Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

"Esquerda católica" - conscientização - revolução:

Alerta da TFP -

modorra dos fazendeiros

 

 

 

 

 

Catolicismo, N° 406-407, Outubro-Novembro de 1984

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COMO A "ESQUERDA CATÓLICA", através da conscientização, está desencadeando em nossos campos uma revolução social sangrenta: novo alerta da TFP para tentar evitar essa marcha e tirar da modorra grande parte dos fazendeiros.

1. Etapas de um só processo: conscientização, agitação, revolução

Na consideração dos fatos narrados na presente edição de "Catolicismo" figuram três fenômenos de natureza distinta, mas encadeados em vista de um mesmo fim. O primeiro deles é a conscientização, operação preparatória da agitação. O terceiro fenômeno é a agressão, isto é, a promoção de ataques, de desordens, de transgressões à lei à mão armada etc.

Qual a distinção entre conscientização, agitação e agressão?

O processo preparatório de sublevação revolucionária compõe-se de fases diversas. Há uma primeira fase - que no linguajar revolucionário chama-se conscientização - mediante a qual o pobre adquire a "consciência" de sua pobreza. Porque ele - segundo inculcam os revolucionários - está de tal maneira habituado a ser carente e a viver com insuficiência de recursos, que julga isso normal. E não se revolta, não se indigna, porque não conhece outra coisa. Ele acha que a ordem natural das coisas é essa.

Assim, "conscientizá-lo" é, em primeiro lugar, dar ao pobre a idéia de que lhe faltam coisas essenciais que ele não possui. E, em segundo lugar, é dar-lhe a idéia de que é injusto ele não possuir tais coisas. Em suma, "conscientizá-lo" é inculcar-lhe a idéia de que, sendo injusta sua situação, é natural que ele se manifeste ou procure pressionar a opinião pública para, por meios legais, conseguir que se lhe faça justiça. Esta é a primeira etapa de um trabalho revolucionário (cfr. As CEBs... das quais muito se fala, pouco se conhece - A TFP as descreve como são, PLINIO CORRÊA DE OLIVEIRA, GUSTAVO A. SOLIMEO, LUIZ S. SOLIMEO, pp. 133-141).

Tal fase caracteriza-se pelo fato de que é um trabalho de pessoa a pessoa, feito apenas para provocar um determinado estado de espírito. Ainda não visa provocar uma ação. Pode também ser trabalho de meios de comunicação de massa sobre um ambiente social. Como também pode ser a ação de um professor ministrando aulas, de um orador discursando para grandes massas etc. As duas idéias centrais inculcadas pela "conscientização", ou seja, o estado de carência essencial e a conseqüente injustiça dessa situação, nunca são provadas. São apenas afirmadas e repetidas, por vezes com estatísticas "assustadoras" e sem qualquer base.

Agitação social

A segunda fase do processo consiste em promover a agitação, que é fruto da "conscientização". Quando muitos se "conscientizam" e, portanto, ficam descontentes - porque o descontentamento é a conseqüência imediata da conscientização revolucionária - verifica-se a contaminação desse descontentamento de uns para outros. Promovem-se conversas sobre isso e, mediante reuniões, círculos de estudos, comícios e outros meios, põe-se aquele descontentamento, antes individual ou de pequenos grupos que não se conhecem, ao alcance de muitos.

Um elemento clássico de descontentamento e, portanto, de agitação ou de preparação para tal, é o desfile de pessoas que sofrem determinada carência - ruas sem asfalto, por exemplo -, que passeiam por um bairro já "conscientizado", dando brados de protesto e incitando os que estão ali a manifestar, através de meios legais, sua inconformidade.

- "Gritemos NÃO a este bandidão! Vamos todos caminhar ao gabinete do prefeito para protestar!" Fórmulas desse tipo ainda estão dentro da legalidade, mas produzem um ambiente de tumulto na opinião pública, tendente, portanto, a provocar uma revolta.

Essa agitação ainda não é ilegal. Está dentro das leis atuais, dentro da liberdade de manifestação. Ela ainda não lança pedras, não arromba portas, não agride nenhum indivíduo, nem sequer põe em fuga ninguém. Ela apenas satura, procura tornar concreto no bairro aquele descontentamento antes difuso. Dá-se então a comunicação dos descontentamentos e, pelo próprio fato de serem vividos em conjunto pelos membros de uma sociedade, e de serem proclamados de público, a intensidade daqueles sentimentos eleva-se a um alto grau.

Agressão, começo de revolução

Tudo, então, está preparado para a fase posterior à agitação social. Essa fase é a agressão. Aí já se entra na ilegalidade e, dentro da ilegalidade, começa-se a fazer algo que, a intensificar-se, será a revolução social.

A entrada na ilegalidade tem como zênite, como desfecho natural, o momento em que os descontentes se armam e investem contra aqueles que se quer derrubar. No caso concreto, a classe dos proprietários rurais. A propriedade urbana e a propriedade industrial - de momento, note-se bem! - não estão questionadas. Por enquanto, está visada a propriedade rural. A idéia é transferir a posse das propriedades rurais para os trabalhadores manuais.

Se os agredidos, usando seu prestígio natural e apoiados em simpatizantes, revidam à agressão, criam-se condições para a conflagração. E se por todo o País continuarem a ocorrer agressões desse tipo e reações por parte dos agredidos, o País mergulhará numa guerra civil de natureza revolucionária. Será mesmo assim? Estarão dispostos os agressores a ir até lá? Vejamos.

Questão de consciência

Prevendo a eventualidade dessa reação, as agitações e as agressões são acompanhadas habitualmente de manobras psicológicas que tendem a fazer com que o proprietário apavorado não reaja. E que, pelo contrário, tomado de certo escrúpulo de consciência sobre a legitimidade de seu direito de propriedade, ele defenda molemente sua propriedade, ou mesmo não a defenda.

Outro elemento necessário para o sucesso da investida revolucionária é o fato de a força policial incumbida de manter a ordem não agir, por solidariedade para com os agressores, pela idéia de que estes últimos estão defendendo seus direitos. E que, portanto, a verdadeira missão das forças policiais seria ajudar a derrubar os proprietários "sanguessugas".

Nessas circunstâncias, jogam um papel decisivo os homens de Igreja, que deveriam interferir criando uma questão de consciência para os agressores, que cometem um enorme pecado ao apropriar-se dos bens alheios. Porque a propriedade privada está garantida pelos 7° e 10° Mandamentos da Lei de Deus: "Não roubarás "e "não cobiçarás as coisas alheias". Entretanto, os fatos indicam que as manifestações de eclesiásticos - inclusive Bispos - criam uma questão de consciência, não no espírito dos agressores, mas no espírito dos agredidos, procurando convencê-los de que a justiça, o espírito do Evangelho - numa palavra, Nosso Senhor Jesus Cristo - está ao lado do agressor. O agressor estaria fazendo justiça, e os proprietários não teriam os direitos que pensam ter.

E o Poder Judiciário?

Se as forças policiais não tornam efetivas as sentenças que ele prolata, o juiz, já sabendo disso, tende a não atuar, pois suas decisões serão inócuas. O Poder Judiciário fica evaporado, semi-inerte ou totalmente inerte, assistindo aos acontecimentos.

Quando tais circunstancias se dão, a revolução social, promovida até por pouca gente, pode vencer.

Em síntese, todos os meios de expansão revolucionária estão em movimento, e todos os meios de repressão ficam desarmados. O necessário para avançar está pronto, o indispensável para resistir não existe.

O Brasil atual encontra-se nesse estágio. Está concluída a montagem para a derrubada da propriedade rural, e com isso, da propriedade privada em nosso Pais. É um perigo iminente, apesar da aparência de tranqüilidade na vida quotidiana de outros tantos setores nacionais.

2. É possível deter este processo?

Assim apresentada, no plano teórico, a atual marcha da revolução social no Brasil, cabe naturalmente perguntar: que possibilidades há de deter tal processo? Estará tudo irremediavelmente perdido? Como a TFP encara essa situação? O que ela fez, faz e pode fazer para evitar que o Brasil seja incendiado pela "esquerda católica"?

Na avaliação dos fatores favoráveis e desfavoráveis da atual investida comunista, cumpre levar em consideração:

a) Os comunistas não constituem senão grupinhos, nos quais se aglutinam intelectuais (vários deles intelectualóides), ricaços (vários dos quais nababos) e políticos bafejados pela publicidade, mas o mais das vezes destituídos de bases autênticas. No campo da estratégia política, eles não são nada, são zero.

b) O algarismo a cuja direita se estruturam todos esses zeros - assim transformados em milhões - é o clero progressista. É ele que constitui a grande ameaça ao instituto da propriedade privada no Brasil.

c) Por enquanto, a forte maioria das massas trabalhadoras rurais e urbanas ainda não está atingida pela detração sistemática que o "esquerdismo católico" move contra as elites. O ódio de classes ainda não existe entre nós.

d) A imensa erisipela constituída pelo novo tipo de guerrilha que se vai alastrando pelo País nada seria se não houvesse uma organização que, no plano concreto, desse unidade de metas e de métodos aos clérigos e leigos engajados no sinistro empreendimento de "reformar o Brasil". Essa organização é constituída pelas Comunidades Eclesiais de Base - CEBs, animadas e apoiadas pela CNBB em todo o território nacional.

e) Por sua vez, as CEBs nada conseguiriam se não fosse a motivação fundamentalmente religiosa da subversão que promovem. Motivação que, em nosso povo majoritariamente católico, lhes dá possibilidades de êxito, pelo menos a longo prazo. Vitória que o comunismo não alcançou, em nome do ateísmo, após décadas de proselitismo efetuado no Brasil. As CEBs, entretanto, promovendo uma revolução que apela para pseudo-princípios religiosos, está alcançando resultados bem mais satisfatórios.

f) Um estado de ânimo alternativamente otimista ("o perigo não existe") e pessimista ("o comunismo vem mesmo") converge para justificar em certos proprietários rurais acentuada disposição para a inércia. A deleitável inércia de quem quer viver, mais do que tudo, para fruir da segurança e fartura de sua situação.

g) Na inércia da vítima - o proprietário - está a força do agressor. Pois a História ensina que o curso dos fatos desserve sempre aos que dormem: "Dormientibus non sucurrit jus - o Direito não socorre aos que dormem".

h) A conjugação desses fatores explica como um segmento tão influente e numericamente imenso da população brasileira - isto é, a classe dos proprietários rurais - esteja sendo, em boa parte, abobadamente conduzida, pela minoria comuno-progressista, para uma situação em que certamente perderá seus direitos.

i) De onde se pode legitimamente concluir que a atual revolução posta em marcha pelas CEBs constitui um passo a mais na guerra psicológica comunista: antes mesmo de desencadear uma operação violenta em grande escala, os comunistas vêm se beneficiando de um estado de ânimo do adversário, o qual se mostra cada vez mais disposto à capitulação.

3. O contributo da TFP

Para evitar tal capitulação - cujo efeito para o País seria o mesmo de um corpo do qual se lhe corta a cabeça - o que pode fazer a TFP?

A TFP - sociedade cívica de inspiração católica - pode dar seu contributo especifico no sentido de alertar os setores responsáveis do País para as manobras da "esquerda católica".

Com efeito, sendo fundamentalmente religioso o motivo pelo qual as CEBs conseguem aglutinar e mobilizar as massas, nada é mais próprio para obstar tal aglutinação e mobilização do que mostrar que essas associações não estão em consonância com os ensinamentos tradicionais dos Romanos Pontífices, e que a luta de classes fomentada por estes organismos é condenada pela Igreja.

A demonstração desse último ponto, a TFP a tem apresentado em numerosos livros, manifestos e artigos, com cortesia, ânimo sereno, argumentação sólida e abundante documentação. O presente número de "Catolicismo" - que a TFP pretende difundir tão largamente quanto lhe seja possível - constitui um passo a mais nessa trajetória. Difundindo "Catolicismo", a TFP mais uma vez entra na liça, usando as armas pacíficas e legais próprias a controvérsias de alto nível. E incita a valorosa classe rural a que, por sua vez, faça o mesmo com não menor destemor.

Assim, a entidade formula um virtual convite à ação. De que natureza seria tal ação?

À TFP não cabe dar diretrizes nem traçar programas para as classes que ela aqui alerta. Sobram a elas os recursos de inteligência, os relacionamentos sociais e políticos e as disponibilidades econômicas para pôr em prática uma larga campanha visando articular as reações que possam cortar o passo ao presente perigo.

Convém recordar que os esforços da TFP não se têm exercido apenas junto às classes dirigentes, mas têm-se voltado amplamente para a classe média e as classes populares. Por exemplo, em 1979 a entidade promoveu, na zona canavieira do Nordeste, jornadas anticomunistas para 440 famílias de trabalhadores rurais. Mais recentemente, a partir de maio deste ano, a TFP está divulgando o livreto em quadrinhos Agitação social, violência: produtos de laboratório que o Brasil rejeita, elaborado no desejo de colocar ao alcance de amplas camadas da população alguns dos temas contidos no "best-seller" As CEBs... das quais muito se fala, pouco se conhece - A TFP as descreve como são. Em apenas 5 meses, escoaram-se 4 edições do livreto, num total de 110 mil exemplares.

4. Lições da História recente

Fatos ocorridos há pouco confirmam que uma atuação de sentido ideológico pode influir decisivamente no curso dos acontecimentos.

Habitualmente se reconhece que a TFP desempenhou papel saliente na preparação do clima psicológico que possibilitou a Revolução de 64. Entretanto, ela não participou de nenhum conciliábulo e de nenhuma reunião preparatória. Não integrou nenhuma das comissões que promoveram as célebres "Marchas".

Como agiu ela então?

Editando e difundindo largamente, de modo especial no seio das classes política e agrícola, o "best-seller" Reforma Agrária - Questão de Consciência, que explicitou, para incontáveis fazendeiros brasileiros, a consciência religiosa de seus próprios direitos, e contribuiu, de norte a sul do Pais, para que eles recusassem os rumos socialistas que vinham sendo trilhados pelo governo de então.

Depois de 64, o Brasil ingressou num período de paz. E grande parte dos fazendeiros caiu na modorra. Mas das cinzas do agro-reformismo, misturadas à grossa poeira da negligência, surgiu posteriormente uma ofensiva ainda maior. Pois desde 64 as fileiras do Episcopado nacional não cessaram de ser engrossadas por novos Bispos, em sua grande maioria simpáticos ao agro-reformismo e engajados na "esquerda católica".

Em 1980, a CNBB publicou o documento Igreja e Problemas da Terra, que propugna a divisão compulsória das grandes e médias propriedades. Cento e setenta e dois Bispos aprovaram o documento.

Ante essa nova investida, em 1981 a TFP difundiu o livro Sou católico: posso ser contra a Reforma Agrária?, que escrevi juntamente com o economista Carlos Patricio del Campo. A acolhida do público foi geralmente amável, tendo-se escoado 29 mil exemplares. Mas, enquanto em 1964 a classe agrícola tinha vontade de se defender, em 1981 muitos e até muitíssimos dentre seus elementos estavam profundamente desanimados, desarticulados e obstinadamente desatentos ao perigo reformista. Sobretudo muitas cúpulas de associações rurais estavam a léguas do problema. Como conseqüência, grande parte de seus associados implicitamente era orientada no mesmo sentido.

Reinando essas condições psicológicas na classe dos proprietários rurais, de certo tempo para cá começaram a ocorrer as ocupações de terra, ora inspiradas, ora até promovidas pela "esquerda católica". Ante elas, até o presente momento, a maioria dos fazendeiros permanece entre indolente e desconcertada. O trabalho de esclarecimento desenvolvido por alguns fazendeiros idealistas valorosos, que nem sempre são seguidos, vai conseguindo êxitos menores do que merece. Este estado de espírito de tantos fazendeiros é talvez o fator decisivo da atual situação.

Tal tendência à inércia tem-se mostrado muito menos freqüente nos Estados do Rio Grande do Sul, Goiás e Pará. E manda a justiça acrescentar que a ampla difusão deste estado de espírito se explica, em boa parte, pelo fato de que contra ele poucas vozes, além da TFP, se têm feito ouvir.

A TFP, graças a Deus, tem podido fazer muito pelo Brasil. Entretanto, nem ela nem ninguém conseguirá levar à vitória classes poderosas, constituídas por numeroso contingente e organizadas, mas em cujas fileiras penetrou, em larga medida, a displicência no que tange a própria derrocada.

Se nossas elites despertarem do letargo em que tantas delas se encontram e resolverem defender-se com força, energia, ênfase e resolução, embora dentro da estrita conformidade com as leis vigentes, ainda será possível deter a derrocada.

Se isto acontecer, como reagirá então a "esquerda católica"?

A experiência indica que a tática do esquerdismo, diante de reações lúcidas e firmes, tem sido a de não ousar enfrentá-las. Por um período ele recuará, fingir-se-á de morto e procurará refúgio em sacristias ou em salões... E depois de retemperar as forças durante a trégua, tão logo perceba que a modorra voltou a dominar, preparará nova investida.

Como será ela?

"Quem viver verá", diz o adágio popular francês.


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