Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Nova et Vetera
 
Ainda os cordéis que manobram o totalitarismo socialista

 

 

 

 

 

Legionário, 21 de outubro de 1945, N. 689, pag. 3

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Não nos temos cansado de dirigir a atenção de nossos leitores para o fato de ser a luta destinada à implantação do Estado totalitário socialista no mundo, uma luta de várias frentes, que se estende desde o mais radical e façanhudo comunismo ou nazismo, ao mais brando e hipócrita “socialismo cristão”, de que é exemplo o tipo esposado por alguns elementos representativos da seita anglicana.

De que se trata de um plano comum, para martelar a cidadela católica, não resta dúvida alguma. Como dizíamos em nosso último rodapé, onde o comunismo não consegue entrar, a esquerda socialista força a brecha. E onde o socialismo “avançado” também é repelido, procura-se passar o contrabando de um socialismo atenuado.

Se esse movimento é articulado, ocorre então a pergunta: de onde promana o comando dessa frente única das forças totalitário-socialistas? Não há muito tempo procuramos desvendar uma das pontas do véu que encobre esse mistério de iniquidade. Foi quando indicamos, para edificação dos ingênuos, onde vão terminar os cordéis que manobram os fantoches socialistas - verdadeiro segredo de polichinelo para os círculos geralmente bem informados... que entretanto evitam cautelosamente abordar este importantíssimo aspecto dos acontecimentos políticos e sociais.

* * *

Estudávamos as resoluções adotadas pela convenção do Grande Oriente francês, reunida em Paris de 21 a 26 de setembro de 1936. Passamos em revista as “medidas imediatas” então aprovadas para a “socialização dos meios de produção e distribuição”, e prometemos oportunamente voltar ao assunto para analisar as “medidas ulteriores”. É o que faremos hoje, baseados no texto publicado pela “Documentation Catholique” de 31 de outubro de 1936.

Dir-se-á que esse documento poderá interessar apenas à França, pois a esse país se destinam as medidas aprovadas naquela convenção. Entretanto, como é fácil de se verificar, são tantas as “coincidências” entre essas medidas e o que vem sendo realizado em outras partes do mundo, que se chega à conclusão de se tratar de uma palavra de ordem geral, de uma instrução lançada a todo os quadrantes do globo.

Já nas “medidas imediatas” vimos o germe do “planejamento” destinado a fazer caminhar a economia e as forças de produção e de consumo segundo essa orientação emanada das “arrière loges”. Já se falava também na “socialização das indústrias chaves, do crédito, dos seguros, dos bancos e da imprensa”, bem como na “generalização dos seguros contra todos os riscos, instituição de aposentadoria para todos os homens e todas as mulheres de mais de sessenta anos”.

Isto nos faz pensar na Inglaterra sob o domínio de um governo trabalhista, formado em sua maioria por socialistas fabianos que estão levando avante, “slowly but surely” (lentamente mas decididamente), o plano de socialização das minas, das empresas de energia elétrica, do Banco da Inglaterra, para não falar no plano Beveridge que representa uma das mais audazes tentativas para conduzir as ilhas britânicas ao mais completo coletivismo, e cuja adoção está sendo estudada sob formas diferentes e disfarçadas, depois da repulsa que inicialmente suscitou.

Isto, porém, não passa de um simples ensaio para um voo mais largo no sentido do totalitarismo socialista.

Eis a primeira das “medidas ulteriores” preconizadas pelo Grande Oriente francês já em 1936:

1º. Socialização dos meios de produção e da distribuição em um regime econômico descentralizado com base na liberdade individual”.

Como vemos, não mais se trata da socialização das indústrias chaves e de outros organismos econômicos, como nas “medidas imediatas”, mas simplesmente da “socialização dos meios de produção e de distribuição”.

Quanto ao “regime econômico descentralizado, com base na liberdade individual”, bem sabemos que valor lhe atribuir. Como disse Pio XI, na organização “socializada” da produção, “os bens mais elevados do homem, sem excetuar a liberdade, estarão subordinados e mesmo sacrificados às exigências da produção mais racional” (“Quadragesimo Anno”).

E é a essa produção mais racional que se refere a segunda medida da série que estamos enumerando:

“2º. Intensificação da produção em todos os domínios:

a) pelo máximo rendimento do aparelho de produção;

b) pela aplicação imediata desde o instante de sua descoberta de processos técnicos que permitam aumentar o rendimento ou diminuir o trabalho dos homens”;

O que se acha em estreita conexão com as duas medidas seguintes:

“3º. Criação do Ministério da Ciência e de suas aplicações técnicas, em relação estreita com a produção e a economia”;

“4º. Repartição integral da produção entre todos os consumidores em função das necessidades normais do homem.”

De modo que, ainda citando Pio XI, “este atentado contra a dignidade humana, na organização “socializada” da produção, se achará amplamente compensado, asseguram eles (os socialistas), pela abundância de bens que, socialmente produzidos, serão prodigalizados aos indivíduos, e que estes poderão a seu gosto dedicar-se às comodidades e aos prazeres desta vida”.

* * *

Não basta, porém, produzir e consumir. O Estado totalitário socialista deve também combater os gigantes da saga beveridgeana: a Miséria, a Doença, a Ignorância, a Promiscuidade e a Ociosidade. E deve combatê-los depois de afastar de seu caminho o trambolho dos vários órgãos associativos de iniciativa privada, destinados à assistência e previdência social das várias classes e profissões. E estaremos livres da preocupação de formar um pecúlio para a aquisição da casa própria e para enfrentar os azares do futuro. O Estado se encarregará de tudo:

“5º. Substituição das instituições antiquadas de crédito, de poupança e de capitalização por um regime de previdência, que implique a inscrição de todo recém-nascido no “grande livro do delito social” e a instituição de um “mínimo vital” levado tão alto quanto o permita o estado da ciência e da técnica e que garanta a cada um, do nascimento à morte, contra todos os riscos da existência”.

Temos aí o Estado, senhor absoluto da previdência e da assistência social, por meio de organismos monstruosos que tudo avassalam. Organismos que no dizer pitoresco de um dos nossos estudiosos de assuntos sociais, costumam se assemelhar a uma frondosa e copada árvore que abriga sob sua ramaria toda uma legião de funcionários, de “técnicos” e de negocistas, deixando, porém, ao sol e à chuva... aqueles a quem devia beneficiar, isto é, a massa anônima de seus contribuintes e associados.

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Entre nós, há quem seja favorável à aplicação de reservas do seguro social na fundação, mantença e desenvolvimento da indústria e em outros ramos da atividade econômica. Como facilmente se pode perceber, essa aplicação de capitais, por parte de organismos estatais que dispõem de fabulosos recursos, oferece o grave perigo de abrir as portas para a coletivização dos empreendimentos industriais e agrícolas, oferecendo uma concorrência esmagadora à iniciativa particular.

Manda o bom senso que os seguros sociais sejam baseados em sólidos cálculos atuariais de que decorram prêmios e contribuições adequados a garantir a prestação dos benefícios, sem necessidade dessa aplicação de reservas em discutíveis empreendimentos industriais e agrícolas. Tais reservas poderiam ser exclusivamente empregadas na resolução do problema da casa própria e da pequena propriedade para os associados, base arqui-conhecida do bem-estar econômico de um povo.

Que acontece, porém? Não somente se dá preferência a esse emprego das reservas em atividades estranhas ao problema da previdência social, mas também começa a prevalecer o ponto de vista de que não se deve favorecer a aquisição da casa própria, mas a construção de grandes grupos residenciais e coletivos, para aluguel! Eis, portanto, o Estado transformado em proprietário da habitação de seus súditos. E já está na Constituição soviética que “a massa fundamental das habitações nas cidades e as aglomerações industriais são propriedade do Estado” (artigo 6).

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Mais ainda.

Dizíamos, recentemente, que a contrafação totalitária do cooperativismo transformaria a sociedade em uma imensa legião de operários, escravos das usinas pertencentes aos organismos econômicos do Estado, e obedecendo exclusivamente aos cânones da eficiência e dos interesses exclusivos do mesmo Estado, ao lado de uma multidão de funcionários públicos também padronizados, e encarregados da complicada burocracia estatal. Todos vestidos, educados (?), medicados, alimentados, arrumados em residências coletivas pelo Estado, único produtor, único educador, único proprietário, única Providência dos cidadãos.

E é a esse pan-cooperativismo absorvente e coletivista que visa a seguinte medida, a sexta do grupo que estamos comentando:

“6º. Organização da “República Social”, sindical e cooperativa pela instituição de agrupamentos de produtores e de consumidores, sendo os produtores sindicalizados os delegados da coletividade na produção que será distribuída pelos sindicatos de consumidores, sob a base comunal, regional ou nacional, conforme o caráter das empresas”.

Portanto, a “República Social”, projetada pelas forças secretas, terá por base o sindicato e a cooperativa. Os sindicatos serão os órgãos do Estado para manobrar as massas trabalhistas, assim como as cooperativas serão os organismos dedicados a conduzir a produção e o consumo, nas mãos de funcionários governamentais.

Ora, o monopólio da previdência social pelo Estado, quer explicitamente, por meio de leis, quer indiretamente, mas de fato, pela concorrência com a iniciativa privada, visto que a tendência é para a absorção de todos os riscos, em si já constitui um perigo para o corpo social, razão pela qual o Código Social de Malines aconselha que, para resolver o problema da previdência, “convém instituir de preferência Caixas profissionais de seguro, isto é, caixas alimentadas e geridas juntamente por patrões e operários de cada profissão, com fiscalização e apoio dos poderes públicos”.

Mas quando os poderes públicos, em vez de se limitarem a fiscalizar e apoiar a iniciativa privada, se propõem chamar a si a previdência de modo total, além disso transforma esses organismos em pan-cooperativas destinadas a fornecer ao povo alimentos, vestuário, medicamentos, educação (?), casa e toda a forma de assistência material, com essas medidas o (executam) com mãos de gato, presta um concurso mais eficaz à implantação do Estado totalitário socialista, que toda uma falange de Agildos Baratas e Trifinos Corrêas com seu comunismo aberto e flibusteiro.

Essa previdência e assistência social fascistizada e monopolizada pelo Estado abre caminho para medida seguinte:

“7º. Substituição da moeda por “bônus” de consumo, uns de uso determinado para os produtos básicos da existência, outros de uso indeterminado, para deixar a cada consumidor a liberdade de escolha.

“8º. Instituição de um serviço social de trabalho a ser prestado por todos os indivíduos válidos, sendo sua duração e seu caráter determinados pelas necessidades coletivas e pelas aptidões e gostos pessoais de cada trabalhador”.

E estará a humanidade, desse modo, depois de vinte séculos de civilização católica, reconduzida à condição da plebe romana nos dias em que os régulos totalitários do paganismo lhe forneciam, gratuitamente, pão e circo, plebe de parasitas e funcionários públicos, de gladiadores, palafreneiros de circo, dançarinos e de exploradores de todos os vícios sociais, alimentada, vestida e anestesiada pelos espetáculos públicos e esportivos, à custa do trabalho escravo nas grandes propriedades dos dominadores da máquina do Estado.

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Que nos resta fazer? Empregar contra esse flagelo que nos ameaça o mesmo remédio que livrou o mundo dos despostas totalitários do cesarismo pagão: a prática fiel e completa da doutrina social da Igreja, que pressupõe a reforma dos corações e das vontades, orientando o homem para Nosso Senhor Jesus Cristo, que hoje como ontem e amanhã, para todo o sempre é o Caminho, Verdade e Vida.