Plinio Corrêa de Oliveira
Garras, negócios e ideal
"A Tarde", Salvador, 21 de novembro de 1972 - "O Jornal", Rio de Janeiro, 23 de novembro de 1972 |
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Segundo têm noticiado as agências internacionais, a Europa vai constituindo-se, lenta mas seguramente, numa grade federação, que se estenderá dos Urais até Lisboa. Não é meu propósito examinar aqui se essa perspectiva justifica esperanças, ou, pelo contrário, apreensões. Limito-me a examinar as eventualidades que ela abre para nosso País. O Sr. Sulzeberger – do "New York Times" – afirmou, há pouco, que os Estados Unidos da Europa poderão falar de igual a igual com os Estados Unidos da América. Embora não o tenha dito o jornalista, é óbvio que isto implicará num considerável declínio do poderio de seu país. Parece forçoso que os observadores íbero-americanos se perguntem qual o efeito que esse imenso fato – uma vez consumado – projetaria sobre seus países. Não está em nossas mãos provocar ou impedir o declínio ianque. Podemos, isto sim, tirar dele todo o proveito compatível com a justiça e a equidade. Ora, salta aos olhos que para fazer face a uma Europa Unida, os E.U.A. precisarão muito mais do apoio da América Latina. Por isso mesmo, estarão propensos a colocar suas relações políticas e econômicas conosco em nível acentuadamente mais satisfatório do que é o atual. Teremos assim ocasião de desenvolver uma política de arrojadas reivindicações. Digo-o aqui do conjunto das nações latino-americanas. Mas é natural que eu pense tomar a dianteira, o que desejo animado de uma eqüitativa mas vigorosa audácia. Sem essa audácia, a situação poderá evoluir contra nós. Sentindo que precisa de nosso apoio, não será de espantar que os E.U.A. queiram agarrar-se à América Latina como último recurso. Ora, pelo menos etimologicamente, agarrar quer dizer meter garras... Sejamos arrojados antes que os ianques o sejam conosco. Na via do arrojo, nada melhor do que conquistar a iniciativa. Outro aspecto do novo panorama no qual vamos entrando está em que, por sua vez, os Estados Unidos da Europa quererão disputar ao seu êmulo norte-americano as riquezas e o apoio político da América Latina. Poderemos tornar-nos, assim, o fiel da balança entre os dois grandes. O que é uma forma também de ser grande. Se soubermos atuar com sagacidade e vigor, poderemos aceder a uma situação culminante, bem mais depressa do que se poderia imaginar. Mas também aí a situação é reversível. Pois à força de a Europa Unida querer contar conosco, pode sentir-se impelida em deitar-nos as garras... De nossa parte, é necessário arrojo, pois. O leitor cético talvez sorria considerando improvável esta última hipótese. Mas seu sorriso lhe fenecerá nos lábios, desde que lembre a vergonhosa, a execrável preponderância que o bloco soviético exercerá no interior da federação européia. Bem sabemos com que facilidade o comunismo internacional deita garras onde bem entende. O quadro, visto em todo o seu conjunto, é claríssimo. A prazo, não digo imediato mas médio, deveremos estar em situação única, tanto pelo que terá de excelente, como pelo que terá de perigoso. Se soubermos sentir o momento e o explorarmos a fundo, a América Latina tudo poderá esperar. Bastará que tenhamos cabeça, jeito e força. E também união. Pois o que o Brasil poderia conseguir para si contando só consigo, conseguí-lo-á mais facilmente toda família latino-americana, se souber agir unida. Bem entendido, vejo para nosso País grandes possibilidades econômicas em todo este provir. Sou, porém, inteiramente leal com os leitores. Por mais que a perspectiva desse enriquecimento atraia-me, voam mais alto minhas ambições. Na ascensão do gigante brasileiro, e do potente bloco das nações irmãs, sobretudo me empolga o zelo idealista de ver o gênio católico e latino, renascido em nossos países, a projetar a sua luz, como astro de primeira grandeza, sobre as rotas do Mundo no Século XXI. Quem, obcecado pela fome do lucro, rir-se desta afirmação, ria-se à vontade. Sou dos que prezam devidamente os interesses, mas colocam acima deles os ideais. E disto não arredo um passo. |