Catolicismo, N.° 441, Setembro de 1987 (www.catolicismo.com.br)

 

Livro-bomba da TFP denuncia:

A Reforma Agrária prejudica mais os trabalhadores rurais do que os próprios fazendeiros!

 

Ao leitor

 

Dado o profundo comprometimento da TFP com as causas da propriedade privada e da livre iniciativa, ameaçadas gra­vemente pelo curso dos trabalhos e deba­tes dentro da Assembléia Nacional Cons­tituinte, crescia a expectativa do público acerca de uma tomada de posição da enti­dade, sobretudo diante do problema da Re­forma Agrária.

Segundo opinião manifestada por diver­sos parlamentares e outras personalidades, o problema da Reforma Agrária é o gran­de divisor de águas nas controvérsias ideo­lógicas na Constituinte. O próprio relator da Comissão de Sistematização, deputado Bernardo Cabral, disse que ela "será o te­ma mais difícil de conciliar naquela comis­são" ("Folha de S. Paulo", 18.6.87).

A questão agro-reformista foi, sem dú­vida, das mais debatidas no âmbito das subcomissões e comissões da Constituinte e tudo indica que o será também no Ple­nário.

Sobre a reforma da saúde, de importân­cia também primacial, a TFP acaba de pu­blicar uma carta aberta, de autoria da res­pectiva Comissão Médica, alertando os srs. Constituintes para os graves inconvenien­tes da estatização da medicina, constantes do Anteprojeto de Constituição (Título IX, Capítulo Il, Secção I). O documento cons­tituiu uma firme e corajosa tomada de po­sição da entidade para a "total rejeição do referido Anteprojeto [da Comissão de Sis­tematização] no que se refere à saúde, e para a promoção de amplo debate, de ma­neira a auscultar os verdadeiros anseios da opinião pública brasileira" ("Folha de S. Paulo", 10.07.87). "Catolicismo" estam­pou esse documento em sua última edição.

O impacto altamente favorável da carta aberta da TFP sobre a estatização da me­dicina faz prever uma ampla difusão dela em todo o território nacional. Difusão aliás já em curso.

Desde 1960, a TFP vem publicando li­vros, em verdadeira cruzada em favor da propriedade privada e da livre iniciativa. Na presente emergência, a entidade não poderia se omitir. O que preparou ela em ma­téria de Reforma Agrária?

A Subcomissão de Política Agrícola e Fundiária e de Reforma Agrária dispôs-se a ouvir sugestões para o trabalho de que estava incumbida. Como subsídio para os debates, o Escritório da TFP em Brasilia — criado especialmente para acompanhar os trabalhos da Constituinte — promoveu a distribuição, a todos os componentes da­quela Subcomissão, das mais recentes obras da TFP a respeito da Reforma Agrária.

Tais obras são bem conhecidas do pú­blico: Sou católico: posso ser contra a Re­forma Agrária? (1981, 29 mil exemplares), A propriedade privada e a livre iniciativa no tufão agro-reformista (1985, 16 mil exemplares), ambas de autoria do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira (parte doutriná­ria) e do Prof. Carlos Patrício del Campo (parte econômica), bem como o estudo No Brasil: a Reforma Agrária leva a miséria ao campo e à cidade — TFP informa, ana­lisa e alerta (1986, 55 mil exemplares), de autoria do Prof. Plinio Corrêa de Olivei­ra.

A difusão delas teve grande repercussão em todo o País. O que levou, no ano pas­sado, o sr. José Eli Veiga, na ocasião su­perintendente regional do INCRA em São Paulo, a reconhecer que a TFP é "o prin­cipal elemento de articulação contra a Re­forma Agrária" ("O Estado de S. Paulo", 21.5.86).

A TFP entra uma vez mais em cena, pa­ra jogar uma grande cartada contra a Rer­forma Agrária. É o lançamento de Refor­ma Agrária: `terra prometida', favela ru­ral ou `Kolkhozes’? — Mistério que a TFP desvenda, que se compõe de três partes.

A primeira delas (Os assentamentos de Reforma Agrária numa visão de conjun­to) oferece aos leitores mais afeitos a ma­térias ligeiras uma condensação do estudo em pauta, deixando aos mais versados em demonstrações e pormenores a parte segun­da do trabalho (Os assentamentos de Re­forma Agrária: natureza, legislação e im­plicações sócio-econômicas). Numa tercei­ra parte (Sem véus nem mistérios: os amar­gos `benefícios' da Reforma Agrária aos trabalhadores rurais) os leitores encontra­rão substancioso conjunto de notícias, ex­traídas dos principais jornais brasileiros, as quais dão sólido embasamento às teses sus­tentadas pelo autor.

A autoria do livro é do destacado sócio da TFP, o advogado Atílio Guilherme Faoro, diplomado pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná. Seus estudos o levaram a aprofundar uma ques­tão que, segundo tenhamos conhecimento, não foi aventada por quem quer que seja: as tão proclamadas vantagens da Reforma Agrária para os trabalhadores rurais bene­ficiados pela distribuição de terras, segun­do o Estatuto da Terra e o Plano Nacio­nal de Reforma Agrária. Concluído o tra­balho, o inteligente e perspicaz autor en­controu uma verdadeira surpresa, ou me­lhor até, uma verdadeira bomba, que hoje a TFP leva ao conhecimento do público brasileiro.

A alta qualidade do trabalho que hoje estamos apresentando foi objeto de elogio­so comentário do Prof. Silvio Rodrigues, professor catedrático de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (a conhecida Faculdade do Lar­go São Francisco) e Doutor Honoris Cau­sa na Faculdade de Direito da Universida­de de Paris XII, bem como autor de fa­moso parecer sobre o direito que cabe aos fazendeiros de defesa à mão armada em ca­so de invasões de terras.

Com efeito, consultado este sobre a in­terpretação dada pelo autor ao artigo 322 do Anteprojeto da Comissão de Sistema­tização da Assembléia Nacional Constituin­te, concernente à outorga de título de do­mínio com cláusula de inalienabilidade no processo de Reforma Agrária, respondeu-lhe o preclaro jurista que não há mister de "qualquer parecer para defender suas con­clusões" nesta matéria. E estendendo suas apreciações ao conjunto da obra, acrescen­tou que "suas asserções, ao campo jurídi­co, são incensuráveis e denotam um minu­cioso conhecimento dos institutos que ver­sa".

Segundo martela constantemente a pro­paganda pró Reforma Agrária, os proprie­tários rurais são defensores egoísticos de seus interesses, e se mantêm indiferentes com a condição do trabalhador rural, o qual viveria na mais negra miséria. E des­sa forma a Reforma Agrária seria, para os lavradores sem terra, mais ou menos o que foi o 13 de maio de 1888, ocasião em que a Princesa Isabel assinou a Lei Áurea e li­bertou assim o elemento servil negro no Brasil.

Lesados pela investida agro-reformista, seriam, pois, os fazendeiros, e mais nin­guém. E a defesa deles contra a Reforma Agrária não passaria de luta de classes, dos opressores contra os oprimidos, sedentos de obter para si e para os seus justas con­dições de trabalho.

Nesta perspectiva não caberia dúvida: o dever de toda a Nação consistiria em coligar-se a favor dos oprimidos, contra os opressores, ou seja, a favor das vítimas contra os seus exploradores.

Tal modo de apreciar o panorama já ho­je se apresenta falso, em vista do estudo revelador de Atilio Guilherme Faoro. Com efeito, a TFP desvenda em toda a medida o quadro verdadeiramente trágico em que se encontram desde agora os "beneficiá­rios" da Reforma Agrária. Isto é, aqueles que receberam terras para cultivo em de­corrência da aplicação dos programas de Reforma Agrária.

Mais. A TFP, na pessoa do autor deste livro, põe em evidência que a Reforma Agrária prejudica muito mais gravemente ainda os trabalhadores rurais, do que os próprios fazendeiros. Se a estes ela "ma­ta", àqueles estraçalha!

Este oportuníssimo livro introduz, pois, um elemento novo e sensacional na con­trovérsia agro-reformista. Interessa ele mais ainda aos trabalhadores sem terra do que aos proprietários rurais. E proclama que é chegada a hora de ambas as classes se alia­rem em frente única contra o golpe irrepa­rável lançado contra uns e outros — con­tra a agricultura brasileira — com a im­plantação da Reforma Agrária.

No front anti-agro-reformista estão os produtores rurais e também seus valorosos trabalhadores. De outro lado, estão as uto­pias, a tecnocracia, a burocracia, o coleti­vismo.

A área de interesse de Reforma Agrária: terra prometida; favela rural ou Kolkho­zes'? — Mistério que a TFP desvenda é ainda mais ampla. Seria do mais palpitan­e interesse para o agro-reformismo procla­mar a todo o Brasil que os assentamentos feitos desde que se implantou o Estatuto da Terra até hoje produziram lisonjeiros re­sultados, quer do ponto de vista do incre­mento da produção agrícola, com o con­seqüente proveito para o bem comum do País, quer do ponto de vista do bem-estar dos assentados.

Tudo isto constituiria tema para uma pla­quete ou um livro opulentamente docu­mentado, em cuja elaboração as tipogra­fias oficiais esmerassem o emprego de seus melhores recursos. E a imensa maquinaria de propaganda do Estado, coadjuvada pela rede de organismos de difusão da CNBB, pela orquestração publicitária das esquer­das, poderia, com esta plaquete, fartar os olhos e encher os ouvidos da Nação.

Ora, nada disso foi feito. E o resultado dos assentamentos constitui matéria sobre a qual a propaganda agro-reformista guar­da o mais prudente e hermético silêncio. É de entrever, neste silêncio, um patente fra­casso da Reforma Agrária.

A verdade, resultante de pesquisa em abundante matéria jornalística selecionada por uma comissão de leitores da TFP, vem agora a lume: a maioria dos projetos de as­sentamentos fracassou, quer do ponto de vista econômico, quer do social.

E assim se explica que comece a se fazer notar, na área agrícola, um fenômeno sócio-econômico inusitado no Brasil: as fa­velas rurais! Famílias inteiras, reduzidas à miséria mais deprimente, vivem em preca­ríssimas condições de alimentação, higie­ne, saúde e habitação. O que vem repre­sentando sérios problemas sociais para ór­gãos públicos, sobretudo para administra­ções municipais.

Que acontecerá quando, em todo o ter­ritório nacional, os assentamentos de Re­forma Agrária estiverem implantados, em lugar da tradicional estrutura agrícola a que o País deve sua pujança econômica? — O Brasil terá um campo empobrecido. Cam­po empobrecido equivale a cidades empo­brecidas. O empobrecimento do campo e da cidade será assim o fruto amargo que a Reforma Agrária oferecerá aos brasilei­ros. Fruto esse só comparável aos sofri­mentos pungentes que constituem o dia-a­-dia dos tristes povos submetidos ao agro-coletivismo: Rússia, China, Cuba, Nicará­gua etc.

Em conclusão: a reação contra a Refor­ma Agrária se eleva ao nível de luta de to­dos os brasileiros, em defesa da população rural e da agricultura — esteio da econo­mia nacional — contra a investida do so­cialismo marxista demolidor.

A projeção da presente obra é, como se pode ver, muito vasta. Mas merece ainda consideração de outros setores da opinião pública.

A Reforma Agrária é o primeiro vaga­lhão de um verdadeiro maremoto que se aproxima, avassalador, implacável, terrível, contra a propriedade privada e a livre ini­ciativa. Tal maremoto chama-se Reformas de Base ou Reformas de Estrutura. Depois da Reforma Agrária, virão necessariamente as Reformas Urbana e Empresarial, entre outras.

Esta impressionante verdade é desinibi­damente afirmada pelo guerrilheiro argentino-cubano "Che" Guevara, para quem "a base das reivindicações sociais que o guerrilheiro deve levantar será a mudan­ça de estrutura da propriedade agrária", sublinhando que "a luta deve desenvolver-se, pois, continuamente sob a bandeira da Reforma Agrária" (Ernesto "Che" Gue­vara, Oeuvres I — Textes Militaires, Fra­çois Maspero, Paris, 1976, pp. 52-53).

Desencadeada a Reforma Agrária, as outras Reformas serão muito mais difíceis de conter. Refreada a Reforma Agrária, as outras ficam sem meios de se expandir. A propriedade agrária é o dique principal e necessário que é preciso romper para rea­lizar a reforma global das estruturas do País. Reforma global que, uma vez reali­zada, levará o Brasil ao comunismo. Uma vez impedida, estará cortado o passo ao avanço do comunismo.

A TFP sempre apontou a conexão ínti­ma entre a Reforma Agrária e a reforma global de toda a estrutura de propriedade privada do Brasil, ressaltando quanto a agro-reforma abre caminho para as demais. Afirma o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira: "Não é possível considerar essa avalanche de igualitarismo fundiário, sem indagar se ela não terminará por atingir, além da em­presa rural, também a empresa industrial e a comercial, e por fim todo o sistema sócio-político-econômico vigente. Ao que a resposta deve ser afirmativa" (Guerrei­ros da Virgem — A réplica da autenticida­de, Ed. Vera Cruz, 1985, p. 8; ver também, do mesmo autor, Sou Católico: posso ser contra a Reforma Agrária?, Ed. Vera Cruz, 1981, p. 43 e As CEBs... das quais muito se fala, pouco se conhece — A TFP as descreve como são, Ed. Vera Cruz, 1982, p. 48, nota 5).

Se assim é, tem todo o propósito que proprietários rurais, urbanos e empresariais formem por sua vez uma ainda mais am­pla frente única contra a Reforma Agrária socialista, confiscatória, coletivizante e ge­radora de miséria.

Da capacidade de mobilização desta frente única, ordeira e pacífica, depende, pois, em larga medida, o futuro do Brasil. A presente obra da TFP é um precioso con­tributo para encorajar o engajamento de todos os bons brasileiros nesta leal e pa­triótica frente comum.

Por leal entendemos a frente única que desenvolva uma luta franca e de viseira er­guida, sem disfarces nem artifícios. Não se trata, em tal luta, propugnada por tão po­deroso e altaneiro front comum, de dize­rem os opositores da Reforma Agrária que são agro-reformistas, mas só em um ou ou­tro ponto.

"Reforma Agrária": a expressão, cu­nhada na controvérsia que dura já 30 anos, designa toda a reforma lesiva do princípio da propriedade individual. De Norte a Sul, o linguajar cotidiano do povo brasileiro as­sim a entende, implícita ou explicitamen­te. Ser pela Reforma Agrária é ser contra o princípio da propriedade individual, é querer eliminá-lo de vez por um golpe ra­dical, ou acumpliciar-se com a eliminação completa do princípio através de sucessi­vos golpes parciais e "moderados". "Mo­derados", sim, de uma "moderação" que, por um processo inelutável, fará de cada concessão uma brecha aberta na afirmação do próprio princípio, sujeito desta forma a uma corrosão processiva implacável.

Não se trata de aceitar a Reforma Agrá­ria sequer em propriedades agrícolas deso­cupadas.

Então — replicará alguém — não se po­de ser a favor da Reforma Agrária no lati­fúndio estatal, cuja extensão como que continental, a TFP foi a primeira a intro­duzir como argumento na controvérsia agro-reformista?

A divisão das terras devolutas se vem fa­zendo no Brasil desde tempos imemoriais e jamais foi qualificada de Reforma Agrá­ria, simplesmente porque não o é. A Re­forma Agrária implica na transferência compulsória da propriedade ou do uso de terras particulares para pessoas que, segun­do a legislação civil em curso, sobre elas não têm nenhum direito. As terras devo­lutas, pelo contrário, pertencem ao Esta­do, ao País, potencialmente a cada brasi­leiro. Entregá-las aos segmentos da popu­lação que as queiram cultivar é a forma de as fazer aproveitar, nas pessoas dos bene­ficiários, pela sociedade toda, que delas é dona.

O Brasil inteiro simpatiza com os traba­lhadores rurais. O Brasil inteiro deseja favorecê-los. A TFP, desinteressadamente, preocupa-se com a sorte deles. E para pro­piciar cada vez mais o engajamento dessa valorosa classe na frente única anti-agro­reformista pretende a TFP publicar tam­bém uma resenha popular e ilustrada do essencial da matéria da presente obra pa­ra ampla difusão no meio deles.

Qual o efeito presumível da obra sobre os membros da Assembléia Nacional Cons­tituinte?

Haverá naturalmente o reflexo que o va­lor persuasório do trabalho pode trazer à consciência e à convicção dos srs. Consti­tuintes.

Mas também é muito de se esperar que, feito o anúncio do livro e a propaganda que em praça pública a TFP levará a cabo em todo o território nacional — com eficácia inexcedida no Brasil, em se tratando de ma­térias com as quais ela se ocupa — os de­putados sentirão muito vivamente a sim­patia e a popularidade desfrutada pela po­sição da TFP no tema específico da pre­sente obra. Assim, é natural que os srs. Constituintes, conscientes do dever de re­presentar com fidelidade a opinião do elei­torado do qual são mandatários, tomem na devida conta esta posição do público ao emitirem seu voto no Plenário.

"Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados" — ensinou Nosso Senhor Jesus Cristo (Mt. 5,6). No presente momento histórico, a classe dos trabalhadores rurais, que por si mesma não dispõe de recursos materiais e humanos para se defender da nocividade da Reforma Agrária, espera que os brasi­leiros que têm “fome e sede de justiça” ve­nham em sua defesa. Lançando a presente publicação, a TFP dá seu contributo para a concretização desta nobre tarefa.

São Paulo, 31 de julho de 1987.
Sociedade Brasileira de Defesa da
Tradição, Família e Propriedade — TFP