Plinio Corrêa de Oliveira

 

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Loucuras

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 21 de março de 1943, N. 554, pag. 2

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Positivamente, o mundo está de pernas para o ar. Se nos vierem dizer que os presos das cadeias públicas vão dirigir institutos de regeneração, não nos espantaremos. Se soubermos que as pessoas casadas no Uruguai, e outras que não são casadas em parte alguma, vão promover a moralização dos costumes, não nos escandalizaremos. Se virmos algum comunista empenhado na restauração social, não duvidaremos de nossos olhos. Se observarmos que algum “scroc” [trapaceiro, vigarista, n.d.c.] internacional se encarregou da reorganização do mundo, tão pouco perderemos a calma. E, ainda que débeis mentais sejam incumbidos do magistério e os imbecis tiverem a direção de empresas, e os ladrões tiverem a guarda dos tesouros, nada nos poderá fazer cair das nuvens. Estamos vacinados contra o absurdo.

Isto tudo porque aconteceu uma coisa mais absurda do que todos os absurdos: existe um sanatório espírita para loucos o que quer dizer, em outros termos, a loucura erigiu-se em restauradora da sanidade mental. E a maior loucura é que tamanha loucura está sendo recebida como se fosse uma coisa natural. Quem havia de dizer que o tempo ainda iria reabilitar a memória de Simão Bacamarte?

O fato é muito grave. O espiritismo tem sido entre nós um agente de desequilíbrios mentais de toda ordem, e grande parte dos loucos, que se abrigam em nossos hospitais, tiveram nas experiências mediúnicas a origem de sua infelicidade. A Sociedade de Medicina Cirúrgica do Rio de Janeiro, entidade de caráter estritamente científico, já chegou até a erigir um fundamentado memorial, pedindo, em nome da saúde mental dos brasileiros, a proibição das práticas espíritas em nosso país. Que destino teve este memorial? Não o sabemos. Contudo, o valor de seus argumentos continua de pé, pois nem sequer apareceu quem o quisesse refutar.

Sabemos que existe a distinção malandra entre alto e baixo espiritismo, tão mais fácil de ser objetada, quanto mais difícil é a determinação dos limites entre estas duas províncias do mediunismo. Aliás, tal distinção, que até hoje ninguém conseguiu precisar porque não passa de uma distinção cerebrina e velhaca, tem servido de capa aos abusos de toda espécie e aos privilégios mais injustificáveis.

De qualquer forma, entretanto uma coisa não pode ser posta em dúvida: o espiritismo, quer alto, quer baixo, é um assunto inteiramente controvertido em que nem os próprios espíritas se entendem.

Ora, o tratamento das moléstias mentais é algo de muito delicado, que exige um longo e cuidadoso preparo técnico, ao par de uma grande idoneidade profissional. Aliás, estas condições são exigidas de todos aqueles que se dedicam, por qualquer forma, ao tratamento da saúde humana, e não há nada mais razoável e justo do que a estreita e severa vigilância que os poderes públicos exercem neste sentido capitulando toda uma série de requisitos a serem preenchidos. Será que um sanatório espírita para loucos, que emprega no tratamento uma doutrina flutuante, que se presta a toda sorte de temeridades e alucinações, poderá ser útil à saúde pública? Não será antes um perigo?


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