Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Nova et Vetera
 
Divórcio e totalitarismo

 

 

 

 

 

 

Legionário, 11 de março de 1945, N. 657, pag. 5

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Alguns partidários do divórcio se lembraram agora de usar como arma de propaganda a argumentação da coincidência frequente do instituto do divórcio com a democracia, e a sua ausência com a ditadura e o totalitarismo.

Tal afirmação só poderia ser feita numa época como a nossa, em que a lógica, a coerência e o amor à verdade são bens cada vez menos procurados, visto que o fim em geral visado pelos demagogos de todos matizes é justamente impedir que o povo raciocine, transformando-o em massa inerme que vai de um lado para outro, de acordo com as paixões nela despertadas por alguns “slogans” habilmente escolhidos.

Está neste caso essa propaganda dos inimigos da indissolubilidade do vínculo conjugal, segundo a qual o divórcio não existe nos países em que domina a ditadura e o totalitarismo.

Ora, o que em boa lógica se pode afirmar, e o que a experiência histórica nos ensina, é justamente o contrário. O divórcio, sintoma da dissolução moral de um povo, grassa sobretudo nas épocas de decadência e sob os regimes despóticos. Foi assim durante os últimos tempos do cesarismo na Roma pagã, quando os divórcios de algumas matronas costumavam ser contados pelos seus anos de vida. O divórcio foi implantado na Inglaterra pelo tirano sanguinário que se chamava Henrique VIII, e em outros países da Europa pela influência do protestantismo sobre o ânimo de príncipes ambiciosos que punham acima dos interesses de Deus e de sua Igreja a própria concupiscência e a ambição de mando.

E nos tempos que correm, além de existir em alguns dos chamados países democráticos, vemos esse cancro social instituído e livremente praticado nos dois maiores expoentes do Estado totalitário moderno, que são a Rússia soviética e a Alemanha nazista. Quanto ao divórcio na Rússia, sob o regime ditatorial soviético, sua existência é por demais notória para merecer comentários.

Vamos nos limitar, em simples transcrição do livro “O Cristianismo no Terceiro Reich”, de Testis Fidelis e provar o cinismo da asserção no que diz respeito à Alemanha nazista, baluarte do totalitarismo. Veremos assim que, pelo contrário, devemos combatê-lo, não somente como instituição nefasta em si, mas também como instrumento usado para lançar o povo na animalidade própria ao império dos regimes totalitários.

* * *

Os princípios pagãos do nacional-socialismo influem especialmente sobre a moral matrimonial e foram eles que determinaram, de forma decisiva, a nova lei matrimonial de 8 de julho de 1937. Nela se diz:

“O novo direito matrimonial deve ser chamado nacional-socialista em todo o sentido da palavra e está caracterizado por todos os princípios fundamentais desta ideologia mundial. Elimina do matrimônio todas as concepções religiosas cristãs e faz depender, por esta razão, a realização do matrimônio, ou sua continuação, das leis vitais da nação, da raça e da nacionalidade. O matrimônio não mais será uma instituição divina, mas a “célula nuclear do Estado e da nacionalidade”.

O matrimônio, pois, não mais é uma “relação essencialmente pessoal que repousa na vontade dos contraentes”, mas um ato nacional público, cuja força legal depende do casamento por intermédio de um funcionário estatal. As premissas para a realização e manutenção de um matrimônio são reguladas unicamente pelo fato de com ele se conseguirem as finalidades públicas nacionais. Portanto, os impedimentos para o matrimônio, em primeira linha, são a diferença de sangue e a inabilidade matrimonial no sentido das leis sanitárias raciais nacionais-socialistas. Pela mesma razão, não mais existe a nulidade do matrimônio pela falta de vontade matrimonial dos contraentes. De agora em diante serão nulos somente os matrimônios que desonrem a raça e aqueles que se contraíram em oposição às leis sobre a saúde racial. Todos os demais matrimônios deficientes, pela mesma razão de terem sido realizados pelo Estado, devem, no futuro, ser dissolvidos pelo Estado, e os mesmos não possuem por sua decisão nenhuma força retroativa, mesmo quando no momento do casamento civil não haja existido consentimento matrimonial dos contraentes”.

Desta concepção segue-se necessariamente que se o interesse é em si e por si bom, este interesse, qualquer que seja a forma de ser conseguido, não pode ser medido em seus meios, mas em si mesmo: o interesse é moralmente normativo, é lei.

Empregada em relação ao matrimônio, esta moral diz: O sentido do matrimônio não é nem divino nem natural, mas político: o filho pertence à nação. Onde não se consegue este fim, o matrimônio é moralmente mau, injusto e deve ser dissolvido. Onde este fim é cumprido, mesmo quando não haja sido realizado o vínculo matrimonial juridicamente, apesar disso fica satisfeito o “mandamento moral”.

Vemos, assim, que a finalidade exclusiva da nova moral nacional-socialista é o interesse nacional no sentido racial. A respeito de tudo isto escreve o “Schwarze Korps” de 28 de julho de 1938, página 1: “O valor da nova lei está determinado somente pelo fato de que condena a concepção liberal do matrimônio como contrato de direito privado e coloca em primeiro lugar os interesses da comunidade nacional. Matrimônios sem interesse ou estéreis e aqueles cuja conservação não pode ser justificada moralmente, devem ser dissolvidos e os cônjuges sãos e vitalmente ativos que estejam atados a um matrimônio torturador e sem conteúdo, devem receber a oportunidade de procurar a felicidade em um novo matrimônio e de cumprir o dever nacional da procriação”.

Este pensamento aparece na nova lei com todos os prós e contras, e também muito claramente em todo “mesmo quando” limitativo.

Em 29 de setembro de 1938 o mesmo jornal diz mais claramente: “Matrimônios enfermos, insinceros e meramente formais não beneficiam o Estado. Para ele não pode nem deve haver mais que este postulado: cônjuges sãos que se complementam harmonicamente em um matrimônio são, filhos sãos, uma vida familiar sã. Neste sentido se deu nova forma ao novo direito do matrimônio e do divórcio”.

Naturalmente foram aumentadas de forma notável, com a nova lei, as possibilidades de divórcio: “Muito recentemente se acrescentou a esterilidade como causa de separação, como também os casos em que se recusa a procriação e concepção de descendência. O próprio Hitler tomou a resolução de que sejam dissolvidos os matrimônios por motivo de esterilidade, se um dos contraentes chega a ficar estéril precocemente. Uma nova disposição, por certo, deveria ser aplicada: a de dissolver o matrimônio quando a comunidade pessoal haja cessado durante três anos, direito que pode também solicitar o cônjuge culpado” (Artigo do “Schwarze Korps” atrás citado).

E o “Schwarze Korps” de 28 de julho de 1938, escreve ainda: “O princípio da dissolução sem culpa real - o postulado que mais expressamente tem sido sustentado – foi cumprido, isto é, um matrimônio no qual os cônjuges tenham vivido estranhos um ao outro sem esperança, e por cuja manutenção a comunidade nacional não tenha nenhum interesse, pode ser dissolvido, mesmo quando não exista uma culpa real. Mas não deve ser dissolvido se um dos esposos levante protesto e atribua ao outro a culpa da desarmonia”.

Desde a promulgação da nova lei matrimonial, na imprensa do partido se discutiu especialmente o parágrafo 55, “segundo o qual um cônjuge pode exigir a dissolução do matrimônio, se a comunidade familiar cessou durante pelo menos três anos e as relações matrimoniais tenham sido insanavelmente abaladas, de forma tal que o restabelecimento da comunidade vital relativa à essência do matrimônio deva ser considerado impossível. O parágrafo citado estabelece, sem embargo, que a dissolução dessa união não pode ser solicitada por um cônjuge, se a culpa do desacordo matrimonial lhe cabe por completo ou em grande parte. Neste caso o outro cônjuge pode opor-se à separação”.

Reiteradamente o “Schwarze Korps” polemizou com violência contra as sentenças dos tribunais, nas quais se recusava o pedido de divórcio invocando a citada disposição limitativa: chegou-se até a um aberto conflito na matéria entre o órgão das S.S. e um órgão oficioso dos juízes alemães (veja-se, por exemplo, o número de 9 de fevereiro de 1939, pagina 16).

Esta limitação citada no parágrafo 55 foi posta de lado como não oficial em março de 1939, conforme um comentário legal. Com o que se resolveu a favor do “Schwarze Korps” a discussão prolongada entre a imprensa nacional-socialista e a imprensa jurídica especializada. A nova resolução apareceu como comentário autêntico do parágrafo 55 do direito matrimonial, no “Völkischer Beobachter” de 29 de março de 1931.

Entre outras coisas diz o comentário: “Segundo a concepção nacional-socialista da essência do matrimônio, um matrimônio destruído (para o que se considera como critério suficiente da destruição a ausência da comunidade familiar durante três anos) não mais oferece interesse e priva aos cônjuges da possibilidade de desenvolver suas energias na felicidade coletiva. Para determinação do valor ou não valor de um matrimônio, o problema da culpa pessoal do cônjuge não decide o caso. O legislador, pois, sancionou em um comentário posterior, o princípio sustentado pelo Partido, segundo o qual o sacrifício de um antigo matrimônio a favor de um novo e valioso, se acha moralmente justificado no sentido político-nacional”.

A campanha oficial em favor das “mães solteiras” e os citados artigos da imprensa não são notas isoladas, mas estão intimamente vinculadas à enorme propaganda difundida insistentemente pelo Terceiro Reich. Por aí se mede, em verdade, até que ponto o nacional-socialismo leva o povo alemão ao precipício da corrupção moral.

Outra consequência são os divórcios cada vez mais numerosos.

Nas memórias estatísticas anuais, publicadas pela cidade de Essen, se acham uns tantos algarismos muito eloquentes sobre os matrimônios e os divórcios, que podem ser considerados como válidos para todo o distrito industrial do oeste alemão. Segundo esses dados, desde o advento do nacional-socialismo, aumentaram notavelmente tanto os matrimônios quanto os divórcios. No correr do ano de 1935 se contraíram em Essen 6.683 matrimônios e se dissolveram 714. Em comparação com o ano de 1925, o número de divórcios quase duplicou.

Damos também os algarismos para todo o Reich: em 1936, de acordo com o Bureau Nacional de Estatística, dissolveram-se 50.377 matrimônios. Correspondem a 32,5 divórcios por mil casamentos, contra 33 no ano de 1935 e 15 no ano de 1913. Enormemente alta é a quota correspondente a Berlim, onde se registraram 227,9 divórcios para cada 100.000 habitantes.

Em primeiro lugar, como motivos de divórcio, estão as ofensas aos deveres conjugais e a conduta infamante ou imoral. Por estes motivos, durante o ano de 1936, em todo o país, foram declarados culpados 30.720 homens e 18.091 mulheres. Por adultério se declararam culpados 8.665 homens e 7.488 mulheres.

O movimento de divórcios desde o ano de 1880 mostra um crescimento em forma de salto com a chegada ao poder do nacional-socialismo.

A introdução das leis raciais provocou na Alemanha um altíssimo número de divórcios, como antes não se conhecera.

O periódico “Wirtschaft und Statistik” (Economia e Estatística) apresenta algumas comprovações muito interessantes e instrutivas sobre a duração das uniões dos divorciados. Já no ano de 1934 aumenta quantidade das uniões que depois de um ano devem ser novamente dissolvidas; em 1936 foi 14% mais elevada que em 1935 e em 1935 foi 18% superior à de 1934. Parece demonstrado que as facilidades matrimoniais levam ao casamento muitos casais, que sabem de antemão, ou o ficam sabendo nos poucos meses de convivência, que não nasceram um para o outro.

Estes dados têm uma linguagem por demais eloquente: põem em sua justa luz as frases sonoras usadas pela propaganda acerca do saneamento da nação alemã pelo nacional-socialismo.

Mais desastrosos ainda foram os efeitos da moral sexual pagã, pregada abertamente pela imprensa nacional-socialista e apoiada pelas autoridades responsáveis.