Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Nova et Vetera
 
O realejo totalitário

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 1° de dezembro de 1946, N. 747, pag. 5

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Não fosse a incorrigível disponibilidade de certos elementos católicos e as artimanhas e manifestações dos inimigos da Igreja resultariam inócuas, tão sem originalidade, grosseiras e pueris elas se apresentam.

Assim, por exemplo, Hitler, Mussolini e outros sátrapas totalitários da direita, usaram e abusaram do espantalho do comunismo para lançar os povos sob seu jugo para o socialismo de Estado que, no fundo, é a quintessência do próprio comunismo.

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E até mesmo o socialismo nem sempre se apresenta a peito descoberto, mas conforme as reações do ambiente em que deseja implantar-se, assume diferentes disfarces, e variados nomes. Seus últimos pseudônimos são o “trabalhismo”, a “economia dirigida” ou “planificada”, a “nacionalização dos meios de produção” etc.

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Embora a questão das palavras não deixe de oferecer importância, sendo uma das características da Babel moderna a falta de precisão de linguagem e o confusionismo dos conceitos, fato é que o nome não pertence à essência das coisas. Mesmo porque nem sempre o rótulo corresponde ao conteúdo. É imperdoável, portanto, que em um mundo inundado por uma tal avalanche de pílulas douradas, ainda haja quem se dê à ingenuidade de correr atrás de meras palavras, sem indagar ou examinar o que elas encobrem.

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E essa cegueira é ainda mais indesculpável sobretudo quando se atenta para a monótona repetição de artifícios com que se procura iludir a opinião católica.

Assim, por exemplo, o truque do perigo comunista, tão surrado pelo totalitarismo socialista da direita, está agora sendo explorado pelos próprios partidos socialistas de tendência esquerdista.

Na Itália, o socialista Saragat lança uma excomunhão maior contra o socialista Nenni, pelo fato deste último desejar a fusão dos socialistas com os comunistas. Na Inglaterra o líder do trabalhismo socialista e fabiano, sr. Haroldo Laski, move uma ação contra um jornal que o acusara de ser partidário de métodos violentos para imposição do programa de seu Partido. É claro que o sr. Laski tinha que protestar, pois uma tal acusação vinha estragar completamente seu jogo, que é o de fazer por vias pacíficas o que o bolchevismo faz pela ação direta. A ficar de pé a acusação, toda a obra de mistificação do “trabalhismo” britânico ficaria destruída, abrindo-se o ventre do cavalo de Tróia antes do tempo.

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E é desta semana um artigo do sr. Mario Mariani sobre “A Igreja e a Democracia”, publicado em um matutino desta capital, em que apresenta aos burgueses assustados o seguinte dilema: “Ou os socialistas se conformam com a fusão com os comunistas, na célebre unidade proletária - que serve aos revolucionários profissionais de Moscou, com a sua habilidade de manobras e sua falta de escrúpulos, para mandar como déspotas em todas as instituições e sindicatos trabalhadores - ou deverão apoiar-se forçosamente na democracia cristã. Ou com o despotismo russo e ao serviço do imperialismo russo, ou com o Vaticano e a serviço da política internacional da Igreja. A mesma situação alternativa que o provérbio oferece à infeliz pescada: “ou o fogo ou a frigideira”.

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Vê-se que a tática do socialista italiano refugiado na Argentina é idêntica à usada pelos fabianos do trabalhismo, com a seguinte diferença: os trabalhistas, aparentes inimigos do comunismo, de início, na Inglaterra, nem sequer se declaravam socialistas. Os sectários, porém, pensam que os tempos estão maduros para mais um passo à frente, e agora já se apresentam declaradamente socialistas, oferecendo aliança aos “democratas-cristãos” na luta contra o comunismo...

E agora usam do mesmo “tutu” do comunismo para espantar as criancinhas, joguetes das novidades doutrinárias de que nos fala São Paulo (na II Ep. a Timóteo, 1-5, n.d.c.): ou os democratas católicos se aliam aos socialistas, ou estes se aliarão aos comunistas e tudo estará perdido...

O dilema não está formulado nestes termos e manhosamente se insinua o inverso, isto é, os socialistas é que, para não cair no horror da ditadura bolchevista, deveriam procurar unir-se aos católicos. Mas quem não percebe que a dificuldade não se acha do lado socialista, mas do lado católico? Quem, a não ser portador de uma imbecilidade invencível ou do mais vesgo farisaísmo, não percebe que a um simples aceno dos católicos os socialistas viriam, em carreira desabalada, cair em seus braços? Vê-se, portanto, claramente a que ponto o sr. Mário Mariani deseja chegar.

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Bem diz, entretanto, o Evangelho que “a boca fala da abundância do coração”. E São Francisco de Sales acrescenta que pela língua se conhecem as disposições da alma.

Por mais que esses sectários fabianos dissimulem suas verdadeiras intenções e ocultem seu plano final, que é a promoção do totalitarismo socialista pela “evolução” e por pseudo-processos legais e “democráticos”, atacando pela retaguarda as tropas que forem das escaramuças do totalitarismo socialista e revolucionário, deixam sempre o rabo de fora.

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Não queremos fazer alusão à baboseira repetida pelo socialista emigrado, quando diz que “o Evangelho é socialista e, no fundo, algo de socialista havia também na Encíclica Rerum Novarum”.

Onde o rabo de palha desse manobrista fica completamente de fora é quando procura lançar a cizânia no campo da Igreja, isto é, ao tentar promover a divisão entre o Santo Padre Pio XII e os fiéis católicos. Segundo o sr. Mario Mariani, de um lado existe na Igreja “a tendência triunfante no catolicismo contemporâneo”, isto é, a dos “católicos socialistas”. De outro lado se acha o Santo Padre Pio XII com a corrente fascistizante. Para fazer o seu jogo, finge o sr. Mario Mariani desconhecer o fato de ser a Igreja adversária tanto da direita totalitária quanto da esquerda. E com isto estabelece um outro dilema muito do agrado das forças secretas: ou o totalitarismo da direita ou o totalitarismo da esquerda, ambos na aparência em antagonismo, mas ambos na realidade tangendo os povos para a escravidão do Estado totalitário e socialista regido pelo omniarca universal a ser engendrado pelo poder oculto.

Mas os verdadeiros filhos da Igreja não se deixarão seduzir por estes falsos profetas, mesmo que façam milagres e prodígios em seus planos de felicidade material, pois o Divino Redentor nos prometeu auxílio na hora extrema e só em Deus se acha nossa esperança de salvação no caos em que o mundo cada vez mais se engolfa.


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