Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Nova et Vetera
 
Presentes de Hitler a Stalin

 

 

 

 

 

Legionário, 28 de janeiro de 1945, N. 651, pag. 5

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Não é surpreendente que os nazistas prefiram ver a Alemanha invadida pelas hordas comunistas, do que pelos exércitos aliados. É que Hitler vem de longa data preparando esse infeliz país para a recepção a ser oferecida aos homens da foice e do martelo. Além da parte negativa de sua campanha contra a Igreja, do fechamento de conventos, de escolas confessionais católicas, da extinção da imprensa católica, da prisão de Sacerdotes e de leigos militantes, do confisco de bens eclesiásticos e da desmoralização do Clero secular e regular, houve o trabalho positivo da criação de uma nova moral nacional-socialista, para substituir a moral cristã. Que os princípios norteadores dessa nova “moral” merecem os maiores encômios da parte de Stalin, verão os nossos leitores pelos seguintes trechos retirados do importante livro-documentário “El Cristianismo en el tercer Reich”, de Testis Fidelis (pseudônimo do Padre Walter Mariaux S.J., foto abaixo n.d.c.):

 

O Estado pagão nacional-socialista e totalitário não pode reconhecer nenhuma esfera religiosa própria, independente, nem em público, nem no campo da piedade individual e da liberdade pessoal de consciência. Por isso, também neste terreno marcha para diante com uma lógica sem contemplações.

As manifestações de uma vida religiosa católica florescente são objeto especial do ódio do nacional socialismo. Coisas que são tão caras ao povo católico, como as procissões, as peregrinações, os exercícios espirituais, as devoções em honra do Redentor, da Santíssima Virgem e dos Santos, são ridicularizadas sistematicamente e cobertas de mofa e de escárnio.

Assim, por exemplo, “Die H. J.” (A Juventude Hitlerista) em seu número de 13 de junho de 1936, página 10, procura denegrir o recurso piedoso dos exercícios espirituais. Da mais grosseira forma, o “S.A. Mann” de 18 de dezembro de 1937, página 3, ataca a peregrinação a Altoetting, que é apresentada como uma empresa para o enriquecimento da Igreja. As procissões e outros atos religiosos são ridicularizados pelo “Schwarze Korps” de 13 de julho de 1939, página 15. Contra o uso da santa Cruz como adorno feminino se insurge o “S.A. Mann” de 28 de agosto de 1938.

Em seu número de 30 de abril de 1936, página 2, o “Schwarze Korps” mofa de modo mais cínico da devoção ao Sagrado Coração de Jesus.

Escarnece-se da devoção ao Santo Anjo da Guarda. Assim escreve o “Schwarze Korps” de 18 de maio de l939, página 16: “O que frequenta assiduamente a Igreja e o confessionário, junta as mãos para oração e não se esquece de dar esmolas, pode contar com um Anjo da Guarda que o coloca na sociedade celeste - exclusiva – de proteção; não necessita de nenhuma defesa antiaérea”.

Uma selvagem diatribe contra o culto católico das relíquias foi publicada pelo “S.A. Mann” a 18 de dezembro de 1937, página 1.

Contra a moral católica

Em seu caminho para a realização de sua brutal finalidade pagã, o Nacional-socialismo entra em choque com a moral católica, como é ensinada e praticada. O Estado totalitário e despótico não deixa lugar para súbditos com vínculos e freios morais. Por isso dirige uma incessante campanha contra a doutrina moral católica.

O “Schwarze Korps” de 1º. de abril de 1937, página 11, depois de expor os castigos mais em uso entre os (...) escreve, entre outras coisas, o seguinte: “A penetração do Cristianismo traz pouco a pouco uma mudança nas idéias, nas opiniões. Conserva-se, é verdade, a pena de morte, mas não recai essa pena sobre o que prejudica o povo, mas sobre os pecadores contra os mandamentos de Deus, os hereges. O perigo dessa moral está à vista. Os delitos contra a raça não têm expiação possível; para os pecados, porém, há absolvição...”

Por meio de referências à teologia moral de Santo Afonso de Ligório, procura-se denegrir em geral a moral católica (“Schwarze Korps” de 8 de junho de 1939, página 11).

O “S.A. Mann” de 8 de janeiro de 1938, página 4, e de 15 de janeiro do mesmo ano, página 4, ridiculariza a “moral eclesiástica de Ligório”, zombando da divisão e definição dos pecados, etc.

O “Schwarze Korps” de 22 de outubro de 1936 considera a caridade cristã como um dos recursos do catolicismo político.

Ataques contra a caridade cristã se acham ao órgão central da Liga Nacional-socialista de Estudantes “Die Bewegung” de 17 de junho de 1933, página 1 e de 19 de outubro do ano seguinte.

No “Schwarze Korps” de 9 de abril de 1936 o conceito cristão de honradez é considerado como perigoso para a juventude.

“Die Bewegung”, órgão central da Liga Nacional-socialista de Estudantes combate a 11 de outubro de 1936 as virtudes cristãs da paciência, da benignidade, etc.

O “Schwarze Korps” de 1º. de julho de 1937 se enfurece contra a imoralidade dos moralistas católicos, especialmente Santo Afonso de Ligório.

O mesmo periódico, em seu número de 15 de setembro de 1938, páginas 3 e 8, qualifica os princípios morais da Igreja com respeito à ginástica feminina, aos trajes de banho, etc., como solapamento da verdadeira moralidade. Idêntica opinião expressa na página 12 do mesmo número: “Não é a moral que periga nos trajes de banho, etc., mas a teologia moral.” E as mesmas acusações faz o “S.A. Mann” de 8 de maio de 1937.

O “Schwarze Korps” de 1º. de julho de 1937, página 8, satiriza em forma inaudita os fundamentos católicos acerca da moda feminina, do banho, etc., mediante repugnantes caricaturas. O mesmo sucede no número de 1º. de abril de 1937, página 17.

Contra a concepção cristã do matrimônio e a Encíclica pontifícia sobre este tema, lança sua gosma o “Schwarze Korps” de 11 de fevereiro de 1937, página 6.

Sempre a mesma folha, a 1º. de abril de 1937, página 6, combate a doutrina católica do matrimônio, e o mesmo faz a 17 de fevereiro de 1938, página 5, assanhando-se especialmente contra as dispensas matrimoniais da Igreja.

O “Schwarze Korps” de 26 de agosto de 1937, página 12, ataca os Bispos e Sacerdotes que apoiam as uniões matrimoniais honestas.

No “Schwarze Korps” de 10 de março de 1938, página 12, os fundamentos cristãos do sexto mandamento são definidos como “moral de anteontem”. O “Arbeitsmann” (O Trabalhador) se entretém a 29 de maio de 1937, páginas 2 e 4, com o “pecado contra a natureza”, e põe Ordens religiosas, o ascetismo, o celibato, etc.

Uma clara e sincera Pastoral de S. Excia. Revma. o Bispo de Berlim, que foi lida nos púlpitos a 11 de julho de 1937, oferece um resumo impressionante dos fatos expostos até aqui:

“Meus queridos diocesanos: o que me induziu de modo especial a dirigir-me a vós no dia de hoje é o fato de que foi declarada a guerra, especialmente pela imprensa, de forma fora do comum, por meio de artigos e caricaturas, contra a doutrina da Fé e da Moral, contra a Igreja, o Papa, os Bispos, os Sacerdotes e os fiéis. E não fazem esta guerra somente as folhas dedicadas abertamente há longa data ao anticristianismo, mas também os órgãos do Partido de maior difusão guiados e recomendados pelas autoridades dirigentes, os quais se colocam na frente mais avançada desta campanha contra a Fé e a Igreja, que se realiza com todas as armas, até as envenenadas, como a calúnia, a mofa, o escárnio, a mentira e a falsificação”.

A nova moral pagã

Talvez exista a tendência de considerar como inofensiva e pouco eficaz a campanha indireta contra a Igreja, em comparação com a guerra direta que descrevemos na primeira parte de nosso livro. Na realidade, porém, é a mais perigosa. Graças aos seus enormes recursos de influência, o nacional-socialismo trabalha justamente sem descanso, e consciente de sua finalidade, na tarefa de opor sua própria moral pagã e sua ideologia ao Cristianismo, que procura suplantar.

Seria demonstrar um desconhecimento fatal do nacional-socialismo o querer concebê-lo exclusivamente como um sistema político. É uma ideologia universal e precisamente totalitária, isto é, uma ideologia universal intolerante ao extremo. Exagera até ao absoluto seus valores máximos. Toda concepção, inclusive os dogmas cristãos, toda a vida e toda a obra humana, da comunidade e do indivíduo, tudo deve integrar-se e subordinar-se a este sistema até ao automatismo.

Não há quase uma única afirmação em toda a literatura escrita e nos discursos dos chefes do nacional-socialismo que se repita tão a miúdo como esta: “O nacional-socialismo é uma ideologia universal.”

A consequência disto é a enorme paganização na vida do Terceiro Reich. Os princípios básicos da moral pagã incorporados a esta nova ideologia penetram cada vez mais na vida popular e familiar. E esta nova moralidade de marca pagã não é somente o inimigo de morte de toda moral cristã, mas também o elemento de destruição da maior força nacional, sobretudo no campo do matrimônio, da família e da moral sexual.

Os aspectos fundamentais da moral nacional-socialista são explicados, com a maior clareza que se possa desejar, pelo “Schwarze Korps” de 6 de maio de 1937, página 6, sob o título: “Moralidade antinatural.” A exposição nos parece tão importante e tão eloquente para determinar o caráter inteiramente pagão e anticristão desta moral, que lamentamos sinceramente não poder reproduzí-la integralmente. Extraímos os pontos mais importantes:

“Desde quase dois mil anos o povo alemão se vem acostumando à concepção de que os fundamentos morais não procedem desde o começo do sangue e da idiossincrasia racial, mas que se deduzem exclusivamente, para todos os povos e para todas as raças, de uma religião revelada. Isto teve por consequência essa espantosa violência espiritual e racial do homem alemão, aquela adaptação de sua alma a leis antinaturais para ele e, sobre todas as coisas, uma disposição moral para um mais além completamente desconhecido, abstrato e perpetuamente em choque com as realidades da existência, que quase conseguiram tirar de seus ângulos existenciais o maravilhoso e inexplorado tesouro humano que representaram nossos antepassados. E a manifestação daquele conhecido deputado do Centro: ‘Não existe uma moral germânica’, demonstra claramente até onde havia progredido este processo de violência espiritual em vinte séculos”.

E depois de expor de maneira completamente errônea a doutrina cristã do sentido do sofrimento, sob o subtítulo de “Elevação da vida – nossa meta”, continua dizendo:

“Uma moralidade construída de acordo com as exigências vitais, não pode sobretudo elaborar um código moral incontestável, porquanto sua eterna mobilidade exige uma conduta pessoal sempre renovada. A ética vital pode e há de dar somente uma diretiva, uma linha de conduta. Muito mais importante que a educação de acordo com regras traçadas de antemão, é a revelação espiritual do homem, sua total compenetração na corrente da vida. A elevação da vida é o supremo postulado da moralidade elaborada pela vida. De que caráter é a moralidade, pois, que cresce desta nova crença vital? É vida imediata em oposição a toda moral atrasada. “Todas as teorias, até as da virtude, são más, são loucas e trazem desgraça” disse uma vez um nobre espírita. A vitalidade espiritual é o fundamento de toda existência moral, e aquele que a não possui, não é de nenhum modo um ser de valor, mesmo se possuir todas as virtudes do mundo. Uma moralidade que festeja a vida, a luz, a força, o amor, e alegria, pode em certas circunstâncias permitir ou tolerar muito do que se opõe às medidas superadas. A esta moralidade contradiz somente uma coisa: o ascetismo, entendido como energia inimiga da vida.”

Sob este outro eloquente subtítulo “Bom é tudo que é forte e belo”, o doutrinador nazista continua:

“Por esta razão dizemos: Bom é tudo o que serve à vida, tudo que é grande, forte, belo; mau e imoral é somente o que erige muralhas e compartimentos estanques ao redor do núcleo vital. Com esta concepção chegamos em seguida a nos colocar em conflito com uma grande série de prescrições morais da Igreja. Basta recordar, entre tantas coisas, a posição da Igreja diante da legislação e eugenética do Estado.”

Matrimônio pagão

Os princípios pagãos do nacional-socialismo influem especialmente sobre a moral matrimonial e determinaram em forma decisiva a nova lei matrimonial de 8 de julho de 1937. Nela se diz:

“O novo direito matrimonial” deve chamar-se nacional-socialista em todo o sentido da palavra e está caracterizado por todos os princípios fundamentais respetivos desta ideologia mundial. Elimina do matrimônio todas as concepções religiosas cristãs, e faz depender por esta razão a realização do matrimônio ou sua continuação das leis vitais da nação, da raça e da nacionalidade. O matrimonio não é mais uma instituição divina, mas a “célula nuclear do Estado e da nacionalidade.”

Os filhos ilegítimos

Desta moral matrimonial resulta que os filhos ilegítimos são equiparados fundamentalmente aos legítimos. Com efeito, o nacional-socialismo põe como princípio que ele mesmo aprecia e trata a família em primeira linha como célula nuclear da nação, mas se origina como consequência da citada concepção que a maternidade ilegítima é cada vez mais colocada na mesma altura da legítima, postulado este que encontramos a miúdo na literatura do nacional-socialismo.

“Der Reichswart” (A Atalaia Nacional) escreve em seu número de 21 de abril de 1935:

“O Estado terá, pois, pleno direito também sobre estes filhos (ilegítimos) e se preocupará para que o filho ilegítimo e sua mãe não sejam tratados e considerados como homens e cidadãos de segunda classe, segundo o labéu que costuma lançar-lhes antecipadamente farisaísmo. O nacional-socialismo representa a honra tanto na vida do povo como na vida do indivíduo. Não tratará nem fará valer como cidadãos desonrados os milhões de mães e de filhos ilegítimos.”

Também a “S.A. Mann” de 14 de agosto de 1937, página 4, sustenta a igualdade dos filhos ilegítimos e dos legítimos. O “Schwarze Korps” sob o título “É-nos sagrada toda mãe de bom sangue”, escreve a 30 de dezembro de 1937, páginas 1 e 9, que em muitos casos “mesmo se a união não é conjugal, há alguns princípios determinantes, que não tocam a qualidade humana dos pais.”

O exagero da cultura física

Em seu número de 17 de dezembro de 1936 o “Schwarze Korps” expõe os princípios nacionais-socialistas no campo da cultura física, sob o título: ”Cultura física - assunto privado?” O artigo se refere expressamente às diretivas de Adolfo Hitler em “Minha luta”, página 452: “O Estado popular deve desenvolver toda sua obra educativa em primeiro lugar não em insuflar o mero saber, mas na elaboração de corpos profundamente sãos.”

Baseado neste ponto de vista, é elogiado como fundamental o livro do major Suren, “O homem e o sol”, dizendo o “Schwarze Korps”: “Presta um grande serviço à cultura corporal livre (nudismo) a que deu vida o major Suren, cujo enorme valor para o saneamento de nosso povo tem sido sempre reconhecido e assinalado com insistência por todas as autoridades competentes.”

Que devemos dizer desse livro tão elogiado do major Suren?

O livro reproduz os conceitos oficiais do nacional-socialismo, o que se deduz do seguinte:

1 – Sua qualidade de encarregado da educação física das classes trabalhadoras da nação, realçada pelo autor.

2 – No livro são citadas como confirmação de seu caráter oficial as personalidades competentes do 3º. Reich, tais como Hitler, Rosenberg, Goebbels e Darré.

3 – O Bureau nacional-socialista para o fomento da literatura alemã deu a 27 de fevereiro de 1936 a esse livro um brilhante certificado.

O livro do major Suren tem por título:O homem e o sol – O novo movimento nudista na Alemanha”.

O autor trata justamente de alhear-se do nudismo dos tempos do marxismo na Alemanha; repele a expressão “cultura nudista” e a substitui por “cultura do corpo livre” ou “espírito ario-olímpico”. Na realidade, porém, a acentuada linha de separação consiste somente em uma presunção, porquanto:

1 - esse livro apareceu em 1924 e foi saudado pelo movimento nudista dos socialistas e comunistas como uma preparação para seus ideais;

2 - seus métodos de propaganda são exatamente os que então se empregaram, isto é, ilustrações, frases contra a hipocrisia, o pudor, e sobretudo a encarniçada luta e enxovalhamento da Igreja católica.”

* * *

Em nosso próximo número vermos, citando esse mesmo documentário de Testis Fidelis, como o nazismo preparou a Alemanha para a ocupação comunista não mais no terreno moral, mas no religioso. Estudaremos o sucedâneo por ele forjado para os ideais cristãos que há séculos vinham norteando aquele grande país. E como também neste ponto Hitler se mostra o grande aliado de Stalin.