Plinio Corrêa de Oliveira
Nova
et Vetera
Legionário, 10 de junho de 1945, N. 670, pag. 5 e 7 |
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Já dizia Nosso Senhor que os filhos do mundo são mais atilados no trato com seus semelhantes, do que os filhos da luz. E um exemplo frisante dessa prudência nós o vamos encontrar no modo como é propagada e realizada a obra revolucionária de cujo programa faz parte a redução do mundo a um vasto e onipotente Estado totalitário socialista. Sabe o agente dessa revolução mundial tirar proveito de todos os meios em que se encontra e, nesse sentido já houve quem dissesse que ele “bêle avec les agneaux et hurle avec les loups” (bale com os cordeiros e uiva com os lobos). Não age de modo uniforme em todas as épocas e em todos os lugares o perfeito agente do “extinto” Komintern ou o inteligente executor das ordens emanadas das “arrière loges”. E além das lições encerradas em passados insucessos, tem eles como guia precioso as tendências psicológicas de um dado povo ou de uma dada época. E assim como sabem, por um audacioso golpe de mão fazer desencadear todos os horrores e violências para implantar seu plano revolucionário quando o ambiente lhes é propício, como na Rússia de 1917, do mesmo modo e com o mesmo senso da oportunidade, sabem contemporizar e usar a tática da infiltração em países como a Inglaterra, em que ainda existe uma opinião pública alerta e imune do fatalismo que caracteriza o povo eslavo, para o qual “avos” (quiçá, em russo), “ose ravno” (não tem importância) e “nichevo” (não importa) são expressões correntes e proverbiais (vide “Missão em Moscou” do ex-embaixador Davies). De forma que aos olhos do perfeito adepto da seita socialista não passa de perfeita bravura e refinada imprudência querer transplantar para as ilhas britânicas os processos violentos de imposição do regime comunista que transformaram o império dos Tzares na U.R.S.S., como foi refinada a imprudência e perfeita loucura o golpe de mão tentado pelos agentes soviéticos no Brasil no ano de 1935. Nestes casos, como medida preparatória para a almejada escalada do poder, impõe-se um período de “catequese” da opinião pública, acompanhada de preferência por medidas legislativas e fiscais, bem como por providências de ordem econômica e financeira, que lenta e imperceptivelmente façam por vias pacíficas o que não pôde ser feito pela força. * Não se pense, porém, que essa tática é nova. Vamos demonstrar que ela vem sendo adaptada por uma seita socialista fundada há mais de sessenta anos na Inglaterra e que hoje possui filiais pelo mundo inteiro. Trata-se da Sociedade dos Fabianos, que se propõe implantar o socialismo no mundo pela EVOLUÇÃO, apesar de não lhe repugnar a REVOLUÇÃO, se o ambiente e os tempos se mostrarem propícios. Iniciando hoje neste rodapé um estudo sumário sobre as atividades já desenvolvidas por esta seita secreta e seus métodos de ação, queremos frisar sobretudo o que de há muito vem o LEGIONÁRIO denunciando como sendo um verdadeiro torpedeamento ou envenenamento da vitória aliada contra o totalitarismo nazista. Com efeito, temos insistido em afirmar que de nada valeriam todos estes anos de horror e de sangue, se por detrás das linhas de fogo se desenvolvia um trabalho lento e pertinaz no sentido de torcer a vitória em favor da implantação do socialismo totalitário nos países em luta contra o eixo. Em particular teve o LEGIONÁRIO ocasião de se referir à propaganda fabiana do falecido “arcebispo” anglicano de Cantuária, Sir William Temple, que abertamente propugnava pela equiparação de rendas, pela cessação dos chamados “privilégios” das indústrias e propriedades privadas e por outras medidas socializantes. Fabiano mostramos ser o método de impingir o comunismo no povo inglês usado pelo “deão” da mesma fé protestante, sir Hewlett Johnson, que se mostra partidário do socialismo POR EVOLUÇÃO, embora procure justificar todas as infâmias cometidas na Rússia e na Espanha pelos atuais dirigentes do “extinto” e nunca tão vivo Komintern. E também nos ocupam os do plano de seguros sociais de sir William Beveridge que com ele quer conduzir o povo inglês insensivelmente ao socialismo de Estado. Fabianas são várias das medidas que, a pretexto do estado de guerra, foram denunciadas por mais de uma vez pelo Episcopado Católico das ilhas britânicas como uma tentativa de implantação ali desse mesmo totalitarismo que os valorosos soldados do grande império combatiam no continente europeu. Tomamos a Inglaterra para exemplo, por ter sido ali que se originou a ação dessa verdadeira quinta-coluna socialista e onde essa mesma ação se faz sentir de modo mais palpável à vista do caráter eminentemente conservador das instituições inglesas. Mas poderíamos dar inúmeros exemplos típicos desse método fabiano em outros países ainda não modernos para a implantação violenta do regime comunista. Se ouvirmos por acaso falar que um país como Cuba proibiu o funcionamento de pequenos engenhos de cana e a fabricação, mesmo caseira e para consumo próprio, de açúcar e de aguardente, teremos todo o direito de suspeitar que consciente ou inconscientemente está-se prestando concurso aos fabianos. Se notamos que grandes proprietários rurais e órgãos ostensivamente dedicados favoráveis ao georgismo ou ao socialismo agrário, porque também não ver nisso a ação oculta de adeptos da seita fabiana, uma vez que ela existe e se acha espalhada pelo mundo inteiro? Quando sabemos que a industrialização estatal é um forte elemento para apoiar uma tentativa de socialismo de Estado e vemos essa alta indústria retirada das mãos de particulares para ser explorada por delegados do governo, podemos também suspeitar dos desígnios de quem dirige essas iniciativas. E que explicação também devemos dar às visitas que banqueiros e industriais lúcidos e inteligentes fazem a conhecidos próceres comunistas e agentes notórios da revolução socialista mundial? Não saberão por acaso a que senhor estão servindo? Por tudo isto torna-se muito oportuno o estudo que iniciamos neste número, das atividades dessa seita que procura fazer vencer o programa da casa matriz socialista pela mitridatização (neologismo que significa ir habituando alguém, através de pequenas doses de veneno, até altas doses, sem causar reações adversas por quem fornece tal elemento, n.d.c.) da opinião pública. * * * A 1º. de novembro de 1930 o “Evening Standart” de Londres publicava o seguinte: “Governos Fabianos “Numerosos membros do Partido trabalhista falam da predominância que exerce no governo essa corporação “acadêmica” que é a Sociedade do Fabianos. Parece que muita gente julgava extinta essa organização que abre as portas do socialismo a um vasto número de intelectuais. Entretanto ela ainda existe, com cerca de 5.000 membros, número bem restrito, mas que exerce uma grande influência. “Com efeito, todas as nomeações recentes, seja para altos ou pequenos cargos na administração trabalhista, foram em favor de membros da Sociedade dos Fabianos; por exemplo o cargo de Ministro da Aviação, dado a Lord Amubree, e o de procurador Geral dado a Sir Stafford Cripps. Estamos também informados de que pelo menos noventa por cento dos membros do Governo se acham inscritos na Sociedade e que, contra os regulamentos administrativos, a proporção é a mesma para os funcionários públicos altamente colocados. “Esses funcionários se defenderão, sem dúvida, alegando como desculpa o fato de tal Sociedade ser mais intelectual do que política. “Essa predominação é devida, sem dúvida, à influência toda poderosa de Lord Passfield e de sua mulher mrs. Sidney Webb, os quais durante toda sua vida tem-se dedicado com verdadeira paixão à Sociedade dos Fabianos”. * * * Que será, portanto, essa Sociedade dos Fabianos, cujos membros, segundo o “Evening Standard”, GOVERNAVAM A INGLATERRA? A resposta nos é dada pela própria Sociedade em uma curta exposição, que se acha apenas a todas suas publicações, do teor seguinte: “BASE DA SOCIEDADE DOS FABIANOS “A Sociedade dos Fabianos se compões de socialistas. “Ela, por conseguinte, tem por fim reorganizar a Sociedade pela emancipação das Terras e do Capital industrial do jugo da Propriedade Individual, para os fazer gerir pela comunidade no interesse geral. “A sociedade, nesse sentido, trabalha para obter a abolição da propriedade imobiliária particular, levando em consideração, porém, os já consagrados costumes e o estabelecimento do lar e do “homestead”: ela trabalha, assim, para efetuar a transferência à comunidade, por meios constitucionais, de todas as Indústrias que podem ser administradas em comum; e, em vista de regularizar o sistema de produção e de distribuição, o que é uma das considerações principais, a Sociedade trabalha por estabelecer a consideração do bem de todos em lugar do lucro individual. “A Sociedade faz parte do Partido Trabalhista e do Congresso Internacional Socialista, apesar disso, ela participa livremente e toma parte em todos os movimentos constitucionais, sociais, econômicos e políticos que possam ser guiados no sentido de seus objetivos. Ela se ocupa diretamente: a) da propaganda socialista e da aplicação do socialismo aos problemas da atualidade; b) de pesquisas das relações sociais, industriais, políticas e econômicas; c) da interposição de princípios socialistas na legislação e na reconstrução administrativa; d) da publicação de suas pesquisas e das lições práticas que delas decorrem. “A Sociedade, professando em toda sua plenitude a doutrina da igualdade de todos os cidadãos, homens e mulheres, é acessível a todos sem distinção de sexo, de raça ou de religião, desde que se comprometam a trabalhar pelas finalidades e desígnios acima expostos e a favorecer seu desenvolvimento.” Não se pode deixar de frisar a ironia contida nas palavras “por meios constitucionais” acima referidas. Como é sabido, os socialistas-bolchevistas da Rússia alegam ter confiscado e desapropriado “por meios constitucionais”... o que na realidade não passou de roubo legalizado. A Sociedade é chamada dos Fabianos por ter adotado como princípio determinante de sua política a CONTEMPORIZAÇÃO para chegar a seus fins, e nisso procura imitar o modo de agir do pró-ditador romano Fábio Cunctator, durante sua luta contra Aníbal, a quem venceu em Tarento no ano de 215 antes de Cristo, pela tática morosa e paciente de cansar o inimigo. A este respeito, Frank Polmore, um dos fundadores da Sociedade dos Fabianos, e conhecido como ocultista, dizia aos aderentes da primeira hora: “Semelhantes a Fábio que, a despeito das censuras que lhe eram feitas, esperou pacientemente, durante sua longa luta contra Aníbal, em certo momento deveis esperar, mas quando soar a hora haveis de desferir o golpe com decisão, como o fez Fábio, ou então vossa espera terá sido vã e sem fruto”. A sociedade fabiana esperou por quarenta anos, desferindo uma série contínua de golpes ocultos na estrutura política, econômica, social e religiosa da Inglaterra e em 1924 galgou o poder com o advento do Primeiro Gabinete formado pelo Partido Trabalhista, que lhe é filiado. Não se pode negar que a Sociedade dos Fabianos soube agrupar em seu seio um grande número de intelectuais, tornando-se centro da “intelligentsia” rebelde cujo programa perece ser a realização do sonho do iluminismo maçônico de Weishaupt, habilmente combinado com o sonho do iluminismo judaico (Haskalah) de Moisés Mendelssohn. Para esboçar rapidamente a história da Sociedade dos Fabianos, devemos remontar ao ano de 1883, data de sua fundação. Por essa época as concepções filosóficas de John Stuart Mill na Inglaterra, bem como o Positivismo de Augusto Comte em França, haviam semeado a dúvida no espírito de muitos pensadores e dado abundante alimento aos livres-pensadores. A obra de Henry George sobre o Socialismo “Progresso e Pobreza” fazia então grande furor. Quanto à influência direta que determinou a formação da referida Sociedade, segundo seu historiador Edward Reynolds Pease (1857-1955, n.d.c.), deve-se procurá-la em uma Associação formada por Thomas Davidson, conhecida pelo nome de “Fraternidade da Nova Vida”, associação que mais tarde culminou na “Sociedade Ética de Cultura” de Nova Iorque. Ademais não se deve omitir a influência exercida sobre os fabianos pelos princípios socialistas de Robert Dale Owen. Deve também ser lembrado o fato de que entre os primitivos membros da Sociedade dos Fabianos, vários eram maçons e ocultistas e que então se aliaram mais tarde a Madame (Helena) Blavastska (1831-1891), quando esta fundou a seita teosófica. As atividades de um deles, Frank Podmore, na maçonaria, no ocultismo e no socialismo fabiano, fornecem assunto para um interessante estudo. Entre os “intelectuais” que ingressaram na Sociedade dos Fabianos logo no início em 1885 se encontram o irlandês Bernard Shaw. Nessa ocasião os fabianos já se achavam completamente separados da “Fraternidade da Nova Vida” e já haviam formulado seu programa socialista próprio. O ano seguinte testemunhou a eleição como fabianos de Sidney Welb (mais tarde Lord Passfield, ex-ministro das Colônias) e de Sydney Olivier (mais tarde Lord Olivier e nomeado para vários cargos públicos importantes). Pouco tempo depois a senhora Annie Pessant, já falecida, e que se tornou conhecida como chefe do movimento teosófico, também foi eleita membro da Sociedade dos Fabianos. De início o socialismo fabiano tateou às apalpadelas pelos caminhos traçados pelos revolucionários que o haviam precedido. Enveredou pelo Babouvismo (movimento originário do revolucionário francês Babeuf), pelo Marxismo, pelo Bakounismo anárquico e pelos diferentes grupos sociais-democratas. Sendo, entretanto, formado em maioria por intelectuais, burocratas, funcionários públicos, jornalistas etc., estes fabianos, cujo “slogan” fundamental parecia se resumir unicamente nas reivindicações da classe operária, não se mostravam partidários de desordens e arruaças, e se limitavam de início a exercer suas atividades em reuniões a portas fechadas. Essas reuniões eram com muita propriedade qualificadas de “parlamentares”. * * * É impossível traçar neste rodapé a história da Sociedade dos Fabianos, mas não deixaremos de fazer ressaltar um ponto relativo às reuniões a que acabamos de aludir. É que delas surgiu a tática contemporizadora dos fabianos e sua decisão de penetrar ou, como Bernard Shaw se exprimiu, de “permear” todos os organismos sociais para neles difundir suas idéias e seus princípios socialistas. Este método de penetrar nos organismos políticos e econômicos deu, com o correr dos tempos, notáveis resultados, graças ao trabalho de verdadeiros cupins desenvolvidos pelos fabianos. Muitos deles, exercendo cargos públicos, facilmente se infiltraram nos círculos liberais, enquanto outros, fazendo em altas vozes profissão de fé socialista, ganharam a confiança das classes operárias. Conservavam assim um pé em cada campo e recrutavam a boa vontade tanto dos liberais quanto dos trabalhistas. O estudo do fabianismo equivale à análise do mais crasso oportunismo. Os fabianos não deram prova de nenhuma originalidade quanto à sua profissão de fé, mas se destacam apenas por uma resolução inabalável de escalar o poder e governar a Inglaterra. E o mesmo podemos dizer da ação dos fabianos em outros países muito nossos conhecidos. Consequentemente, para atingir os seus fins, eles se adaptavam ao credo ou ao meio do campo em que penetravam, e, por etapas, depois de cativar a confiança dos que o cercavam, neles inculcavam idéias e princípios tendentes irresistivelmente a promover o progresso da causa fabiana nos meios políticos, industriais e educacionais. Desse modo, chegaram a ocupar vários postos estratégicos, ou posições chaves. Nada desprezam, nem mesmo o anarquismo, para a prática do qual formaram um ramo fabiano especial, que tomou o nome de “Liga Parlamentar dos Fabianos”. E nenhum campo de ação parece ter escapado a esses “iluminados” intelectuais e socialistas. É o que continuaremos a expor em nosso próximo número, mostrando as conquistas maquiavélicas dos fabianos, principalmente no campo político, no campo econômico e no campo educativo. E esse estudo dos processos de “infiltração” socialista nos será muito útil para explicar a súbita transformação dos nossos ferrabrases e sanguinários agitadores soviéticos nas pombas sem fel que agora comovem os corações sensíveis com as entrevistas e manifestos em favor do processo fabiano de bolchevizar o Brasil..., isto é, através da substituição da revolução vermelha pela de cor laranja. |