Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Nova et Vetera
 
O exemplo de Péricles

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 21 de setembro de 1947, N. 789, pag. 5-6

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Valter Pitkin se estendeu em volume de quinhentas e quarenta páginas para esboçar simplesmente uma pequena introdução à história da estupidez humana. Fê-lo em linguagem blasfematória, dando a contraprova, em vários pontos, do que São Paulo dizia sobre a oposição irredutível que há entre a pseudo-sabedoria do mundo e a sabedoria de Deus. Discordamos, portanto, do autor quanto à natureza dessa estupidez, mas estamos de pleno acordo com ele quanto aos seus dilatados domínios.

Para o católico, o vício oposto ao dom da Sabedoria, e que vem a ser essa insensatez e necedade supremas, consiste em querer formar juízo cabal de uma coisa sem ter em conta o destino que Deus lhe assinalou. É a estupidez dos que forjam planos ou ajustam projetos sem lembrar-se de Deus, ou prescindindo Dele.

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Criaturas limitadas e falíveis, estamos a cada passo expostos a cair em erro e a tomar o “sim” pelo “não”. A guiar nossos passos vacilantes e incertos, temos, porém, a Igreja com sua luminosa doutrina, o exemplo de seus Santos e as lições de seus Doutores.

É a comprovação direta de que nos achamos no bom caminho. Há, porém, um outro meio, e este indireto, de nos certificarmos se enveredamos ou não por atalho errado. É um velho método experimental.

Discursava Péricles, quando é interrompido pelos aplausos de seus opositores. Vira-se então para um partidário amigo e pergunta desconfiado: será que eu disse alguma asneira?

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Se nossas ações ou idéias são elogiadas pelos inimigos da Igreja, manda-nos a prudência que analisemos com cuidado nossos atos ou atitudes, pois é possível que estejamos inconscientemente fazendo o jogo de nossos adversários.

“Se fosseis do mundo, disse aos seus discípulos o Divino Redentor, amaria o mundo o que era seu; mas, como não sois do mundo - antes eu vos escolhi do mundo - por isso é que o mundo vos odeia”.

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Este desejo de agradar ao mundo é que explica a existência de tantos católicos que “sabendo perfeitamente que nunca podem ser abandonados ou suprimidos os princípios católicos, parecem volver os olhos à Santa Sé”, pedindo com instância que seja resolvido se o socialismo moderado no que diz respeito à luta de classes e à propriedade privada “se acha suficientemente purgado de suas falsas doutrinas, para que sem sacrificar nenhum princípio cristão possa ser admitido e de certo modo batizado” (Pio XI na “Quadragesimo Anno”).

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Para que bem possamos compreender a resposta da Santa Sé, no sentido de que o socialismo, como doutrina, como fato histórico ou como ação, “é incompatível com os dogmas da Igreja católica, por ser sua maneira de conceber a sociedade oposta diametralmente à verdade cristã”, necessário se torna que renunciemos à tendência de ver na questão social apenas a luta do capitalismo sem entranhas, de um lado, e do outro um bando de vítimas espoliadas, a massa proletária.

Já nos demoramos na análise do aspecto doutrinário do problema do socialismo. Queremos hoje insistir no seu aspecto prático e político. Veremos, assim, que não se trata de um jogo natural e cego entre duas classes sociais, em que a massa, explorada e oprimida, reage e procura sobrepujar a burguesia opressora.

A acentuação do desiquilíbrio entre o capital e o trabalho é apenas um dos elementos manobrados pelos verdadeiros mentores da subversão socialista. Neste conflito artificialmente insuflado, a massa não é atora principal, mas simples comparsa, achando-se os cordéis que a manobram em mãos muito diferentes do que geralmente se supõe. E ela será a maior vítima da nova ordem que se avizinha, pois os capitalistas verdadeiramente responsáveis pelo caos econômico e pelas injustiças sociais em que nos debatemos, estes se arranjarão muito bem no regime socialista, possivelmente apenas trocarão de nome, serão os “comissários do povo” ou que denominação tiverem os diretores da máquina de produção e das “autarquias” estatais...

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Onde se acham, porém, os verdadeiros insufladores e provocadores do presente caos social, já que o burguês e o operário, embora atores e corresponsáveis por serem criaturas humanas possuidoras de livre arbítrio, não passam de meros comparsas secundários, tais como os “schiavi”, “prisioneri”, “soldati” e “contrabandisti” das óperas italianas?

Já o Santo Padre Gregório XVI na Encíclica “Mirari Vos” dizia:  “Destruído o freio da religião santíssima, pela qual somente subsistem os reinos e se confirma o vigor de toda potestade, vemos que se impõe a ruína da ordem pública, a desonra dos governantes e a perversão de toda autoridade legítima, e devemos buscar a origem de tantas calamidades na ação simultânea daquelas sociedades a que, como cloaca imensa, tem vindo parar tudo quanto de sacrílego, subversivo e blasfemo acumularam a heresia e a impiedade em todos os tempos”.

Que sociedades serão essas?

Esclarece-nos Leão XIII na Encíclica “Humanum Genus”: “Há várias seitas que, se bem diferentes em nome, ritos, forma e origem, unidas entre si por certa comunhão de propósitos e afinidade entre suas opiniões capitais, concordam de fato com a seita maçônica, espécie de centro de onde todas saem e para onde voltam”.

Estas sociedades filiadas, acrescenta Leão XIII, “posto que aparentemente não queiram de maneira alguma ocultar-se nas trevas, e tenham suas reuniões à vista de todos, e publiquem seus periódicos, contudo, bem observadas são um gênero de sociedades secretas, cujos usos conservam”.

Será o socialismo uma delas?

Sem dúvida, responde Leão XIII. Depois de se referir à subversão social, diz ele na citada Encíclica: “E são precisamente esta mudança e transtorno o que muito maduramente maquinam e sustentam em consonância muitas sociedades comunistas e socialistas, a cujos desígnios não poderá dizer-se alheia a seita dos maçons, que favorece grandemente seus intentos e concorda com elas nos seus principais dogmas”.

E se mais não fazem, acrescenta Leão XIII, é devido “à virtude da Igreja Católica” e “à parte mais sã da humanidade, que reage contra a servidão das sociedades secretas”.

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Mais ainda. Na Encíclica “Quod Apostolici Muneris”, toda ela “contra as seitas socialistas”, Leão XIII diz: “A todos, finalmente, é manifesto com quão graves palavras e quanta firmeza e constância de ânimo nosso glorioso predecessor Pio IX, de feliz memória, combateu, seja em alocuções, seja em encíclicas aos Bispos de todo o orbe, contra os iníquos intentos das seitas, e assinaladamente contra a peste do socialismo, proveniente das mesmas”.

Na carta magna dos operários, a “Rerum Novarum”, falando sobre certas associações operárias, diz Leão XIII: “De muitas delas não é lugar aqui de examinar onde nascem, que querem e por que caminhos vão. Crê-se, entretanto, e são muitas as coisas que confirmam esta crença, que as governam, comumente, chefes ocultos que lhes dão uma organização que não condiz com o nome cristão e o bem estar dos Estados”.

Passemos ao pontificado de Pio X. Depois de condenar as aberrações socialistas do “Sillon” adverte esse Soberano Pontífice na Carta Apostólica “Notre Charge Apostolique”:

“Nós conhecemos demasiado bem os sombrios laboratórios em que se elaboram estas doutrinas deletérias, que não deveriam seduzir espíritos clarividentes”.

Não queremos esgotar o assunto, mas apenas realçar como é fácil às pessoas de boa fé descobrir o carácter conspiratório e anticatólico do socialismo através da palavra dos últimos Papas.

Vemos, assim, o artificialismo da organização socialista e sua manobra por mãos ocultas, seguindo um plano determinado e orientado pelas sociedades secretas, das quais estão alheias as mais empolgantes porções da “massa”.

Socialismo e maçonaria parecem irmãos siameses. Eis o que também diz Pio XI na Encíclica “Non abbiamo bisogno” fazendo alusão à pseudo-luta do fascismo contra esses dois inseparáveis aliados: “Não podemos estar agradecidos a quem depois de haver dissolvido o socialismo e a maçonaria, nossos inimigos declarados (mas não apenas nossos), lhes abriu uma ampla estrada, como todo o mundo o vê e o declara, e permitiu que cheguem a ser tanto mais fortes e perigosos quanto mais dissimulados e mais favorecidos pelo novo uniforme”.

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Estamos, portanto, diante do mal conscientemente organizado, de um dos setores de ação do corpo místico de satanás contra o Corpo Místico de Nosso Senhor Jesus Cristo.

E se quisermos tratar realmente como irmãos aos operários, aos desprotegidos da sorte de um modo geral, um de nossos principais deveres será esse de desfazer a balela socialista das forças “cegas” que lançam as “massas” contra as elites dirigentes e de procurar extirpar o egoísmo e as paixões da sociedade de hoje - e quem diz “sociedade” não se limita a uma classe - mediante a reforma dos corações pela volta de todos ao Caminho, à Verdade e à Vida.

Quanto maior, porém, for o bem que assim fizermos ao nosso próximo, tanto mais furioso será o ódio que despertaremos nos sectários. Preparemo-nos, portanto, para receber as vaias de nossos adversários, e não aplausos.


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