Plinio Corrêa de Oliveira

 

Carta para Alceu Amoroso Lima,

 20 de agosto de 1934

 

 

 

 

 

 

 

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São Paulo, 20 de agosto de 1934

 

Meu caro Dr. Alceu

Exceção feita de alguns telegramas ou telefonemas, não tivemos quase contato, depois de minha partida do Rio.

Escrevo-lhe em um momento de extraordinária preocupação para nós, pois que, como sabe, colocada a Liga como elemento neutro entre os dois partidos que se vão entrechocar, ela se torna, pelo próprio jogo das circunstâncias, o fiel da balança, para a solução dos casos mais delicados da política de São Paulo, e provavelmente influirá de modo decisivo sobre a fixação das forças políticas do Estado durante muitos anos.

Por um lado, esta situação deve causar contentamento, pois que mostra a vitalidade do sentimento religioso em São Paulo, que vê colocada no ápice de todas as suas questões, o problema religioso. Além disto, naturalmente é de excelente efeito, sobre o espírito público, este prestígio da Igreja, que se afirma como uma realidade social de primeira importância, quando há algum tempo ela era rotulada, pelos nossos adversários, como uma simples revivescência do passado, destinada a perecer mais cedo ou mais tarde, ao sopro da influência materialista da época.

No entanto, por outro lado, a questão religiosa passa a estar ligada a uma série de problemas altamente apaixonantes para a opinião pública, mas inteiramente adjetivos para nós. Com isto, corremos o risco de ferir, ainda que involuntariamente, melindres muito sensíveis, por pouco que sejamos imprudentes em nossas atitudes.

Que o Divino Espírito nos ilumine e Nossa Senhora nos assista em deliberações de tal gravidade, que deveremos tomar em tempo relativamente pouco distante de nós.

A meu ver, a questão se colocada seguinte forma: é preciso obter para a Liga (Eleitoral Católica) o máximo de vantagens quanto a compromissos com os diversos candidatos SEM ROMPER A EQUIDISTÂNCIA EM QUE SE TEM CONSERVADO [as maiúsculas são do original, n.d.c.].

A menos que a nova reforma do Código Eleitoral venha alterar profundamente o sistema atualmente em vigor, parece-me que a solução está no seguinte: a Liga mandará imprimir diversas cédulas de tipo diferente, das quais cada uma conterá os nomes dos candidatos de cada legenda, que tiverem aceito nosso compromisso, feita a exclusão daqueles que não tiverem chegado a acordo conosco.

Esclarecendo: o P.R.P. apresenta uma lista com 60 candidatos à Constituinte Estadual, encabeçados pela legenda do Partido, devidamente registrada etc. Destes 60 candidatos, 50 aceitam nosso programa, e 10 o rejeitam. Se um católico votar na legenda do P.R.P., ele votará nos que são favoráveis e também nos que são contrários às nossas reivindicações. Portanto, em consciência, ele é obrigado (ainda que a Liga não existisse, existiria esta obrigação) a fazer uma cédula avulsa, contendo apenas os nomes dos que aceitam nossas reivindicações. Não há aí exigência da Liga, nem dever imperioso d consciência, que obriga sob pena de pecado.

O mesmo se daria em relação ao P.C., à Federação, aos Integralistas etc.

Ora, concretamente, cada Partido deverá apresentar chapas com 60 nomes para a Constituinte Estadual, e 34 para a Câmara Federal, perfazendo o total de 94 nomes. É absolutamente impossível que a unanimidade dos candidatos das duas ou três maiores correntes aceitem lealmente nossos compromissos. Logo, praticamente, os católicos serão forçados a “furar” as chapas de qualquer partido em que se encontrem.

Eu proponho que a Liga se incumba de imprimir as diversas chapas, devidamente “furadas”, substituídos os nomes que a Liga for obrigada a excluir, por outros nomes apolíticos, de sua imediata confiança; O eleitorado da Liga teria liberdade para preferir a chapa da corrente política que lhe fosse mais simpática, uma vez que ela se apresentasse devidamente expurgada, de acordo com nossas instruções.

As vantagens desta combinação seriam evidentes: 1) nós deslocaríamos, para lugares inferiores, os candidatos que nos fossem contrários, e daríamos preferência aos que nos fossem simpáticos; 2) poderíamos eleger candidatos de nossa imediata confiança, e inteiramente apolíticos, sem inconveniente nenhum para nós; 3) não tomaríamos posição entre as diversas correntes, autorizando nosso eleitorado a optar de acordo com suas preferências partidárias legítimas, sem que nos possa ser imputada a derrotada eventual de qualquer dos nossos partidos.

PARA GOVERNO MEU, PEÇO-LHE QUE ME ESCREVA URGENTEMENTE SOBRE O QUE PENSA A RESPEITO DA SOLUÇÃO QUE LEMBRO (maiúsculas do original, n.d.c.).

Quanto ao programa, estudei algumas concordatas, como a da Áustria, a da Alemanha e a de Baden, e achei que deveria constar dos seguintes pontos, entre outros que foram lembrados:

1) manutenção dos dispositivos constitucionais que nos interessam, enumerados todos no ato de compromisso (sublinhado do original, n.d.c.), sendo incluído entre tais dispositivos o que assegura a liberdade de ensino em todos os seus graus;

2) da solução das questões constantes da lista anexa, soluções que deixei ao seu critério, lembrando apenas os problemas que, inevitavelmente, serão suscitados pela prática de nossas medidas.

Há apenas uma circunstância que eu quero lembrar: o compromisso deverá abranger todas estas questões, do contrário será inteiramente ineficiente.

Conviria também fazer alguma referência à educação sexual.

Todos estes pontos poderão constar de um memorandum do Centro Dom Vital à LEC, que será fornecido impresso aos candidatos, para que lhes deem ou recusem adesão.

Há ainda, nesta matéria, um ponto a tratar, mas que quero que fique na mais absoluta reserva entre nós, apenas, e o interessado.

É a candidatura de “X”. Acho-a boa sob todos os pontos de vista. É um rapaz de uma comprovada dedicação, inteligente, hábil e extremamente mineiro. Prestar-nos-á os melhores serviços na Câmara, serviços que serão certamente muito melhores do que os de outros candidatos apresentados pelo “Y”, nas últimas eleições, com exceção de Sucupira, do Xavier e do Waldemar, que também trabalharam bem.

Prefiro mil vezes uma candidatura assim, à de algum elemento mais representativo, e mais “amacedado”.

Escrevo-lhe com muita dificuldade, pois que estou com uma inflamação na mão, que acaba de se agravar. Quero, porém, abordar mais uma questão.

Se o Sr. quiser algum trabalho junto à Bancada Paulista, sobre Código Eleitoral, este trabalho terá que ser feito aqui, e não no Rio. Efetivamente, as duas facções (P.R.P. e P.C.) terão atitudes, quanto ao voto avulso, conforme ao que nós combinarmos com as respectivas direções partidárias aqui a respeito das próximas eleições. É pois conveniente que o Sr. me mande dizer com urgência se quer que eu empreenda qualquer coisa a este respeito, e que alterações devo pleitear.

Efetivamente, os deputados só reformarão o Código Eleitoral de acordo com as respectivas vantagens partidárias no próximo pleito, e estas vantagens mudarão de aspecto, conforme o que combinar a Liga quanto à sua atitude nas próximas eleições.

Qualquer trabalho sobre os deputados atualmente presentes no Rio será, pois, inteiramente estéril.

Vou acabar, porque a minha mão não me permite escrever mais.

Receba um afetuoso abraço de seu sincero amigo em Nossa Senhora,

Plinio

Em tempo: acabo de ser informado de que a reforma do Código não poderá vigorar para as próximas eleições, porque as Disposições Transitórias da Constituição exigem que elas se efetuem “na forma da legislação em vigor”.


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