Reforma Agrária - Questão de Consciência


Secção II

Opiniões socializantes que preparam o ambiente para a "Reforma Agrária": exposição e análise

Proposição 2

Impugnada

Este princípio da igualdade também é ensinado pelo Evangelho, que nos manda amar o próximo como a nós mesmos (77).

Quem ama o próximo como a si mesmo não pode querer mais riqueza para si do que para o próximo.

 

 

 

Afirmada

Esta desigualdade proporcionada e harmônica, que a ninguém deixa na indigência, mas permite aos mais capazes e operosos ocupar uma situação melhor, é a aplicação lógica do princípio do Evangelho, de que devemos amar o próximo como a nós mesmos.

Este princípio nos obriga a amar todos os homens porque nos são próximos. E, pois, ele nos preceitua particular amor para com os mais próximos. Ora, para cada homem, o mais próximo é ele próprio e sua família.

Assim, é razoável que, sem recusar aos outros justiça nem caridade, cada um se beneficie a si e aos seus, em medida muito mais larga, com o produto de seu trabalho.

 

Comentário

 

1.– Todos os homens nos são próximos

Todos os homens nos são próximos, ensina o Evangelho (78). Com efeito, fomos todos criados à imagem e semelhança de Deus, e remidos por Jesus Cristo. Assim, a todos devemos fraterno amor.

2.– Mas há graus nessa proximidade

Mas a experiência mais comezinha nos ensina que nas relações humanas a proximidade tem graus. Segundo é bem evidente, o ente mais próximo para cada homem é ele mesmo. Vem depois sua família, que é como o prolongamento de seu próprio ser, a carne de sua carne e o sangue de seu sangue. E sucessivamente, como em círculos concêntricos cada vez mais largos, vêm as pessoas com quem o homem tem relações de proximidade particulares: os amigos, os alunos, os empregados, os compatriotas, os companheiros de trabalho ou de estudo etc. Por fim, como última periferia, vêm os que nos são desconhecidos, que formam a grande sociedade humana.

3.– Por isso há graus no amor do próximo

A essa gradação de proximidades corresponde uma gradação de amor ao próximo. Pois, se amamos o próximo porque próximo, é claro que devemos amar mais os que nos são mais próximos. Se devemos a todos o mesmo amor, não o devemos a todos em medida igual (79).

Amando todos os homens, devemos desejar que todos tenham os bens de alma e de corpo que correspondem à natureza humana (80). Mas devemos querer em abundância ainda maior esses bens para os que nos são mais próximos, isto é, nós mesmos, nossas famílias etc.

É este o ensinamento unânime dos Papas e dos moralistas católicos.

4.– Logo, a desigualdade de propriedades é legítima

Em conseqüência, é falsa a proposição impugnada.

Estas considerações tornam fácil perceber que, em boa medida, a oposição entre Catolicismo e socialismo está em que aquele afirma a legitimidade de uma gradação no amor ao próximo, e este a nega.

5.- A posição orgânica do homem na sociedade cristã

Uma sociedade cristã é como que uma imensa rede de amor ao próximo que tem por imediato objeto a família e os círculos vizinhos, e por aí se irradia a todo o corpo social.

É pois do íntimo dos homens que jorra a vida dos grupos e da sociedade. Vida tão intensa que é, de algum modo, mais ela do que o Estado a grande força propulsora de um país ou de uma civilização.

Aliás, esta gradação no amor ao próximo é bem o que corresponde à natural tendência da alma humana, que não se satisfaz com um mero amor genérico à humanidade, mas pede imperiosamente seres concretos, com quem tenha relações diretas e a quem se dedique de modo pessoal.

Por isso, se se nega que devemos amar mais os mais próximos, as relações de proximidade perdem todo o alcance e significação, praticamente desaparecem. É bem o modo por que o socialismo e o comunismo concebem o amor ao próximo – em sua linguagem laica ou atéia, simples solidariedade humana – igual para todos.

6.- Situação anorgânica do homem nas massas socializadas

Daí a formação de imensas massas sem contextura interna, o isolamento trágico e glacial do indivíduo na multidão, e a inteira ausência de vida de alma na sociedade humana, bem como a sujeição desta a um organismo com o qual ela não tem relações vitais, mas apenas mecânicas: o Estado, alheio à multidão e dirigido por técnicos sem contato vivo com a realidade.

7.- Povo e massa

Na sociedade cristã se constitui um organismo vivo, diferenciado em órgãos hierárquicos e profundamente solidários entre si: é o povo. No regime socialista forma-se a massa.

A diferença entre povo e massa foi admiravelmente descrita por Pio XII, de saudosa memória, em documento adiante citado (81).

O igualitarismo socialista e a "Reforma Agrária" não passam de aspectos da grande vaga de socialização que varre o Ocidente. O erguer diques a essa vaga não deve ser visto como um mero trabalho de preservação de elites, meritório em si. Esta tarefa tem seu sentido pleno no desígnio de assegurar para o povo todo, como sociedade – compreendendo famílias e grupos de vários níveis orgânicos e diferenciados – o caráter de povo. Seu objetivo é impedir a trágica transformação do povo em massa inerte, anorgânica e escrava.

* * *

Aludimos de passagem ao laicismo ou ateísmo socialista. O tema merece uma palavra de elucidação.

Segundo a doutrina católica, todos os homens são irmãos, pois foram criados por Deus e remidos por Jesus Cristo, e a pátria não é senão uma família de famílias. Compreende-se todo o calor de afeto fraterno que daí promana, na família primeiramente, mas gradativamente também em todas as relações humanas, e em toda a humanidade. É uma imensa efusão de amor, graduado por certo e como que hierarquizados, mas que atinge de fato todos os homens com uma plenitude esplêndida, toda fundada – é importante notar – no amor de Deus.

Segundo a doutrina socialista, não há Deus, ou pelo menos ignora-se sua existência, pois deseja-se construir todo o edifício social e econômico à margem de concepções religiosas: isto é, precisamente como se Deus não existisse. O que resta então como fundamento para o amor entre os homens? As relações humanas passam a ser um gélido e inóspito consórcio de interesses...

Os adeptos de tal doutrina não têm direito, pois, a manejar o argumento do amor ao próximo.

 

 

Textos Pontifícios

 

O amor ao próximo ensinado por Jesus Cristo é o oposto da utopia igualitária do socialismo

"Certamente, Jesus nos amou com um amor imenso, infinito, e veio à terra sofrer e morrer, a fim de que, reunidos em redor dele na justiça e no amor, animados dos mesmos sentimentos de mútua caridade, todos os homens vivam na paz e na felicidade. Mas para a realização desta felicidade temporal e eterna Ele impôs, com autoridade soberana, a condição de se fazer parte de seu rebanho, de se aceitar sua doutrina, de se praticar a virtude e de se deixar ensinar e guiar por Pedro e seus Sucessores. Ademais, se Jesus foi bom para os transviados e os pecadores, não respeitou suas convicções errôneas, por sinceras que parecessem; amou-os a todos para os instruir, converter e salvar. Se chamou junto de Si, para os consolar, os aflitos e os sofredores, não foi para lhes pregar o anseio de uma igualdade quimérica. Se levantou os humildes, não foi para lhes inspirar sentimentos de uma dignidade independente e rebelde à obediência. Se seu coração transbordava de mansidão pelas almas de boa vontade, soube igualmente armar-Se de uma santa indignação contra os profanadores da casa de Deus, contra os miseráveis que escandalizam os pequenos, contra as autoridades que acabrunham o povo sob a carga de pesados fardos, sem aliviá-la sequer com o dedo. Foi tão forte quão doce; repreendeu, ameaçou, castigou, sabendo e nos ensinando que, muitas vezes, o temor é o começo da sabedoria, e que, às vezes, convém cortar um membro para salvar o corpo. Enfim, não anunciou para a sociedade futura o reinado de uma felicidade ideal, de onde o sofrimento fosse banido; mas, por lições e exemplos, traçou o caminho da felicidade possível na terra e da felicidade perfeita no Céu: a estrada real da cruz. Estes são ensinamentos que seria errado aplicar somente à vida individual em vista da salvação eterna; são ensinamentos eminentemente sociais, e nos mostram em Nosso Senhor Jesus Cristo outra coisa que não um humanitarismo sem consistência e sem autoridade" (82).

Amor ao próximo entre grandes e pequenos

"Os humildes, de seu lado, se alegrarão com a prosperidade das pessoas de posição mais elevada, e esperarão o seu apoio com confiança, como, numa mesma família, os mais jovens repousam sobre a proteção e a assistência dos mais velhos" (83).

O amor a si mesmo e à família é harmônico com o amor à pátria e ao gênero humano

A Igreja "é igualmente alheia a todos os extremos do erro como de quaisquer exageros de partidos ou sistemas que lhes sejam aderentes; atém-se sempre ao equilíbrio da verdade e da justiça; reivindica-o em teoria, aplica-o e promove-o na prática conciliando direitos e deveres de uns com os outros isto é, a autoridade com a liberdade, a dignidade do indivíduo com a do Estado, a personalidade humana do súdito com a representação divina no superior, e pois a devida dependência e o amor ordenado de si próprio, da família e da pátria, com o amor de outras famílias e de outros povos, fundado no amor de Deus, Pai de todos, primeiro princípio e último fim" (84).

A diversidade das classes não obsta à justiça e ao amor entre os homens

"... toda a economia das verdades religiosas, de que a Igreja é guarda e intérprete, é de natureza a aproximar e reconciliar os ricos e os pobres, lembrando às duas classes os seus deveres mútuos e, primeiro que todos os outros, os que derivam da justiça" (85).

Fraternidade cristã e hierarquia social

"Num povo digno de tal nome, todas as desigualdades que derivam, não do arbítrio, mas da própria natureza das coisas, desigualdades de cultura, de haveres, de posição social – sem prejuízo, bem entendido, da justiça e da caridade mútua – não são absolutamente um obstáculo à existência e ao predomínio de um autêntico espírito de comunidade e fraternidade. Pois, pelo contrário, longe de lesar de qualquer modo a igualdade civil, lhe conferem o seu significado legítimo, isto é, cada um, em face do Estado, tem o direito de viver honradamente a própria vida pessoal, no lugar e nas condições em que os desígnios e disposições da Providência o colocaram" (86).

As desigualdades individuais e sociais, fonte de beleza e harmonia

"A concórdia que se procura entre os povos deve ser promovida cada vez mais entre as classes sociais. Se isto não se verifica, podem em conseqüência resultar ódios e dissensões, como já estamos presenciando; daí nascerão perturbações, revoluções e por vezes massacres, bem como a diminuição progressiva da riqueza e as crises que afetam a economia pública e privada. Leão XIII, Nosso Predecessor, já observava com justeza: "Deus quis na comunidade humana uma diferença de classes, mas ao mesmo tempo certa equanimidade proveniente da colaboração amistosa" (Carta "Permoti Nos"). De fato, "assim como no corpo humano os diversos membros se ajustam entre si e determinam essas relações harmoniosas a que chamamos simetria, da mesma forma a natureza exige que na sociedade as classes se integrem umas às outras e por sua colaboração mútua realizem um justo equilíbrio. Cada uma delas tem necessidade da outra; o capital não existe sem o trabalho, nem o trabalho sem o capital. Sua harmonia produz a beleza e a ordem"(Leão XIII, Encíclica "Rerum Novarum"). Quem ousa, pois, negar a diversidade de classes sociais contradiz a ordem mesma da natureza. E também os que se opõem a esta colaboração amistosa e necessária entre as classes buscam, sem dúvida, perturbar e dividir a sociedade, para o maior dano do bem público e privado. De resto, eis o que afirmava Nosso Predecessor de imortal memória, Pio XII: "Num povo digno de tal nome, todas as desigualdades que derivam não do arbítrio, mas da própria natureza das coisas, desigualdades de cultura, de haveres, de posição social – sem prejuízo, bem entendido, da justiça e da caridade mútua – não são absolutamente um obstáculo à existência e ao predomínio de um autêntico espírito de comunidade e fraternidade" (Radio mensagem de Natal de 1944). É verdade que toda classe e toda categoria de cidadãos pode defender os próprios direitos, desde que o faça na legalidade e sem violência, no respeito dos direitos alheios, tão invioláveis quanto os seus. Todos são irmãos; é, pois, necessário que todas as questões se resolvam amigavelmente, com caridade fraterna e mútua" (87).

É numa desigualdade orgânica que floresce a fraternidade cristã

"... é preciso que vos sintais verdadeiramente irmãos. Não se trata de uma simples alegoria: sois verdadeiramente filhos de Deus e portanto verdadeiros irmãos.

Pois bem, os irmãos não nascem nem permanecem todos iguais: uns são fortes, outros débeis; uns inteligentes, outros incapazes; talvez algum seja anormal, e também pode acontecer que se torne indigno. É pois inevitável uma certa desigualdade material, intelectual, moral, numa mesma família. Porém, do mesmo modo que nada – nem as contingências, nem o uso do livre arbítrio – poderá destruir a paternidade e a maternidade, assim também deve manter-se intangível e operante, nos limites do justo e do possível, a fraternidade entre os filhos de um mesmo pai e de uma mesma mãe.

Aplicai isto à vossa paróquia, que Nós desejaríamos ver transformada numa verdadeira e grande família. Pretender a igualdade absoluta de todos seria o mesmo que pretender dar idênticas funções a membros diversos do mesmo organismo. Isto posto, é necessário tornar operante vossa fraternidade, porque somente se vos amardes uns aos outros, os homens reconhecerão que sois uma paróquia cristãmente renovada" (88).

As desigualdades são condição da organicidade social

"... do mesmo modo que a perfeita constituição do corpo humano resulta da união e do conjunto dos membros, que não têm as mesmas forças nem as mesmas funções, mas cuja feliz associação e concurso harmonioso dão a todo o organismo a sua beleza plástica, a sua força e a sua aptidão para prestar os serviços necessários, assim também, no seio da sociedade humana, acha-se uma variedade quase infinita de partes dessemelhantes. Se elas fossem todas iguais entre si, e livres cada uma por sua conta de agir a seu talante, nada seria mais disforme do que tal sociedade. Pelo contrário, se, por uma sábia hierarquia dos merecimentos, dos gostos, das aptidões, cada uma delas concorre para o bem geral, vedes erguer-se diante de vós a imagem de uma sociedade bem ordenada e conforme à natureza" (89).

A sociedade como um organismo vivo, ou como máquina sujeita ao Estado – Povo e massa

"O Estado não contém em si e não reúne mecanicamente num dado território uma aglomeração amorfa de indivíduos. Ele é, e na realidade deve ser, a unidade orgânica e organizadora de um verdadeiro povo.

Povo e multidão amorfa, ou, como se costuma dizer "massa", são dois conceitos diversos. O povo vive e se move por vida própria; a massa é de si inerte, e não pode ser movida senão por fora. O povo vive da plenitude da vida dos homens que o compõem, cada um dos quais – em seu próprio posto e a seu próprio modo – é uma pessoa consciente das próprias responsabilidades e das próprias convicções. A massa, ao invés, espera o impulso de fora, fácil joguete nas mãos de quem quer que desfrute seus instintos ou impressões, pronta a seguir, vez por vez, hoje esta, amanhã aquela bandeira. Da exuberância de vida de um verdadeiro povo a vida se difunde, abundante, rica, no Estado e em todos os seus órgãos, infundindo-lhes com vigor incessantemente renovado a consciência da própria responsabilidade, o verdadeiro senso do bem comum. Da força elementar da massa, habilmente manejada e utilizada, o Estado pode também servir-se: nas mãos ambiciosas de um só ou de vários que as tendências egoísticas tenham agrupado artificialmente, o mesmo Estado pode, com o apoio da massa, reduzida a não mais que uma simples máquina, impor seu arbítrio à parte melhor do verdadeiro povo: em conseqüência, o interesse comum fica gravemente e por largo tempo atingido e a ferida é bem freqüentemente de cura difícil" (90).

O amor ao próximo, tema cristão que o socialismo sabe explorar

"O comunismo manifestou-se no começo tal qual era em toda a sua perversidade, mas logo percebeu que assim afastava de si os povos; mudou então de tática, e procura ardilosamente atrair as multidões, ocultando os próprios intuitos atrás de idéias em si boas e atraentes.

Destarte, vendo o desejo comum de paz, os chefes do comunismo fingem ser os mais zelosos fautores e propagandistas do movimento pela paz mundial; mas ao mesmo tempo excitam os homens para a luta de classes, que faz correr rios de sangue, e, pressentindo falta de garantia interna de paz, recorrem a armamentos sem limites. Assim, sob denominações várias, que nem sequer fazem alusão ao comunismo, fundam associações e periódicos que, na verdade, servem só para fazer penetrar suas idéias em meios que de outra forma lhes seriam menos acessíveis; procuram até infiltrar-se insidiosamente em associações católicas e religiosas. Assim, em alguns lugares, mantendo-se firmes em seus perversos princípios, convidam os católicos a colaborar com eles no chamado campo humanitário e caritativo, propondo por vezes coisas em tudo até conformes ao espírito cristão e à doutrina da Igreja. Em outras partes, sua hipocrisia vai ao ponto de fazer acreditar que o comunismo, em países de maior fé ou de maior cultura, tomará feição mais branda, não impedirá o culto religioso e respeitará a liberdade de consciência. Mais. Alguns há que, referindo-se a certas mudanças introduzidas recentemente na legislação soviética, daí concluem que o comunismo está prestes a abandonar o seu programa de luta contra Deus.

Velai, Veneráveis Irmãos, por que se não deixem iludir os fiéis. Intrinsecamente mau é o comunismo, e não se pode admitir, em campo algum, a colaboração recíproca, por parte de quem quer que pretenda salvar a civilização cristã" (91).

Estas palavras de Pio XI foram escritas a respeito do comunismo. A experiência mostra que o socialismo, a seu modo embora, também procede assim.

O zelo do católico pelo preceito do amor ao próximo não o pode levar ao socialismo

"Socialismo religioso, socialismo católico são termos contraditórios: ninguém pode ser ao mesmo tempo bom católico e verdadeiro socialista" (92).

O católico deve reagir contra a socialização

"Se os sinais dos tempos não enganam, na segunda fase das controvérsias sociais, em que já entramos, têm precedência (com relação à questão operária, que dominou a primeira fase) outras questões e problemas. Citemos aqui dois deles:

A superação da luta de classes por uma recíproca e orgânica ordenação entre o empregador e o empregado. Pois a luta de classes nunca poderá ser um objetivo da ética social católica. A Igreja sabe que é sempre responsável por todas as classes e camadas do povo.

Ademais, a proteção do indivíduo e da família, frente à corrente que ameaça arrastar a uma socialização total, em cujo fim se tornaria pavorosa realidade a imagem terrificante do "Leviatan". A Igreja travará esta luta até o extremo, pois aqui se trata de valores supremos: a dignidade do homem e a salvação da alma" (93).

Lamentável desvio de certos católicos

"Atribuindo a todo o povo a tarefa própria, se bem que parcial, de ordenar a economia futura, estamos muito longe de admitir que esse encargo deva ser confiado ao Estado como tal. Entretanto, ao observar o andamento de certos congressos, mesmo católicos, em matérias econômicas e sociais, pode-se notar uma tendência sempre crescente para invocar a intervenção do Estado, de modo que se tem por vezes como que a impressão de que esse é o único expediente imaginável. Ora, sem dúvida alguma, segundo a doutrina social da Igreja, o Estado tem seu papel próprio na ordenação da vida social. Para desempenhar esse papel, deve mesmo ser forte e ter autoridade. Mas os que o invocam continuamente e lançam sobre ele toda a responsabilidade o conduzem à ruína e fazem mesmo o jogo de certos poderosos grupos interessados. A conclusão é que dessa forma toda responsabilidade pessoal nas coisas públicas vem a cessar, e que se alguém fala dos deveres ou das negligências do Estado, refere-se aos deveres ou faltas de grupos anônimos, entre os quais, naturalmente, não cogita de contar-se a si próprio" (94).

Caráter laicista do socialismo

"... o socialismo, ignorando por completo ou desprezando este fim sublime dos indivíduos e da sociedade, opina que o consórcio humano foi instituído só pela vantagem material que oferece" (95).

Sem Deus, o convívio humano decai e se degrada

"... porque muitos desprezam e repelem completamente a autoridade suprema e eterna de Deus – que ordena ou que proíbe – a consciência do dever cristão tem, em conseqüência, enfraquecido, a fé definha nas almas ou completamente se extingue; e daí resulta que as próprias bases do consórcio humano se deslocam e arruinam miseravelmente" (96).


Notas:

(77) Marc. 12,31.

(78) Lc. 10, 29-37.

(79) Cfr. São Tomás de Aquino, Suma Teológica, IIa. IIae., q. 26.

(80) Cfr. Comentário à Proposição 1.

(81) Cfr. Textos Pontifícios desta Proposição.

(82) São Pio X, Carta Apostólica "Notre Charge Apostolique", de 25 de agosto de 1910 – "Editora Vozes Ltda.", Petrópolis, págs. 25 e 26.

(83) Bento XV, Encíclica "Ad Beatissimi", de 1º de novembro de 1914 – "Les Enseignements Pontificaux – La Paix intérieure des Nations – par les moines de Solesmes" – Desclée & Cie., pág. 288.

(84) Pio XI, Encíclica "Divini Redemptoris", de 19 de março de 1937 – "Editora Vozes Ltda.", Petrópolis, pág. 18.

(85) Leão XIII, Encíclica "Rerum Novarum", de 15 de maio de 1891 – "Editora Vozes Ltda.", Petrópolis, págs. 14 e 15.

(86) Pio XII, Radiomensagem de Natal de 1944 – "Discorsi e Radiomessaggi", vol. VI, págs. 239-240.

(87) João XXIII, Encíclica "Ad Petri Cathedram", de 29 de junho de 1959 – AAS, vol. LI, n. 10, págs. 505-506.

(88) Pio XII, Discurso de 4 de junho de 1953, a um grupo de fiéis da Paróquia da Marsciano, Perusa – "Discorsi e Radiomessaggi", vol. XV, pág. 195.

(89) Leão XIII, Encíclica "Humanum Genus", de 20 de abril de 1884 – "Editora Vozes Ltda.", Petrópolis, pág. 20.

(90) Pio XII, Radiomensagem de Natal de 1944 – "Discorsi e Radiomessaggi", vol. VI, págs. 238-239.

(91) Pio XI, Encíclica "Divini Redemptoris", de 19 de março de 1937 – Editora Vozes Ltda.", Petrópolis, págs. 29-30.

(92) Pio XI, Encíclica "Quadragesimo Anno", de 15 de maio de 1931 – "Editora Vozes Ltda., Petrópolis, pág. 44.

(93) Pio XII, Radiomensagem ao "Katholikentag" de Viena, de 14 de setembro de 1952 – "Discorsi e Radiomessaggi", vol. XIV, pág. 314.

(94) Pio XII, Discurso de 7 de março de 1957 ao VII Congresso da União Cristã dos Chefes de Empresas e Dirigentes da Itália – UCID – "Discorsi e Radiomessaggi", n. XIX, pág. 30.

(95) Pio XI, Encíclica "Quadragesimo Anno", de 15 de maio de 1931 – "Editora Vozes Ltda.", Petrópolis, pág. 43.

(96) Pio XI, Encíclica "Ingravescentibus Malis", de 29 de setembro de 1937 – "Editora Vozes Ltda.", Petrópolis, pág. 4.


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