1. Semelhanças da ação do progressismo no Chile e no Brasil
Todos esses fatos prepararam caminho para se abordar
no Brasil, sob outros prismas, a denúncia que estava pegando fogo no Chile [152].
Em 1976 publiquei o livro
A Igreja ante a escalada
da ameaça comunista — Apelo aos Bispos silenciosos.
Esse trabalho eu o quis publicar como estudo
introdutório a uma condensação de La Iglesia del Silencio en Chile
- La TFP proclama la verdad
entera.
Existia entre ambos os trabalhos íntima afinidade.
Tal afinidade resultava da semelhança de situações entre o Brasil e o
Chile no que concerne à atuação da Hierarquia eclesiástica.
Lá, ainda mais claramente do que aqui, a maior parte
do Episcopado (e não apenas setores dele, como no Brasil) trabalhou pela
comunistização do país, como provava com abundância de documentos o
referido livro chileno [153].
2. Dom Casáldaliga e a Regional Sul II da CNBB
O meu objetivo era fazer com que o perigo comunista,
enquanto imbricado dentro da Igreja Católica, aparecesse com clareza maior
do que nunca para a população.
Eu notava que os católicos brasileiros tinham a noção
de que essa infiltração existia. Mas faltava a eles uma explanação
sistematizada que mostrasse como essa infiltração havia nascido, como
estava estruturada e que possibilidades de desenvolvimento ainda possuía.
Era também necessário demonstrar que ela não constituía apenas um fato
isolado, mas era um perigo em marcha. Sobre tudo isto as pessoas possuíam
uma ideia muito confusa [154].
* *
*
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“Yo me siento con esta ropa de guerrillero, como me
podría sentir revestido de sacerdote”, declara Mons.
Pedro Casaldáliga, Bispo de São Félix de Araguaia, Brasil,
em meio a aplausos e gritos frenéticos em evento na PUC de
São Paulo no anos 80 [Para
mais detalhes ver aqui] |
Dei a esse meu trabalho um caráter de análise
marcadamente doutrinária das posições então assumidas pela Hierarquia
eclesiástica no Brasil, em favor do comunismo. Por exemplo, a pregação
claramente pró-comunista de Dom Pedro Casaldáliga, Bispo de São Félix do
Araguaia* [155].
* Dr. Plinio
focalizava de modo especial as poesias de Dom Casaldáliga. Nessas poesias,
o trêfego Prelado de São Félix do Araguaia lançava maldições e imprecações
contra a propriedade e os proprietários: “Malditas sejam todas as
cercas! Malditas todas as propriedades privadas”; chamava os
proprietários de “mal-nascidos”, “prostitutos presunçosos da Mãe
comum”, “gordos [...] como porcos cevados” (cfr. “Tierra
Nuestra, Libertad”, Editorial Guadalupe, Buenos Aires, novembro de
1974).
Em outro livro de
poemas, ele se vangloriava: “Monsenhor ‘martelo e foice’? Chamar-me-ão
subversivo. E lhes direi: eu o sou. [...] Tenho fé de guerrilheiro
e amor de Revolução . [...] Incito à subversão, contra o Poder e o
Dinheiro . [...] Creio na Internacional [...] E chamo à
Ordem de mal, e ao Progresso de mentira. Tenho menos paz
que ira” (cfr. “Canción de la hoz y el haz”, págs.
117 e 118).
Em sua
autobiografia, Dom Casaldáliga afirma: “Quanto a mim, a vida diária à
luz da Fé, o cotidiano e crescente contato com os pobres e oprimidos —
pelo imperativo da Caridade — me levaram à compreensão da dialética
marxista e a uma metanóia política total”. Diz ainda em outro
trecho: "O povo-povo — não os mandarins, não os reverendos, nem as
damas, nem as famílias de posição, nem os donos — ganhou com Fidel ou com
Allende ou com Mao", completando logo depois: "Procurando ser
cristão, sei que posso e devo ir mais longe que o comunismo" (“Yo
creo en la justicia y en la esperanza!”, Editorial Española
Desclée de Brouwer, Bilbao, 1976, p. 188 — o destaque é nosso).
A pergunta que eu levantava era: como pôde um clérigo
portador de tais opiniões e capaz de tais atitudes chegar a Bispo da
Igreja de Deus?
Ainda mais que o Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, ao
chegar de Roma, declarou ter ouvido de Paulo VI, a propósito de fatos do
Araguaia, a seguinte frase: “Mexer com Dom Pedro Casaldáliga, Bispo de
S. Félix, seria mexer com o próprio Papa” (cfr. O São Paulo, 10
a 16/1/76).
Ademais, como reagia a Conferência Nacional dos
Bispos do Brasil diante desta escandalosa explosão do espírito subversivo
na pena de um Bispo católico? Vendo-se tão claramente infiltrada pela
subversão, como se defendia a Hierarquia eclesiástica brasileira?
Resposta incômoda de dar... [156]
* *
*
Aliás, não só Dom Casaldáliga era posto em xeque por
meu livro [157].
O mesmo livro transcrevia o documento em que a
Regional Sul II da CNBB, constituída por Bispos paranaenses, já antevia a
tomada do Brasil pelos comunistas, e recomendava a seus colegas a
capitulação e até a colaboração com o invasor* [158].
* Este
pronunciamento da Regional Sul II da CNBB, composta por dois Arcebispos e
dezessete Bispos do Estado do Paraná, publicada no semanário católico Voz do Paraná, de Curitiba (n° de 25 de abril a 1° de maio de 1976)
sob o título A Igreja do Vietnã está disposta a sobreviver, trazia
um longo histórico da implantação do comunismo no Vietnã, apresentando-a
sob o prisma simpático de “libertação” do povo vietnamita. A matéria
citava elogiosamente um comunicado do “Arcebispo de Ho Chi Minh” de
sentido totalmente colaboracionista em relação ao comunismo (artigo
O
Arcebispo de Ho Chi Minh, Folha de S. Paulo, 9 de outubro de
1977).
Paralelamente a essa triste evolução do Episcopado, o
livro mostrava também a luta travada pelo grupo de católicos fiéis que se
reuniu inicialmente em torno do Legionário, depois de Catolicismo [159].
Era o histórico da grande crise religiosa em que se debatia o Brasil, e
constituía de algum modo o histórico da TFP brasileira [160].
E, embora teoricamente falando o elemento mais
importante fosse o chileno (era, aliás, o que ocupava maior número de
páginas), a parte que se referia ao Brasil naturalmente interessava mais
ao leitor brasileiro [161].
3. Aos Bispos silenciosos: falai!
Ademais de doutrinário, debaixo de certo ponto de
vista era um estudo mais histórico do que de outra natureza [162].
E nele formulei um apelo veemente aos “Bispos silenciosos” [163].
Por que os Bispos silenciosos?
O quadro da situação eclesiástica no Brasil se
apresentava da seguinte maneira.
Havia, de um lado, Bispos declaradamente simpáticos
ao socialismo e ao comunismo. De outro lado, notávamos um grande número
dos outros Bispos, quietos, olhando para essa realidade com olhar de
vidro, como que não vendo nada [164].
Constituíam estes últimos a “maioria silenciosa”
do Episcopado, que parecia habitualmente conservadora, mas julgava que
podia dispensar um estudo próprio para emitir seu julgamento.
Nas Assembléias da CNBB votava ela com a minoria
esquerdista, aceitando uma argumentação que não se deu o trabalho de
examinar a fundo.
Tal atitude, interpretada pelo grande público como
expressão de alheamento às coisas temporais, ia desconcertando sempre mais [165].
Que falassem! Eram eles numerosos e dispunham de
prestígio suficiente para salvar o Brasil, se simplesmente dessem ampla
difusão entre os fiéis aos numerosos documentos pontifícios sobre o
assunto [166].
Fiz portanto a esses Srs. Bispos uma apóstrofe:
—
Vede, há uma escalada do comunismo. O vosso silêncio favorece essa
escalada. Neutros não podeis ficar [167].
Se há “tempus tacendi”, há também “tempus loquendi”: há
tempos em que convém calar, mas há tempos em que convém falar (Ecle. 3,
7).
Atuem. Nós lho imploramos. Falem, ensinem, lutem. O
anjo protetor de nossa Pátria os espera para os confortar ao longo dos
prélios [168].
* *
*
Eu mandei o nosso livro a todos os “Bispos
silenciosos", e alguns até me responderam favoravelmente. Mas julguei de
especial interesse a carta que Dom José Newton de Almeida [169],
Arcebispo de Brasília me escreveu.
Lembro-me de que, nessa carta, uma das coisas que ele
me dizia era: "Dr. Plinio, seu livro é terrível!"*
* O Prelado
demonstrava na missiva acentuado mal-estar: "Recebi seu livro 'A Igreja
ante a escalada da ameaça comunista', acompanhado de carta, ao mesmo tempo
oferecimento e indisfarçável desafio. É convite para que eu entre de
público numa porfia de imensa gravidade, que deve levar mais bem à oração
e a uma atitude de prudência de absoluta fidelidade aos princípios. Há
calar e calar. Não tenho sido um silencioso em meio à atual agitação de
que resultam fatos por demais dolorosos, como o caso Lefebvre de um lado,
e o de Dom Adriano Hipólito, de outro. O que me preocupa é realmente
calar, a menos que a fala venha a ser melhor que o silêncio".
Em seguida ele
afirma que lhe causou dor, não os fatos que ele já conhecia, mas a
denúncia desses fatos de público, por lançar a dúvida a respeito da
conduta dos Bispos que não combatiam: "Li o livro. Confesso que me
impressionou e me causou dor e tristeza, não porque me trouxesse
novidades, mas pelo mal que está a causar difundido largamente entre uma
maioria que não sabe discernir. Longe de produzir efeito contra o que
combate ─ a gente fica sem saber se o ataque é contra o comunismo, ou
contra a Igreja ─ leva a dúvida, a incerteza, a uma reação lógica dos
contrários, mesmo porque os extremos se tocam".
E, sem levar em
conta o clamoroso da denúncia feita, de um Episcopado inteiro como o do
Chile se empenhar a fundo na manutenção do regime comunista em seu país, e
de uma infiltração comunista no Brasil cujos paroxismos encontrava em Dom
Casaldáliga o seu polo mais radical, comenta: "Ao combater o comunismo
desse jeito cai-se no extremo oposto do liberalismo, e condena-se o que na
intenção se quisera exaltar. Seu livro coloca 'propter intentionem', assim
quero crer, a Igreja, o Papa, os Bispos, no banco dos réus e julga sem
cerimônia".
Dom José Newton foi
assim desenvolvendo o seu pensamento, até aquela afirmação algo patética:
"Dr. Plinio, seu livro é terrível! Contribui para que nossa gente,
nosso bom povo, perca o amor e a confiança na Igreja. O livro
perturba e divide" (carta de outubro de 1976
- cfr. SD 19/10/76).
Dom José Newton representava bem, dentro do
Episcopado, a parte direitista do centro. E neste sentido, a carta dele
tinha certo interesse, pois, além de ele reconhecer a importância do tema
levantado por meu livro, mostrava até que ponto certas áreas silenciosas
ficaram incomodadas com ele [170].
4. Das ruas de São Paulo até às “mesas do Vaticano”
|
Campanha pública de difusão de "A Igreja ante a escalada
da ameaça comunista" |
O livro produziu muito impacto, circulando no país
inteiro [171].
Teve uma difusão realmente esplêndida [172].
Tamanho foi o impacto, que o Sr. Rocco Morabito, correspondente de O
Estado de S. Paulo em Roma, testemunhou que o livro podia ser visto
nas mesas de trabalho do Vaticano* [173].
* Este jornalista
relatou: “Em várias épocas era possível encontrar, em mesas de trabalho
do Vaticano, algumas cópias do livro de Plinio Corrêa de Oliveira — A
Igreja ante a escalada da ameaça comunista —, editado em São Paulo, e que
contém justamente longas citações de escritos e poesias de dom Pedro”
(O Estado de S. Paulo, 8/4/77).
Do livro,
escoaram-se quatro edições, num total de 51 mil exemplares, vendidos em
1700 cidades de 24 Unidades da Federação.
Não tenho dúvida nenhuma de que o livro se tornou um
espinho atravessado na garganta da esquerda* [174].
* A contraprova
disso foi a particular repercussão provocada nos meios eclesiásticos, a
ponto de dar ocasião a vários comunicados de protesto (não de refutação,
note-se bem).
O primeiro deles
(de 29/7/76) foi do Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns, junto com seus oito
Bispos Auxiliares. O Osservatore Romano, edição em português,
reproduziu esse comunicado.
O segundo vinha
assinado por todos os demais Bispos da Província Eclesiástica de São
Paulo (de 30/9/76).
Análogos
pronunciamentos foram os de Dom Ivo Lorscheiter, Bispo de Santa Maria (em
11/8/76), em nome próprio. Depois como secretário geral da CNBB (em
13/8/76).
Aquelas autoridades
eclesiásticas não apresentaram qualquer refutação, nem no terreno dos
fatos nem no da doutrina.
Limitavam-se a
manifestar seu desacordo em termos vagos, não raras vezes amargurados. O
que contrastava com o relacionamento descontraído e "ecumênico" por elas
entabulado com as mais variadas seitas religiosas e correntes
sócio-econômicas (cfr.
A TFP, perseguidora de Prelados católicos?,
Catolicismo n° 338, fevereiro de 1979).
- Toda esta controvérsia pode ser
consultada em Catolicismo n° 309, setembro de 1976, e no site
www.pliniocorreadeoliveira.info.
* *
*
Em Recife, segundo foi noticiado pela imprensa
diária, a Cúria Metropolitana publicou no Boletim Arquidiocesano uma nota
sobre a campanha que a TFP então fazia em vias públicas daquela capital.
Em síntese, a nota acusava a TFP ou sua campanha:
1) De estar assumindo “atitude contestadora da
atual renovação da Igreja”;
2) De haverem sido as “posições e atitudes” da
TFP “suficientemente desautorizadas pela CNBB”, bem como “reprovadas e condenadas por bom número de membros do Episcopado
brasileiro, como aconteceu, recentemente, em pronunciamento do Episcopado
paulista”;
3) De falar a TFP “em nome da Igreja” sem ter
direito para tal [175].
Em vista dessas acusações, ditei um comunicado
redargüindo a nota da Cúria de Recife*.
* Este comunicado
foi publicado no Diário de Pernambuco e no Jornal do Commércio,
ambos de Recife, no dia 17/8/76. Transcrevemos aqui seus principais
tópicos:
|
Manifesto
publicado no "Diário de Pernambuco" de 17 de agosto de 1976 [clique
na foto para vê-lo inteiro] |
“A nota da Cúria
Metropolitana de Recife, vazada aliás em lamentável português, é
absolutamente esquiva quanto ao ponto essencial da matéria por ela
tratada. [Pois] esquiva-se cautelosamente de emitir qualquer juízo
sobre o livro, e faz apenas ataques vagos à campanha. Essa omissão tira à
nota qualquer seriedade. E confere à TFP o direito de pedir à Cúria
Metropolitana que declare, do modo mais explícito, se no livro encontra
algo de reprovável. Caso encontre, por que não o diz? Caso não encontre,
por que ataca a campanha?
“Muito
especialmente, esta Sociedade pergunta à Cúria Metropolitana se considera
conforme ao ensinamento da Igreja e à ‘atual renovação’ desta, a doutrina
contida tanto no livro ‘Yo creo en la justicia y en la esperanza!’, quanto
nas poesias do Bispo Dom Pedro Casaldáliga, qualificada de subversiva no
livro difundido pela TFP.
“A mesma
pergunta faz a TFP com relação ao documento da Regional Sul II da CNBB [...], documento esse igualmente qualificado de subversivo por aquele
livro.
“Quanto a
atitudes da CNBB desautorando a TFP, queira a Cúria Metropolitana declarar
quais foram e quando ocorreram. A TFP dirá em seguida o que tem a informar
sobre o assunto.
“Sobre o
‘pronunciamento do Episcopado paulista’, [...] versou este sobre o
mesmo livro ora difundido no Recife pela TFP. Em resposta, esta Sociedade
perguntou pela imprensa ao Emmo. Cardeal-Arcebispo e aos Srs.
Bispos-Auxiliares paulistanos se consideram irrepreensíveis do ponto de
vista da doutrina católica as poesias e as reflexões de Dom Pedro
Casaldáliga [e] os textos do pronunciamento da Regional Sul II da
CNBB, citados no mesmo livro.
“As incômodas
perguntas [...] ficaram sem resposta. Sabia disto a Cúria
Metropolitana de Olinda e Recife? Se o sabia, por que não o mencionou em
seu comunicado? Se não o sabia, aqui está a informação. Faça a Cúria
Metropolitana uso dela, explicando ao público recifense por que motivo
ficaram em silêncio os Prelado paulistanos.
“‘Falar em nome
da Igreja’ é falar como autoridade investida por Nosso Senhor Jesus Cristo
ou pelo Direito Canônico, dos poderes necessários para tal. Queira a Cúria
Metropolitana informar em que página do mencionado livro a TFP se arroga
indebitamente de assim proceder. Se nada encontrar no livro que justifique
tal acusação, queira a Cúria Metropolitana retratá-la, cumprindo assim um
elementar dever de justiça.
“A TFP se
permite dirigir, por cima da Cúria Metropolitana, essas reflexões e
perguntas ao Sr. Arcebispo Dom Helder Câmara. Com efeito, o envolvimento
do Prelado em problemas como os tratados em nosso livro tem sido tão
freqüente, que a própria temática deste comunicado está a pedir um
pronunciamento pessoal dele.
“A TFP redigiu o
presente texto, inspirada pelo preceito do Evangelho: ‘Seja a vossa
linguagem: sim, sim; não, não’ (S. Mateus 5, 37). E não pede em resposta
senão a clareza do sim e do não”.
NOTAS
Índice da "Parte X"
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