Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Nova et Vetera
 
Protestantismo descristianizante

 

 

 

 

 

Legionário, 3 de fevereiro de 1946, N. 704, pag. 5

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Para continuidade da ação de Seu Corpo Místico, deixou Nosso Senhor Jesus Cristo na terra a Santa Igreja, a que confiou a missão de salvar as almas, de repartir e de colher os frutos da Redenção. A Igreja faz parte, portanto, do plano divino de salvação do gênero humano. Este plano existe e se concretiza na obra realizada pelos sucessores de São Pedro, pelos mártires, pelos confessores, pela Igreja militante, unida à Igreja triunfante, pelo liame da Comunhão dos Santos.

Vimos, no estudo sumário que fizemos das heresias, que a continuidade de ação do Corpo Místico de Satanás também estava a exigir uma sociedade, incumbida de levar avante no mundo o plano de perdição engendrado por Lúcifer, caricatura do plano de salvação que nos trouxe o Messias.

Se já no tempo de Santo Agostinho os maniqueus tinham reuniões secretas, cujo ritual, cujos juramentos, cujo caráter hermético em tudo e por tudo coincidem com o que se passa no recesso das lojas de nossos dias; se em plena Idade Média vemos essa mesma organização secreta como base de ação da heresia dos albigenses, dos cátaros, dos templários; se desde o início do Renascimento constatamos a presença dessa associação oculta no insuflar da revolta humanista e do livre exame protestante: se o dedo desse poder secreto se faz notar no filosofismo, na revolução liberal, na revolução comunista de nossos dias, bem podemos afirmar que é a maçonaria essa sociedade que no Corpo Místico de Satanás exerce o papel que no Corpo Místico de Cristo cabe à Sua Santa Igreja. Diz a sabedoria popular que Judas é o “santo” do demônio. Com efeito, assim como Deus não dispensa a colaboração dos homens e a história da Igreja está a demonstrar o papel providencial de seus Santos e Doutores, do mesmo modo Lúcifer não dispensa o concurso dos filhos de Adão, e a escolha desses auxiliares não resta dúvida que obedece a um critério inteligente, sendo muitas vezes feita pessoalmente pelo demônio, como se depreende da tentação do próprio Salvador, que Lúcifer via ser um homem prodigioso, mas que ignorava fosse o Messias.

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Lutero foi um desses instrumentos do pai da mentira. Vimos, ademais, em nosso último número, como as forças secretas constituíam a alma danada da pseudo-reforma protestante. E se elas se achavam presentes no nascimento desse monstro, não deixaram de acompanhar-lhe os passos através dos séculos, valendo-se desse germe de dissolução religiosa para realizar seu plano indireto e incompleto, que é o de substituir a verdadeira Igreja por uma imitação simiesca, para em seguida liquidar essa própria contrafação e lançar o mundo no mais completo naturalismo: fim último e completo das seitas secretas.

Com efeito, segundo Leão XIII afirma na Encíclica “Humanum Genus”, “o supremo desejo dos maçons é arruinar completamente toda a disciplina religiosa e social nascida de instituições cristãs e substituí-la por uma nova, talhada segundo suas ideias, e cujas leis e princípios fundamentais sejam fornecidos pelo naturalismo”.

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Foi o protestantismo a causa mais próxima da doutrina do Contrato Social, germe do socialismo e do totalitarismo modernos, tendo a revolução liberal como etapa intermediária.

Aliás, constatemos um fato curioso: não foi Rousseau o criador do Contrato Social. Antes dele, um protestante, sob o pseudônimo de Junius Brutus, expunha pela primeira vez a teoria do “contrato” como origem da sociedade.

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A ação desagregadora da heresia protestante, de Lutero aos nossos dias, tem sido desenvolvida paralelamente com os progressos do plano de perdição das forças secretas.

Segundo o depoimento de autores católicos que têm tratado do assunto, “a franco-maçonaria favorece e algumas vezes ela própria funda as “Sociedades Bíblicas”. Os protestantes não iniciados talvez acreditem que essas sociedades, aparentemente dirigidas por eles próprios, não sofram influência estranha. Na realidade, elas frequentemente não passam de meros instrumentos e até mesmo de setores da franco-maçonaria” (ver por exemplo “La Cité antichrétienne au XIXème siècle”).

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Assim agindo, bem sabem os sectários que através do protestantismo estão conduzindo os espíritos ao racionalismo e ao naturalismo. Já a revista maçônica “Latonia”, da Alemanha, dizia que “o protestantismo é a metade da maçonaria”, isto é, acaba por rejeitar a Bíblia e por abraçar o racionalismo. Aliás, os próprios católicos, submetidos à influência protestante, caem no racionalismo, mesmo sem passar pelo protestantismo.

Foi o que compreendeu o Grande Oriente francês ao fundar a “Liga do Ensino” e ao confiar a três conhecidos intelectuais protestantes a elaboração e a execução das leis escolares da terra de São Luís (IX, rei de França, n.d.c.), na segunda metade do século passado.

Dizia um deles, Pecaut: “A obra de secularização moral que as sociedades católicas não realizaram no século dezesseis por via de reforma eclesiástica ou religiosa, as sociedades católicas tentam fazer por via de reforma escolas” (G. Goyau no livro “A escola de hoje” – 1ª. série).

Quer dizer, o que não fez Lutero diretamente com o protestantismo, faria Edgard Quinet (1803–1875, histórico, escritor e político francês, n.d.c.), com o laicismo escolar.

De Quinet dizia Léon Gambetta (1838-1882, político francês, n.d.c.): “Foi o promotor do ensino leigo em França”. E qual era a opinião desse representante do Grande Oriente francês junto ao setor do laicismo escolar quanto ao meio mais eficaz de combate à influência da Igreja Católica junto ao povo?

“Para acabar com toda religião, dizia E. Quinet na introdução às obras de (Filips van) Marnix, eis as duas vias que se abrem diante de nós. Podeis atacar, juntamente com o catolicismo, todas as religiões da terra, e especialmente as seitas cristãs; neste caso, tereis contra vós o universo todo inteiro. Pelo contrário, podeis vos armar de tudo o que se opõe ao catolicismo, especialmente todas as seitas cristãs que lhe movem guerra; se a isso acrescentardes a força de impulsão da Revolução Francesa, colocareis o catolicismo no maior perigo por que jamais passou. Eis porque me dirijo a todas as crenças, a todas as religiões que já combateram Roma: quer queiram ou não queiram, se acham todas elas em nossas fileiras, pois que no fundo sua existência é tão irreconciliável que a nossa com o domínio de Roma. Não são apenas Rousseau, Voltaire e Kant que se acham conosco contra a eterna opressão (a Igreja Católica): são também Lutero, Zwinglio, Calvino, etc., toda a legião dos espíritos que combatem com seu tempo, com seus povos, contra o mesmo inimigo que nos embarga os passos. Que de mais lógico no mundo que fazer um único feixe das revoluções que apareceram no mundo nestes últimos séculos e de as reunir em uma mesma luta, para conseguir a vitória sobre a religião da Idade Média”.

São desse mesmo trespingado as seguintes palavras: “As seitas protestantes são as mil portas abertas para se sair do cristianismo”.

E Mons. Wilhelm Emmanuel Ketteler, o grande apóstolo dos operários, em seu livro “A Alemanha após a guerra de 1866”, fornece curiosos pormenores das manobras dos sectários maçons para fazer da Alemanha um vasto império protestante.

No plano internacional, dizia Eugenio Sue (1804-1857, escritor francês, n.d.c.): “O melhor meio de descristianizar a Europa é protestantizá-la”.