Plinio Corrêa de Oliveira

 

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O Carnaval e a guerra

 

 

 

 

 

 

 

 

Legionário, 28 de fevereiro de 1943, N. 551, pag. 2

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Certos escritores de meia tigela, que se querem dar ares de profundos, de psicólogos, de filósofos ou de qualquer outra coisa em que se lhes possam estatelar o pedantismo e a superficialidade, costumam afirmar que é durante a mascarada carnavalesca que o homem, “tirando a máscara dos preconceitos e das convenções sociais”, mostra a sua verdadeira fisionomia. E o ultra cediço chavão, o pretendido paradoxo encontra sempre, entre certas pessoas graves, o acolhimento devido aos grandes oráculos.

Ora, nós achamos exatamente o contrário. No Carnaval, não só a humanidade não tira máscara alguma, antes, se aferra mais encarniçadamente à máscara que, nestes últimos tempos, não cessa de usar. Assim, o Carnaval não é um oásis, ou uma trégua; é um auge, um recrudescimento, crise delirante de um estado crônico. De fato, o Carnaval moderno não passa de uma torpe falsificação, de uma réles intrujice, de uma atroz mistificação. Sob pretexto de cultuar a alegria, o Carnaval trai a alegria. Em verdade, que é a alegria carnavalesca? Embriaguez de álcool, embriaguez de éter, embriaguez de ritmo, em suma, a completa desordem do sistema nervoso, alucinação de pessoas que desejam fugir de si mesmas, porque em si mesmas morrerão de tédio ou de náusea. Para uma humanidade falsificada, idiotizada, brutalizada, que detesta a sua alma e não quer contemplar a sua própria face, só mesmo uma alegria falsificada: o Carnaval é inumano.

Neste momento, discute-se se o Carnaval deverá ou não deverá ser festejado este ano. Não ficam bem, dizem, os festejos carnavalescos, quando o Brasil se acha em guerra. Neste sentido, até uma entidade carnavalesca já dirigiu um fundamentado comunicado à imprensa, anunciando oficialmente o propósito de abster-se de suas atividades, no presente ano. Nós achamos que não só em tempo de guerra, mas em qualquer outro tempo, se devem suprimir as festas pagãs do Carnaval. A guerra, apenas, vem trazer um argumento a mais.

Desde que as calamidades são consequências dos pecados, façamos penitência e, muito especialmente, afastemos as causas dos pecados, a fim de que Deus se compadeça de nós.

Mesmo porque, há uma inegável afinidade, afinidade íntima e secreta, entre o Carnaval e a guerra. Ambos nada mais são, no fundo, do que a mesma animalização do homem, que o torna cruel e sensual, duas coisas idênticas, na realidade: as orgias de Nero não eram completas sem o martírio de muitos cristãos.

Assim sendo, portanto, para que mais três dias de Carnaval, se já temos mais de três anos da guerra? A bestialidade de nosso século já tem este grande Carnaval sangrento, não precisa de ninharia do tríduo carnavalesco.


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