Plinio Corrêa de Oliveira

 

Carta para Alceu Amoroso Lima,

3-10-1930

 

 

 

 

 

 

 

 

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[Os negritos são deste site]

São Paulo, 3 de Outubro de 1930

Meu querido Dr. Alceu

Com certeza, o Sr. Me chamará tratante, dado o meu longo silêncio, depois de uma carta que exigia algumas respostas urgentes.

Estou preparando um comentário dos Estatutos da Liga (Eleitoral Católica), feitos ad usum delphini, para o caso da LEC de S. Paulo, pois que há aqui – fique isto apenas entre nós – um casinho em formação. É para evitá-lo que estou preparando o comentário. Escrever-lhe-ei mais longamente a este respeito, quando o comentário ficar pronto, e eu lho enviar.

Penso que o comentário pode servir, aliás, para todo o Brasil.

Vamos ao “caso do X”. Realmente, ele desmanchou o noivado. Para compreender sua atitude, é necessário recordar algumas circunstâncias. “X” ficou noivo há 2 ou 3 anos, sentindo nessa ocasião uma forte inclinação [o sublinhado é do original, n.d.c.] para o matrimônio. De lá para cá, sua vida espiritual tomou, graças a Nossa Senhora, uma intensidade cada vez maior. Uma evolução sensível operou-se dentro dele. E, ao cabo deste tempo, ele poude verificar nitidamente que, embora sua inclinação [o sublinhado é do original, n.d.c.]  possa ter sido para o matrimônio em dado momento de sua vida, sua vocação [idem] (que é coisa bem diversa, que Santo Inácio distingue nitidamente na sua meditação sobre a escolha dos estados) era outra. Obedeceu à ordem interior que lhe dava Nosso Senhor. Entendeu claramente que um compromisso eminentemente condicional, como o do noivado, podia perfeitamente ser suspenso, em face de um motivo de suma gravidade, como o que o movia. Lealmente, declarou-o à [sua ex-noiva], que lhe escreveu uma carta belíssima, em que teve ocasião de patentear um grande espírito católico. E aí está contado o caso, em duas palavras.

Contardo Ferrini (1859-1902), leigo, jurista, manteve-se sempre solteiro, beatificado por São Pio X

O que fará agora o “X”? Não lhe posso dar uma certeza a este respeito. Ele se sente, positivamente, inclinado para um gênero de vida mais perfeito do que o do pater famílias [pai de família]. No entanto, nada resolveu definitivamente. A Igreja sancionou a atitude de um Contardo Ferrini, que chegou à grande perfeição espiritual que o Sr. provavelmente conhece, igualmente distante do claustro e da família. O “X” poderá imitá-lo, se tal for a vontade de Nosso Senhor. Acabará ele sendo elevado à suprema dignidade de Padre? Não sei. Por enquanto, ele nada resolveu, embora me pareça bem distante do segundo alvitre.

Em um cartãozinho que me escreveu, botou o Cardeal, de seu próprio punho, o seguinte post scriptum: Vejo que está sendo o mais votado. AOS QUE AMAM A DEUS, TUDO CONCORRE PARA O BEM” [as maiúsculas são do original, n.d.c.]. Não será o caso de aplicar ao “X” a frase?

Estou certo de que, embora a atitude de “X” possa ter entrado em choque com uma ou outra incompreensão, o Senhor a aprovará in totum.

Agora, meu querido Dr. Alceu, permita-me que aplique também ao Senhor a pequena frase que me mandou o Cardeal, e que me fez muito bem.

O Senhor me escreve sobre suas dificuldades financeiras. Compreendo bem o sacrifício espiritual que representa para o Senhor esta diminuição de sua atividade apostólica. No entanto, “AOS QUE AMAM A DEUS, TUDO CONCORRE PARA O BEM”. A Providência é sempre maternal. É provável – diria quase que é certo – que Nossa Senhora prepara, através destas dificuldades, uma situação em que o Sr. se possa entregar a seu apostolado, com mais liberdade do que nunca, o que de muitos modos pode suceder.

Esta privação, que não será longa, significa principalmente que o Sr. deve mais do que nunca agradecer o tempo e os talentos de que a Providência o dotou para a defesa da Igreja, graças estas, que o Sr. talvez ainda não tenha agradecido devidamente. Depois desta provação, o Sr. estará mais em condições de apreciar na sua devida altura a graça que terá de gozar de inteira folga para a sua ação.

Já que lhe escrevo com a data de Santa Teresinha [à época, sua festa era comemorada no dia 3 de outubro, n.d.c.], aconselho que o Sr. aproveite a ocasião para praticar o “abandono confiante” e a “infância espiritual” que Ela pregou. Deixe-se guiar por Nossa Senhora, refugie-se em Seus Braços, como Nosso Senhor o fez por ocasião da fuga do Egito, e, confiado nEla e em S. José, atravessará em paz, incólume, todos os perigos como sucedeu a Nosso Senhor.


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