Plinio Corrêa de Oliveira

 

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O comunismo e o protecionismo industrial

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 25 de março de 1945, N. 659, pag. 2

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O sr. Luiz Carlos Prestes, agora que cessou sua incomunicabilidade, acaba de dar à Imprensa uma entrevista, em que apresenta os pontos de vista dos comunistas “puros”, em face do momento presente. E estes pontos de vista são muito menos contrários à evolução atual do Brasil do que a generalidade das pessoas poderia esperar; até mesmo poder-se-ia dizer que são favoráveis, se não fossem algumas afirmações muito pouco explícitas contra o “reacionarismo”.

Quanto, porém, à natureza e aos agentes deste “reacionarismo”, o sr. Luiz Carlos Prestes não é nada elucidativo.

Entretanto, uma qualidade fundamental não se pode negar a esta entrevista: é um documento profundamente pensado, cheio de idéias, que indica um espírito extremamente lúcido, habituado a ver a substância das realidades político-sociais, o seu verdadeiro sentido interno, não se deixando enganar pelas aparências diversas, e até contrárias, de que estas realidades tantas vezes se revestem. Seria mesmo muito de se desejar que todos os católicos tivessem igual solércia para descobrir a significação real dos acontecimentos, não se deixando levar por aparências falazes, como, infelizmente, está cheia de exemplos tristes para a Igreja a história recente. Porém, Jesus Cristose queixou de que “os filhos do século são mais prudentes do que os filhos da luz”; e logo explicou o fato, acrescentando que ninguém pode servir a dois senhores. Se todos procurassem exclusivamente servir a Deus, seria muito menor o número das “ingenuidades” desastrosas para a Igreja.

Mas, encerremos esta digressão. Para o sr. Luiz Carlos Prestes seria erro imperdoável querer estabelecer imediatamente uma república soviética no Brasil. Isto só poderia comprometer os ideais comunistas, porque o nosso País ainda não está convenientemente preparado. Antes de tudo, será necessário industrializar altamente o Brasil, pois, conforme afirma textualmente, “num país industrialmente atrasado como o nosso, a classe operária sofre muito menos da exploração capitalista do que da insuficiência do desenvolvimento capitalista e do atraso técnico de uma indústria pequena e primitiva”. Assim, antes da república soviética, será necessária uma república “capitalista”, ipsis litteris. Para o sr. Prestes, os grandes inimigos não são os industriais, são os proprietários rurais: são estes que mantêm as massas “camponesas” em estado de servidão feudal. Desta forma, o sr. Prestes se coloca decididamente ao lado dos fabricadores de “lucros extraordinários” e do protecionismo industrial, chegando mesmo a citar, com elogios, o relatório de uma grande organização industrial de São Paulo.

Ora, se observarmos a substância dos fenômenos econômicos brasileiros, nos últimos lustros, verificaremos que eles se caracterizam por uma crescente desorganização e decadência da agricultura, acompanhada por um paralelo crescimento e prosperidade da indústria. A agricultura tem sido sacrificada sistematicamente aos interesses da indústria. Basta lembrar que os produtos agrícolas são tabelados, ao passo que os produtos manufaturados não sofrem tabelamento algum. Isto sem falar das restrições cambiais, que, juntamente com as sucessivas emissões de papel moeda, representam um pesadíssimo tributo imposto à agricultura, a favor das atividades industriais e capitalísticas, fomentando a formação das grandes concentrações industriais de hoje em dia, que tanto agradam ao sr. Luiz Carlos Prestes.

Assim, o paraíso que os comunistas desejam para o Brasil é um feudalismo industrial em que as massas anônimas serão servas dos poucos detentores de “lucros extraordinários”; e esta nova civilização refletirá a fisionomia cruel do senhor deste mundo. É por esta razão que os últimos Papas - e Pio XII, com especial insistência – têm chamado a atenção para os perigos do industrialismo exagerado e para a necessidade de levantar a agricultura.

Em nossos dias, agricultura e indústria significam muito mais do que simples modalidades econômicas; mas, através delas, é a própria dignidade da existência humana que está em jogo.


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