Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Nova et Vetera
 
Trancas em casa arrombada

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 25 de maio de 1947, N. 772, pag. 5

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Dizia Pio XI que as formas brandas de socialismo são mais perigosas que as mais radicais e declaradas, pois que certos meios naturalmente imunes em relação aos erros grosseiros, não oferecem a mesma resistência diante do erro disfarçado.

Não nos cansamos de repetir o exemplo do trabalhismo inglês, fórmula hipócrita criada pela Sociedade dos Fabianos para impor o socialismo nas ilhas britânicas sem chocar a mentalidade conservadora dos súditos de George VI. Houve tempo em que a dissimulação dos fabianos trabalhistas chegou ao ponto de recusar qualquer ação em comum ou aliança com os comunistas. O Partido Trabalhista britânico “edificava” os ingênuos pelo seu exemplar procedimento em relação ao credo vermelho.

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Chegou, porém, o momento em que os sectários socialistas não mais julgam necessário tal despistamento. Neste período de após guerra, o líder fabiano Harold Laski se encarregou de desfazer um tanto a cortina de fumaça que separava essa solidariedade ideológica. E o seguinte telegrama da semana atrasada se encarrega de derrubar completamente o muro e de demonstrar com toda a clareza o que de há muito vínhamos afirmando:

LONDRES, 9 (R.) O relatório anual do executivo nacional do Partido Trabalhista Britânico divulgou hoje detalhes sobre as conversações privadas mantidas há nove meses em Moscou, entre “missão de boa vontade” do partido e o generalíssimo Stalin.

O relatório diz que Stalin se mostrou satisfeito por saber que dois grandes países estavam caminhando na direção socialista e afirmou que ambos poderiam atingir o seu objetivo.

Stalin – revela o relatório – disse que reconhecia, que embora o socialismo pudesse ser obtido por outros métodos além daquele que os sovietes empregaram na Rússia, acreditava que este último era o caminho mais curto, mesmo que fosse o mais difícil e pudesse motivar derramamento de sangue.

O relatório acrescenta ainda: ”Os britânicos tiveram a possibilidade de um acesso mais pacífico ao socialismo. Sabia-se que o povo britânico tinha sentimentos de amizade para com a Rússia, mas não era tão conhecido o fato desses sentimentos encontrarem reciprocidade no povo russo...”

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Como podemos notar, Stalin se confessa plenamente satisfeito com a marcha do comunismo na Inglaterra, onde ele é realizado sob rótulo do socialismo trabalhista por vias pacíficas, embora continue pessoalmente a preferir os processos violentos, que são o caminho, mais curto para a bolchevização.

Mas os mentores da subversão social sabem contemporizar onde o páreo se torna mais duro e difícil para a ação direta.

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No Brasil atualmente vemos, além da ação dos bolchevistas declarados, a mesma colaboração indireta que em outros lugares emprestam ao totalitarismo socialista os adeptos de credos políticos e sociais supostamente indiferentes ou mesmo na aparência hostis ao comunismo.

Ainda está no cartaz, por exemplo, o caso da reforma tributária proposta no ante-projeto da Constituição paulista, e que visa o gradativo confisco da propriedade privada, etapa inicial para a exploração estatal da terra e do controle dos meios de produção, base do totalitarismo socialista.

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Um dos processos indiretos de preparação socialista vem a ser justamente este confisco das rendas, através de uma taxação excessiva. Pois é meridianamente claro que quando o imposto chega a ameaçar a renda líquida, há começo de desapropriação pelo confisco do valor real do bem de raiz. É o que visa o georgismo.

Ora, como bem acentuou um dos observadores econômicos de nossa imprensa diária, o que é verdade é que Henry George não concebeu o imposto único para proteger a lavoura e os lavradores. Pensou antes no confisco da renda, conforme se vê desta frase citada por Nitti: «Não proponho nem comprar nem confiscar a propriedade particular da terra, fora injusto ou inútil. Que os indivíduos que a possuem atualmente, conservem, se quiserem, a propriedade daquilo a que chamam sua terra, e continuem, pois, a chamá-la assim; que continuem a poder vendê-la, dá-la, partilhá-la; poderemos deixar-lhes as cascas e guardaremos a noz. Não é absolutamente necessário confiscar terra, basta confiscar a renda».

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O perigo do comunismo vermelho consegue impressionar e mesmo alarmar a maioria do nosso povo. Quantos, porém, chegam a meditar sobre esses outros inúmeros disfarces sob os quais o mesmo flagelo se insinua em nosso organismo social? Quem se dispõe seriamente a observar o paralelismo do totalitarismo esquerdista com a ditadura direitista?

Nada deterá a marcha da bolchevização universal enquanto os adversários sinceros do comunismo não se compenetrarem que devem lutar contra toda uma ordem de idéias – e não apenas contra um partido, contra a coisa e não apenas contra um nome.

Estaremos pondo tranca em uma porta, deixando as demais sem defesa e, aliás, já arrombadas.


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