Plinio Corrêa de Oliveira
Função social da compaixão
"O Jornal", Rio de Janeiro, 17 de agosto de 1972 |
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Recente declaração oficial da Conferência dos Bispos norte-americanos pediu a cessação do bloqueio econômico de Cuba. O argumento essencial daquele organismo eclesiástico consiste em que o bloqueio é uma medida política, porém, seus efeitos devem ser medidos, não em função da política, mas das privações e do sofrimento que causa. Li esta notícia nas "Informations Catholiques Internationales", de 15 de julho p.p. No mesmo número da revista li também outra notícia; o líder católico Luiz Boitel, que rompera há tempos com Fidel Castro, tendo cumprido, em 1970, dez anos de prisão, foi convidado a aceitar uma "reeducação" marxista. E como se tivesse recusado a tal, foi sujeito a torturas "pedagógicas" de que resultou sua morte. Naturalmente, confrontei as duas notícias. E daí me veio uma pergunta, que põe em xeque a posição da Conferência Episcopal ianque: - Bloquear Cuba é realmente aumentar o sofrimento dos cubanos? O regime comunista deu origem em Cuba ao confisco da soberania nacional pelos soviéticos. Acarretou o cerceamento das mais legítimas liberdades entre as quais a da Igreja. Ele trouxe consigo a insegurança, a tortura e a morte. Implantou a fome. E isto por efeito da própria essência da doutrina marxista. O caso Boitel não é senão uma tragédia individual dentro dessa imensa tragédia nacional. Assim, o único jeito de aliviar os sofrimentos de Cuba consiste em derrubar o comunismo. O bloqueio é um dos meios para este fim. Ele não aumenta os sofrimentos dos cubanos, senão como certos remédios necessários agravam os padecimentos do enfermo. Não terão ocorrido estas consideração aos líderes do episcopado norte-americano? A este propósito, lembrei-me do que li na revista "Antenie", de Londres (nº 109, de abril de 1972). Na aldeia de Brudzowice, Polônia, a população desejava construir, no cemitério local, uma casa para exéquias. A população obtivera o material necessário. Mas o Departamento de Cultos proibiu a construção, receoso de que o edifício viesse a ser usado como capela. Por isto, os mandarins do dito Departamento ordenaram a destruição do barraco que guardava o material de construção. Certa manhã apareceram na aldeia 50 caminhões militares, camionetas para presos, ambulância, carros com alto-falantes e dois tratores. Percebendo a que vinha tudo isto, algumas mulheres bloquearam corajosamente o caminho. Milicianos armados desimpediram brutalmente a estrada. Os veículos chegaram ao barraco. Foram atiradas bombas lacrimogêneas contra as pessoas que nele se achavam. Todos os resistentes foram levados pela polícia. Começou a demolição. Passadas três horas, tudo estava arrasado. Mas, enquanto durava a tragédia, as mulheres choravam e – num protesto heróico – cantavam hinos religiosos... Era a desforra sublime da Fé. Pergunto-me: por que a Conferência Episcopal ianque não tem uma palavra de protesto contra enormidades como esta, que se estão repetindo na Finlândia, na Ucrânia, etc? Por que só cogita ela de que se suprima o bloqueio de Cuba? Insisto: por quê? Não se veja na insistência desta pergunta um ressaibo de impertinência em relação aos componentes da Conferência Episcopal norte-americana. Se insisto é por outra causa. Sim, é pura e simplesmente uma imperiosa necessidade de saber que me inspira. Pois o problema que levanto é dos mais sérios. Explico-me. Esta contradição não é apenas da referida Conferência Episcopal, nem se circunscreve ao âmbito mais extenso dos eclesiásticos da esquerda (ou da corrente esquerdista do centro), que se encontram cá, lá e alhures. De modo geral – e portanto com as clássicas e necessárias exceções – o sentimento de compaixão parece impelido por um sopro, para a esquerda, em nossos dias. Mesmo em pessoas nada esquerdistas, de preferência a comiseração se inclina, muitas vezes, para o lado errado. Assim, num tiroteio entre subversivos e a polícia, muitos são os que se compadecem mais do terrorista ferido do que do policial igualmente ferido. – Por que isto? – Numa altercação entre um aluno insolente e um mestre afrontado, na qual cada um se exceda um tanto, a compaixão vai muito mais para o aluno ("coitadinho"), do que para o mestre. E assim os exemplos se poderiam aduzir aos centos. Quanto ganha com isto a maré montante da anarquia, é fácil ver. E quanto perde a sociedade, também. – Como corrigir isto? – Penso que está esquecido um alto princípio. Hoje tanto se fala em função social; não seria o caso de retificar essa compaixão errada, lembrando a função social da compaixão? |