Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Comentando...
 
A nacionalização da economia

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 9 de setembro de 1945, N. 683, pag. 2

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Merece ser atentamente meditado o artigo do sr. Harcourt-Rivington, publicado recentemente pelo “Estado de São Paulo”, sobre a nacionalização da economia, ou seja, o controle absoluto do Estado sobre as atividades econômicas. O autor vai diretamente aos fatos, e lembra a experiência socialista inglesa de 1931, quando Mac Donald era primeiro ministro. Como sói acontecer a economia rural foi a cobaia, através das “Leis do Mercado Agrícola”, a economia urbana não foi afetada. A “urbs” moderna está se tornando cada vez mais um aglomerado inorgânico, sem relação com os interesses vitais do país; o seu habitante quer receber alimentação farta, boa e abundante, sem saber como, e costuma olhar com desprezo e com desconfiança as populações rurais. Pela sua contiguidade com os grandes centros de administração pública o homem urbano acaba por dominá-la completamente, estabelecendo uma verdadeira ditadura sobre o homem rural. São de origem urbana, geralmente, as teorias de socialização ou redistribuição das terras. O homem urbano, convencido de sua superioridade, atribui à incapacidade do homem rural todos os problemas da agricultura, e se considera capaz de resolvê-los. Daí o absoluto descaso e sobranceria com que os órgãos de controle da economia rural, sempre nitidamente urbanas (como entre nós, o DNO, por exemplo), costumam tratar o homem rural e seus interesses pessoais como se fossem criaturas inferiores e desprezíveis. Não deixa de ser cômico o espetáculo do sr. Prestes ser aplaudido freneticamente, ao prometer a distribuição de terras por parte de pessoas que não seriam capazes de cultivar uma horta. A respeito deste assunto Spengler tem razão.

Mas, voltemos à experiência do sr. Mac Donald. O sr. Harcourt-Rivington no referido artigo, analisa concretamente o que aconteceu com o leite. Toda a economia leiteira da Inglaterra passou a ser governada discricionariamente pela “Junta do Leite”. Seria demasiado longo relatar aqui todas as graves perturbações que isto causou àquela economia. Queremos salientar apenas o seguinte: o público logo teve que pagar preços bem mais elevados pelo produto, pois a “Junta” se revelou um organismo extremamente caro. Tão caro mesmo, que este aumento de preço não bastou e a “Junta” precisou de ser subvencionada pelo Governo, que para isto, recorreu a um novo agravamento dos impostos. Por outro lado, assumindo a “Junta” o monopólio do comércio do leite, os produtores ficaram obrigados a entregar a ela toda sua produção, sendo punível a venda direta. Para garantir tal monopólio a “Junta” estabeleceu uma verdadeira inquisição contra os produtores, com um tribunal de exceção funcionando em Londres cujos julgados eram irrecorríveis. Deste tribunal, certo juiz chegou a dizer que era uma reedição da famosa “Câmara Estrelada”, de negra memória. E como tal tribunal funcionava em Londres, muitos produtores deixavam correr à revelia os processos, por não poderem ir à Capital. Por isso, muita gente ficou arruinada.

Este exemplo é claro para demonstrar como é antinatural a socialização ou a nacionalização (é a mesma coisa) da economia e como termina, necessariamente, num estrito totalitarismo. De fato, nada adiantam as declamações a respeito da dignidade da pessoa humana e de liberdade, se se tiram as condições físicas a esta liberdade e dignidade. A alma humana existe num corpo material, com exigências materiais. E se o Estado tiver controle destas condições materiais, a liberdade e a dignidade terão se evaporado.

Diante disto o sr. Harcourt-Rivington indaga como foi possível a vitória trabalhista nas últimas eleições inglesas, que deu ao sr Attlee plenos poderes para nacionalizar a economia. E dá essa resposta muito digna de ser considerada:

“Milhões de eleitores são jovens, tanto homens quanto mulheres, de idade variando entre 21 a 25 anos, os quais, não sendo casados, não tem responsabilidades e não tem experiência dos problemas domésticos. Vivem nas cidades, pouco sabem a respeito das condições agrícolas e muito menos da administração da justiça ou da ciência da economia. Milhões de outros, de idade mais madura, também vivem nas cidades e também são igualmente ignorantes das questões rurais. Acredito não ser exagero dizer que nem um em mil eleitores britânicos sabe alguma coisa sobre o funcionamento das “Leis do Mercado Agrícola”, e certamente nada sobre os abusos que provocara, e certamente se mostraria incrédulo se estes lhe fossem apontados.” E para nossa edificação, acrescentemos mais este comentário do sr Harcourt-Rivington: “Todos estes acontecimentos verdadeiramente estonteantes ocorreram em um país onde a democracia havia chegado ao mais alto grau de perfeição.”


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