Plinio Corrêa de Oliveira

 

Nobreza e elites tradicionais análogas nas alocuções de Pio XII ao Patriciado e à Nobreza romana

 

Apêndice à edição Norte-Americana

Setembro de 1993

 

ESTADOS UNIDOS: NAÇÃO ARISTOCRÁTICA NUM ESTADO DEMOCRÁTICO

 

 

Capítulo III

 

O SENTIMENTALISMO COMO EXPLICAÇÃO PARA UMA MENTALIDADE IGUALITÁRIA

 

1. Uma compaixão mal entendida

Existe em não poucos norte-americanos uma aversão às desigualdades sociais e econômicas, a qual provém, não tanto de convicções filosóficas, como de uma disposição temperamental, em cujo cerne encontra-se um sentimento de mal entendida compaixão.

Este sentimento faz com que a pessoa tenha a idéia de que as desigualdades, especialmente as de caráter social e econômico, são causa de sofrimento para os que têm menos.

Segundo esta falsa percepção, uma pessoa, mesmo possuindo o suficiente para levar uma vida sem privações, se sente diminuída e menosprezada pelo fato de outros terem mais do que ela. E isto a faz sofrer.

Mais ainda. Esta percepção também leva a supor que, mesmo pessoas ricas, se sentem diminuídas e sofrem pelo simples fato de haver outras ainda mais ricas que elas. No fundo, se encontra aí, silenciosa mas atuante, o que se poderia talvez chamar uma filosofia da inveja.

Esta atitude resulta de uma interpretação errada da verdadeira compaixão cristã diante das desigualdades sócio-econômicas.

A compaixão cristã não obriga a ter pena de quem tem o necessário para viver, como convém segundo sua condição social. Ela simplesmente leva ao desejo de socorrer aqueles que não têm o que é proporcionado a uma vida digna, segundo as necessidades da natureza humana e próprias à condição de cada um. Assim, não há razão alguma para alguém envergonhar-se simplesmente por se apresentar como mais rico e de melhor condição social que outros. O fato de ter menos não faz o homem reto sofrer, mas deve levá-lo a um espírito admirativo, contente por ver que outros têm mais que ele.

Esta idéia errada a respeito da compaixão afeta os membros das elites tradicionais de um modo curioso. Julgam eles ser seu dever não ostentar sua alta condição, sua educação, seu brilho. Crêem assim cumprir um dever cristão, ao evitar que outros sofram diante da evidência de sua condição inferior.

Porém, as classes mais altas têm obrigação de brilhar aos olhos das classes mais baixas. E estas têm o direito de contemplar o brilho das classes mais altas e de enlevar-se com ele.

Com efeito, a condição das classes mais altas deve servir de estímulo a que os membros das classes baixas melhorem as condições de sua própria classe. E que um ou outro membro desta última, provido de dotes excepcionais, deseje legitimamente ascender a uma condição mais alta. Tal desejo não se deve confundir com uma vil "cobiça dos bens alheios", proibida pelo décimo mandamento do decálogo.

Esta cobiça ocorre quando alguém sente pesar em que outrem seja ou tenha mais do que ele, ou que o leve ao ódio de seu próximo e ao censurável anseio de lhe subtrair o que lhe pertence, e locupletar-se com isso.

Ora, todos os sentimentos vis não podem confundir-se com um nobre desejo de, admirativamente, adquirir para si, com um esforço aplicado e inteligente, uma situação que vê reluzir em outro, ou até excedê-la.

Não se pode negar também que em certas situações é compreensível alguém afastar-se do olhar público. Se as classes altas sabem que o brilho de sua vida social vai ser mal interpretado e manipulado maliciosamente contra elas, cabe-lhes o direito de manter a discrição que julgarem adequada.

2. Filantropismo liberal, reformista e igualitário

Movidas pela falsa compaixão de que falamos, muitas pessoas ricas julgam que sua própria felicidade não será completa, se houver outras que sofrem por não possuir tanto quanto elas.

Esta atitude as leva inicialmente a um sentimentalismo filantrópico, a sentir um bem estar em ajudar materialmente não só aos realmente pobres, mas a todos os menos favorecidos que elas. Para afiançar sua própria felicidade, tornam-se filantropas.

Em seguida, passam a querer solucionar as supostas causas que jazem na raiz de tal "infelicidade", isto é, as desigualdades sociais e econômicas. Nasce assim um anseio reformista de cunho liberal e igualitário, para transformar a sociedade no sentido revolucionário.

Este anseio se manifesta, por exemplo, na condução da política externa norte-americana, orientada freqüentemente segundo princípios liberais, e tentando impor medidas democratizantes, as quais, segundo seus mentores, seriam o remédio mágico para os males econômicos e sociais dos países mais pobres.

Nos Estados Unidos, as reformas liberais e igualitárias de cunho socialista muitas vezes partiram dos elementos revolucionários das classes altas, e não das classes trabalhadoras.