Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Artigos na

 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

Folha de S. Paulo, 9 de janeiro de 1972

"Revolução comunista invisível"

Prometi aos leitores um comentário das palavras do Gal. Humberto de Souza Mello, Comandante do II Exército, proferidas em homenagem à Marinha de Guerra, na Semana de Tamandaré.

Agora que, com o texto em mãos, me preparo para cumprir a promessa, hesito em escolher os tópicos que mais convidam à análise: o elogio sóbrio e vigoroso de Tamandaré, o enaltecimento comovido da missão e dos feitos da Marinha, ou a caracterização de um adversário perigoso que, no momento, ameaça nossa Pátria. Mas o critério para a opção facilmente me vem ao espírito. Ser-me-ia mais atraente e distensivo tratar do primeiro ou do segundo tema. Porém, mais importante para a formação da opinião pública é o terceiro. Assim, devo optar por ele.

O Gal. Souza Mello indica seu ponto de mira com uma linguagem concisa e elegante, e de uma coragem toda militar: é "o adversário solerte, covarde, e inconseqüente do comunismo", movido por "interesses espúrios e contrários ao nosso sistema de vida" e "fáceis de descobrir".

Entretanto, não imagine o leitor que o General tratará do perigo comunista em termos convencionais.

E tem razão. Com efeito, se os interesses do comunismo são sempre claros, os seus manejos são cada vez mais obscuros, e isto por uma imperiosa necessidade tática. Outrora, o comunismo se caracterizava pela brutalidade tanto na pregação ideológica desabrida como na ação revolucionária violenta. Mas os resultados práticos desta brutalidade são pífios. Mais de cem anos já lá vão, desde que Marx se atirou à luta. E, até o momento presente, o comunismo não conseguiu maioria eleitoral em nenhum país, nem aquém nem além da cortina de ferro. Digo nenhum, porque o Chile não constitui exceção. Demonstrei em artigo publicado neste mesmo jornal ("Toda a verdade sobre as eleições no Chile", em 10-9-70) que naquele país irmão foi à Democracia-Cristã que Allende deveu sua vitória. A votação marxista até decaíra no pleito que levou o Senador comunista ao poder.

Assim, do ponto de vista da conquista das massas, o comunismo se encontra diante de um estrondoso insucesso. Demonstra-o muito bem recente estudo da revista "Est-Ouest", que desejo comentar no próximo domingo, como prolongamento do presente artigo. Antecipo simplesmente que a conhecida revista prova, com dados estatísticos irrecusáveis, que os PCs estão em retrocesso em toda a Europa. Nos últimos dias, as agências telegráficas publicaram uma notícia que se acrescenta à demonstração de "Est-Ouest" como um dado novo: o comunismo acaba de ser derrotado também na Finlândia.

Deve-se, pois, rejeitar a impressão mítica de que o comunismo possui uma verdadeira capacidade de atração sobre as massas.

Não se pode, entretanto, negar que ele dispõe de técnicos de primeira ordem na manipulação psicológica das multidões. Diante desse insucesso, tais técnicos procurariam forçosamente meios novos.

O que está acontecendo seria, pois, inevitável. O comunismo, sem de nenhum modo renunciar à doutrinação e à ação violentas, que constituem a subversão clássica, organizou paralelamente um estilo de luta inteiramente novo. É para ele que o General Souza Mello volta sua atenção.

* * *

O Comandante do II Exército descreve este novo tipo de ação, com rara lucidez:

1 - Importa ele em uma ação "solerte (...) na utilização dos nossos meios de difusão: jornais, revistas, cinema, teatro, rádio e televisão; ou ainda através das artes e da literatura das coleções populares de grandes escritores socialistas". Como vê o leitor, trata-se de uma propaganda feita com ardil, pelo largo uso de meios tons, de afirmações apenas discreta e implicitamente comunistas, pela difusão de doutrinas ou programas para-comunistas, capazes de evoluir, aos poucos, para posições pré-comunistas e, por fim, comunistas. "Tudo isso representa contribuição decisiva para alcançar profundamente a vida das populações dos centros urbanos e áreas rurais, principalmente a juventude universitária, operária e camponesa", pondera o General. E com razão. Pois todas essas áreas da opinião, que até aqui se têm mostrado pouco sensíveis às técnicas clássicas do comunismo desabrido, podem ir sendo impregnadas aos poucos de espírito comunista, por esse processo mais sutil;

2 - O General se refere também a um reformismo tumultuoso e inconsiderado, que visa impulsionar "a transformação das estruturas sociais de forma acelerada, sem atender ao equilíbrio interior, que requer, através de algumas gerações, necessária adaptação psicológica e ajustes em termos econômicos, para suportar as mudanças influentes na sociedade de hoje". Esta observação — com dor o digo enquanto católico — me parece especialmente merecida pelos Hélderes e Comblins, bem conhecidos por seu programa truculento e açodadamente reformista;

3 - Por fim, outro ponto importante. É o "vislumbramento do alcoolismo, do sexualismo despudorado e do aumento do uso de tóxicos, que arrastam à dissolução coletiva pelo desencadeamento de instintos perigosos e inconscientes, e destroem as tradições nos mais elevados padrões morais, espirituais e religiosos". Esta observação relaciona argutamente com os métodos comunistas atuais, todo o imenso processo de deterioração moral, religiosa e cultural, que vai devastando sempre mais nossa juventude. Tanto tenho escrito aqui sobre vários aspectos desse fenômeno, que me parece desnecessário insistir a respeito.

Em conseqüência, passo desde logo à conclusão. Ela me parece de suma importância: o conjunto das atividades enumeradas pelo Comandante do II Exército constitui, segundo ele, "a revolução comunista invisível, tão importante, ou talvez mais, do que a pregada por Fidel Castro, recentemente (...)". Esse mesmo Fidel Castro que se dirige às multidões "indicando o caminho da violência como a solução única à tomada do poder na América Latina, apesar de considerar muito boas as condições que possibilitam a revolução socialista pelo domínio comunista".

* * *

O General Souza Mello dispõe de uma grande autoridade pessoal e funcional para emitir esses conceitos. Foram eles externados em uma comemoração essencialmente militar, mas creio que merecem chegar ao conhecimento de toda a população civil do País.

Apesar do efeito pacificador inerente aos êxitos econômicos tão brilhantes que o Brasil vem alcançando, apesar do declínio da subversão violenta, o País se encontra em pleno impacto da revolução comunista invisível. Uma revolução de métodos moderníssimos, a um tempo agressivos e sutis, impalpáveis e penetrantes, aliciantes e perigosos, que tentam envolver o País em uma atmosfera própria a intoxicá-lo imperceptivelmente e profundamente de comunismo.

"A revolução comunista invisível, tão importante, ou talvez mais, do que a pregada por Fidel Castro", é a meu ver, o grande perigo do momento.

* * *

Dirigindo-se em nome do II Exército à Marinha de Guerra, o General exclama, em conseqüência: "Cabe-nos, pois, vigiar e reagir seja contra aquela solerte e invisível penetração, através [de] bem elaborada campanha psicológica no lar, na escola, nas artes, nas instituições culturais e nas diversões públicas, seja contra a sua expansão no combate contínuo e violento aos diferentes tipos e formas de luta aconselhados pelos dirigentes comunistas e executados pelas organizações do partido".

É óbvio que no cumprimento dessa nobre missão de lutar contra a "revolução comunista invisível", o elemento civil tem uma parcela de responsabilidade muito grande. Parece-me que a análise feita pelo General Souza Mello torna bem claro que nenhum brasileiro pode assistir de braços cruzados a esse drama, que é o envolvimento de sua própria Pátria por essa terrível névoa ideológica. No lar, na escola, na universidade, nos locais de trabalho, nos ambientes de lazer, nos recintos religiosos, toca a cada um de nós a tarefa da vigilância e da resistência proporcionadas à magnitude do perigo.

E é por isto que não quis deixar de utilizar esta coluna para um apelo a que os leitores tomem na mais alta conta as palavras do Comandante do II Exército, e as adotem como um programa de ação.

* * *

O fecho das palavras do General Souza Mello é animador. Proclama ele, com justificada ufania: "Está (o II Exército) preparado, adestrado e vem se empenhando juntamente com os demais Comandos e Órgãos de Segurança, na defesa das instituições brasileiras e da tranqüilidade das populações ordeiras em sua área de jurisdição, com fé e esperança na verdade que se fundamenta no amor e paz de Jesus Cristo, sacrificado no Calvário".

Essa garantia de vigilância e dedicação do setor militar, dada com os olhos postos no Homem-Deus, repercute suavemente nos espíritos, nestes dias marcados ainda pela doce unção do Santo Natal.


Home