Plinio Corrêa de Oliveira
Nossa Senhora nos planos de Deus e Seu papel na História em geral, como dos indivíduos Sua excelsa glória
Sede da Saúde (em São Paulo), 7 de fevereiro de 1971, Reunião de Encerramento da SEFAC |
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A D V E R T Ê N C I A Gravação de conferência do Prof. Plinio com sócios e cooperadores da TFP, não tendo sido revista pelo autor. Se Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:
Sede da Saúde (em São Paulo), 7 de fevereiro de 1971, Reunião de Encerramento da SEFAC [Semana Especializada para a Formação Anticomunista]
[..] fazendo a conferência de encerramento dessa Semana de Estudos, eu não posso deixar, antes de tudo, de manifestar aos senhores a minha alegria de vê-los reunidos aqui e a esperança que eu tenho, ao mesmo tempo, de que os senhores perseverem no bom caminho por onde começaram a entrar com essa Semana de Estudos. É mais ou menos incalculável, na época em que nós vivemos, o alcance de uma escolha de caminho a essa altura da vida em que estão os senhores. O povo brasileiro é um povo que se caracteriza por uma propriedade, uma peculiaridade de espírito singular, que é a seguinte: em geral, os anos decisivos da vida de um homem são os anos em que os senhores estão vivendo. É mais ou menos na idade dos senhores que o homem escolheu seu caminho na vida. Se ele resolve ser um homem fiel à civilização cristã, fiel aos ideais da Igreja Católica, ele tem possibilidade de o ser a vida inteira. Se, pelo contrário, ele fecha essa porta na idade dos senhores, há mil possibilidades sobre uma, de esta porta nunca mais se reabrir. De maneira que os senhores estão numa encruzilhada e na encruzilhada mais importante de sua vida. Os senhores estão fazendo, no fundo, uma escolha, que é muito mais importante do que a escolha da carreira, a escolha do trabalho, a escolha do estudo, a escolha dos amigos, ou qualquer outra escolha. Os senhores estão fazendo a escolha fundamental da vida de um homem: é escolher por Deus, ou pelo demônio. Nessa época em que nós estamos, em que a Igreja Católica, a autêntica Igreja Católica, que não é a Igreja do progressismo, mas é a Santa Igreja Católica, Apostólica, Romana, entra em choque com todas as formas possíveis de corrupção e de mal. Nessa época em que nós estamos, nós vemos bem claramente que só há dois partidos: um partido de Deus e um partido do demônio. Tudo quanto há no mundo de bem ordenando, de lógico, de limpo, de digno de respeito, de admiração, tudo quanto há no mundo de composto, se se tomarem as consequências lógicas, conduz até Deus, conduz até à Igreja Católica. Pelo contrário, se nós tomarmos qualquer dessas coisas desordenadas que andam hoje pelo mundo, se nós formos tomar as consequências lógicas que daí se depreendem, se vai até o culto do demônio. Uma pessoa me contou que há hoje, em circulação, numerosas revistas pornográficas que falam diretamente do culto do demônio e apresentam em quadrinhos, em desenhos animados etc., apresentam o demônio como sendo o termo normal da pornografia. E falando até de uma época que não está longe - segundo essas revistas - na qual o demônio aparecerá de forma sensível para estimular os homens à imoralidade e para se fazer adorar. E quando nós consideramos esse auge de obscenidade, esse auge de concupiscência, de ganância, de incoerência, de confusão de espírito em que nós estamos, nós não podemos deixar de reconhecer que nós estamos caminhando para aquilo que é a civilização do demônio. No momento em que se encontram as orlas desses dois extremos opostos, em que os passos dos senhores estão para a escolha de um caminho ou de outro caminho, participar de uma Semana de Estudos como essa é uma verdadeira graça. Porque os senhores aqui tiveram a oportunidade de conhecer a coisa mais bela que há na terra. A coisa mais bela que há na terra não é a TFP. Os senhores tiveram a oportunidade de conhecer a verdadeira face da Santa Igreja Católica, Apostólica, Romana. Os senhores tiveram a oportunidade de conhecer a Igreja segundo a sua verdadeira doutrina, segundo seu verdadeiro espírito, segundo seus verdadeiros costumes, sua verdadeira finalidade dentro de um ambiente católico, infelizmente já tão trabalhado por toda espécie de germens, de deterioração e de confusão. Nesse momento se torna mais necessário do que nunca nós conversamos, nós falarmos alguma coisa a respeito da devoção a Nossa Senhora. Porque Nossa Senhora é a Medianeira de todas as graças, é através dEla que sobem a Deus todos os pedidos feitos pelos homens e é através dEla que vêm todos os favores que Deus concede aos homens, de maneira tal que ou nós nos aproximamos dessa Medianeira e nós obtemos os favores dEla, ou nós não seremos capazes de fazer acertadamente essa grande escolha que diante de nós está. Nós devemos dizer, pois, nessa conferência de encerramento, algumas coisas a respeito de Nossa Senhora. E eu vou tentar expor isso aos senhores, entrando até um pouco fundo no terreno da contemplação, mas com o intuito de fazer os senhores compreenderem bem o papel de Nossa Senhora dentro da doutrina católica. Para que os senhores compreendam bem esse papel, é preciso que os senhores compreendam, antes de tudo, o papel de Nossa Senhora nos planos de Deus. E que os senhores entendam bem quem é Nossa Senhora, qual é a fisionomia espiritual de Nossa Senhora, para que depois os senhores compreendam o papel que Ela tem dentro da doutrina católica. Qual é o papel de Nossa Senhora nos planos de Deus? Quando os senhores observam em torno de si a natureza – eu digo a natureza material - quando os senhores observam os bonitos panoramas, quando os senhores observam a mudança de cores e de luz durante o dia, quando os senhores observam o que for, os senhores notam que na natureza é frequente que formas de beleza, as mais excelentes, se produzem por meio de tonalidades intermediárias. Assim, os senhores tomem, por exemplo, o arco–íris. O arco–íris é composto de uma série de tonalidades intermediárias, de maneira tal que a beleza dele vem do fato dele ter várias cores. Mas, de outro lado, vem também do fato de não haver nenhuma cor que está junto à outra, de modo muito brusco, que está junto à outra de modo a espantar. Cada cor do arco–íris é um tanto parecida, um tanto análoga com a cor que lhe vem imediatamente depois. Essa, por sua vez, é análoga a uma terceira. E quando a gente contempla os dois extremos de um fragmento do arco–íris, a gente percebe que harmoniosamente, através de cores intermediárias, Deus fez a ótica humana passar de um extremo de uma cor para o extremo da outra cor. E que é nessa conjugação dos dois extremos, através de formas intermediárias de beleza, é nessa conjugação que está verdadeiramente a beleza do arco–íris. Isso os senhores poderão encontrar numerosas vezes em plantas. Os senhores tomem as pétalas de certas plantas, ou então o caule de certa planta, quando é muito bonito. Os senhores notam, por exemplo, que em algumas plantas a parte central, a corola, é de uma cor, as pétalas mais próximas são de uma cor vizinha a essa. À medida que vai se abrindo a roda das pétalas, as cores vão sendo mais diferentes. Quer dizer, há uma gradação. O princípio da gradatividade é um dos princípios mais belos da natureza, segundo o qual todas as coisas se dispõem em graus. Não há saltos, não há choques, não há coisas bruscas. Há uma harmonia feita de coisas diversas que se justapõem e que nos fazem passar de um extremo até outro extremo. É por isso, por exemplo, que os joalheiros dão muita importância, quando se trata de avaliar colares. Eles dão muita importância ao princípio de gradação para certo tipo de colares. Os senhores já devem ter visto, com certeza, senhoras com colares de pérola, em que as pérolas bem pequenas, que ficam junto ao fecho, vão aumentando, aumentando sucessivamente até dar numa pérola bem grande. É preciso que a diferença de cada pérola para outra seja proporcional a desta para a pérola seguinte. E que a grande pérola central tenha uma beleza, um tamanho, que de algum modo represente, englobe, os tamanhos de todas as outras pérolas vizinhas. É a aplicação, a um colar de pérolas, do princípio da gradatividade. São os graus sucessivos, harmônicos, que conduzem do menor ao maior. Ou, se os senhores quiserem, que conduzem do maior ao menor. E esta beleza faz com que os joalheiros, muitas vezes, deem mais valor a um colar de pérolas com pérolas pequenas e grandes que formam uma gradação, do que um colar onde todas as pérolas são grandes e iguais. Porque é mais difícil encontrar uma série de pérolas com tamanhos inteiramente adequados e há uma forma de beleza mais artística e mais especial nessas pérolas que formam, assim, uma coleção, do que um conjunto de pérolas redondas circundando o pescoço de uma senhora. Esse princípio, que então eu repito, é o princípio da gradatividade, esse princípio tem, como outro aspecto, a ideia de que em todas as coisas graduadas e conjuntas, deve haver uma máxima e deve haver muitas mínimas. E que, em torno dessa coisa máxima, que no caso do colar de pérolas é a pérola grande, se ordena a beleza de todas as outras pérolas. Os senhores não conceberiam, por exemplo, um colar de pérolas onde a pérola grande de uma senhora ficasse aqui, por exemplo. Seria uma coisa caricata. Ou está aqui, ou não está em nenhum lugar. Porque ela deve ser o fecho normal, para ela deve convergir tudo. Toda a beleza do colar deve ir para a pérola grande. Não é verdade? Quer dizer, tudo se ordena em rumo ao maior. Quando os senhores examinam o universo, não mais dos seres inanimados, nem das plantas, nem dos animais, mas quando os senhores examinam o universo dos seres intelectuais, que têm inteligência e que estão, então, absolutamente acima dos animais e dos outros, os senhores observam que existe uma gradação assim: que há os seres intelectuais, os seres dotados de inteligência, que têm um espírito. Esses seres dotados de inteligência, segundo a doutrina católica, têm toda uma gradação. Depois os senhores têm os seres dotados de matéria e os senhores têm toda outra gradação. Os senhores, entre os seres dotados de espírito, os senhores têm o homem. Por cima do homem os Anjos. Há uma quantidade incalculável de Anjos, mas é certo, segundo São Tomás, que o número de Anjos é muito maior do que de todos os homens que foram criados até agora e que existirão até o fim do mundo. Os senhores têm os Anjos. Mas os senhores sabem que os Anjos são distribuídos em nove hierarquias, em nove coros, que são, se quiserem, nove categorias de Anjos. Mas dentro dessas categorias de Anjos não há nenhum Anjo igual ao outro. Cada Anjo tem um superior e um inferior. De maneira que os senhores, para representarem o mundo angélico, os senhores deveriam imaginar uma fileira fabulosa de espíritos, cada vez mais lúcidos, cada vez mais fortes, cada vez mais virtuosos, cada vez mais próximos de Deus, até chegar aos supremos Serafins que veem Deus face a face e que, extasiados com a beleza de Deus, “velam as suas faces”, diz alegoricamente a Escritura – porque Anjo não tem face, mas é um modo de dizer - e ficam deslumbrados porque eles têm uma visão mais clara e mais direta de Deus do que todos os outros Anjos. E repetem eternamente o Sanctus: Sois Santo, Santo, Santo, Senhor Deus dos exércitos. Aquela adoração muda e, ao mesmo tempo, continuamente feita de exclamações, no mais alto de toda a série dos Anjos. Bem, então os senhores têm que de uma fileira que vai, de nós, pobres homens, que também entre nós temos uma hierarquia. Porque Deus escolheu uns para serem mais santos do que outros. Escolheu uns para O conhecerem melhor do que outros, embora tenha escolhido todos para serem santos e para O amarem. Os senhores têm então uma hierarquia dos homens, depois a hierarquia angélica, depois toca em Deus. O homem é um misto de espírito e matéria. Nós temos espírito e matéria. Depois os senhores têm os puros espíritos, mas espíritos criados. Por cima dos puros espíritos e dos espíritos criados, os senhores têm o espírito perfeito, absoluto, eterno, incriado, criador ele mesmo de todas as coisas e que é Deus Nosso Senhor. Os senhores têm o princípio da gradatividade admiravelmente aplicado. Agora os senhores olham, não do homem para cima, mas do homem para baixo. Os senhores, como homem, não olhem mais para o homem, mas olhem para o macaco; não olhem mais para o Anjo e olhem para o macaco. E nós quase diríamos - seria um exagero - que nós estamos para o Anjo como o macaco está para nós. Porque o macaco é vivo, ele tem até um corpo parecido com o nosso. Esses loroteiros que dizem que o homem descende do macaco afirmam uma imbecilidade jamais demonstrada. É evidente. O fato de uma coisa parecer-se com outra, quer dizer que descende da outra, é uma coisa que não tem sentido. Afinal de contas, nós olhamos para o macaco, a gente quase diria que é um homem sem alma. Portanto burrão, sem jeito, sem elegância, olhando de modo esquisito, dando saltos, aquilo não é dominado pelo espírito. Ele tem uma alma material, ele não tem uma alma espiritual, ele tem um princípio de vida material. Ele tem vida. Mas os bichos têm uma vantagem. Eles não têm inteligência, mas eles têm um conhecimento instintivo do que existe fora deles. Então os senhores consideram, por exemplo, a superioridade de um animal em relação a uma planta, é simplesmente fabulosa! Por este simples fato de que [o animal] tem sensibilidade e a planta não tem sensibilidade. A planta não sente e o animal sente. O animal, por isso, percebe o que se passa fora dele. Não sei se os senhores já se deram ao trabalho de examinar, por exemplo, um gato andando numa goteira. O mundo de finura e de sensibilidade que o gato põe nisso. Cada passo é dado com critério, ele olha, olha em volta de si, quando a coisa não é muito segura ele não se precipita, examina, move um pouco a orelha... quando ele está muito preocupado ele mia. Ele só se joga quando ele percebe que pode jogar. Às vezes é de alturas vertiginosas, ele dá o pulo, cai com naturalidade e sai andando como se não tivesse acontecido nada. É uma sensibilidade muito aguda, muito perfeita que o gato tem. Para algumas coisas, mais perfeita do que a sensibilidade do homem. Bem, os senhores olham uma pobre planta atarraxada no chão. A gente compara, por exemplo, um gato e uma árvore colossal, que deita galhos enormes com folhagens, nela pousam os pássaros, ela cobre toda uma extensão de uma planície. A gente olha e diz: que glória! É glória, mas que cativeiro! Ela está amarrada no chão pelas raízes, não é capaz de se defender contra nada, é uma prisioneira do solo. E o próprio solo do qual ela suga o que viver é a prisão onde ela está até morrer. Ela é incapaz de qualquer movimento que seja verdadeiramente defensivo. Há uma coisa à maneira de sensibilidade, que é o heliotropismo das plantas. Algumas plantas que procuram o sol. Parece que delas a mais famosa é o girassol. Mas não é verdadeiramente sensibilidade. É uma coisa parecida com a sensibilidade, mas os cientistas negam que seja sensibilidade. O que caracteriza a diferença entre o animal e a planta é que a planta não tem sensibilidade. Os senhores peguem o brilhante mais estupendo, a pérola mais magnífica; peguem depois a folha de alface mais ordinária que possa haver. A gente olha para o brilhante, é um preço enorme, é uma beleza extraordinária! A folha de alface tem uma coisa que deixa o brilhante longe: ela tem vida... O brilhante é morto. O que é o brilhante? É uma coisa morta. Qualquer ervinha, qualquer graminha que existe aí pelo chão vale incomparavelmente mais do que o brilhante. Não no sentido de mercadoria. Eu digo no sentido de valor de ser. Um ser que em si mesmo tem um valor enormemente maior do que o do brilhante. Qual é esse valor? É a vida. Quer dizer, então os senhores têm uma gradação. Essa gradação é: - os seres mortos; - os seres vivos sem nenhuma forma de conhecimento, que são os vegetais; - os seres vivos com conhecimento instintivo, que são os animais; - os seres vivos com conhecimento instintivo e, ao mesmo tempo, com conhecimento intelectivo, que são os homens, mas ainda imersos na matéria; - e por cima do homem, o Anjo, que já paira acima da matéria, que está enormemente acima da matéria; esse Anjo já está em outra categoria; - depois, dos Anjos se vai até Deus. Os senhores percebem que há, portanto, uma espécie de gradação que vai da última pedra, da poça de lama mais ordinária até Deus Nosso Senhor. E vai, por meio de uma gradação magnífica, em que há uma hierarquia e uma harmonia extraordinária. Quando nós nos perguntamos qual é o mais alto desses seres, nós devemos naturalmente dizer que o mais alto dos seres é um Serafim. Porque ele está no mais alto. Mas as obras de Deus são cheias de subtileza, porque Deus sendo a própria inteligência, Ele é a própria subtileza e tudo quanto Deus faz é enormemente subtil. E entre as subtilezas da obra de Deus está essa: é verdade que no alto da hierarquia de valores nós temos os Serafins, mas é verdade também que o homem apresenta uma qualidade especial: só o homem contém dentro de si o universo inteiro. O Anjo é só espírito. Nós temos o universo inteiro, porque nós temos espírito como os Anjos, temos corpo como os animais, temos vida vegetativa como as plantas e nós temos materiais dentro de nós, que são materiais tirados do mundo mineral. De maneira que o homem é uma espécie de miniatura do universo. E se é verdade que o Anjo é superior a nós por ele ser só espírito, nós poderíamos - forçando um pouco a nota - responder a um Anjo, depois de lhe ter feito, evidentemente, uma profunda reverência a que ele tem direito, responder a um Anjo: é verdade, vós sois superior a mim porque vós sois só espírito; eu, entretanto, sou superior a vós porque não sou só espírito. E não é um jogo de palavras. É um aspecto, é um aspecto “minor”, é um aspecto menor, mas é um aspecto da realidade. E um aspecto da realidade, os senhores vão ver daqui a pouco, no plano da Criação a enorme importância que teve, o aspecto da realidade é esse: cada um dos senhores tem dentro de si uma espécie de súmula do universo inteiro. E se é verdade, como disse a Bíblia e, portanto, é verdade, que Deus quando criou todos os seres repousou considerando a todos e que viu que cada um era bom, mas que o conjunto era ainda melhor do que cada um, nós poderíamos dizer a um Anjo: vós sois incomparavelmente mais nobre do que nós, enquanto puro espírito; o conjunto em nós se representa mais adequadamente do que em vós. Depois disso, grande reverência, a verdade está dita... É um aspecto da verdade, é um aspecto menor da verdade, é um aspecto importantíssimo da verdade. Os senhores sabem qual foi o resultado dessa dignidade excepcional do homem? É que mesmo antes de ter havido o pecado original, mesmo antes do pecado original Deus já tinha assente fazer com que a Segunda Pessoa da Santíssima Trindade se unisse hipostaticamente a uma criatura. E essa criatura não era um Anjo, essa criatura deveria ser um homem. E por que deveria ser um homem? Deveria ser um homem, não necessariamente, mas conviria que fosse um homem porque - dizem os teólogos - porque o homem contém toda a criação. E Deus, unindo-se a um homem e não a um Anjo, honrava de modo especial todos os graus da criação. E é por causa disso que Deus “se fez carne e habitou entre nós”. É tão grande essa dignidade de nós sermos um compêndio de toda a criação, que motivou essa honra especial que o Verbo de Deus quis nos fazer. Ele “se fez carne e habitou entre nós”. E Ele se teria feito carne e teria habitado entre nós ainda que não tivesse havido pecado original, para, na sua misericórdia, honrar todas as formas da criação. E então a gente vê como é belo o que Doutores e teólogos dizem que quando Nosso Senhor Jesus Cristo nasceu, houve uma alegria em toda a natureza. A natureza toda tomou um esplendor novo. Os astros brilharam com mais força, o ar se tornou mais puro, as águas das fontes se tornaram mais cristalinas, as plantas tomaram mais viço, os animais se alegraram e tomaram mais saúde. Os homens tomaram mais esperança e alguma coisa de melhor se moveu dentro deles. Por quê? Porque vinha ao mundo Aquele que ao mesmo tempo que era Deus e tinha ligado a si todo esse conjunto, toda essa fileira que vai de alto a baixo, desde Deus Nosso Senhor, até a última das criaturas. Agora, então nós temos a seguinte visualização: Nós temos Deus. Nós temos no alto, junto a Deus, a humanidade santíssima de Nosso Senhor Jesus Cristo, ligada hipostaticamente a Deus. E depois toda a criação que está compendiada em Cristo, que está representada por Nosso Senhor Jesus Cristo e do qual decorre, portanto, uma glória e uma honra especial para toda a natureza. Quando nós olharmos a menor das pedras, quando nós olharmos o menor dos bichos, sobretudo quando nós olharmos o menor ou o maior dos homens, nós devemos pensar isso: ele, a natureza dele está de algum modo presente em Nosso Senhor Jesus Cristo. E essa natureza está ligada hipostaticamente a Deus e está no maior da glória, no mais alto do Céu, no oceano de esplendor de santidade da Santíssima Trindade! Então, nós temos o Criador, o Homem-Deus e depois todas as criaturas. Quando os senhores examinam esse plano, os senhores verificam que o espírito humano, sequioso de ordem, sequioso de razoabilidade em todas as coisas, que o espírito humano começa a pensar e se pergunta se não falta algo dentro disso. Porque entre Deus e a criação há o Homem-Deus, inteiramente Deus como as outras pessoas da Santíssima Trindade, tão homem como cada um de nós. Não tem dúvida. Mas fica um tal abismo entre Nosso Senhor Jesus Cristo, Homem-Deus e a pura criação, que nós podemos nos perguntar se na ordem das coisas não deveria haver outra coisa, se não deveria haver um outro ser que, de algum modo, pelo menos preenchesse esse hiato. Um ser que fosse não mais Homem-Deus, mas puro homem. E que estivesse tão próximo de Deus, que estivesse mais alto do que todos os homens, que estivesse tão próximo de Deus, que estivesse mais alto do que todos os Anjos. Quer dizer, nós compreendemos que falta alguma coisa. Esse ser tão alto, que é infinitamente inferior a Deus, mas ao mesmo tempo não é infinitamente superior aos homens, mas é insondavelmente superior a qualquer homem, insondavelmente superior a todos os homens que houve, que há e que haverá até o fim do mundo, esse ser é precisamente Nossa Senhora! Nossa Senhora representa o preenchimento desse vácuo nesse conjunto. Ela foi colocada numa altitude inimaginável e insondável. Ela foi colocada numa plenitude de glória, de perfeição e de santidade, de que ninguém pode ter nem um pouco uma ideia. Essa é Nossa Senhora colocada acima de todas as criaturas. Ela tem acima de Si apenas Deus. Infinitamente inferior a Ele, porque tudo o que existe é infinitamente inferior a Ele. Mas entre Deus e Ela não há ninguém, a não ser o Divino Filho dEla, que é Nosso Senhor Jesus Cristo, Deus. Aí os senhores têm Nossa Senhora como ponta da pirâmide de toda a criação. Os senhores me dirão: mas Dr. Plínio, o senhor falou dos homens, os Anjos ficaram de fora. Os Anjos não ficaram de fora; eles são obras primas de Deus. Nem podiam ficar de fora. Mas acontece que Nossa Senhora, sendo Mãe de Jesus Cristo, Ela foi verdadeira Esposa do Espírito Santo. Os senhores sabem que por um mistério, também ele insondável, Nossa Senhora gerou virginalmente a Nosso Senhor Jesus Cristo. Ela foi Virgem antes do parto, durante o parto e depois do parto. Este é um dogma de fé. A Deus tudo é possível e aquele para quem tudo é possível, é possível fazer essa maravilha. Ela concebeu por uma ação do Espírito Santo que foi, portanto, o verdadeiro Esposo dEla. Foi o verdadeiro Criador ou gerador do Filho dEla. Para Ela estar à altura dessa dignidade de Esposa do Espírito Santo, Ela tinha que ser mais do que os Anjos. E então os senhores têm como Ela, uma criatura puramente humana, essa criatura puramente humana é mais, entretanto, do que todos os Anjos. Não é só a humanidade de Nosso Senhor Jesus Cristo que é mais do que todos os Anjos; é Aquela que teve a glória de ser a Mãe da Segunda Pessoa da Santíssima Trindade, a Esposa da Terceira Pessoa da Santíssima Trindade, portanto, a Filha predileta da Primeira Pessoa da Santíssima Trindade, que é o Padre Eterno. A criatura que foi escolhida para ser Mãe de Deus Filho, Esposa de Deus Espírito Santo é uma criatura que para Deus Padre era a mais eleita das criaturas. E então os senhores têm Nossa Senhora acima dos próprios Anjos e incomparável com qualquer outro ser. E aí os senhores têm o tríplice título de glória de Nossa Senhora: Filha predileta, entre todas as filhas, do Padre Eterno; Mãe daquele que é o Filho do Padre Eterno, Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo; Esposa do Divino Espírito Santo. Nenhum título, de nenhum jeito, poderia se equiparar ao de Nossa Senhora, a não ser o do próprio Homem-Deus. Ele é superior a Ela. O resto, nada pode se comparar com Ela! É por causa disso que Dante, na Divina Comédia - que muitas pessoas têm dito que é a “Suma Teológica de São Tomás de Aquino posta em verso” – Dante, na Divina Comédia, faz Beatriz percorrer os vários círculos dos bem-aventurados no Céu. Depois de ter passado pelo inferno, de ter passado pelo purgatório, percorre os vários círculos dos bem-aventurados no Céu. E então quando chega nos mais altos Serafins, no mais alto do Céu, Dante, conduzido por Beatriz, começa a ver a glória de Deus que aparece. É uma luz difusa, mas que os olhos dele não conseguem sustentar. Mas então ele vê, acima dos Anjos, mais um ser: ele vê Nossa Senhora. E então Nossa Senhora sorri para ele e ele olha para dentro dos olhos de Nossa Senhora. E dentro dos olhos de Nossa Senhora ele vê algo da luz de Deus. Acabou-se a Divina Comédia... Depois da pessoa ter posto os olhos nos olhos celestes e virginais de Nossa Senhora, não tem mais nada nessa terra que olhar... É só no Céu, em que verá Deus face a face. E está acabado! O olhar humano chegou tão alto quanto podia chegar. O olhar humano fitou o olhar puríssimo, o olhar sacralíssimo, o olhar sumamente régio, o olhar indizivelmente materno de Nossa Senhora. E então está tudo acabado. A Divina Comédia termina na mais alta das cogitações humanas. [aplausos] Esta concepção nos faz ver, então, que o princípio da gradatividade, enunciado por mim no começo da conferência, comporta uma aplicação excelente em Nossa Senhora. Porque Ela é o grampo de ouro, ou de um material mais precioso ainda do que o ouro, o grampo de ouro que liga toda a criação a Nosso Senhor Jesus Cristo. É Aquela que está colocada no alto de toda a criação e que contém em Si toda a beleza das meras criaturas. Nosso Senhor Jesus Cristo já não é uma mera criatura. Porque Ele tem de criado o corpo e a alma humanas; Ele tem de incriado a Sua divindade. Qual é o papel dessa criatura tão excelsa em relação a nós? Qual é a missão de Nossa Senhora na história? Na história de cada homem, na história da Santa Igreja Católica, Apostólica, Romana, ou seja, no centro da história da humanidade? Porque o centro da história da humanidade é a História da Santa Igreja Católica. A resposta é a seguinte. Nossa Senhora foi e é Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo. E o Evangelho nos conta que Ela estava em oração quando apareceu diante dEla, ou apareceu a Ela o Arcanjo São Gabriel e lhe perguntou se Ela queria ser a Mãe do Verbo de Deus, que é Deus, na sua infinitude inexprimível por nós, Deus, entretanto, trata com muito respeito cada uma de Suas criaturas. E no momento de dar a uma simples criatura essa honra tão extraordinária, que era a de ser a Mãe do Verbo, Ele perguntou a Ela se Ela queria. Notem bem o pormenor: Ela estava rezando, em primeiro lugar. Segundo lugar: Ele perguntou a Ela se Ela queria. O mundo estava num “mare magnum” de pecado, de desordem, de caos, quando Nossa Senhora estava rezando. Quatro ou cinco mil anos de história da humanidade não tinham sido senão uma sucessão de impérios que se erguem e que rolam para o chão, ou que se estagnam numa estagnação embolorada e que não vão para a frente. Uma sucessão de crimes, uma sucessão de abominações, uma sucessão de fracassos. Os poetas latinos daquele tempo - os senhores sabem que Roma, era a maior potência do mundo mediterrâneo, que era tida como o centro da terra naquele tempo -, os poetas latinos eles mesmos cantavam dizendo que o orbe estava exausto, não aguentava mais, se sentia velho e ninguém mais conseguia carregar o fardo da vida. Era uma situação parecida com esse mundo contemporâneo, o mundo contemporâneo pior todavia. Bem, Nossa Senhora foi mandada por Deus à terra, foi criada para que Ela pedisse a Encarnação do Verbo, para que viesse o Salvador que por meio de Sua Paixão e Cruz haveria de resgatar todos os homens. E haveria de fundar uma instituição, que é a Igreja Católica, que dispensaria a graça de Deus a todos os homens em proporções tão abundantes, que os homens afinal pudessem se tornar, frequentemente, facilmente virtuosos. E que então a verdade, a beleza, o bem, a grandeza, sobretudo o amor de Deus, que é o ápice de tudo isso, que tudo isso pudesse constituir-se no mundo e elevar-se até o Céu. Nossa Senhora foi criada para pedir isso. Porque nenhuma criatura humana tinha valor e virtude para pedir isso. Ela teve especialmente a missão de pedir isso. E Ela estava em oração pedindo a Encarnação do Verbo, quando o Anjo veio anunciando a Ela que o pedido dEla estava atendido. Ela não pedia para ser Mãe de Deus. Na sua humildade Ela julgava que Ela nem de longe estava na altura de ser Mãe de Deus. Ela queria ser a escrava da Mãe de Deus, a serva da Mãe de Deus. No entusiasmo que Ela tinha por essa criatura que viria e que seria a Mãe do Messias, quando veio o Anjo e disse a Ela que Ela era a escolhida. Mas ao mesmo tempo em que Ele disse que Ela era a escolhida, significou a Ela que Ela deveria suportar as dores e os padecimentos da Redenção. Que o Filho dEla sofreria como nunca nenhum homem tinha sofrido e nunca haveria de sofrer até o fim do mundo. E que Ela teria que carregar junto esse sofrimento. Nosso Senhor Jesus Cristo teria a Paixão, “passio”, o sofrimento. Ela teria a “cum passio”, a compaixão, o sofrimento com, o co-sofrimento com o Homem mais sofredor da história, que era o Homem-Deus que haveria de nascer dEla. E Ela, por amor aos homens, para que os homens pudessem ser salvos e dar glória a Deus, por amor a Deus, portanto, Ela consentiu em ser Mãe de Deus e em suportar esse tremendo sofrimento que foi a Paixão. Os senhores podem imaginar, para não me estender demais sobre esse ponto, os senhores podem imaginar o que Nossa Senhora sofreu durante a Paixão? Os senhores tomem qualquer mãe, dessas mães que andam por aí. Os senhores imaginem o que essa mãe sentiria se ela fosse andando pela rua e, de repente, ouvisse um alarido; se aproximasse e visse seu filho chicoteado, chibatado, deitando sangue por todos os poros, com uma dor indizível, carregando uma cruz, objeto da selvageria de um populacho brutal, vil, dando risada dele, dizendo atrocidades, escarrando nele e levando-o, junto com essa cruz, para ser crucificado e para morrer no mais horroroso dos martírios no alto de uma montanha. Essa mãe desmaiaria, essa mãe ficaria psicótica, essa mãe ficaria louca, conforme o caso ela poderia morrer. Nossa Senhora queria Nosso Senhor Jesus Cristo incomparavelmente mais bem do que qualquer de nossas mães nos quis a nós. Em primeiro lugar, porque Ela é a melhor Mãe que houve. Mas em segundo lugar, porque Ela teve um Filho, que os senhores não duvidarão, é incomparavelmente melhor do que nós como filho... Os senhores podem imaginar toda a graça e encanto de Nosso Senhor como Filho? Todo o respeito, toda a ternura, toda a veneração, toda a delicadeza, toda a hombridade, toda a grandeza? O que é que podem ter sido esses trinta anos de intimidade de Nossa Senhora com Ele, em que Ela viu a Ele crescer em graça e santidade diante de Deus e dos homens. E amou, com amor perfeito, cada estágio da perfeição dEle que ia se desenvolvendo? Qual era o abismo de adoração no qual Ela se desfazia em relação a ele? Agora, Ela ver esse Filho, o próprio Deus, Santo como ninguém foi santo, é a própria santidade, tratado assim por aquele populacho? Pois bem, quando Ela teve o encontro com Ele durante a Via Dolorosa, quando Ela O abraçou, quando Ela O osculou, quando Ela teve a glória enorme de ter o Seu rosto tinto com o Sangue divino e a Sua túnica virginal tinta também com o Sangue divino, quando Ela recolheu os gemidos dEle... Quando depois Ela foi ao lado dEle subindo até o alto do Calvário, quando Ela viu os estertores finais dEle e Ele gritar “Eli, Eli, lammá sabactani - Meu Deus, meu Pai, por que vós Me abandonastes?” E depois dizer: “Está tudo terminado”, inclinar a cabeça e deitar o espírito. Quando Ela viu tudo isso, os senhores podem imaginar o que Ela sofreu? Pois bem, nesse momento em que Ela sofreu isso de um modo indizível, com uma serenidade tão perfeita que se conservou de pé o tempo inteiro ao pé da Cruz; com uma tranquilidade, uma dor, uma resignação, uma força que é o modelo da criatura humana posta no sofrimento. Quando aconteceu isso a Ela, Ela, até o último momento, Ela dizia ao Padre Eterno: Eu consinto em que aconteça isso ao Meu Filho, para que Ele salve as almas dos homens, para Vós, ó meu Pai, dar a glória devida e para que eles gozem da felicidade eterna junto a Vós no Céu. Foi esse sofrimento que Ela resolveu aceitar e que Ela aceitou e aceitou por cada um de nós. Dizem os teólogos que, do alto da Cruz, Nosso Senhor, cuja inteligência era infinita, conhecia todos os homens pelos quais Ele havia de derramar o Sangue. E que Ele, individualmente, via todos os pecados que esses homens cometiam, sofria por todos esses pecados e, ao mesmo tempo, derramava o Seu Sangue e dava Sua vida para que os que estavam chamados para o Céu, para o Céu acabassem indo. Quer dizer, a mim, do alto da Cruz, Ele viu. A mim, com as minhas imperfeições, com os meus defeitos, com as minhas ingratidões. A cada um dos senhores, nominalmente falando, Ele conheceu como se conhecesse só esse homem. E cada um dos senhores esteve presente no alto da Cruz, como se fosse só esse homem. E por cada um de nós Ele resolveu dar a Sua vida, e ofereceu a Sua vida e ofereceu todas aquelas dores, de tal maneira que se Ele tivesse que sofrer tudo quanto Ele sofreu apenas com esse objetivo, Ele teria sofrido. Quer dizer, só por mim Ele teria sofrido isso, só por cada um dos senhores Ele teria sofrido isso. Eu creio que para que a compaixão de Nossa Senhora fosse completa, Ela também nos conheceu a cada um de nós naquela ocasião. E que Ela rezou individualmente, um por um, em favor de cada um de nós. De maneira tal que naquela hora em que o Verbo de Deus via aquela multidão de pecados que se desprendia dos homens ao longo dos séculos, Ela pedia perdão para cada um e Ele ia perdoando a cada um pelo pedido dEla, porque Ela sendo inocente, Ela merecia o perdão que nós não merecíamos. E foi por causa do pedido dEla que cada um de nós obteve de ser batizado, obteve de conhecer a Igreja Católica, obteve de receber os sacramentos, obteve a devoção a Ela, obteve de ser fiel à Igreja Católica nessa tormenta e nessa tempestade. E pelo favor dEla conseguirá o Céu. Aí está o papel de Nossa Senhora, como nossa Mãe e nossa Advogada. Mãe de Cristo, Ela foi Mãe de todos aqueles que nasceram para a graça de Nosso Senhor Jesus Cristo. Mãe de Nosso Senhor Jesus Cristo, Ela se tornou Mãe dos pecadores. E Ela desempenhou um papel que, de algum modo, o próprio Deus não poderia desempenhar. Porque Deus é juiz. Deus ofendido, Deus ultrajado tem que castigar. Mas Ela é Mãe e os senhores sabem que as mães não têm o papel de julgar. Elas são advogadas. A mãe é naturalmente a advogada do filho. E por mais miserável que seja o filho, por mais imundo, mais asqueroso, mais crápula que seja o filho, em relação à mãe, a mãe perdoa e a mãe pede a Deus que o perdoe também. A mãe está solidária com o filho, até quando o pai o abomina completamente. E é por isso que a Escritura diz: “a benção de Deus constrói uma casa e a maldição de uma mãe a arrasa até os alicerces”. Porque quando um homem chega a ser amaldiçoado por sua mãe, acabou-se. Mas Nossa Senhora é a Mãe supremamente boa, que reza por cada um de nós e que considerando que aquelas chagas que estavam em Nosso Senhor, foram feitas em parte por meus pecados, Ela pediu a Ele: Meu Deus, Meu Filho, pela Minha inocência, pela Minha virgindade, pelo amor que vós sabeis que eu Vos tenho, eu Vos peço por ele. E essa chaga que Vós sofreis por causa dele, Eu Vos peço em nome dessa chaga, que o perdoeis a ele. E assim cada um de nós foi perdoado. Então, foi por meio de Nossa Senhora que Deus veio a nós no nascimento, foi por meio de Nossa Senhora que nós viemos a Deus no momento da Cruz, no momento da Paixão, no momento da Redenção. Isso explica que, depois de morto Nosso Senhor, Nossa Senhora tenha continuado a ser a grande intercessora. Nossa Senhora tenha continuado a ser a grande intermediária, que nunca dos nuncas abandonou nenhuma espécie de homem. A tal ponto nunca abandonou nenhum homem, que todos os teólogos dizem o seguinte: São Pedro, como os senhores sabem, cometeu um pecado horroroso, quando ele abandonou Nosso Senhor Jesus Cristo no Horto das Oliveiras. E ele, que era o chefe da Igreja, fugiu. E depois, quando ele negou Nosso Senhor três vezes e depois o galo cantou, Nosso Senhor olhou para ele. Nosso Senhor olhou para ele e ele começou a chorar e fugiu. Dizem os teólogos que ele foi correndo procurar Nossa Senhora. E que como ele se voltou para Nossa Senhora, Ela teve pena dele e obteve o perdão dele. Ele não se desesperou, ele se salvou. São Pedro voltou-se para Nossa Senhora e foi perdoado. Mas o pecado de São Pedro de nenhum modo foi horroroso, por mais horrendo que tenha sido, do que o pecado do pecador por excelência. Não se pode dizer o pecador com “p” maiúsculo, porque essa é uma palavra que não comporta maiúscula. Mas se diria o pecador com “p” porco. É o “mercador péssimo”, é Judas Iscariotis, que vendeu Nosso Senhor por trinta dinheiros. Pois bem, os teólogos dizem que se Judas tivesse ido procurar Nossa Senhora, Ela o teria recebido com toda bondade, com toda misericórdia, teria obtido o perdão dele. E que Ela rezou para ele ir falar com Ela. Mas que ele recusou todas as graças e se precipitou no inferno por meio da corda maldita, na qual ele se enforcou. A tal ponto chega a misericórdia de Nossa Senhora. Os senhores veem Nossa Senhora que reúne os Apóstolos em torno de Si depois que Nosso Senhor morreu. Que depois está junto a eles em Pentecostes, quando vem o Espírito Santo. Que acompanha a Igreja nos primeiros passos de Sua vida e que depois, ao longo de toda a existência da Igreja, é a grande Protetora da Igreja. Presente nas batalhas onde os guerreiros católicos derrubaram os exércitos dos inimigos anticatólicos. Presente nas lutas dos povos fiéis contra os povos infiéis. Presente na luta de cada homem contra seus defeitos. De maneira que noite e dia todo homem luta contra seus defeitos, luta para adquirir maiores virtudes, noite e dia, ainda que nós não nos lembremos de Nossa Senhora, Nossa Senhora está se lembrando de nós do alto do Céu. E Ela está pedindo por nós, com uma misericórdia que nenhuma forma de pecado pode esgotar. É só nós nos voltarmos para Ela, que Ela cheia de bondade nos atende e nos limpa a alma, nos dá força para praticarmos a virtude e nos transforma de pecadores em homens bons. Aqui está a missão específica de Nossa Senhora: o homem pecador é pecador por maldade, mas ele peca por maldade porque é duro praticar a Lei de Deus. Mas porque é duro praticar a Lei de Deus, Nossa Senhora nos dá forças proporcionadas a isso. Nós nunca faltamos de forças para os sacrifícios necessários para praticar a Lei de Deus, desde que nós peçamos a Nossa Senhora. Aqueles que se voltam a Nossa Senhora recebem tudo! Aqueles que se afastam de Nossa Senhora não recebem nada. Nossa Senhora é chamada pela Igreja a “Porta do Céu”. É por essa porta que todos os homens conseguem as graças. É por essa porta que todas as orações dos homens chegam a Deus. É por essa porta também que todas as graças de Deus baixam para os homens. Tudo vem por intermédio de Nossa Senhora. São Luís Grignion de Montfort, numa comparação magnífica, usa essa imagem. Ele diz: imagine uma criancinha do povo que não tem outra coisa a oferecer para sua mãe senão uma maçã. Na Europa, maçã é uma fruta completamente popular. A criança não sabe como fazer e dá para a mãe do Rei. A criança quer oferecer essa maçã ao rei, mas não tem coragem, porque é um presente muito comum. Então pede à mãe do rei que ofereça ao rei essa maçã. A mãe do rei coloca a maçã numa bandeja de prata e diz ao rei: meu filho, essa criança é minha filha também, manda vos oferecer isso. O rei sorri e recebe como se fosse uma esfera de ouro. Diz ele: essas são as nossas ações junto a Nossa Senhora. As melhores ações dos homens valem, aos olhos de Deus, como uma maçã e uma pífia maçã; mas oferecidas por Nossa Senhora e com o sorriso de Nossa Senhora, Deus as recebe com encanto, Deus agradece e Deus recompensa. Quanto mais unidos a Nossa Senhora, mais nós poderemos praticar a virtude e nos tornamos agradáveis a Deus. Essa ideia conduziu São Luís Grignion de Montfort ao princípio seguinte: se Nossa Senhora é de tal maneira a distribuidora de todos os dons, Ela é a Rainha do universo. E isso é bem verdade. A Igreja ensina isso mesmo. Ela governa o universo inteiro. Se Ela governa o universo inteiro, é também bem verdade que nós devemos nos consagrar a Ela como servos dEla. Porque nós somos súditos dEla, nós devemos fazer tudo quanto Ela quer. Ele usa uma imagem enérgica, mas verdadeira: como nós não devemos querer senão o que Ela quer, não devemos fazer senão o que Ela faz, nós devemos nos consagrar a Ela não só como filhos dEla, mas como escravos dEla, unidos de tal maneira a Ela, que não façamos outra coisa senão aquilo que Ela quer. E então ele descreve magnificamente qual é a alma, quais são as transformações que Nossa Senhora faz na alma daqueles que se consagram como perfeitos escravos dEla. Tornam-se homens de fogo, homens inteiriços, homens de uma potência de vontade, de uma potência de ação, de um valor de fé, que ficam os homens mais magníficos que houve em toda a história da humanidade. Os homens capazes de derrotar a grande apostasia da terra e de fazer vencer o Reino de Maria. Essa é a imagem do verdadeiro e do perfeito escravo de Nossa Senhora. Vós me direis: mas Dr. Plínio, eu sinto a minha fraqueza, eu sinto a minha imperfeição. Será que Nossa Senhora, a mim, tão cheio de pecados, quererá para uma elevação dessas? Eu digo: não tem dúvida. Porque Nossa Senhora não recua diante do pecado de nenhum homem. Eu soube há pouco tempo de um fato que, em matéria de devoção mariana, foi talvez o fato que mais me tenha emocionado até hoje e com o qual eu termino essa exposição. Há na Venezuela um santuário que é consagrado à patrona nacional da Venezuela, que é Nossa Senhora de Coromoto. Nesse santuário há um ostensório enorme e dentro dele uma pedrazinha pequena na qual está gravada a imagem, a figura de Nossa Senhora. É pena eu não ter aqui a estampa: é uma Nossa Senhora régia, sentada no trono, com o Menino Jesus no braço e um olhar de Rainha, de Anjo, de Teóloga, e de Mãe. Um olhar verdadeiramente admirável! A história dessa imagem, da patrona da Venezuela, é uma história maravilhosa. Havia lá pelos matos da Venezuela, no tempo da colonização, havia um índio que morava numa choça, no interior, e a quem certa vez Nossa Senhora apareceu. Esse índio viu Nossa Senhora como uma Rainha gloriosa e Ela perguntou se ele queria morar na cidade onde Ela era Rainha. Ele disse que sim. Ela disse: vá para tal cidade assim, procure uns homens vestidos de tal jeito assim - eram os padres - e eles ensinam o caminho do Meu Reino que era, evidentemente, o caminho do Céu. O índio foi lá, batizou-se e foi durante vários anos um bom católico. Com sua esposa morava nesse lugar. Num belo momento deu uma ingratidão pavorosa qualquer nesse índio, e o índio então abandonou tudo, voltou para sua choça e deixou a religião. Nossa Senhora ali apareceu um dia, na entrada da choça, risonha, amável, convidando-o para voltar às graças dEla. Ele estava de tal maneira péssimo, que voltou-se e tentou esmurrar Nossa Senhora. Mas não conseguiu, sentiu seus membros atados. Então ele tomou um arco e uma flecha e tentou dar uma flechada em Nossa Senhora. O miserável não se lembrava que ele, com isso dava as provas de que era autêntica a aparição. Ele estava vendo tão claramente, tão concretamente, que ele até quis agredir. Não era uma fantasia, não era uma imaginação. Bem, a mulher dele impediu que ele desse a flechada e a aparição se desfez. Quando ele deu acordo de si, ele tinha na mão uma pedrazinha que parece que ele queria jogar contra Ela. Ele olhou a pedra. Ela tinha deixado, por amor para com ele, a imagem dEla impressa nessa pedra... Quer dizer, um verdadeiro milagre. Ele então, de raiva ainda, pegou essa pedra e jogou no sótão da choça dele. Mas Nossa Senhora ainda assim o perdoou. Infatigavelmente perseguindo esse homem para esse homem se converter. E em determinado momento ele não resistiu mais à graça, ele pediu perdão, ele se reconciliou com Nossa Senhora e algum tempo depois ele morreu inteiramente em paz e sua alma foi para o Céu. Quer dizer, depois das piores ofensas, Nossa Senhora ainda venceu e ainda o perdoou. Isso eu tenho certeza que é o símbolo mais eloquente da misericórdia de Nossa Senhora e como nem os piores pecados daqueles a quem Ela ama são capazes de constituir uma barreira à bondade e à misericórdia dEla. Nossa Senhora, em nossa época, está sofrendo agressões que são piores do que as que Ela sofreu da parte desse índio. Os pecados do mundo contemporâneo são muito mais responsáveis, são muito mais cheios de malícia do que desse miserável, desse canalha desse índio. Nossa Senhora, entretanto, não quer que a humanidade acabe. Ela quer o perdão para a humanidade. E quando Ela, em Fátima - nós temos aqui sobre nós a imagem de Nossa Senhora de Fátima - quando Ela em Fátima prenunciou castigos para os homens e disse até que várias nações vão desaparecer, Ela ao mesmo tempo anunciava, com esses castigos, misericórdia. Porque conta São Pedro que, com o Dilúvio, muitos homens que iriam para o inferno se arrependeram e ainda foram para o Céu. E com os castigos, um certo número pelo menos dos homens contemporâneos vão se arrepender e ainda vão para o Céu. E muitos hão de viver perdoados por Ela para entrarem para o Reino de Maria. Assim Ela disse: “por fim o meu Imaculado Coração triunfará!” Nós devemos pedir a Nossa Senhora que, em relação a cada um de nós, Ela use da graça que teve para com o índio de Coromoto, que Ela vença nossos obstáculos, aniquile as nossas maldades e que seja verdadeira para o mundo contemporâneo - como para cada um de nós individualmente - a promessa dEla. Que em nós o Imaculado Coração dEla triunfe, que nós sejamos perfeitos filhos dEla, Apóstolos dos Últimos Tempos, escravos dEla perfeitos, para que, por essa forma, o Reino de Maria substitua o reino do demônio sobre a face da terra. É isso que nós devemos pedir a Nossa Senhora depois de uma tão longa meditação sobre a glória excelsa dEla. É o que eu tenho a dizer. [aplausos] Nota: Para conhecer mais a respeito da invocação a Nossa Senhora de Coromoto, clicar em https://cienciaconfirmaigreja.blogspot.com/2018/09/imagem-de-nossa-senhora-de-coromoto.html https://www.youtube.com/watch?v=zalUIcfLnjQ (vídeo de 7 minutos, em castelhano) Diversas afirmações e/ou teses teológicas citadas, podem ser encontradas na douta obra a respeito do Paraíso do Con. Pierre-Joseph Pession (1899, Aosta-Itália) https://pliniocorreadeoliveira.info/Paraiso_1889_Pession.htm |