"A Cidade", Campos (RJ), 29 de agosto de 1992

Morreu o comunismo?

A frouxa federação soviética, que agonizava quando o malogrado Mikhail Gorbachev foi precipitado do poder, acabou por se transformar em uma "Comunidade de Estados Independentes", entre cujos componentes se vêm acendendo sérias fricções, as quais causam preocupação a homens públicos e a analistas políticos em geral. Tanto mais quanto várias dessas repúblicas possuem armamentos atômicos ou outros de considerável poder destrutivo, que podem disparar, seja umas contra as outras, seja contra os adversários do Islã, cuja influência no mundo ex-soviético cresce dia a dia, com vivas apreensões para os que se preocupam com o equilíbrio planetário.

Acrescente-se a isso que os efeitos dessas agressões mútuas podem ser múltiplos. Entre eles, principalmente, o êxodo de populações contidas outrora além do que foi a Cortina de Ferro, e que, agora, pelos riscos de catástrofes imensas, podem sentir redobrados impulsos para "pedir" a hospitalidade da Europa Ocidental.

E não só dela, mas também de nações do continente americano...

Com efeito, e em abono destas perspectivas, no Brasil, o Governador do Estado do Rio de Janeiro, Sr. Leonel Brizola, com aplauso do Ministro da Agricultura do Governo Federal, propôs atrair lavradores do Leste europeu, dentro dos programas oficiais de Reforma Agrária. Em seguida, o Presidente da Argentina, Carlos Menem, em contatos com a Comunidade Econômica Européia, manifestou-se disposto a que seu país acolha muitos milhares desses imigrantes. E, pouco depois, a titular da Chancelaria colombiana, Sra. Nohemi Sanin, disse que o governo de seu país estuda a admissão de técnicos provenientes do Leste. Até estes extremos podem chegar os vagalhões das "invasões".

E o comunismo? O que é feito dele? A forte impressão de que ele morrera apoderou-se da maior parte da opinião pública do Ocidente, deslumbrada ante a perspectiva de uma paz universal de duração indeterminada. Ou quiçá de uma duração perene, com o conseqüente desaparecimento do terrível fantasma da hecatombe nuclear mundial.

Esta "lua de mel" do Ocidente com seu suposto paraíso de desanuviamento e de paz, vem refulgindo gradualmente menos.

Refiro-me, com efeito, às agressões que relampagueiam nos territórios da finada URSS. Cabe-nos, pois, perguntar se o comunismo morreu. De início, as vozes que punham em dúvida a autenticidade da morte do comunismo foram raras, isoladas e escassas em fundamentação.

Aos poucos, de cá e de lá, sombras foram aparecendo no horizonte. Em nações da Europa Central dos Balcãs, como do próprio território da ex-URSS, foi-se notando que os novos detentores do Poder, em alguns casos, eram figuras de destaque do próprio Partido Comunista local. Exceto na Alemanha Oriental, a caminhada para a privatização se vem fazendo a passos de cágado, lentos e sem rumo inteiramente definido.

Ou seja, pode-se dizer que nesses países o comunismo morreu? Ou que ele entrou simplesmente num complicado processo de metamorfose? Dúvidas a este respeito se vêm avolumando, enquanto os últimos ecos da alegria universal pela suposta queda do comunismo se vêm apagando discretamente.

Quanto aos partidos comunistas existentes no Ocidente, murcharam de modo evidente, ao estampido das primeiras derrocadas na URSS. Mas já hoje vários deles começam a se reorganizar com rótulos novos. Tal mudança de rótulo é uma ressurreição? Uma metamorfose? Inclino-me de preferência por esta última hipótese. Certezas, só o futuro as poderá dar.

Essa atualização do quadro em função do qual o mundo vai tomando posição, parece-me indispensável como tentativa de pôr um pouco de clareza e de ordem num horizonte em cujos quadrantes o que cresce principalmente é o caos.

Em meio a esse caos, só algo não variará. É, em meu coração e em meus lábios, como no de todos os que vêem e pensam comigo, devidamente adaptada a Nossa Senhora, a oração que o Salmista dirige ao Senhor:

"Levanto meus olhos para ti, que habitas nos Céus. Vêde que, assim como os olhos dos servos estão fixos nas mãos dos seus senhores, como os olhos da escrava nas mãos de sua senhora, assim nossos olhos estão fixos na Senhora, Mãe nossa, até que Ela tenha misericórdia de nós".

Sim, voltamos nossos olhos para Nossa Senhora, pedindo-lhe quanto antes a contrição que nos obtenha os grandes perdões, a força para travarmos os grandes combates, e a abnegação para sermos desprendidos nas grandes vitórias que trarão consigo a implantação do Reino dEla. Vitórias estas que desejamos de todo coração, ainda que, para chegar até elas, a Igreja e o gênero humano tenham de passar pelos castigos apocalípticos – mas quão justiceiros, regeneradores e misericordiosos – por Ela previstos em 1917, na Cova da Iria, em Portugal.

Eis a afirmação da invariável confiança da alma católica, genuflexa, mas firme, em meio à convulsão geral.

Firme com toda a firmeza dos que, em meio da borrasca, e com uma força de alma maior do que esta, continuarem a afirmar do mais fundo do coração: "Creio na Igreja Una, Santa, Católica, Apostólica, Romana", contra a qual, segundo a promessa feita a Pedro, as portas do inferno não prevalecerão.