Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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O Novo Mundo

 

 

 

 

 

Legionário, 3 de fevereiro de 1946, N. 704, pag. 2

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Vai surgir qualquer coisa nova na vida humana! Os espíritos precursores (quase íamos dizendo os “profetas”, mas o termo se presta a equívocos) já de há muito estão anunciando uma nova era, um novo mundo, uma nova civilização. Estamos no limiar, é o que se vem repetindo. E a nova era vem mesmo, é inelutável e imprescindível. Mas quem será ela? Quem desvendará o mistério?

Entretanto este mistério já revelou alguma coisa de seus segredos. Desde que a primeira guerra veio demonstrar a fragilidade de fundamentos que se supunham inabaláveis, talvez antes disso mesmo, antes não tanto como depois disso são já muitos os que puseram mãos à obra e já deram início à edificação da cidade futura. Certamente um marco importante neste processo foi o “ravissement” (maravilhamento, arrebatamento, n.d.c.) espiritual de Jules Romains, quando descia a “Rue d’Amsterdam”, e que o arrancou à disponibilidade em que se encontrava.

Nós, católicos, vivemos a proclamar e a insistir em que não haverá paz sem Deus, que todos os movimentos pacifistas abortarão se não se reintegrar a Religião em seu lugar; e assim queremos assinalar a inanidade dos esforços dispendidos neste século para afastar os pesadelos das guerras.

Não sabemos até que ponto vamos causar espanto, mas nossa opinião é que estamos chovendo no molhado. A necessidade de uma base religiosa, mesmo mística, para o pacifismo é questão passada em julgado para as inteligências mais lúcidas de nosso tempo.

Ainda agora acabamos de ler um artigo do Sr. Bastide no “Estado de S. Paulo” sobre o poeta francês Jouve (1887-1976). Aí está uma interessante figura de literato que pôs a sua pena e a sua inspiração ao serviço do pacifismo. Porém o pacifismo de Jouve não é de comités nem de propaganda; é ontológico. O poeta despojou-se de si mesmo, passou por “noites escuras, até atingir o âmago de sua experiência mística onde se apresentam os dados fundamentais do destino humano. É em função destes dados que põem para Jouve os termos do problema, ou, melhor, do “mistério” da paz para utilizar uma terminologia atual. A paz será fruto da comunhão dos homens nesta mesma experiência mística. Tal mística, porém, está acima de qualificações confessionais, é natural, espontânea e livre. Ricos e pobres, bons e maus, nobres e plebeus, os querubins e os vermes, tal como na Ode de Schiller, cantada na 9ª. Sinfonia, todos viverão da mesma alegria, da mesma centelha divina.

É interessante observar que simetricamente a isto nota-se uma tendência de socialismo, como de esquerdismo em geral, a despir-se de seu aspecto puramente utilitário, que joga quase exclusivamente com fatores econômicos, bem como de seu modo mecânico de conceber a vida social, para assim, livres de dogmas e de uma rígida administração partidária, liberto de esquemas, penetra na vida espiritual, apelando para instituições fundamentais, tomando assim um caráter nitidamente religioso. Estes fatos naturalmente não se notam nos comícios, mas se preparam nos bastidores.

Para completar o quadro, recordemos que um telegrama, divulgado pelo Escritório de Assuntos Interamericanos, informava, ainda recentemente, de que na cidade polonesa de Lidice, que vai ser reconstruída, será levantada uma igreja, onde haverá capelas dedicadas a cada uma das religiões do mundo.

Tudo isto são alguns indícios da “vista venturi saeculi” que se prepara... Quem lê, entenda.


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