Plinio Corrêa de Oliveira

 

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O espírito de Munique

 

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 3 de junho de 1945, N. 669, pag. 2

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O grande mérito de Churchill, foi sem dúvida, o ter derrotado o espírito de Munique. Mais do que tudo, este era o grande inimigo, o sinal mais grave da decadência da civilização, que se mostrava disposta a entregar os pontos, covardemente, ante o bárbaro que se levantava arrogante. Chamberlain incarnou, em certo momento, tudo quanto havia de moribundo neste nosso mundo ocidental, a demissão dos valores da cultura, o comodismo imediatista, o egoísmo mais estreito, o espírito liquidacionista, em suma, esta preguiça de viver, que se deixava arrastar molemente para o aniquilamento. Nesta situação angustiosa, em que Hitler parecia já não ter barreiras diante de si para realizar todos os seus planos celerados e diabólicos, levantou-se Churchill, representando todos aqueles que não se conformavam com o fim da civilização. Se não tivesse havido o espírito de Munique, jamais haveríamos presenciado a ostentação impudente da barbárie nazista, e o mundo não teria estado à beira do abismo sem fundo em que esteve a ponto de despenhar-se; mas é preciso reconhecer, Churchill conjurou o espírito de Munique.

Conjurou-o, é verdade, mas não conseguiu exterminá-lo, e os efeitos do exorcismo parece que já estão passando. O espírito de Munique está ganhando força, novamente. E houve até mesmo uma ocasião em que o próprio Churchill pareceu ter-se deixado contaminar por ele. Foi de quando, ao regressar da reunião Yalta, houve a impressão de que o Primeiro Ministro havia sacrificado a Polônia. Neste momento, a imprensa inglesa foi muito peremptória: se a Polônia fosse entregue à própria sorte, chegava-se ao fim da guerra no mesmo ponto em que ela principiara; tinham sido vãos todos os sofrimentos, pois Yalta reeditara Munique.

A presente crise política da Inglaterra, porém, veio desfazer esta impressão. Os trabalhistas não hesitariam em desmanchar o governo de coalisão, no momento preciso das mais graves tarefas de reconstrução do mundo e consolidação da paz, porque desejam uma colaboração mais larga e íntima com a Rússia nos assuntos europeus. Em outros termos, porque desejam dar à Rússia a mais completa liberdade nestes assuntos. Por causa disto, pode acontecer que Churchill venha a não participar das reuniões do “big three”.

Ora, é interessante recordar que, em situação análoga, quando o nazismo praticou o “anschluss” contra a Áustria, a França viu-se impossibilitada de intervir em questão de seu interesse tão substancial, porque se achava a braços com uma crise política suscitada pelos socialistas. Clement Attlee e Leon Blum, os dois líderes esquerdistas, estão, pois, lado a lado. E o espírito de Munique acaba de desforrar-se de Churchill, no dia seguinte da vitória.


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