aqui empregadas no sentido que lhes dá Dr. Plinio em seu livro “Revolução e Contra-Revolução“, cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de “Catolicismo”, em abril de 1959.

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Alguns jovens que estavam se preparando para a Primeira Comunhão perguntaram ao Prof. Plinio como havia transcorrido aquela grande data para ele (a 19 de novembro de 1917) que normalmente marca a fundo a alma, sobretudo quando se é pequeno, mas já com o uso da razão, conforme estabelecido pelo Papa São Pio X. 

 

 

Minha primeira comunhão foi preparada por Dona Lucilia [Lucilia Ribeiro dos Santos Corrêa de Oliveira], mãe do Prof. Plinio] para mim, minha irmã e uma sobrinha dela que morava em nossa casa e que ela tratava como filha. Éramos ainda muito crianças, pois a Primeira Comunhão foi em 1917. Como nasci em 1908 [no dia 13 de dezembro], tinha nove anos [incompletos], mas já estava largamente na idade recomendada por São Pio X para as crianças fazerem sua Primeira Comunhão. Podia ser mais cedo, mas foi com nove anos que fiz a minha.

Dona Lucilia, querendo que essa formação religiosa tivesse o maior esmero possível, quis que o vigário de Santa Cecília, chamado Padre Pedrosa — indicado a ela pelo famoso Padre Chico de Paula e tido como o melhor diretor espiritual, o mais piedoso e um dos melhores oradores sacros de São Paulo —, nos preparasse para a Primeira Comunhão.

 

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Mas foi muito mais do que isso. Ela quis também que essa preparação fosse dada só para nós três. Realizada numa bela sala da igreja de Santa Cecília, na parte traseira da igreja, com vitrais muito bonitos, uma mesa com madeira grossa muito bem trabalhada. O ambiente dava muito a ideia da seriedade da aula.

Esse padre sabia muito bem tratar com crianças, sabia explicar como a comunhão é um ato de uma sublime grandeza, mas, ao mesmo tempo, com muita bondade etc. Ele tinha intenção de nos fazer sentir bem a bondade do Sacratíssimo Coração de Jesus e do Sacral e Imaculado Coração de Maria.

As aulas para as crianças eram muito explicadinhas, tudo muito claro, direito etc., e eram agradáveis de ouvir. Mas, no modo de ensinar catecismo naquele tempo, inculcava-se muito o respeito que se devia àquela doutrina e o respeito e a veneração que se deveria ter a tudo quanto a Igreja ensinava, sua doutrina etc.

Se eu não me engano, foi lá que ouvi pela primeira vez falar de infalibilidade papal, que foi um das maiores graças da minha vida, porque eu via em torno de mim muitas discussões a respeito.

Minha família era muito unida, mas nela se discutia muito política, e religião também. E havia alguns que eram católicos e monarquistas, enquanto outros eram ateus e republicanos. E formavam-se discussões. Eram até inteligentes, eles discutiam bem de um lado e do outro. Os republicanos naturalmente não tinham razão, mas também diziam alguma coisa, alguns argumentozinhos que era preciso saber destruir.

Mas eu notava também que as pessoas mais velhas que me rodeavam, e que eu respeitava naquele tempo profundamente, estavam em desacordo sobre um mundo de outras opiniões. […]

E eu, menino ainda, ouvia as discussões e pensava o seguinte: Aqui estão umas pessoas que são razoavelmente inteligentes. Também são razoavelmente instruídas, e estão em desacordo uns com os outros em quase tudo, mas elas mesmas estão vendo que os homens razoavelmente instruídos e inteligentes, caem facilmente em erro. Porque, do contrário, não pode ser que eles tivessem tanto desacordo. Onde há muito desacordo, um dos lados está errado. E se um dos lados está errado, havendo muitas teses opostas, há muitos erros, e se houver muitos erros, há muita gente errada. Onde é que vai parar isso? É natural que eles errem. Eu vejo que está na natureza deles errar. Mas sinto que, quando eu ficar adulto, vou errar também. Se todo o mundo erra, do que adianta raciocinar?

O que está dito é flagrantemente verdadeiro. E eu pensava: “Não sei que confiança vou ter no meu raciocínio quando for adulto, que bagunça pode dar isso, onde é que isso pode me levar”.

E nessas considerações eu ficava assim imerso na ideia de que no fundo não vale a pena pensar, porque se em cada dez ideias que a gente tenha pelo menos uma está errada, é mais ou menos como um homem que sabe que em cada dez passos que ele der na caminhada, ele cai uma vez no chão. Então mais vale a pena não andar. Está acabado! Para quê? Para me escangalhar na estrada? Não convém.

Assim, quando entrou na preparação para a Primeira Comunhão a tese da infalibilidade papal, eu tive um entusiasmo extraordinário. Mas é difícil calcularem o interesse e o entusiasmo que eu tive pela infalibilidade papal. Eu pensei: “Essa é a solução, tem de haver um que é infalível. Se eu errar — e sei de antemão que em vários pontos eu vou errar —, que confiança eu posso ter em mim mesmo? Ah, se eu pudesse me apoiar em um homem que não errasse!”.

De repente aparece a solução [o dogma da infalibilidade]. Não é um homem que não erra, é um Pastor dos pastores, instituído por Nosso Senhor Jesus Cristo [vira a fita, perdendo-se algumas palavras] É [a Igreja Católica] a única religião que sustenta a infalibilidade. Para saber se essa é a religião de Deus não precisa mais nada! […]

Em tudo que eu penso, a minha preocupação essencial é: “O que pensará a Santa Sé? Existem documentos dos Papas dizendo isto?” Porque se existir, aí eu tomo uma firmeza que não tenho em nenhuma opinião minha puramente pessoal. Mas sei que se me apoiar na doutrina infalível dos representantes de Cristo na Terra, não tem perigo de errar. Posso avançar, porque não errarei. […]

Graças a Deus, sou um homem que tenho muita convicção do que digo. Na realidade, isto é assim porque eu creio na infalibilidade papal. É o fundamento de tudo. O que me deu muita segurança e muito agradecimento e admiração a Nosso Senhor porque Ele excogitou uma Igreja assim.

Depois a ideia [na Primeira Comunhão] de que era o próprio Homem-Deus que eu iria receber. Seu Corpo, Sangue, Alma e divindade iriam habitar dentro de mim por certo espaço de tempo. Isso me deixava entusiasmadíssimo! Por outro lado, Dona Lucilia tomava muito cuidado com uma porção de coisas. Em primeiro lugar o seguinte:

 

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Naquele tempo, para realçar a importância da comunhão, o Papa São Pio X tinha querido que todas as famílias — naturalmente cada uma na medida do que pudesse — celebrasse a festa da Primeira Comunhão com alguma coisa que chamasse a atenção das crianças. E o que o costume estabeleceu — não sei se hoje ainda é assim — é que o dia da Primeira Comunhão fosse um dia de festa em casa. Nesse dia as crianças não estudavam, não trabalhavam, ficavam apenas em casa rezando ou fazendo algum giro a pé, alguma outra coisa, mas por pouco tempo. Elas deveriam ficar a maior parte do tempo recolhidas e pensando.

Em segundo lugar, no dia da Primeira Comunhão, para manter nas crianças o respeito [à Sagrada Eucaristia], os meninos e as meninas deveriam usar uma roupa especial. E essa roupa devia evocar virgindade. Quando ainda crianças, se pode esperar que fossem virgens.

Assim, a menina se apresentava para a Primeira Comunhão com vestido igual ao de noiva, que simboliza a virgindade. E na cabeça uma grinalda de flores, em geral bonitas. […]

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Para os meninos era uma roupa — ao menos aqui em São Paulo — copiada do traje oficial de um dos maiores colégios de meninos daInglaterra, o Eton College. A Inglaterra sempre foi muito cuidadosa e muito bem sucedida no que diz respeito aos trajes. Todos comungavam com essa roupa — que era em ponto pequeno a roupa de um homem adulto, com colarinho duro, gravata muito bonita, colete, sapatos de verniz e uma fita de seda com uns pingentes de ouro no braço — para dar a entender que aquele menino era casto e se alegrava de ser casto.

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Esse traje me impressionou muito e gostei muito usá-lo, porque era muito tradicional e, ao mesmo tempo, muito católico. Essa manifestação de castidade me alegrou muito. Usando essa roupa no dia da Primeira Comunhão, senti-me muito elevado, dignificado em receber Nosso Senhor com esse traje.

Na véspera do dia da Primeira Comunhão eu tive um sonho […]. Sonhei em ver um bolo — a minha fantasia estava toda tomada com a ideia dos bolos e dos doces na festa do dia seguinte — e, em certo momento, o bolo se abria e aparecia dentro Nosso Senhor Jesus Cristo pisando sobre um globo e com os braços abertos […]. Era muito estranho, porque não é adequado Nosso Senhor aparecer num bolo. Enfim, era um sonho que não deixava de me produzir certa emoção.

Assim foi dia da Primeira Comunhão, que recebi com recolhimento, com muito desejo de que fosse uma comunhão perfeita, mas eu achava que seria natural que essa comunhão fosse para mim um momento de muito enlevo e me sentisse profundamente tocado. Pelo contrário, Nossa Senhora obteve de Nosso Senhor que fosse um momento de aridez. […] Mas rezei atentamente e creio que Ele, pela intercessão de Nossa Senhora, teve pena de mim, porque essa aridez não me fez mal algum, pelo contrário, eu lucrei, e dias depois a minha vida espiritual tinha retomado seu curso.

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