Plinio Corrêa de Oliveira

 

Falsidade para com os outros, para consigo próprio e para com Deus

A beleza da virtude da retidão

 

 

 

 

 

 

Santo do Dia, 18 de novembro de 1978, sábado

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A D V E R T Ê N C I A

Gravação de conferência do Prof. Plinio com sócios e cooperadores da TFP, não tendo sido revista pelo autor.

Se Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras "Revolução" e "Contra-Revolução", são aqui empregadas no sentido que lhes dá Dr. Plinio em seu livro "Revolução e Contra-Revolução", cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de "Catolicismo", em abril de 1959.



 

Imagem ilustrativa: "O homem de seis cabeças". Caricatura anônima representando Talleyrand (Charles-Maurice de Talleyrand-Périgord, 1754-1838), bispo apóstata, diplomata e político francês, sugeriu a Napoleão Bonaporte a execução do último descendente dos Condé, pediu ao futuro rei Luís XVIII que retornasse à França e expulsasse, portanto, a Napoleão... Certa ocasião perguntaram a Talleyrand qual seria o rei dos queijos, ao que imediatamente respondeu: "O queijo brie é o rei dos queijos!" Um dos circunstantes comentou: "Então, este foi o único rei que não traístes..." Tal era sua fama, que em 1815 foi feita a caricatura que ilustra o presente áudio e cujo original se encontra na Biblioteca Nacional da França (em Paris).

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Não há tema mais belo que a “retidão”, porque nele se contém a beleza de todos os temas.

A retidão é o por onde toda qualidade permanece fiel a si mesma, todo bom propósito se executa até o seu fim e toda fidelidade suporta qualquer espécie de provas. Esta é a retidão. Portanto, nenhuma virtude é autêntica se ela não tiver no seu âmago a virtude da retidão.

O que é propriamente a retidão?

O mais curioso é que, sendo ela tão bela, é difícil falar belamente sobre ela. Porque ela não se apresenta engalanada, com atavios, ela não tem o esplendor das outras virtudes, porque ela não é senão a perfeição das outras virtudes. Cada virtude tem uma espécie de beleza autônoma e a retidão não a tem. E por outro lado a retidão fala de modo desagradável ao homem que tudo quer, menos a própria retidão.

E por causa isso é difícil fazer uma conferência sobre a retidão que agrade. Basta dizer que, para fazer entender a retidão, nós vamos ter que começar por falar a respeito do contrário da retidão. E temos, portanto, que descrever algo que é de si repelente, que é a falsidade do homem para consigo mesmo, a falsidade do homem para com os outros, a falsidade do homem para com Deus.

É na base disso que nós vamos ter que examinar uma série de defecções que se encontram ao longo da História no bom caminho. Não só defecções dos homens, mas dos grupos, das correntes, dos partidos, das civilizações e é compreendendo bem esse papel da falta de retidão é que compreenderemos inteiramente o que é a retidão.

Mais precisamente o seguinte, para nós entendermos bem as coisas:

O demônio nota bem que quando a alma recebe graças de Nossa Senhora, ela fica muitas vezes tocada tão a fundo, que nela alguma coisa fica, para ele, impossível de modificar. E que quando ele nota que essa impossibilidade de modificação se verifica, ele propõe então algo que venha a ser a falta de retidão. Quer dizer um compromisso, quer dizer um arranjo, quer dizer um meio termo infame, em função do qual a alma, sem abandonar aquilo que ela amou, passa a amar aquilo que ela abandonou. Não há aí um jogo de palavras, mas eu vos dando um exemplo claro de como as coisas são, vós entendereis bem.

Qual é a razão dessa baixa? É um problema que você não quer explicitar para si mesmo. É uma coisa que você não quer ver em si mesmo, que você não quer reconhecer em si mesmo. E que por isto lhe dá um misto de prazer e de sofrimento. E você gosta de se refocilar nesse misto de prazer e de sofrimento pelo gosto de ter uma encrenca, pelo gosto de ter um problema, pelo gosto de se azedar, pela satisfação da coisa mal explicada dentro da alma. E você, portanto, por falta de retidão, tem dentro de si um micróbio que se transformou numa cobra, e uma cobra que pode se transformar numa sucuri na própria alma. Ao cabo de um ano, de dois anos, de cinco anos, está uma crise. Está uma crise enorme!

Qual foi a origem dessa crise?

O problema inicial para o qual a pessoa não quis abrir os olhos, a respeito do qual ela não quis abrir-se para alguém, não quis ouvir um conselho, não quis receber uma refutação, não quis ser posta em ordem reta. Ela desviou seus passos do caminho reto, que seria reconhecer: “1) tal ponto constitui em mim uma dificuldade. 2) não posso continuar assim, tenho que me explicar com alguém, tenho que rezar a Nossa Senhora para ver claro. 3) ainda que eu não veja claro, minha fidelidade em nada se abala, porque quanto mais demorar para eu ver claro, tanto mais claro eu verei num dia. E debaixo desse cupim que está no chão e onde eu não consigo ver nada, um sol está nascendo para me iluminar meu futuro”. (Mas) a pessoa diz o contrário: “não, eu fico quieta”.

Com isto, ela sai da verdadeira via, ela anda no oblíquo e do oblíquo ela derrapa para longe.

Se o demônio tivesse tentado a ela num ponto onde ela adere muito, ela teria rejeitado. O demônio tenta num ponto pequeno e começa o caminho oblíquo. Não é o caminho para baixo, direto para o inferno. É oblíquo, intencionalmente descrito assim: cada passo, cada passo, cada passo se afasta mais um pouco, sem se afastar inteiramente. Ao cabo de algum tempo a pessoa está levada longe aonde não queria. Por que ela está levada longe? Porque lhe faltou a retidão.

Assim somos nós, com quase todos os nossos defeitos.

Para dizer pouco: nós não gostamos de olhar de frente os nossos defeitos. E quando analisamos os nossos defeitos, só analisamos os que saltam aos olhos, os que produzem ações que nós não temos coragem de negar que foram praticadas e que foram más. Mas nós não levantamos um mapa inteiro de nossa mentalidade. Nós não temos a coragem de nos censurar de frente, e totalmente, e procurando as agravantes, ponto por ponto, implacavelmente, de maneira que no fim nós possamos dizer: “Minha Mãe, se é verdade que eu persevero infelizmente neste pecado, eu consegui, pelo menos, vê-lo inteiro e detestá-lo inteiro. Eu me inclino diante de Vós, eu Vos peço perdão. Eu pequei e andei mal, agora dai-me a vossa misericórdia, dai-me a vossa ajuda”.

Peço uma vez, peço duas vezes. “Minha Mãe, pedirei duas mil vezes; Minha Mãe, pedirei dois milhões de vezes! Mas um dia virá em que Vós tereis pena de mim e me atendereis. Eu não fecharei meus olhos para o meu pecado, meu pecado está sempre de pé contra mim, me dizendo as verdades a respeito de mim mesmo. Eu não fecharei os olhos para ele e um dia, depois de tanto eu me humilhar, de tanto eu bater no peito, de tanto eu detestar o defeito que eu tinha, eu acabarei vendo”.

E uma luz nasce em mim, uma força nasce em mim, uma capacidade de me modificar nasce em mim, por onde eu me sinto outro e de um momento para outro, eu me livro de tudo e eu estou felizmente resgatado, estou livre do defeito que eu tive!

 

Alto relevo de Louis Veuillot, na igreja “Nossa Senhora do Milagre” (Madonna del Miracolo, também conhecida como Sant’Andrea delle fratte, em Roma)

Eu me lembro de já ter contado aos senhores uma vez, que um famoso escritor contra-revolucionário do século passado, Louis Veuillot, francês, escreveu um livro “Les Parfuns de Rome”, “Os perfumes de Roma”, mas era Roma pré-garibaldina, era Roma anterior aos Savoias, era a Roma magnífica do tempo em que os Papas eram reis de toda a cidade de Roma e de uma província vizinha que formava os Estados Pontifícios. Ele ali então, ele era diretor de um grande jornal católico chamado “L’Univers”, para fazer reportagem ele ia fazer uma visita a Roma. E ele uma vez contou que, percorrendo uma velha basílica que o encantou, ele percorreu dentro, gostou muito.

Depois voltou e percorreu por fora também. E passando de trás da basílica, por uma pedra que fazia parte do fundamento do muro externo da basílica, ele viu que alguma coisa estava escrita. Então ele se agachou para ver. E viu escrito, com uma espécie de lápis de carvão, o seguinte: dia tanto de tanto, pequei; meu Deus, tende pena de mim; dia tanto de tanto, pequei de novo; meu Deus, tenha pena de mim; dia tanto não pequei, graças a Deus. Assim ia, pecado e não pecado, anos! Essa alma em algumas pedras tinha escrito seu “diário espiritual”. E um belo dia chegava o seguinte: Meu Deus, há x - digamos seis meses, ou um ano - eu não peco mais. “Gloria in excelsis Deo”. Glória no mais alto dos Céus a Deus! E Veuillot teve esse comentário magnífico. Ele transcreve no artigo dele.

Aliás seria fácil os senhores pedirem ao professor, ele teria isso ao alcance da mão e poderia mostrar isso aos senhores, ele transcreve no artigo dele trechos grandes disto. E  quando vem a parte final ele diz o seguinte: se ele tivesse encontrado naquela parte da pedra onde estava escrito esse “Gloria in Excelsis Deo”, ou nas partes anteriores, sangue de mártires, ele não teria venerado menos do que esse itinerário escrito com carvão preto, sobre uma pedra dura, dando o sacrifício de uma alma para se libertar de um pecado e readquirir o estado de alma. É magnífico!

E nos mostra exatamente o que é a retidão. Era uma alma que o tempo inteiro foi reta. Ela pelo menos se viu como ela era e ela se increpou o tempo inteiro como ela merecia. Desse fato vinha uma humildade: Como eu sou torto! Como eu sou errado! Como eu sou pouco! Meu Deus! Minha Mãe, que estais no mais alto dos Céus, bem junto a Deus, como Vós sois! Cada um a seu modo, Vós como mera criatura, e Vós, Senhor, como Criador, perfeitíssimo, como Vós sois diferente de mim! Magníficos, perfeitos, irrepreensíveis. Que diferença! Mas, neste abismo de diferença, que coluna intensa de fumaça de incenso devido a Vós”.

Quando nós sabemos increpar os nossos próprios defeitos, aí nos tornamos capazes de admiração. Porque quando vemos o mal que há em nós, é que podemos admirar o bem que não há em nós. E aí temos admiração sem inveja, que sobe então do fundo da nossa miséria, aquela coluna de incenso: “como é belo; Vós então estais, Minha Mãe, por cima dos Querubins, por cima dos Serafins, Vós olhais Deus face à face, por toda a eternidade, Vós fostes concebida sem pecado original, Vós sofrestes o que mais do que todas as criaturas. Mas aos pés da Cruz Vós estáveis, de pé, firme, assistindo a morte de Vosso Divino Filho. E isso, e aquilo, e aquilo... ah! como é magnífico ser como eu não sou! como é estupendo ser superior a mim! Minha Mãe, eu me dobro diante de Vós, não só por execração aos meus defeitos, mas por um corolário necessário dessa execração, pela admiração pelas vossas qualidades”.

A alma que é capaz de se increpar a si mesma, essa alma é capaz de admirar. Mas quando a gente não tem a coragem de olhar de frente para o seu próprio defeito, a gente não é capaz de admiração.

E o defeito pelo qual a gente não olha bem a própria alma como é, este defeito se chama falta de retidão. A virtude pela qual nós nos vemos como somos chama-se retidão.

A virtude pela qual nós admiramos quem não é como nós chama-se retidão.

A retidão é aquela integridade por onde a alma faz tudo aquilo que deve, faz como deve, sem delonga, sem tapeação, sem protelação. Ela faz totalmente e inteiramente. Ainda que seja na fraqueza humana, pedindo perdão, caindo e se levantando, mas dizendo a si mesma bem direito a verdade que merece ser dita.

Desta virtude da retidão nascem as famílias de almas retas. E dessa retidão das famílias de alma nascem então as grandes correntes de retidão dentro da História, e nasce aquilo que na História é um reflexo do Sapiencial e Imaculado Coração de Maria. Do retíssimo Coração de Maria.

Os senhores me dirão: mas haverá um símbolo do Imaculado Coração de Maria que fala da retidão dela? Eu digo: . O Coração de Maria traspassado por sete espadas, os senhores já devem ter lido isto: são as Sete Dores de Nossa Senhora. O Coração de Maria traspassado por sete espadas, poderia ser chamado “as sete retidões”. O “sete”, como os senhores sabem, é um número simbólico na Escritura. Os sete sacramentos, muitas outras coisas são sete. Indica uma totalidade. Nossa Senhora das Sete Dores, não é porque Ela tenha tido só sete. É porque Ela teve todas, das quais sete foram as principais. Mas Ela teve todas as dores.

Assim também, nós podemos dizer então que cada espada retilínea foi uma posição firme e reta que Ela tomou diante de tudo. Ela ter todas as retilineidades. E isto lhe veio toda a sua dor. Tudo isto lhe veio porque tinha a retidão. Ela olhou tudo de frente, sofreu de frente e foi até o fim

 Isto, meus caros, portanto, que se dá com os nossos defeitos, que nós não queremos ver de frente, se dá também com os nossos sofrimentos. Muito poucas pessoas têm a coragem de por diante de si a ideia seguinte: a vida é um vale de lágrimas! Ou seja, numa expressão mais rigorosa, é um campo de batalha. E, portanto, só vive uma vida digna de ser vivida, quem luta, quem luta contra o mal, luta a favor do bem, e se expõe a todos os sofrimentos inerentes à luta. E então olha para as coisas como o guerreiro olha para o seu adversário.

Uma das coisas da retidão é a gente não olhar para as suas próprias qualidades. Olhando a gente as perde. O melhor meio de perder uma qualidade é olhar para ela. O melhor meio de perder um defeito é olhar para ele.

Eu dizia então que essa posição reta é a posição que faz com que se dê... Eu passo agora... Talvez eu não saia ainda da situação das almas e eu ainda trato das almas individualmente para depois desenvolver a coisa em terreno mais amplo.

O que acontece? É que, por falta de retidão – e isso já é falta de retidão - a maior parte das pessoas tem preguiça de pensar. E por causa disso tem preguiça de prestar atenção em si mesmas.

Se a pessoa fosse verdadeiramente inocente ela gostaria de pensar. O pensamento é para a alma inocente como a respiração é para o corpo. E ter preguiça de pensar é para a alma uma coisa tão maluca quanto preguiça de respirar o é para os pulmões. Que juízo nós faríamos de alguém a quem nós disséssemos: “por que está respirando tão fraco?”, ele diria “é de preguiça!” Como? Preguiça? Então você deve achar uma delícia ter asma! Porque respira pouquinho. É isso que você quer?! A doença passou a ser para você uma preguiça! É inconcebível.

As pessoas têm preguiça de pensar por falta de inocência. Por falta de inocência elas têm preguiça de prestar atenção, portanto, em si mesmas. Porque precisa prestar atenção e fazer uma descrição.

Por falta de inocência e preguiça elas começam a fazer as análises incompletas de si próprias. E a análise incompleta de si própria tem dois aspectos.

A pessoa não olha inteiramente seus defeitos, e, por causa disso, cai num outro erro - falta de retidão também: a pessoa começa a imaginar qualidades que não tem. Porque quem não quer ver os defeitos que tem, imagina qualidades que não tem. É forçoso.

A partir desse momento forma uma falsa idéia de sua própria pessoa. Formando uma idéia falsa de sua pessoa, forma um itinerário errado na vida. Porque quem está andando de bicicleta e pensa que aquilo é automóvel não pode ficar atento na viagem; aciona a bicicleta de uma maneira tal que ela se quebra. Ou um que tem um automóvel e pensa que aquilo é um tanque, é um bulldozer, aciona de tal maneira que ele se espandonga inteiro também.

Nós somos o “veículo” de nós mesmos ao longo da vida. E se nós não sabemos que “marca de veículo” cada um é, como pode dirigir-se a si próprio bem de maneira a chegar até o fim da vida? Nem sabe bem o que tem que apetecer; apetece o que não lhe convém; lhe convêm coisas que não lhe apetecem e é um imbroglio no qual o indivíduo não se entende dentro da vida.

É assim! Não tem dúvida nenhuma de que é assim.

Acontece que, por causa disso, a pessoa então cai num erro pior do que os outros: começa a viver uma vida que não era para ela viver.

Então dá tudo torto. O indivíduo sonha que é para ter uma vida que não é para ele. Vive a vida que ele não sonhou, porque ninguém realiza o próprio sonho, nota que dá tudo torto por dentro porque ele percebe que ele é outro e que tudo é outro e dá essas frustrações da vida, essa coisa horrorosa.

Eu me lembro de um velho senhor, que eu conheci, senhor, aliás, muito distinto de maneiras, muito agradável de trato, que já estando bem velho, ele era calvo, e eu o vi num dia de calor, sentado a uma mesa, com um lenço assim, e pensando. Com o ar mais empurrado e mais desagradado que possa haver. E eu, para aliviar um pouco a vida dele, me aproximei dele. Era uma pessoa a quem eu devia atenções e até favores, e eu devia pagar. Eu não pagava apenas contabilmente; eu tinha boa vontade em fazer aquilo, com o desejo de ser útil a ele. Eu me aproximei dele e disse: o senhor quereria – ele de vez em quando olhava o relógio e punha o relógio no bolso. Eu francamente, fiquei com medo que ele quisesse suicidar. E eu então aproximei-me dele e disse:  o senhor queria ver alguma coisa, precisaria alguma coisa etc., etc. Ele levantou a cabeça e me disse: Você não sabe o que é a vida; você pensa que sabe, mas você não sabe. Eu era muito mais moço do que ele. Tinha uns 20, 22, 23, 25 anos. “Você pensa que sabe o que é a vida, mas você não sabe; cada vez que eu tiro o relógio, eu não consigo ver o quadrante do relógio, porque os meus olhos me apresentam a figura de algo de irreal que eu sonhei. E quando eu vou consultar o tempo, eu consulto as velhas reminiscências dos meus sonhos que não se realizaram; e por causa disso eu me desespero dessa maneira”.

Eu achei uma coisa terrível; tanto mais que eu percebia muito bem que pelo menos uma boa parte eram sonhos de obscenidades. E que olhava para aquilo e aquilo vinha à cabeça dele. Sonhou, sonhou, sonhou, tornou-se obsessão. Tornaram-se associações de imagens defectivas. Quando ele olhava para alguma coisa, a associação de imagens partia errada e levava para o mundo de mentiras dentro do qual o miserável tinha vivido. Era o horror da falta de retidão.

Agora, qual é a reação torta e a reação reta diante disto que eu acabo de dizer.

A reação torta é a seguinte: Isso mexe tanto com os fundos de minha moleza e com os fundos de meu amor próprio, que eu não tenho nenhuma coragem em mexer no que o Dr. Plínio está falando. E, portanto, eu ouço o que ele diz, não digo “não”, mas sobretudo não digo “sim”. E saio daqui como eu entrei.

O que tem isso de não reto? É que essa pessoa, máxime agora, depois do que estou dizendo, está compreendendo que o que se pede para ela é pouco: é que ela acuse a si mesma. Eventualmente em confissão. Mas não trato aqui de questão de confissão. Acuse a si mesma o defeito que tem com todas as agravantes. O defeito que vê. Não estou pedindo que ela olhe desde logo até o fundo da alma dela. Ela olha o que está ao alcance dela olhar. E aquilo ela descreva para si mesma com clareza. De camada em camada, de defeito em defeito, ela chegará até a profundidade. Ela acabará se vendo totalmente. Mas apenas veja-se. Não minta para si mesmo. Não feche os olhos para os próprios defeitos. Veja-os, e veja-os com suas agravantes. E depois confie em que Nossa Senhora, por mais inverossímil que seja, o tirará disso.

São os modos variados dos quais a Providência se serve para fazer cessar os nossos defeitos. Cessam como nós não imaginávamos, mas cessam. Desde que a gente peça, a gente peça, a gente consegue o absurdo, por assim dizer. O inverossímil a gente consegue à força de pedir. Mas por causa disso, se nós não corrigirmos os nossos defeitos é porque, no fundo, nós não temos retidão inclusive em reconhecer que se pedirmos o defeito é corrigido mesmo.

Eu conheci uma pessoa que uma vez eu a abordei numa igreja. Era um rapaz. Era na Igreja de Santa Cecília. E o rapaz estava rezando diante de uma gruta de Nossa Senhora de Lourdes, que tem ali à direita de quem entra. E eu acabava de comungar, estava saindo, e ele saiu correndo. Sumiu. Depois ele entrou para a Congregação Mariana etc., passou a ser dos meus amigos etc., etc. Um dia ele me disse: “Você não notou que uma ocasião quando você vinha saindo assim etc., eu saí correndo? Eu fingi que não tinha visto você. Mas eu percebi que, se eu ficasse ali, você ia me abordar; se você me abordasse, você me levaria para junto de sua companhia; e que você me levando para sua companhia, eu me corrigiria de um defeito que eu não queria corrigir. E por causa disto eu fugi de você”. Mas então não diga que não estava ao alcance dele. Estava ao alcance e ele não quis. Mesmo assim Nossa Senhora teve pena dele e acabou dando a ele aquilo que ele não queria. E acabou lhe dando uma conversão e ele foi muito bom congregado mariano. Enfim, as coisas correram bem com ele etc., etc.

Para os senhores verem como Nossa Senhora ajuda sempre, ajuda de um modo inimaginável, os senhores deveriam ler as “Confissões” de Santo Agostinho, ainda que os mais moços saltem as partes puramente filosóficas, ler a parte biográfica. É um resplendor a gente ver como chegou ao fim, em que ele estava sozinho naquela angústia, gnóstico, corrupto, com um filho ilegítimo. Portanto, herege e impuro. E, vacilando. De repente ele ouve uma voz que diz a ele: “Tolle, lege; tolle, lege”. Ele falava latim. “Toma e lê; toma e lê”. Era a voz de Deus mandando ler, se não me engano, era um livro da Escritura. Ele vai ler e tinha um trecho que resolvia o problema dele.

E a partir daquele momento ele se converte e dá um grande Doutor da Igreja. Esse Doutor da Igreja, para castigar-se dos pecados que cometeu, escreveu essa biografia, à qual ele deu o título de Confissões, para se confessar a si próprio, diante do mundo inteiro, pelos seus defeitos.

E a morte dele foi a mais bela morte de penitente que se possa imaginar. Ele foi elevado a Bispo - um luminar da Igreja Católica! Mas Bispo da minúscula cidadezinha de Hipona. Hipona era no norte da África, uma cidade romana, de cultura, de língua romana. Não sei se era de raça latina. Mas era uma cidade romana, e estava cercada pelos vândalos, que vinham da Germânia, atravessaram a França, a Espanha e desceram pela a África. E cercaram várias cidades. No caminho estava Hipona. E Hipona ia ser tomada por eles. Eram pagãos, além do mais. Ele moribundo, provavelmente já com a vista enfraquecida, mandou que os salmos de Davi, os salmos da penitência, fossem escritos num muro, diante do leito dele, em letras bem grandes para ele poder ler. E ele até o fim da vida lia os salmos pedindo perdão, para ele ser recebido por Nossa Senhora.

Uma alma que com tanta retidão e tanta lealdade se examinou a si mesma. Com tanta retidão confiou na misericórdia de Nossa Senhora e ensinou a misericórdia de Nossa Senhora. A esta alma, com certeza, as portas do Céu - é de fé!  ele é um santo canonizado - as portas do Céu se abriram e ele entrou pelo eixo reto que conduz até Nossa Senhora. Nossa Senhora que é o caminho reto até Deus. Por que? Porque ele tinha sido reto a vida inteira.

Linda frase - e com isso eu termino a parte individual da retidão - linda frase a respeito da retidão, é a de São Paulo: Bonum certamen certavi, cursum consumavi – Eu combati o bom combate e terminei a carreira que eu tinha de fazer. Meu Deus, dai-me agora o prêmio de Vossa Glória.

Mas não pode haver coisa mais bonita do que um homem que olha para trás e pode dizer isto! Porque, no latim, ao pé da letra, bonum certamen certavi não quer dizer travei um bom combate; quer dizer, eu combati todo o bom combate que eu tinha de combater. Cursum consumavi quer dizer, eu percorri todo o caminho longo e difícil que eu tinha que percorrer; quer dizer, fui reto; combatendo, combateu tudo; tendo que percorrer o caminho, percorreu inteiro. Agora, com a calma, a paz de espírito dos retos, ele se voltava a Deus e dizia: “Meu Deus, dai-me agora o prêmio de Vossa Glória”. E recebeu!

Este é o modo de expirar da alma reta. Ou é na penitência confiante de Santo Agostinho, ou é nessa quase respeitosa cobrança de cheque de São Paulo: “eu paguei, meu Deus! chegou a hora dos vossos juros: eu entro na eternidade”. É uma beleza!

Não se sabe até qual é a mais bonita das duas formas de morte reta. Os senhores opinem... Eu não digo o que eu acho. Os que acham que é mais bonita a morte reta de Santo Agostinho, levantem o braço... Os que acham mais bonita a morte de São Paulo, levantem o braço... Se eu pudesse levantar os dois, eu levantaria os dois. Se se trata de fazer uma escolha, os senhores escolheram a meu ver bem. Não porque se possa dizer que uma coisa seja mais perfeita que a outra, mas é mais de acordo com a nossa espiritualidade. É mais de acordo com o nosso caminho.

Depois de ter increpado os nossos pecados, como Santo Agostinho increpou os dele, nós combatemos o adversário como São Paulo combateu. Santo Agostinho, aliás, os combateu esplendidamente. É por onde nós propriamente devemos “elancé”. E é o modelo que fica posto para nós.

Isto meus caros, quanto à retidão em nível individual.

Eu hoje, andando para Itaquera, vi longe de mim um caminhão que ia sacodindo. O caminhão ia vazio. Um sujeito ia sentado no caminhão. Ele estava com um pano imundo. Eu não sei há quanto tempo ele não se lavava. Ou não lavava aquele pano e a si próprio também. Parecia sentir-se dentro daquela sujeira perfeitamente bem. Mas de fato, eu me lembrei o seguinte.

Um pensamento que me veio à cabeça. Nem me lembrei que eu devesse falar hoje à noite de retidão aos senhores. Se este homem lavasse essa roupa, este pano seria ainda aproveitável? E imaginei a aguaceira que sairia de lá. Depois pensei com os meus botões: se fosse lavado uma vez, teria que passar por outra pia, porque esta pia já deveria ser lavada de ter lavado isto. Mas se lavassem e acabasse ficando inteiramente limpo e passassem caco de telha nesse sujeito de maneira a obrigá-lo a ficar limpo também, eu me pergunto se ele não sentiria um bem estar diferente desse bem estar de deboche, de sujeira e de desordem que ele está sentindo agora aqui. E cheguei à conclusão: chegaria. 

E depois me veio ao espírito: isto é a alma que chegou a se lavar inteira, porque viu a sua sujeira inteira. E não se contentou enquanto não se lavou por completo. A alma quando tem a sua túnica limpa, quando ela se lava a si própria, ela sente um bem estar que nenhuma outra forma de conforto dá. E por causa disso, se um homem nesta terra apenas fosse atrás da felicidade, ele deveria ir atrás da retidão. Porque não há nada comparável ao bem estar interior que dá a retidão.

E, portanto, se alguém aqui quer levar uma vida agradável e depois ir ao Céu, seja reto. Vai ser duro como tudo. Mas é magnífico! Porque o que se sente é mais ou menos como quem escalou montanhas vertiginosas e vê depois panoramas extraordinários. Embaixo pode haver até poeira levantada pelo vento. Mas à altura em que está, as poeiras não chegam. Nada. Tudo onde ele está é limpo. E ele vê tudo.

Ainda há pouco eu estava vendo uma paisagem alpina. Uma limpeza, uma limpeza, uma limpeza! A alma de um santo seria desta maneira. É esta a felicidade que cada um de nós deveria desejar para si.

Assim, meus caros, fica aqui um convite para a retidão.

Em virtude da retidão também que eu olho bem para o relógio. Dona Lucília me dizia: sempre fale menos do que quer porque é mais do que os outros desejam. É a pura verdade.

*    *    *

Nós passamos agora para um outro aspecto da questão.

É por isso também que os homens e as nações caem em heresia.

Os senhores tomem, por exemplo, o protestantismo. Cada seita protestante rompeu com a Igreja Católica por um lado. Mas eles não tiveram coragem, no primeiro momento, de dizer que eles não eram católicos. Primeiro, não tiveram coragem, a maior parte, de dizer que não eram católicos. Eles procuraram ficar na Igreja Católica mentindo que eram católicos, quando já não eram. E a maior parte deles foi preciso a Igreja excomungar porque eles queriam se enquistar nela, indebitamente. Essa é a realidade.

Provavelmente muitos nem queriam reconhecer para si que não eram católicos. Por que que era? Porque algum ponto da Igreja Católica lhes tocava no orgulho. Está na RCR [a obra “Revolução e Contra-Revoluçao”] e eu não vou estender. Ou tocava na sensualidade. Está em RCR, está na vida, eu não vou me estender a respeito do caso.

O fato é que, não ousando dizer que não eram católicos, uma vez excomungados continuaram a dizer que admitiam Jesus Cristo como Deus, mas que de fato não admitiam mais a religião católica como a religião divina. Ao longo das gerações a maior parte dos protestantes foi cada vez menos acreditando em Jesus Cristo como Deus. Em Jesus Cristo como uma pessoa muito benfazeja, que expiou os pecados do mundo, que obteve um perdão de Deus sim, mas como um homem.

E hoje em dia, em muitas seitas, a grande maioria dos que estão lá já nem acreditam na existência de Deus. Há pastores protestantes anglicanos que pregam a existência de Deus e quando acabam o sermão dizem: eu faço isto porque sou funcionário da coroa da Inglaterra e sou mandado fazer, mas eu não acredito no que eu disse.

Agora, donde é que veio isso?o primeiro, quando rompeu com a Igreja Católica, ele já tinha a semente do ateísmo dentro de si, mas por causa de retidão não quis reconhecer. E mentiu para si que ele continuava acreditando. Se ele tivesse visto claro, que ele já tinha em si a semente do ateísmo, talvez ele tivesse recuado e talvez não tivesse caído na heresia. Como ele mentiu, ele fabricou para si uma religião falsa. E como fabricou uma religião falsa, o filho dele ainda fabricou mais, e o neto mais, e o neto mais, até chegar no que nós vemos. O protestantismo caiu praticamente no ateísmo.

A Revolução Francesa foi a mesma falta de retidão. Quer dizer, muitos católicos não tendo a coragem de imitar os protestantes, porque os protestantes estavam ultra mal afamados, na França, com as vitórias que a Igreja lá tinha obtido sobre o protestantismo, eles começaram a ter idéias protestantes sob matéria política. E daí veio a Revolução Francesa. Não foi outra coisa senão isso. E acabaram ateus.

Caminhando através de idéias políticas, acabaram indo para o comunismo. As várias Revoluções foram mentiras que as que pessoas se pregaram falta de retidão, no fundo, desde já pré comunistas, sem ousar dizer o que eram. Se ousassem dizer que o eram, se fossem retas, elas se teriam detido na queda. Elas não ousaram dizer o que eram, não foram retas, elas caíram aos poucos, foram resvalando. São séculos de abominação, mas caem!

Os senhores tomem a IO [igreja ortodoxa, grecos-cismáticos]. A primeira seita que rompeu com a Igreja Católica e se conservou nesse estado até hoje foi a IO. A chamada igreja ortodoxa, os grecos-cismáticos. Eles saíram da Igreja fingindo conservar da Igreja tudo, exceto a infalibilidade papal e a autoridade do Papa sobre toda a Igreja. Eles deram essa autoridade ao Czar, que era uma espécie de papa da IO.

É muito curioso que o Joseph de Maistre, num trabalho dele conta isso. Antes de romper com a Igreja, quando o arcebispo metropolita de Moscou subia ao cavalo, se o czar estava presente, vendo no metropolita de Moscou um representante de Deus, continuador dos apóstolos, ele segurava os estribos do cavalo para o metropolita subir. Quando o metropolita rompeu com o Papa, a primeira coisa que o czar mandou a ele foi o seguinte: agora, quem sobe no cavalo sou eu, e quem pega no estribo é você!

Bem, veio de lá uma série de gerações de arcebispos, de bispos, de arquimandritas etc., cada vez mais próximos do ateísmo. O Joseph de Maistre conta que, quando chegavam certos atos da igreja, ele morou na Rússia, da igreja da IO - proclamações etc. - para o povo, havia umas fórmulas de fé, dos primeiros, que eles assinavam dando risada. Vinham já impressas e eles assinavam dando risada. Eles não acreditavam mais. Está impresso, a gente tem que assinar. O povinho acreditava. Resultado: foi a primeira igreja que caiu. Qual foi o defeito? Falta de retidão.

O que é que a Revolução nos propõe? A maior parte das vezes ela nos propõe um meio termo. Ela diz: “Não! Não rompa inteiro com a Igreja Católica, rompa só num ponto. Os outros vão...” E a coisa vai para frente. Depois ela propõe mais um pouco, mais um pouco, a pessoa se arrebenta toda.

A falta de retidão levou mais gente para o inferno do que todas as tentações declaradas e diretas. A maior parte das pessoas vai por ter escorregado por tentações pequenas e indiretas. E não querendo ver claramente as coisas como são.

*     *    *

Bem. Isso terminado, alguém me dirá: Dr. Plínio, está bem, mas qual é o pulchrum disso? Qual é a beleza disso?

Eu digo: nada teria pulchrum se não fosse isso. Todos os homens escorregariam por todos os abismos, de mentira em mentira, se não fosse isso. E os senhores têm a prova no fato que eu estava comentando hoje à tarde, na Reunião de Recortes, e que eu não faço senão repetir sumariamente para os senhores.

Está entrando o calor. E eu tenho observado na rua que o número de homens despidos até a cintura está crescendo cada vez mais. Não é claro, mas o mais das vezes sob um pretexto de que estão trabalhando. E de dia eles querem fazer um esforço sem se sentir demais calor. Pretexto não reto! O que é que acontece? Eles vão se despindo, mas, de outro lado, também neles as calças vão encurtando. E se há no traje dois movimentos, um pelo qual o traje vai cada vez baixando mais, e outro pelo qual ele vai cada vez subindo mais, ele se encolhe. Isto é encolher-se. Uma coisa se encolhe assim. Quando de seus extremos limites ela reflui para seu centro. Isto chama encolher-se. E quando encolhem, encolhem, encolhem, acabam por desaparecer. Como que se devora a si próprio. Quer dizer, nós caminhamos para o nudismo.

Eu assisti a entrada dos primeiros decotes em São Paulo. Os primeiros decotes escandalosos e das primeiras mangas usadas decotadas até aqui em cima. Assisti, vi e muitas senhoras usavam o que já não se pode censurar, ou quase não se pode censurar, as mangas até aqui. Portanto, com isto tudo coberto. E ouvi comentários entre elas a respeito da nova moda. E umas diziam: não, não tem nada. Uma ou outra dizia: aonde isto vai parar? A outra dava risada e dizia: Não, quando ficar perigoso a gente pára, por enquanto a gente se diverte. E já ia a manga de uma vez até aqui... Não passava disto, mais ia até aqui... Outra dizia: não, eu uso só até aqui. Isto é um acesso de loucura; daqui há pouco as mangas vão baixar até aqui... Não tem importância. Todas cediam!

Eu pensava com os meus botões: se todas cedem agora, as descendentes delas não vão opor resistência quando chegar a hora do nudismo. É o que está acontecendo. Por que? Elas, as primeiras, não tiveram a retidão de reconhecer que era o nudismo que estava entrando. Se elas tivessem tido a retidão, parava essa moda. Mas como elas não quiseram ver de frente, elas não tiveram seriedade para ver de frente, a coisa foi entrando, entrando e foi corroendo a pureza como uma lepra. O resultado é que os senhores têm hoje: o biquini.

Bem, e daí para fora. Alguém dirá: Dr. Plinio é só na praia. Eu creio que aqui não há um ingênuo que diga isto. Porque não há quem não perceba que é praia, é piscina. Se é praia, é piscina, é o bar da piscina. É o bar junto da praia e é depois a vida de todos os dias. Leva um pouco mais de tempo, leva um pouco menos de tempo, é a vida de todos os dias.

Quer dizer, o nudismo, notem bem que a implantação do nudismo equivale ao reino do demônio na terra. O nudismo entra no mundo através dos imprevidentes que não tiveram retidão. Se os primeiros tivessem tido retidão, isto não teria sido assim. 

A primeira falta de retidão qual foi? Eva, com a serpente. E depois Adão, com Eva.

Eva podia perfeitamente ter visto que a serpente estava sendo acionada pelo demônio. Ela sabia da existência do demônio, ela não era concebida em pecado original, ela portanto tinha mil meios para discernir o demônio; ela vendo um bicho ter com ela aquele tipo de relação que o Gênese descreve, ela tinha que perceber que aquilo era mais do que um bicho. Mas ela achou engraçadinho. Era um bicho muito engraçadinho, que divertiu a ela, ela deu trela. Depois quando ela foi falar com Adão ela já estava endemoninhada e Adão repetiu com ela o erro que ela cometeu com a serpente. Ambos não tiveram retidão. E porque não tiveram retidão, todos nós estamos na situação de desgraçados em que estamos.

Qual é o grande restaurador da retidão? Nosso Senhor Jesus Cristo. O Verbo se encarnou e habitou entre nós para reabrir o caminho do Céu e com o Seu Sangue dar aos homens o reto caminho e a coragem de serem retos.

Retidão, retidão, retidão: Nossa Senhora! Na pura criatura, Nossa Senhora. Nossa Senhora, concebida sem pecado original, Ela conhecia tudo quanto se passava dentro dEla. E no seu subconsciente nada era obscuro para Ela. Ela sabia de tudo. Mais ainda. O corpo concebido sem pecado original, não tem nada de vergonhoso ou de prosaico que tem o corpo humano hoje em dia. O corpo de Nossa Senhora não tinha nada desse vergonhoso ou desse prosaico. Nossa Senhora conhecia todos os movimentos internos de seu corpo. Conhecia e governava. Era porque Ela queria. Porque antes do pecado original o homem governava o seu próprio corpo inteiramente. Por exemplo, não tinha doença. Inclusive porque se ele quisesse fechar uma ferida, ele dava ordem e ela fechava. E pelo poder natural dele: Acabe com isso! Pronto, acabou. Ele tinha o pleno domínio sobre si.

E então, durante o período trans-celeste em que o Menino Jesus viveu no claustro da Virgem Maria e em que Ela foi dando do corpo dEla para a formação do corpo dEle, cada doação que Ela fazia era conhecida por Ela e Ela sabia que era para formar o corpo do Homem Deus. E correspondia a algo de simbólico que a alma dEla dava também para a formação do corpo do Homem Deus.

Depois, Ele nasceu. Os senhores podem imaginar o “emerveillement” [maravilhamento] dEla vendo o Menino de Jesus pela primeira vez, que Ela tinha pensado antes, que Ela tinha concebido, que estava ali, na manjedoura.

Qual foi o primeiro momento em que Ela soube que Ele ia ser crucificado? É um problema. Ela certamente soube pelas Escrituras, porque Ela tinha um conhecimento lucidíssimo da Escritura. E como Esposa do Espírito Santo, Ela não se tornou mestra infalível mas era pessoalmente infalível. Ela não caia mais em erro. De maneira que Ela sabia perfeitamente e entendia tudo das Escrituras, completamente, completamente.

Os senhores imaginem Ela lendo as Escrituras e dando com os trechos proféticos, em que Ela percebia que o tesouro que Ela estava gerando ia ser morto daquele jeito? Ou, então, vindo um Anjo e revelando? Ou ambas as coisas? Primeiro Ela lê, depois vem um Anjo e conta. E Ela resolve: “vai ser assim!”

E Ela acompanha a vida dEle inteira ciente do horror que vai se passar e a cada passo passando esse horror, até o momento da morte dEle na Cruz, em que o Padre Eterno pediu o consentimento dEla, como Mãe e Senhora do Filho, que Ela consentisse que Ele morresse. E Ela, no meio das agonias dEle e da alma dEla, disse mais uma vez: “Faça-se nEle segundo a Vossa palavra”. E Ele: “Voce magna” [brada, n.d.c.] exclama: “Consummatum est”. Quer dizer, Ela levou retilineamente o sacrifício até o fim. E no “Consummatum est” Ela recebe depois o cadáver nas mãos, dAquele que era a própria retidão e Ela viu o fruto do consentimento que Ela tinha dado. Era a Vida em morte, e era a Vitória esplendorosa diante do esmagamento completo. No meio de toda essa tristeza o júbilo dEla nascendo, quando Ela percebe que o Céu está se encobrindo e que Deus estava preparando as pompas fúnebres do Filho dEle e o castigo sobre a nação deicida.

E quando Ela sentiu o terremoto e quando Ela percebeu, soube, conheceu, que o véu do Templo se rasgou e que os Anjos todos saíram do Templo, dizendo: “saiamos daqui, saiamos daqui”; que Ela viu os mortos aparecerem para os justos e para os outros. E que Ela percebeu que o castigo se descarregava sobre o culpado, a retidão dEla se reacendeu. E dentro do luto tremendo dEla, foi a alegria dEla.

Agora, nenhuma alegria maior do que no Sábado Santo, quando Ele aparece a Ela, ressuscitado. Ninguém viu a não ser Ela. E Ela o via resplandecente. A justiça estava feita, a vitória estava ganha!

E muito melhor ainda do que São Paulo, Ela e Ele podiam dizer “Bonum certamen certavi; cursum consummavi”. Estava feito tudo. Os senhores podem imaginar a alegria dEla. Quer dizer, a vitória!

Depois, na Ascenção, Ele sobe, magnífico!

Ela envelhece, Ela morre: olha a retidão! Ela se deita no seu leito - mais um altar do que um leito! - e morre de uma morte que era mais um sono do que de uma morte. Suave... Mas Ela passou pela dilaceração. Mas também a Igreja chama isso “dormitio Beatae Maria Virginae” - a dormição da Bem-Aventurada Virgem Maria. Os senhores nunca ouviram falar na “morte de Nossa Senhora”; é a dormição de Nossa Senhora. Tão leve essa morte.

Mas a morte é tremenda, e dizer que ela é leve! É cheia de “senões”. Ela passou por mais essa!

Também depois, a Assunção. Magnífica! No Céu!

Os senhores compreendem o que foi a retidão.  Aí os senhores podem perceber o pulchrum da retidão. Podem amar o pulchrum da retidão e podem compreender como podem obtê-la.

Meus caros, é o que eu tinha a dizer sobre a retidão.

Os senhores saberão dizer, depois, como completar ou o que completar. Terá ficado apenas um “relâmpago” de tudo isso? Ou terá ficado uma “luz” acesa? Um “fósforo” que seja? Eu também não sei. Eu procurei lhes falar retamente sobre a retidão. E quero que nós encerremos pedindo hoje, em todas as orações desta noite, para rezarmos, para obter de Nossa Senhora essa virtude da retidão.


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