Revista "Catolicismo", n° 460, abril de 1989 (
www.catolicismo.com.br)Aplauso ao operariado brasileiro
Considerável parte de nossos meios políticos, intelectuais e publicitários, bem como das cúpulas de nossos círculos sociais é conduzida, na apreciação da realidade nacional contemporânea, por um "dogma" revolucionário velho de 200 anos. É o estado de espírito que o "Projet" socialista do Partido de Mitterrand descreveu sinteticamente com essas palavras: "Tudo, imediatamente, sempre e por toda parte". Assim, ante qualquer desigualdade, máxime econômica, elas se sentiriam motivadas para uma revolução social. O que se daria, a fortiori, se tal desigualdade se agravasse com um penoso estado de carência.
As classes humildes, um perigo
Daí decorreria que as classes mais humildes têm uma tendência natural permanente a se organizarem e a manterem um assalto aos segmentos sociais mais favorecidos. Essa tendência ("trabalhadores do mundo inteiro, uni-vos", Marx), uma vez que resulte em unidade organizada, faz, então, das massas, a força onipotente da política contemporânea.
A corrida para a esquerda
Nesta perspectiva, os políticos que queiram galgar o poder, os publicitários que almejem alcançar a liderança das massas, os intelectuais que aspirem ver seus artigos e seus livros sofregamente lidos pelas multidões, os eclesiásticos que ambicionem desligar-se das tradições comprometedoras com o passado, os plutocratas sequiosos de conservar o que têm e de prosseguir sem obstáculos na caminhada de seu enriquecimento devem aceitar como fato consumado que o mundo pertence hoje a tais multidões famintas e revoltadas. Ante elas, cabe a todos esses segmentos tão-só a estratégia de lisonjear as turbas onipotentes, estimando esses impulsos nos gananciosos e rebeldes, acenando-lhes a longo prazo, com promessas mais ou menos indefinidas, e a curto prazo, com concessões ao mesmo tempo tão grandes quanto necessárias para aquietá-las, e tão pequenas quanto possível. É a tática do "ceder para não perder". Ou seja, de sobreviver o mais possível, ceder o menos possível. Mas, alerta! Nunca ceder tão pouco que a massa perceba o truque e se revolte.
Daí a corrida de tantos "bem situados", rumo à esquerda. Quem ganhar a corrida terá melhorada sua situação para o dia de amanhã… Se bem que ao mesmo tempo tenha dado mais um passo para a aniquilação de sua própria classe depois de amanhã.
A aniquilação dos "bem situados": uma fatalidade
A quem lhe aponte o desacerto flagrante dessa conduta, tal "bem situado" responderá com uma pergunta: "Que remédio?" Já que a destruição de todas as classes bem situadas é uma fatalidade histórica, não há meios de impedi-la. O melhor proveito a ser tirado da atual situação não consiste em travar com a fatalidade histórica uma batalha exaustiva, perigosa e inútil.
Só o que resta é ir tornando cada vez mais agradável a vida quotidiana, enquanto a hora fatal não chegar!
Essa visão de conjunto, o "bem situado" não só a tem por existente no Brasil, mas no Ocidente. Ela explica aos olhos dele, especificamente o curso aloucado dos atuais acontecimentos brasileiros ou hispano-americanos.
O fatalismo determinista que a inspira caracteriza a mentalidade do homem sem fé, segundo o qual Deus jamais intervêm para desviar misericordiosamente o curso da História, dos precipícios para os quais a impele o desregramento humano.
A verdade sobre o "perigo operário"
Ademais, tal fatalismo se baseia em um pressuposto radicalmente falso. Em outros termos, a psicologia de nossas multidões não é a que os mencionados estrategistas "bem situados" imaginavam.
O povo brasileiro – isto é, aqueles que há tempos se designava como "povinho" e hoje se designa como "povão" – em sua muito grande maioria não é constituído de gananciosos, ele não quer avançar sobre o que é dos outros. O que ele deseja, isto sim, é trabalhar em ordem e em paz. E isso, oh glória!, ele o quer ainda mesmo quando as circunstancias o põem em estado de carência.
A greve, um fiasco
Demonstrou-o com exuberância o fiasco indisfarçável da greve geral com a qual a CUT e a CGT, apoiadas no PT e na esquerda católica, vinham há tempos aterrorizando o País. Greve que foi apresentada por seus promotores como tendo os seguintes objetivos:
1) Recuperação imediata das perdas salariais do "Plano Verão", empreendido pelo Governo Federal;
2) Reajuste salarial mensal de acordo com a inflação;
3) Protesto contra a recessão, o desemprego e a dívida externa.
Não é possível imaginar no Brasil atual uma greve que tenha contado com melhor publicidade, melhores colaborações e mais influentes cumplicidades.
Pois bem, deflagrada a greve tão cheia de promessas, a população operária, em sua grande maioria, a olhou com desdém, quando não com desconfiança, e até com antipatia, é o que os fatos tornaram patente.
"Catolicismo" no teatro das operações
Não podendo "cobrir" essa assertiva com um noticiário obtido em todo o território nacional, "Catolicismo" organizou a cobertura meticulosa de tudo quanto se passou em São Paulo. Cobertura essa, feita diretamente no teatro dos acontecimentos, que se desenrolaram no maior centro industrial do Brasil e até da América do Sul.
Apresentar tal cobertura é para "Catolicismo" motivo para dois atos. Um de graças a Deus, outro de ufano aplauso que, como órgão de imprensa [de inspiração] católica, "Catolicismo" dirige ao operariado nacional.
O fruto da justiça é a paz
Esta atitude obviamente não conduz os que assim se entusiasmam com a atitude do operariado nacional a cruzar os braços ante as reais necessidades deste, pelo único motivo de que ele "não constitui perigo". Pelo contrário, os que o aplaudem têm agora redobrada obrigação de o ajudar e de apoiar suas reivindicações justas.
É este o caminho para a verdadeira concórdia social: "opus justitiae pax" – o fruto da justiça é a paz, rezava o lema do Papa Pio XII.