Plinio Corrêa de Oliveira
Santo
Inácio de Loiola
Legionário, 30 de julho de 1944, N. 625, pag. 4 |
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Santo Inácio genuflexo ante o Papa Paulo III, o qual confirmou sua Ordem religiosa com a bula pontifícia Regimini militantis ecclesiae (27-9-1540) Quem passasse outrora pelos arredores de Azpeitia, na província basca de Guipuzcoa, veria, em uma altura que domina todos os arredores, um imponente castelo-forte, edifício quadrado, guarnecido de seteiras, ameias, torreões, e ao qual enormes pedras de cantaria davam um aspecto de majestosa solidez. Esse castelo, construído no século XIII, era o solar dos Oñaz y Loyola, “fidalgos de linhagem, cota de armas e solar conhecido”, ligados às principais famílias de Espanha e titulados de “parientes mayores”, remontando sua árvore genealógica a 1180. Família de guerreiros, em mil refregas tremulou vitorioso o pendão em que se viam as insígnias dos Loyola: dois lobos ou leões segurando uma panela ou “olla”. A “olla” representava o direito de alimentar as tropas por sua própria conta. Os lobos simbolizam o valor e a força que os nobres põem ao serviço de Deus e do Rei. Nos fins do século XV era senhor do castelo de Loyola, como chefe da família, D. Beltran Yáñez de Oñaz y Loyola, que havia desposado D. Marina Sáenz de Licona y Balda. Foi do matrimonio desses fidalgos que, em 1491 nasceu aquele que devia ser uma das maiores entre as grandes glórias da Santa Igreja de Deus: Santo Inácio de Loiola. O Senhores de Loyola, “cristianos viejos” que eram, deram a seu filho uma educação cristã, como convinha a um descendente dos heróis que haviam derramado seu sangue na luta contra o turco infame (muçulmanos, n.d.c.). Aos sete anos, D. Iñigo – assim se assinou o Santo até 1546 – foi mandado à luxuosa corte de D. João Velaszques de Cuellar, e mais tarde aos paços de Carlos V, para receber as últimas lições de “bem viver e alta cortesia”. No fim de alguns anos, D. Iñigo é oficial das tropas do vice-rei de Navarra. Extraordinariamente inteligente, “muito bom escrivão”, elegante, músico e bom poeta, soldado destemido, o jovem Loyola seria um cavaleiro perfeito. Infelizmente, porém, embora muito afeiçoado à sua fé, vivia de modo pouco conforme a ela. Mas era audaz, rijo, valente, animoso em enfrentar empresas árduas, prudente em dirigi-las e constante em leva-las a cabo. É importante conhecer-se o nobre nascimento de S. Inácio porque, como a graça não destrói mas aperfeiçoa a natureza, o Santo conservou, depois de sua conversão, tudo o que de mais magnífico e admirável se encontrava no caráter dos fidalgos de sua época. Nesse tempo Carlos V estava em luta com o seu constante inimigo, Francisco I de França. D. Iñigo foi designado para governador da cidade de Pamplona. Cercada a praça de guerra pelos franceses, o jovem Grande de Espanha tudo fez para bem defende-la. Mas outros eram os planos da Providência. O fidalgo Loyola feriu-se no joelho esquerdo e os franceses apoderaram-se da cidade. Muito ferido, retirou-se para o castelo de seus pais, onde esperou a cura. Qual não foi seu desapontamento quando verificou que o estado em que sua perna ficara prejudicava de maneira irreparável a sua elegância incomparável e a graça de seus movimentos fáceis, graça essa conhecida e comentada. Mandou pois quebrar de novo a perna para ser convenientemente encanada, não temendo a brutalidade dos métodos então empregados no tratamento de fraturas. Durante todo esse período, foi ele tomado de tédio, acabando por ordenar que lhe trouxessem livros. Os únicos que havia no castelo eram “A vida de Cristo”, de Ludolfo de Saxônia, o Cartuxo, e a “Flos Sanctorum”. Aborrece-se o cavaleiro ao deparar com estes títulos. Mas, à falta de outros, pôs-se a lê-los. E eis que o jovem e brilhante oficial é vencido pela graça divina e, depois de hesitar por algum tempo, toma a resolução de fazer o que fizeram os Santos. E imediatamente começa a pôr em prática sua resolução. Assim que teve forças, levantou-se e, a custo, apoiado a uma bengala, prostrou-se de joelhos ante uma imagem da Santíssima Virgem e Lhe pede que aceite o compromisso que ele toma de servir para sempre sob Sua bandeira. No mesmo instante, formidável abalo seguido de espantoso estrondo produziu uma larga fenda na parede do quarto em que se achava D. Iñigo. Era o demônio que manifestava seu ódio impotente contra aquele que seria um de seus piores inimigos. Logo que a doença o permitiu, Iñigo partiu da casa paterna, com intenção de nunca mais voltar. Depois de visitar o Duque de Nájera, seu tio, dirigiu-se ao Mosteiro Beneditino de Monserrate. Ao iniciar essa peregrinação, fez voto de castidade perpétua. Chegado ao Mosteiro, pediu para se confessar com um dos Monges do Patriarca São Bento. Confessa-se com grandíssima dor de seus pecados, troca suas ricas vestes por uma túnica de tecido grosseiro, e faz a “vigília de armas” diante do altar da Virgem, como o faziam os futuros cavaleiros na véspera do dia em que deviam ser armados. Era o dia 25 de março (festa da Encarnação do Verbo, n.d.c.) de 1522. Fugindo à afluência de peregrinos, o novo cavaleiro de Nossa Senhora se dirige a Manresa, onde se abriga em uma hospedaria destinada aos indigentes, pois de agora em diante ele também é um mendigo.
Impedido de seguir para a Terra Santa, conforme era sua intenção, o fidalgo mendigo ficou bastante tempo em Manresa (foto acima, tal qual se apresenta em nossos dias este histórico local). Foi aí que fez seu noviciado espiritual, com grandes penitencias, muitas consolações e, depois, terríveis tentações e escrúpulos. À tempestade seguiu-se a bonança. Santo Inácio recebeu então extraordinárias luzes divinas e admiráveis revelações. Essas revelações ele as coligiu em um livro “em todos os pontos de vista prodigioso”, como diz a Santa Liturgia: o livro dos Exercícios Espirituais. Em 29 de março de 1523, depois de viajar à custa de esmolas, chegou a Roma. Daí, vencendo com sua férrea força de vontade enormes dificuldades e obstáculos, vai em peregrinação à Palestina. *** Em fevereiro de 1524, Santo Inácio, que contava então 33 anos de idade, começa a estudar latim e ciências. Em 1526, ei-lo na Universidade de Alcalá, onde ouve dialética, teologia e filosofia. Já então tinha vários discípulos espirituais e várias senhoras, entre as quais algumas penitentes, confiavam-lhe a direção de suas consciências. Três jovens foram arrebatados pelos seus ideais apostólicos e se uniram a ele: João de Arteaga, Lopez de Caceres e Calixto. Mas em Alcalá e Salamanca (para onde se passou e onde adquiriu mais um sócio) Santo Inácio foi preso e julgado pela Inquisição, que temia que aqueles homens fossem hereges, e muito se espantava de vê-los discorrer sobre pontos difíceis da doutrina católica sem serem formados. Embora provado que a doutrina que ensinavam era perfeitamente ortodoxa, foi-lhes proibido continuar ensinando determinados pontos mais complexos. Diante disso Iñigo se põe a caminho para Paris. A 2 de fevereiro de 1528, chega à principal metrópole do saber da Europa, e se torna um entre os quatro mil estudantes que frequentavam as aulas da cidade universitária. Aí conhece o tomismo cujo imenso valor percebe imediatamente. Aos 44 anos de idade, depois de muito lutar com a falta de dinheiro e outras dificuldades, Santo Inácio é doutor. Graças a esse contato com as principais universidades poderá, mais tarde, traçar normas admiráveis para a formação intelectual dos membros da sua Ordem. *** Santo Inácio havia tomado a resolução de formar apóstolos imbuídos dos seus princípios. Mas tem que sofrer algumas desilusões: os seus quatro primeiros discípulos o abandonam e os três que recrutou em Paris, seguem o exemplo dos primeiros. Ensinado por essas defecções, o Santo faz novos recrutas, aos quais propõe o modo de viver que levariam os membros da futura Companhia. Esses recrutas, que seriam os generais da gloriosa milícia, foram: o Bem-aventurado Pedro Fabro, São Francisco Xavier, Laynez, Salmerón, Bobadilha e Simão Rodrigues (para ler comentários do Prof. Plinio a quadros da época representando a vários deles, basta clicar aqui, n.d.c.). Em 1534 reuniu-se esse pequeno grupo na igreja de Montmartre, em Paris, e, depois da Santa Comunhão, todos fizeram o voto de abandonar o mundo e entregar-se exclusivamente ao serviço de Deus. Estava fundada praticamente a Companhia de Jesus. Inácio foi para Roma, onde exerceu a sua missão. Em 24 de julho de 1537, Santo Inácio recebe juntamente com os companheiros que ainda não eram Sacerdotes a Sagrada Ordem do Presbiterado. Aos 27 de setembro de 1540, Paulo III, que já o conhecia e estima, assinava a Bula “Regimini Militantis Ecclesiae” em que aprovava a Companhia de Jesus. Santo Inácio foi eleito o primeiro Geral da Ordem por ele fundada, cargo que só aceitou depois de muitas insistências de seus companheiros. Desde então a Companhia não cessou de prosperar. Os Reis logo pediram a Santo Inácio alguns Padres para fundações em seus reinos. O primeiro foi Dom João III de Portugal, que desejava nada menos de sete Padres. Recebeu dois dos que tinham prestado compromisso na cripta de Montmartre: Afonso Rodrigues e Francisco Xavier. Este, porém, logo que a fundação de Portugal poude dispensar-lhe os serviços, recebeu ordem de partir para a Índia. Apesar de extremamente ocupado, Santo Inácio não deixava de ensinar as crianças, de fundar recolhimentos, de preparar novos Jesuítas. Preocupava-se constantemente com a situação alemã. Tão ativo foi o Santo espanhol que chegou a circunscrever em muitos lugares a obra nefasta do protestantismo, apesar de sua Companhia contar poucos anos de existência.
Uma de suas obras foi a fundação do Colégio Romano (foto acima) em Roma, obra que só por si bastaria para imortaliza-lo. Santo Inácio, antes de seu glorioso trânsito (31 de julho de 1556), poude ver os primeiros grandes frutos de sua obra. São Francisco Xavier deitava as sementes do catolicismo no Japão e nas Índias. Em Mogúncia, Colônia e outras cidades alemãs, a pseudo-reforma protestante foi completamente sufocada no nascedouro. Não admira pois que essa Companhia de Santo Inácio seja a Ordem mais caluniada da Igreja. O seu Fundador, pouco antes de morrer, revelou aos seus Padres que ela sofreria perseguição por amor à Justiça, como aconteceu a Nosso Senhor Jesus Cristo, porque o servo não é melhor que o seu Senhor. Inúmeras outras coisas se poderiam dizer sobre aquele a quem a Sagrada Liturgia chama “mestre especializado na formação dos Santos”; “seu amor suavíssimo e dulcíssimo de Pai” (palavra do R. Ribadeneira, um dos Jesuítas formados pelo Santo Fundador), sua intransigência quando se tratava de expulsar um membro indigno, seu amor aos pobres, seus dons místicos, seu amor à Sagrada Liturgia, sua prudência, e tantas outras coisas que encheriam vários livros para serem contadas. Todavia há uma palavra que é sua e que resume de modo perfeito toda a sua vida: “Omnia ad majorem Dei gloriam” (tudo para a maior glória de Deus). |