Plinio Corrêa de Oliveira
Nova
et Vetera
Legionário, 2 de setembro de 1945, N. 682, pag. 5 |
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Que é preciso fazer, que remédios haveremos de usar para defender a Civilização cristã contra os perigos que a ameaçam? “Como em todos os períodos mais tormentosos da história da Igreja, responde-nos Pio XI na Encíclica “Divini Redemptoris”, assim também hoje o remédio fundamental é a renovação sincera da vida particular e pública, conforme os princípios do Evangelho, em todos aqueles que se gloriam de pertencer ao redil de Cristo, a fim de que sejam realmente sal da terra, que preserva a sociedade de tal corrupção”. Vivamos, portanto, verdadeira e sinceramente a nossa Fé, empreguemos o melhor de nossos esforços e de nossos sacrifícios pela renovação da vida pública de que depende a salvação de nossa Pátria, diante dos perigos que a ameaçam. Entre as armas pacíficas de que dispomos para esse bom combate, se acha o uso do direito de voto. Torna-se assim, muito oportuno dedicar esta crônica de transcrições a alguns tópicos do que, sobre o dever eleitoral e a união dos católicos nestes momentos decisivos da vida de um país, se acha nos ”Princípios Católicos de Ação Cívica” obra em que D. Lallement, a pedido da Assembleia de Cardeais e Arcebispos de França, procurou reunir os ensinamentos da moral católica concernentes à atividade política dos filhos da Igreja. Inicialmente uma pergunta muito importante nestes dias em que nos achamos em plena campanha de alistamento eleitoral: “O uso do direito de voto atinge a consciência?” Na medida em que a constituição do Estado outorgue o direito de voto como meio de participar na condução dos negócios públicos, os cidadãos, por estar obrigados a ocupar-se do bem público, devem considerar o uso desse direito como um caso de consciência. Estão, pois, obrigados: 1) a usar os direitos de voto que lhes outorga a constituição; 2) a usar deles para o bem comum (Carta do Cardeal Rampolla, em nome de Leão XIII, ao Arcebispo de Bogotá). Em que se funda esta obrigação de consciência? 1) Na justiça social. É um dever do direito natural para o cidadão o aplicar-se em impedir o mal e o procurar o bem da sociedade, dentro das funções que lhe tenham sido designadas pela Constituição. Havendo-nos concedido a lei o direito do sufrágio para que demos legisladores ao Estado, dirigentes aos municípios, etc., se nos abstemos, não fazemos o bem a que estamos obrigados; facilitamos o mal. E se usamos o direito de voto para servir interesses privados, interesses pessoais ou interesses de grupo ou de partido, em detrimento do bem comum, faltamos da mesma maneira a nossos deveres para com a sociedade. Isto tende indiretamente a causar com muita frequência graves prejuízos às famílias e às pessoas que tem necessidade de uma prudente administração municipal e geral. 2) Também se funda esta obrigação de consciência na Fé e na Religião. Como pedimos no Padre Nosso “Venha a nós o Vosso Reino”, é nosso dever de homens, de batizados e de confirmados - sobretudo em tempos em que a Fé periga – a não deixar nada por fazer, dentro das funções que nos correspondem, para impedir aquilo que seria prejudicial para o bem das almas, à ação espiritual da Igreja e procurar, pelo contrário, as condições que tornem mais fácil o exercício de sua missão. Não votando, ou votando por candidatos hostis à religião ou que desconheçam a necessidade de seu papel na sociedade, os católicos faltam a seus deveres com respeito a Deus, à Igreja e à alma de seu próximo (Encíclica “Immortale Dei”, II, 47, 49). 3) Esta obrigação também se funda na Caridade. A abstenção é um motivo de escândalo. Se a pessoa se crê com direito a abster-se, também seu vizinho pensará do mesmo modo. Pelo contrário, a presença de um único homem pode arrastar a outros que se achavam tentados a não cumprir seu dever. O “farão o mesmo sem mim” é sempre um raciocínio lastimável, oposto ao espírito de ajuda fraternal e de colaboração. Por outro lado, o uso do voto em benefício de interesses privados, em detrimento do bem comum, é, evidentemente, ao mesmo tempo que contrário à justiça social, contrário também ao amor de Deus, de nossa pátria e de nossos concidadãos. * * * Pode a abstenção chegar a ser uma falta grave? A gravidade da falta daquele que não vota varia de acordo com a seriedade dos interesses que se ventilam. Frequentemente uma eleição põe em jogo interesses de grande importância para a Igreja e para o Estado; a abstenção é então uma coisa grave. É particularmente grave nos momentos de grande dificuldade para a Igreja e para o país; e quando a eleição é asperamente disputada entre aqueles que servirão verdadeiramente o bem público e aqueles que o comprometerão. “Com efeito, aqueles que se esforçam por destruir a religião e a sociedade, buscam, antes de tudo, apoderar-se da direção dos negócios públicos e fazer-se eleger como legisladores” (Pio X, Inter Catholicos, II, 150). * * * Acha-se obrigado o eleitor a examinar que uso fará o eleito do poder que seu voto tende a conferir-lhe? Como o eleito pode usar bem ou mal o mandato eletivo que lhe foi confiado, o eleitor, ao votar, deve prever, tanto quanto lhe seja possível, o uso que o eleito fará de seu poder. “O principal esforço dos católicos nesta matéria será o de enviar, seja à municipalidade, seja ao corpo legislativo, homens que, dadas as particularidades de cada eleição e as circunstancias de tempo e de lugar, pareçam velar melhor pelos interesses da religião e da pátria na administração dos assuntos públicos” (Pio X Inter Catholicos II, 152). O voto é uma função pública na qual não se devem deixar dominar considerações de amizade pessoal ou de agradecimento privado, mas na qual se devem deixar dominar a clara preocupação do verdadeiro bem comum. * * * Qual será o bom candidato? Será aquele que possua competência e capacidade para preencher a função que lhe será confiada. A competência exige o conhecimento dos problemas sociais que se expõem ao estudo da assembleia da qual o eleito fará parte; ou se este conhecimento atual falta, a capacidade e a vontade de adquiri-lo. Será um candidato honesto, que permita acreditar prudentemente que cumprirá a função que lhe será conferida conforme as leis da religião e as exigências do bem comum. O candidato deve achar-se disposto a não votar senão aquelas medidas em que sejam respeitados os direitos superiores de Deus, de Jesus Cristo, Rei e Redentor do mundo e da Igreja estabelecida por Nosso Senhor entre as nações, acima delas, para santificá-las (direito de ser reconhecida, direito de exercer seu magistério de verdade, de ensinar, de exercer seu ministério de santificação, seu culto público, seu governo hierárquico, e direito de possuir); medidas nas quais serão também respeitados os direitos imprescritíveis da consciência religiosa (liberdade de praticar individualmente ou em comum a religião, de instruir-se nela e de instruir aos demais, aos meninos em particular). A honestidade exige, ademais, que o candidato tenha a vontade de defender ou de realizar as outras condições essenciais à vida e à prosperidade do país e que são: a família com sua indissolubilidade e sua unidade, com sua liberdade de instruir e de fazer instruir seus filhos em conformidade com seus princípios religiosos; a propriedade com os direitos do capital e do trabalho, com as obrigações de justiça social e de caridade; a autoridade com o caráter de missão divina que impõe seus justos mandatos à obediência dos subordinados e com sua função de guardiã e de promotora do verdadeiro bem comum. Estas condições bastam para assinalar as obrigações que se impõem ao bom candidato e os artigos que devem ter o primeiro lugar em seu programa. Um candidato é mau quando é incapaz de preencher a função que ambiciona, ou na medida em que suprime algum ou o conjunto dos princípios acima. * * * Estão os católicos obrigados a unir-se no terreno eleitoral, para defender sua Fé e as exigências primordiais do bem comum? Não obstante ser verdade que os católicos podem, no exercício de seu direito eleitoral, preocupar-se em fazer triunfar de um modo justo as concepções políticas que julguem pessoalmente melhores, é absolutamente necessário evitar que o espírito de partido tenha primazia sobre a consideração do bem da religião e das exigências fundamentais do bem comum. As divisões dos católicos nas eleições constituem um mal gravíssimo. Elas têm sido frequentemente causa de cruéis vexames e perseguições para a Igreja e podem, do mesmo modo, ser muito prejudiciais ao bem da ordem no país. Em qualquer caso em que a eleição for disputada de tal maneira que ponha em jogo os interesses da religião e os mais graves interesses do país, existe, pois, a obrigação de eleger um candidato capaz de reunir em torno de si a maioria dos católicos e dos demais cidadãos de boa vontade e de fazer calar toda ambição particular, toda rivalidade de partido (Pio X, Inter Catholicos, II, 150). * * * Quais são os deveres dos eleitos? Devem visar o bem comum na forma em que lhes corresponda dentro da função para a qual hajam sido eleitos. Toda função pública, com efeito, tem por lei suprema o verdadeiro bem comum. Não devem, pois, ter primazia os compromissos partidários ou as promessas que hajam sido feitas sem prever o que exigiria o bem real do país, sobre o que se reconhece ser, uma vez em exercício, o bem público. As promessas de um candidato honesto não podem ser interpretadas senão deixando a salvo “o bem comum que ele deverá defender sendo eleito”, por ser essa a primeira regra do mandato ambicionado. Um católico eleito para uma função pública, “deve recordar, antes de tudo, que há de ser em qualquer circunstância e há de mostrar-se verdadeiramente católico assumindo e exercendo os cargos públicos com a firme e constante resolução de tanto quanto possa fazê-lo, promover o bem social e econômico da pátria e particularmente do povo, seguindo os princípios da civilização nitidamente cristã, e há de defender ao mesmo tempo os interesses da religião e os da justiça.” (Pio X, Il fermo proposito, II, 99). * * * Tomemos, portanto, a providência mais elementar a que estamos obrigados para o cumprimento de nosso dever de católicos e de brasileiros alistando-nos como eleitores. |